Passada em Ipswich, uma cidade do Oregon nos anos 1980, Verão de 84 começa com um menino, Davey (Graham Verchere), andando de bicicleta, narrando mentalmente sua rotina e seus dias, refletindo e discutindo a vida pacata e típica do subúrbio. Seu dia a dia é chato, monótono, o máximo de animação que ele faz é ser voyeur de uma vizinha bonita que ele tem. Ele e seu grupo de amigos falam em tentar se emancipar, em tentar coisas novas, mas não tem muito ideia de onde ir ou do que fazer.
Esse quadro muda de maneira bem lenta, e só há realmente uma ruptura com a morosidade quando o personagem Rich Sommer aparece, o senhor Wayne Mackey. Vendo algo suspeito no comportamento dele, que é um delegado de policia, eles passam a vigiar o homem, achando que ele pode ser um assassino em série, embora os elementos para essa constatação sejam praticamente nulos.
O principal diferencial do filme de Anouk Whissell, François Simard e Yoann-Karl Whissell é o apelo a nostalgia, se valendo de elementos da moda como historias protagonizados por crianças, como foi com o recente ITe Stranger Things – esse aspecto está tão em voga que até o mais recente Brinquedo Assassino também lança mão disso – mas o que se vê também são mais elementos das historias de Stephen King, como o mistério na cidade pequena, e uma amizade bem intensa entre meninos, embora todo o restante das referencias seja mais ligada a estética trash e slasher, em especial na exploração da sexualidade, embora até essa seja bem suavizada, assim como o apelo ao gore.
O filme é bem comedido, promete uma aura de mistério que se desenrola muito vagarosamente. De positivo, há a construção da paranoia de Davey, que piora depois que os adultos intervém. Sua postura acaba se mostrando uma atitude mais madura e correta que a dos seus pais e dos pais de seus amigos, na questão que é sem dúvida o ponto mais positivo dos 105 minutos de exibição.
Toda a carga dramática é deixada para o final, em uma perseguição agressiva, impiedosa e pessimista, do vilão sobre os heróis. As atuações melhoram muito perto do desfecho, em especial os citados Verchere e Sommers, o diálogo que eles tem beira a tortura psicológica e revela o pior que o ser humano carrega. Apesar de irregular, Verão de 84 é um bom filme barato, apresenta boas idéias e uma abordagem despretensiosa e comedida.
O início de Tolkien, filme biográfico dirigido por Dome Karukoski se dá com uma cena fantástica, de luta dentro do contexto mitológico que o autor de Senhor dos Anéis escreveria alguns anos depois. Não demora a ser mostrado J.R.R. Tolkien, de Nicholas Holt, deitado em uma cama de uma das trincheiras da Primeira Guerra Mundial, ondeserve e tem até uma posição de prestígio. O filme da Fox Searchlight talvez seja uma das ultimas produções mais graúdas do estúdio, que está sob risco de acabar, graças as decisões comerciais da Disney, que comprou a Fox e suas companhias secundarias.
O filme não tem uma linha de tempo principal, varia muito entre o período adulto pré Guerra, durante o conflito e o pós, além de mostrar a infância do futuro escritor, que na época era conhecido com Ronald e era vivido por Harry Gilby, que aliás, tem um desempenho melhor e mais emocional que Hoult. É na fase infantil que o longa apresenta seus melhores momentos, pois a maior parte onde ele já é crescido, é envolto em alguns problemas narrativos sérios.
A trilha é manipuladora e isso se percebe já nos primeiros momentos, pois há uma tentativa de encurtar o jogo de sentimentos em clichês muito gratuitos, e que irritam o espectador que tem qualquer senso crítico. A parte romântica piora a trama ainda mais, soando excessivamente melodramática. O casal formado por Holt e por Lily Collins também não tem funciona, não há química, fato que complica demais o espectador julgar bem a historia como um todo.
A adaptação ganha ares de uma cine biografia genérica, e que piora por ter um início divertido e inventivo, misturando autor e obra em um som argumento. As idas e voltas da narrativa, variando entre guerra, amor e infância cansam, não há um foco realmente certeiro em nenhum deles. O filme funciona fundamentalmente quando se permite ser onírico, nos sonhos do futuro autor, que se aventura por paisagens que lembram a Terra Média e o infortúnio de Frodo, em paralelo com a desolação de seu criador quando está no campo de batalha. Holt não segura bem o filme, é um protagonista com zero carisma. O final de Tolkien tenta evocar o lado escritor do protagonista, mas o faz de maneira tão piegas que boa parte do caráter épico de sua trajetória de vida e da sua obra são banalizadas. Karukoski tem uma mão pesada, e que não funciona na maior parte de seus longos 112 minutos.
