Primeira parte de uma trilogia de “amor líquido”, O Uivo da Gaita é uma história regida por Bruno Safadi que tem na rotina amorosa a pauta da segurança enquanto unidade familiar. O início, contemplativo, revela belas imagens da costa litorânea carioca, reunindo todos os sentidos possíveis da história de amor. Já na areia, as duas personagens femininas fazem uma descompromissada corrida atrás do vento, sem qualquer sentido ou moral, unicamente seguindo seus instintos.
Luana e Antônia se entregam ao prazer proibido, maximizado por suas duas belas intérpretes, Leandra Leal e Mariana Ximenes, que fazem produzir cenas tórridas, dignas de qualquer fantasia heterossexual masculina, possantes e potentes, mesmo nos parcos minutos iniciais, para logo depois revelar o presente, momento em que o roteiro pretende montar sua história.
Abrindo mão de falas que poderiam prever qualquer movimento, o roteiro contempla a “vida real” de Antônia, presa em uma relação comum com Pedro (Jiddu Pinheiro), relacionamento cujo cotidiano pesa mais do que qualquer outro aspecto. Os ecos audíveis das pessoas flagradas em cena só ocorrem aos quinze minutos, com quase um quarto de filme, somente para reforçar a ideia de discussão de relação, ainda que a abordagem entre os antes iguais esteja claramente na curva descendente, às vésperas de acabar.
É em uma das interações entre Pedro e Antônia que Luana surge, a princípio para “brincar” com eles, dançando em um ritmo louco, levantando possibilidades de poligamia, artifício comum em relações em fase de degradação, mas aos poucos os paradigmas mudam. Os jogos de sedução começam brandos, algo bem diferente do explícito exibido no começo da fita.
Os ângulos que Safadi escolhe primam pela sensualidade, esbanjando bom gosto especialmente ao analisar as voluptuosas curvas de Leandra Leal e seu poder de alcançar o fetiche das duas partes do casal. A naturalidade dos seus movimentos mostra-se também para a câmera, que causa choro e emoção às duas partes do casal, mas que não consegue passar tal ebriedade ao público, pelo caráter lento da narrativa, ambiciosamente dividida em três longas-metragens.
Mostrando pessoalidade na confecção de seus heróis, o realizador insere uma desolação de alma no comportamento distinto de Luana, mostrando-a desagradável em sua rotina comum, longe das outras duas personagens. O affair construído causa uma interdependência que se assemelha à sensação abstêmia de quem é obrigado subitamente a deixar de usar uma substância da qual é dependente.
O desfecho é inconclusivo, referenciando a segunda parte, O Rio Nos Pertence, que explora o mesmo elenco mas em tramas diferentes, tendo em comum o cenário da cidade maravilhosa. Depois das dedicatórias, há uma cena pós crédito que relembra a lentidão narrativa da obra, tornando erudito um texto simples, mas que pouco foge das convenções sofisticas. Apesar das boas imagens, o filme é mais digno de reprimendas do que de aplausos.