Charles Stone III, diretor da comédia O Rei do Jogo e do genérico de ação protagonizado por mulheres Lila & Eve surpreendeu o mundo ao realizar um filme sobre esporte e superação com não atores – entre jogadores, como Kyrie Irving e Aaron Gordon e ex-jogadores da NBA, incluindo aí Shaquille O’Neal, Chris Webber, Reggie Miller, Nate Robinson e até a campeão mundial de basquete feminino Lisa Leslie – que foi muito elogiado, trata-se de Tio Drew, produção em parceria com a Amazon que chegou a ser cogitado para a temporada de premiações nas categorias de maquiagem.
A historia é engraçada, começa como um falso documentário da ESPN, no formato 30/30, explicando a importância de uma lenda do basquete de rua, fruto da lendária quadra Rucker Park, no Harlem – local que foi alvo do documentário #Rucker50, que inclusive, seria o torneio que o filme retrata – um sujeito tão mágico que seria ele a figura da silhueta símbolo da NBA, claro, com o cabelo mais comportado, isso dito pelo próprio Jerry West, que seria o real modelo. Nessa parte, se vê figuras como Dikembe Motumbo, Steve Nash e outras figuras do Harlem e do resto dos Estados Unidos, louvando a memória desse ótimo jogador, que desapareceu.
Paralelo a essa historia, corre do medíocre Dax (Lil Rel Howery), um aficionado pelo esporte. Quando criança se inspirava demais em Michael Jordan, e ia bem, até ser bloqueado por Mookie Bass, que na fase adulta é feito por Nick Kroll. O insucesso da infância persegue ele, mesmo na fase da meia idade, quando treina um time amador. Após Dax fracassar, seu caminho cruza o de Drew, como dois astros cadentes, que vêem em ambas misérias a possibilidade de melhorar, embora o homem geriátrico já não tenha nem vontade nem disposição para competir, precisando ser convencido – o que aliás, nem demanda tanto esforço do treinador.
Kyrie Irving já vinha fazendo o personagem em comerciais da Pepsi desde 2012, tanto que Uncle Drew virou seu apelido. É engraçado como a maquiagem tosca funciona bem, e torna o filme em algo despretensioso e ao mesmo tempo mágico. A sensação de que o basquete é o evento e coisa mais magnífica e mágica do mundo é muito bem
Há pequenas menções e reverências do filme, como o personagem Lights, de Reggie Miller, que tem toda a compleição física de Kareem Abdul Jabbar, a lenda do basquete que se tornou ator e discípulo de Bruce Lee – há de se lembrar também que Reggie tinha momentos homéricos de discussão com Spike Lee, nos jogos contra o New York Knicks. Se da parte dramática, na relação entre os personagens principais que vem a formar o quinteto titular do Harlem Money há um show de momentos bem piegas e clichês do roteiro de Jay Longino, sobra espontaneidade e naturalidade por parte do elenco, em especial Irving e Shaq, que finalmente se redime pelos péssimos Kazaam e Steel, retomando uma boa participação como havia feito em Blue Chips.
É um bocado estranho como, mesmo tendo maquiagens e efeitos muito pesados e risíveis, mesmo com uma história de fundo bem fraca para cada um dos personagens, há também muita alma e muita graça na comédia. Tio Drew está longe de ser um filme hilário, suas piadas são muito básicas, mas há claramente um esforço por parte de quem fez o filme acontecer para que este seja uma reverência ao basquete de rua, a tradição do Harlem em formar jogadores profissionais e amadores, e claro, a prática dos showmans do garrafão.
A magia e atmosfera da localidade, da comunidade e do Rucker Park é muito bem registrada, além é claro desse ser uma ode ao basquete clássico, pondo frente a frente um crossover que reside no imaginário dos fãs mais ardorosos da NBA, que adoram colocar frente a frente times do presente e do passado, e a batalha moral entre Chris Webber e Aaron Gordon. Tio Drew mistura elementos típicos dos filmes mais melosos de Adam Sandler com uma genuína necessidade de louvar as origens do basquetebol americano, pondo tanta alma e verve neste último que todo o resto é compensado, não se imaginava quando Irving protagonizava os comerciais de refrigerante que algo tão sentimental e singelo sairia como esse saiu – e nem que o filme teria uma representação de movimentos de basquete tão boa quanto em Brancos Não Sabem Enterrar e Blue Chips – e de certa forma a vida imita a arte, uma vez que não tanto tempo após o filme ser lançado, Irving voltaria a bater bola em Nova York, passando a jogar pela franquia do Brooklyn Nets, resta saber se terá tanto sucesso quanto seu personagem teve no Jubileu do Rucker Park, só o tempo dirá.
Lançado para a televisão, dirigido por Frank Pierson, Conspiração foi um filme lançado em 2001, que começa com a arrumação de uma casa em Hansee, no subúrbio de Berlim, onde ocorre a preparação para a chegada de alguém importante. Serviçais e empregadas abrem lençóis, servem mesas, varrem o assoalho e preparam comida suficiente para um banquete. Quem está organizando esse evento, é Adolf Eichmann, personagem de Stanley Tucci que aliás, está muito bem fazendo um anfitrião que aparenta calma e apatia mas que esconde uma enorme tensão e expectativa pelo encontro que ocorrerá. Eles esperam a chegada de Reinhard Heydrich (Kenneth Branagh) um general da SS que liderará uma reunião sobre o futuro da guerra, ao menos no que tange o Reich.
O filme é muito baseado em seus atores. Tucci está muito a vontade, mostrando que sua ansiedade não é só com o rumo de sua vida futura, mas obviamente também dos rumos da guerra, que serão de certa forma decididos naquela refeição/reunião. Se nota o senso de urgência no semblante do ator ítalo-americano, assim como se percebe uma altivez na versão que Branagh entrega do chefe do exercito alemão.
Há uma certa demora na chegada dos integrantes da reunia, e uma enorme liturgia na recepção dos mesmos. O modo como cada um deles é apresentado mostra não só a importância do ajuntamento, mas também que segredos muito grandes estão para ser discutidos. Outro aspecto que deixa isso muito claro é a câmera, que fica bem próxima dos convidados, e vez por outra varia rapidamente entre os ombros de uma pessoa para logo depois passear pelo rosto e corpo da pessoa que está no hemisfério oposto.
Um dos personagens que logo de cara parece importante, é o Dr. Wilhelm Stuckart (Colin Firth), mas só se nota realmente qual é sua importância quando as conversas começam a ficar mais séria. Conspiração é claramente um filme de diálogo, com boa parte dele se passando em conversas durante o jantar e pelas estratégias, mas se seu título fosse Consenso, não seria estranho, uma vez que a maioria dos assuntos “debatidos”, são simplesmente impostos se não houvesse vozes dissonantes ali, embora haja um ou outro incômodo por parte dos mais escrupulosos.
O começo das conversações é sobre coisas e eventos triviais, não há nada muito fora do ordinário. Tendo ciência dos rumos da guerra, da humilhação imposta aos judeus, as mortes que foram causadas. Ver discussões sobre gastos, sobre organização ou sobre o que será ou não consumidos nos territórios e nas estalagens militares é bizarro, especialmente por que os personagens, com a pompa de serem homens importantes falando como se fosse normal o fuzilamento de judeus ou de meio-judeus é no mínimo estarrecedor. Tentar amenizar isso beira o irreal, no entanto é fato que aconteceu e é fato que a historia se repete nesse sentido, de se normalizar certos tipos de comportamentos extremos, como se não houvesse qualquer incomodo ou erro nesse tipo de comportamento quando a segregação deveria só ser combatida por qualquer tipo de liderança de esquerda ou progressista, ou conservadora e direita como é com os alemães.
Se demora mais de um terço do filme para haver a primeira discussão mais incisiva, quando um dos generais diz que não vê necessidade em exterminar os judeus nos campos ou cidades, quando “só” expulsá-los seria o suficiente. Também se tenta passar como lei a regra de esterilização dos judeus, como método para controlar o estado de saúde na Polônia e outras nações que fazem parte do território sob as ordens de Hitler.
Mesmo com toada a frieza nas discussões e na leitura dos relatórios de quantos morreram nas câmaras de gás, há de se lembrar que se tratam de homens, de pessoas de carne e osso, que tem alma, que fazem suas necessidades como quaisquer outras e que não tem (em sua maioria pelo menos), qualquer receio de parecer ou não monstruosos. Conspiração termina sem muitas viradas narrativas, é um filme de diálogo e que precisa muito do desempenho de seu elenco, que aliás, está afiadíssimo. Antes dos créditos finais, é dito o destino de cada um dos que lá estavam, e se nota impressionantemente o quão pequenas foram as penas de todos, e talvez essa historia jamais tivesse chegado ao conhecimento geral caso houvesse esforço de procura de registros e investigação para muito além do Tribunal de Nuremberg.
Começa com o pronunciamento patriótico de uma senhora, que utiliza sua fala no microfone para louvar a iniciativa do programa esportivo do Harlem, que faz 50 anos e leva alguns muitos jovens a liga de basquete profissional. #Rucker50 – Gigantes do Basquete é um pequeno documentário, de pouco menos de uma hora, conduzido por Robert McCulough Jr, o documentário reúne falas de lideranças locais de ontem e de hoje, e passa obviamente pelo assunto do basquete como fator de inclusão social de jovens negros.
No início, o filme dedica um trecho para falar do evento que foi a marcha sobre Selma, em 1965, retratada muito bem no filme Selmade Ava DuVerney. Esse especial é um bocado panfletário, tem um cunho social diferenciado, e mostra que o local era efervescente desde cedo, sendo pioneiro na construção da mentalidade e identidade do negro estadunidense, e parte dês emancipação de postura, é fruto da localidade do Rucker Park, a quadra de basquete localizada no Harlem, batizada assim por conta de Holcombe Rucker, um jogador valente que perdeu a luta contra o câncer e morreu cedo demais.
O formato da obra é bem televisivo, e mostra um bocado do legado de Rucker, que entre outros feitos, ajudou a formar até senadores, como Bob McCulough, que vem a ser pai do diretor do especial, além de um político bastante importante para a comunidade. Da parte do esporte, há imagens de arquivo maravilhosos de jogos na Rucker, envolvendo Freddie Crawford, com lances absurdos, como uma ponte aérea vinda quase da quadra de defesa, e foi ali também que começou as tradições das Ligas de Verão, que por sua vez, revelaram grandes talentos da NBA, como Wilt Chamberlain.
O programa é bastante quadrado, seus capítulos demonstram isso muito bem, mostram cada etapa nomeada, se fala um pouco sobre, mostra a cena de hip hop e também como o basquete e o rap se misturam na historia do Harlem. Apesar de não aprofundar em quase nenhum dos muitos assuntos que aborda, é uma boa introdução ao assunto, especialmente par quem não conhece quase nada das culturas dentro do mega universo que Nova York traz, para muito além do pensamento capitalista típico dos Estado Unidos, fortalecendo a ideia de comunidade e do poder e exemplo da comunidade negra americana, respeitando demais as origens afro-descendentes das mesmas. Em alguns momentos, o filme chega a emocionar, muito por conta dos depoimentos emocionados dos entrevistados, que dão mais cor ao que poderia ser só mais um documentário genérico sobre algum lugar de gueto dos EUA.
Oscar era um jogador brasileiro de muita fama no Brasil, e muitos ao analisar sua carreira, não fazem jus ao jogador que Schmidt era. A maioria dos fãs do esporte consideravam o Mão Santa como um jogador de um tipo de jogada, de arremessos de três pontos. A realidade, é que a maioria das pessoas no país quando viram ele jogando, já o viram em fim de carreira, no Flamengo, sem ver o auge dele como atleta, quando ainda era competitivo, em 1984 ele foi draftado, pelo New Jersey Nets – atual Brooklyn Nets – mas por motivos até hoje não totalmente esclarecidos, ele não jogou pelos Nets.
O motivo oficial é dito sobre a dura regra da NBA, de que se lá jogasse, não poderia jogar na sua seleção, e isso ele não queria, mas muito se fala sobre a possibilidade dele não querer correr o risco de ser reserva, quando na Itália era ídolo. No ano de 2017, já veterano, aposentado já há 14 anos, ele foi indicado a uma homenagem no Basketball Hall of Fame. Curiosamente, ele é levado até o palco pela lenda do Boston Celtics, Larry Bird, que também era especialista em arremessos de três pontos.
Os entrevistados que falam sobre quem era Oscar como atleta são muitos, se destaca Kobe Bryant, que viveu na Itália e teve oportunidade de ver o modo de chutar que Schmidt fazia (ele ainda diz que Oscar não seria mais um, e sim dominaria as quadras da NBA). O próprio Bird dizia que ele era imarcável. Entre os brasileiros, a fala mais marcante era de Dodi, ex-jogador do Sírio dizia que ele tinha febre em quadra, exigindo que dessem a bola para ele, chegando a 39 graus. Não se sabe se isso era modo de falar ou se correspondia a realidade. Em se tratando de um sujeito que bateu quase 50 mil pontos,
Há um destaque sobre o draft de 84, que contou com jogadores como Charles Barklay, John Stockton, Michael Jordan e a primeira opção Hakeem Olajuwon. Oscar foi para o pós segunda rodada, e seria um dos primeiros estrangeiros a jogar na NBA, mas ele não aceitou. Incrivelmente, o Nets só desistiria de contratar ele em 1987, sempre renovavam os pedidos por contratos, e coincidentemente foi em 87 a vitoria da seleção de Oscar e Marcel Souza sobre os Estados Unidos no Pan Americano de Indianapolis.
É engraçado ver a rotina dele, uma vez que após parar de jogar, pelo Flamengo em 2003, ele jamais havia entrado em quadra de novo de maneira séria. Nos treinos para o jogo exibição, ele errava lances bem simples, provando a máxima/clichê que ele mesmo dizia, de que não tinha mão santa e sim treinada, pois ele só melhorou quando voltou a praticar. Obviamente que os adversários não faziam marcação cerrada em cima de si, afinal era um senhor de 59 anos, que passou por muita coisa, entre elas, um tumor canceroso.
A Estreia se dedica a mostrar um pouco da rica historia de Oscar, mas sem revelar tanto. O produto que Andrea Cassola dirigiu e Danilo Gullame roteirizou é sensacional em sua proposta, e serve bem esse episódio mágico para o jogador. É seco, direto, vai direto ao ponto, sendo sucinto e emocionante na medida, dando a possibilidade do próprio explicar o porque jamais jogou no melhor campeonato do mundo.
O documentário Iverson começa em uma quadra, cheia de crianças, com o câmera perguntando para elas quem é Allen Iverson, e eles discutem um pouco de quem ele é, de sua origens e como foi sua trajetória profissional, falando da época universitária, na NBA e um pouco sobre sua passagem na Europa. Nos primeiros momentos do filme o ícone anuncia sua aposentadoria, na Filadélfia, em Outubro de 2013, e segundo as falas do próprio documentário, ele era o mais popular jogador da China pós Michael Jordan. O filme de Zatella Beatty se dedica a discutir quem ele era em quadra e fora de quadra, e o legado que deixou pós aposentadoria.
Não demora a retornar a Newport, Virginia, onde o mito se originou e onde o chamavam de Bubba Chuck. O documentário é bem quadrado e normativo, seu formato não ousa muito, fala um pouco sobre o passado do biografado, toca uma trilha sentimental que manipula um bocado as emoções do espectador e neste início,o que realmente vale nota é que ele era fenomenal no futebol americano também, e manteve uma carreira colegial vitoriosa e quebradora de recordes em ambas modalidades quando ainda estava
Gasta-se um tempo demasiado explorando a primeira prisão dele e o julgamento em corte que quase inviabilizou sua carreira. Do ponto de vista prático, há pouco a acrescentar esse extenso trecho, que poderia facilmente ser encurtado para uma pequena nota. Gasta-se mais tempo nisto que na parte que discute a origem humilde e a falta que fez o pai tê-lo abandonado, e isso pesa na produção que tem quase 90 minutos de duração. É inegável que é importante contextualizar todo imbróglio, até porque ele só saiu da prisão graças ao perdão do governador. Ao menos, a ponte para a apresentação de John Thompson como um de seus mentores na faculdade é bem pavimentada. As declarações do mesmo e das pessoas próximas garantem que se não fosse o técnico, dificilmente ele teria se dado bem na Georgetown University, e dificilmente seria draftado como primeira opção de 1996 do Philadelphia 76yers.
Toda a morosidade anterior aos 40 minutos de exibição é compensada quando ele finalmente age na NBA, e mostra ser exímio demais em Crossovers, e obviamente que o Beatty foca bastante nos confrontos que ele fez com Michael Jordan, quando batia bola tão rápido na frente do melhor jogador do mundo e o deixava sem reação, quando ainda era calouro, e isso o fez ser eleito o melhor novato do ano, fato que jamais havia acontecido da Filadélfia.
O maior legado do armador fora seu jogo diferenciado e obviamente sua habilidade de jingar e trazer qualquer adversário para sua dança, era o estilo Thug Life e a mentalidade do movimento Hip Hop que trazia para os holofotes da ribalta esportiva. Por mais que tivesse problemas anteriores com a lei, ele incutiu na cabeça de muitos meninos jovens da periferia americana que seus estilos de vida não eram errados, e que poderiam vencer, claro que tudo isso passava por uma ideia de consumismo, mas não há o que condenar em relação a isso, pois boa parte deles vivia por curtos períodos de tempo.
O que não condizia muito com conduta exemplar, eram as acusações de porte de arma ilegal e suposto uso de drogas, ainda que essas acusações nos tribunais também não prosperassem. A realidade é que ele abriu a possibilidade para muitos jogadores semelhantes a ele, não só casos como o de Carmelo Anthony, mas também outros jogadores famosos se sentiram bem para se tatuar e para fazer de seus corpos exatamente o que quisessem. Apesar de falar um pouco sobre a indisciplina dele, o filme é condescende e chapa branca, parecendo uma mera obra encomendada.
Iverson dedica pouco tempo a derrocada de Allen, mas que a cineasta ratifique o quanto a ligação dele com seu time inicial era forte, e como a curva descendente de sua carreira ocorreu graças a erros de escolha do mesmo. Ele poderia ter sido muito maior do que foi, mas isso não o faz parecer um derrotado, uma vez que teve um auge físico por muito tempo, diferente de outras figuras do esporte vistas como desperdício de talento e de potencial, como foi o centro-avante Adriano Imperador no Flamengo e Internazionale de Milão. Iverson era diferenciado, marcou época, ditou moda de uma maneira tão grande que a NBA precisou fazer sanções para que os jogadores usassem roupas mais formais nos preparativos para os jogos, fato que até hoje é muito polêmico, e descaracteriza boa parte dos jogadores. Por mais que o filme de Beatty seja aquém da figura do biografado, é fato que Allen foi um dos mais importantes jogadores e figuras do basquetebol americano.
Michael J. Fox faz Scott Howard, o número 42 do Beavers, um time escolar tão inofensivo em seu jogo e no quinteto titular que o primeiro momento do jogo ele cobra uma arremesso livre pisando na linha e pulando, lances que anulariam a jogada, e absolutamente ninguém reclama, pois eles estão muito atrás do placar. O filme se debruça sobre a historia desses perdedores e no Brasil ficou conhecido pela picaretagem da tradução, que evoca o clássico também protagonizado por J Fox, De Volta Para o Futuro, sendo que não há qualquer menção nesse há algo fora do presente de 1985.
Hoje, o filme é mais conhecido por sua serie derivada, Teen Wolf, que tem em comum quase nada, alem do nome original e do fato de ser protagonizado por um lobisomem. Meio sem motivo, o corpo de Scott vai mudando, adquirindo pelos que vem de modo repentino, tornando suas orelhas mais agudas, escondidas apenas por seu penteado de tigela e isso o deixa preocupado, por possivelmente impedir ele de farrear, e de curtir o pedaço do filme que faz lembrar os filmes adolescentes de festa, com um Porkys ou Picardias Estudantis mais leve e sem nudez.
Ao menos, Rod Daniel, o diretor dignifica seu filme a não dedicar muito tempo e esmero a transformação, fazendo dela uma enorme piada, que ocorre com pouco mais de 30 minutos de exibição e é grotesca visualmente, e só não surpreende mais graças ao fato que ocorre logo depois, com uma mini conversa de pai e filho sobre essa condição. O roteiro obviamente extrapola e exagera as sensações típicas da puberdade e as mudanças corporais que um jovem sofre ao se aproximar da vida adulta, e trata isso com comédia e até leveza.
Scott decide começar a curtir suas transformações, e faz isso no meio de um jogo e ao invés de sofrer bullying, vira um jogador melhor e passa a concentrar a atenção das meninas, além de assustar adversários em um primeiro momento. Sua popularidade cresce, até o mascote do time muda e ele vira o mais popular dos meninos do colegial.
O filme é gaiato ao extremo, o personagem principal consegue transitar bem entre o sujeito que incomoda pela fama repentina recente e o sujeito que não perde sua humildade, ele se aproxima da garota mais popular do colégio, Pamela (Lorie Griffin) e incomoda seu namorado, Mick (único que o recrimina basicamente) e ainda mantém viva a chama com a moça que sempre o cortejou mesmo quando ele ainda era um perdedor. Nesse ponto, o roteiro é maniqueísta, não traz muitas conseqüências ao seu personagem principal, ainda que o mostre humano.
A forma como o script de Jeph Loeb (o mesmo que fez a série das cores na Marvel e Batman – O Longo Dia das Bruxas) e Matthew Weisman desenvolve os momentos finais é bem clichê, restringindo as capacidades do lobisomem adolescente e mostrando que o devido valor dele já existia antes mesmo dele perceber a condição da licantropia, embora antes, não houvesse qualquer indício disso. Apesar de O Garoto do Futuro ter toda essa carga descompromissada com qualquer moralidade típica dos anos 80, há muito charme e graça no filme, especialmente por Michael J. Fox emprestar seu carisma a Scott, fazendo acreditar não só que ele pode ser um monstrinho bondoso, capaz de gerar simpatia em tudo e todos, mas também fazendo acreditar que um quase anão seria uma fera do basquete colegial.
Filme de 2008, protagonizado por Will Ferrell e dirigido por Kent Alterman, Os Aloprados se passa em 1976 em Flint, cidade do estado de Michigan, focado no famoso e decadente cantor Jackie Moon, que após o grande sucesso de um hit seu, comete uma extravagância enorme, que é comprar seu próprio time de basquete, o Flint Tropics, se tornando o técnico da franquia, além de jogador. Já no início há uma apresentação dos Tropis com uma musica do mestre de cerimônias, onde ele desdenha de cada um dos membros do seu time, para logo depois começar o vergonhoso certame.
Os Tropics fazem parte de ligas amadoras, que servem basicamente para chacotas, e para o protagonista vivido por Ferrell tentar brilhar, ainda que seja um dos piores entre os nada habilidosos jogadores de seu time. Aqui, se percebe que o time semi profissional (o nome original é Semi Pro) é feito para vaidade de seu dono, para sofrer chacota dos narradores e comentarista, Dick Pepperfield (Andrew Daly) e Lou Redwood (Will Arnett), e para de vez em quando o comerciante Clarence Downtown Malone (Andre 3000 Benjamin) brilhar, já que quando era novo já havia jogado.
Os comentários dos especialistas são ácidos, e o humor do filme passa por comentários pejorativos respeito da elite financeira dos Estados Unidos. O papel do perfeito idiota que Ferrell sempre faz serve para desconstruir a ideia de que os empresários endinheirados são pessoas inteligentes e com a cabeça no lugar, nesse caso, é um velho entediado, impotente, casado com uma mulher que não o ama e que o trai o tempo todo, ou seja, um pastiche dos homens brancos poderosos dos EUA que se julgam superior a todos por ter algum dinheiro.
Uma nova regra é estabelecida, a liga ABA – onde os Spirits jogam – será incorporada a NBA, e quatro franquias irão para o campeonato nacional, enquanto as outras serão extintas, e isso faz com que o time de Jackie corra risco de extinção, fato que o deixa triste. Todas as cenas de reunião para se decidir o destino dessas quatro vagas é extravagante ao extremo, não só pelo estouro emocional de Moon, mas também pela participação de outros comediantes, como David Koechner .
O roteiro de Scot Armstrong não guarda surpresas, os fatos se desenrolam rapidamente, e o treinador Monix é contratado, sendo feito por Woody Harrelson (que aliás, faz uso de uma peruca terrível), é impressionante como o script dá vazão a momentos grotescos e engraçados, seja nas brigas vaidosas entre os integrantes dos Spits, ou no fato deles se utilizarem de todo tipo de tática para vencer, seja entrando na mão, ou utilizando rímel nos olhos para assustar os outros times, fato é que Jackie é querido por todos, mesmo quando age de maneira infantil, ou quando é contrariado e ameaça a família do juiz. Há qualquer coisa em seu carisma que o faz ser amado pela maioria das pessoas, mesmo que sua música seja terrível, mesmo que seus métodos também não sejam grandes coisas.
Mesmo sendo uma comédia escrachada, há pontos bem maduros no filme, com direito a lições de moral e desconstrução de mitos a respeito de ex campeões da NBA. Por mais grotesco que seja assistir humoristas e atores veteranos usando camisa regata e shorts curtos, é impossível não achar genial toda a besteirada apresentada ali, principalmente por representar a maioria das presepadas feitas por treinadores e dirigentes, ainda que de forma mega exagerada e irrealista. Ainda assim, boa parte dos treinos táticos apresentados na metade final do filme correspondem a realidade, e o fato dos Spirits mal sobreviverem com a implementação desses momentos impressiona.
A fotografia de Shane Hurlbut garante momentos de beleza ímpar, ressaltando as cores aqui, que nessa abordagem ficam muito bonitas. Até o uso de tons pastéis e de tonalidades pouco utilizadas tanto em filmes blockbusters quanto em times de basquete, já que laranja e azul quase não funcionam juntos, ainda assim, aqui há um certo charme, fazendo com que os excluídos e ignorantes ganhem os holofotes de alguma forma, nem que seja para demarcar o quão são derrotados e o quanto podem crescer, dentro do pensamento motivador e positivista que Monix impõe.
Tal qual ocorre com Escorregando Para Gloria e Ricky Bobby – A Toda Velocidade, Aloprados se destaca por apelar para um humor auto depreciativo bizarro. As piadas com infidelidade conjugal e com o fetiche do corno em compartilhar suas senhoras se expande para mais de um personagem. Em alguns pontos não se sabe minimamente qual estranheza aparecerá em tela, e isso não ocorre só com Jackie, mas com quaisquer outros personagens. Até luta com animais selvagens ocorre, sabe-se lá porque razão.
A versão Unrated faz o filme soar ainda mais estranho e sem freios, e é uma pena que ele seja tão subestimado e tão pouco lembrado. As tomadas e ângulos escolhidas por Alterman são curiosas, mostram uma Michigan bela e inspiradora, apesar de não ter a mesma pompa. Os momentos finais tratam de demonstrar de maneira categórica o motivo pelo qual a cidade de Flint e seus cidadãos amam tanto Jackie, pois ninguém se esforçou tanto para fazer a cidade entrar no mapa do basquete norte-americano.
Dentro da loucura que é o jogo final, contra o San Antonio Spurs, Moon acaba inventando a ponte aérea, o famigerado chute da vovó (grandma shoot) que Jackie faz, acompanhando do ângulo completamente constrangedor de sua virilha suada é um bom resumo do que Aloprados oferece ao seu espectador, escondendo uma historia de desajustados carentes com um visual e abordagem arrojada demais para as comédias pastelão típicas de Will Ferrell, além é claro de valorizar demais o esporte que é o basquete, mostrando ele como o principal objeto de adulação do país norte americano, além de ser o catalisador de oportunidade de pessoas comuns brilharem como ídolos nacionais.
O basquete de rua é uma modalidade de um esporte popular que tem tantos adeptos que rivaliza facilmente com as modalidades profissionais, claro, sem boa parte do glamour. Crossover trata disso, mas também mergulha em uma realidade diferente, mostrando personagens humanizados e idealizados, em um contexto diferente, primeiro jogando Streetball, que é uma forma mais organizado do tradicional basquete de rua, e outro na realidade de Tech (Anthony Mackie) e Noah Cruise (Wesley Jonathan), dois caras habilidosos de Michigan/Detroit, que trabalham na mesma loja de eletrônicos, com ambições bem diferentes e que jogam no mesmo time combinado, o Enemy of the State.
Tech é um sujeito mais pés no chão, trabalha como atendente, é viajandão e impulsivo, seu amigo por outro lado tem um talento maior, e seus planos passam por se profissionalizar. O que eles tem a mão são os campeonatos amadores, e essa construção de atmosfera e cenário. Infelizmente há poucas cenas dos jogos em si, o que se desenvolve é a rivalidade entre Tech e Vaughn (Wayne Brady), um adversário de quadra, e eventualmente os convites de Vaughn (Wayne Brady) a Noah, para tentar a vida como esportista ao invés de investir nos estudos que faz na faculdade de medicina.
Há uma clara referência visual, seja em tom de reverência ou mero compartilhamento de inspirações com os filmes de John Singleton. Há tomadas que lembram demais +Velozes +Furiosos, Os Donos da Rua e Baby Boy. Além disso, nos pequenos golpes de Tech, nota-se uma reverência enorme a Roy Preston e seu Homens Brancos Não Sabem Enterrar, embora a realidade aqui seja muito mais suburbana, e seus cenários
O filme foi rodado basicamente em dois lugares, basicamente, Detroit e Los Angeles, mas quase não se nota a diferença local nas tomadas escolhidas pelo diretor Preston A. Whitmore II. A diferença local mesmo é vista na mentalidade dos dois personagens. Tech cresceu e vive no mesmo bairro perigoso de sua infância, e essa vivência influi até em seu ego, que não aceita bem a participação que faz em um comercial quando um ator famoso substitui seu rosto nessa que é uma propaganda de circulação nacional, enquanto Cruise, por ter se mudado para um bairro de poder aquisitivo maior, depois que sua mãe morre e vai para casa de sua avó, que o ajuda a ter mais oportunidades, por ter mais dinheiro.
O argumento de que o dinheiro liberta a mente é um bocado complicado, a impressão que o roteiro dá em muitos pontos é que a indolência de Tech é dada pelo ambiente em que vive, mas a realidade é que o lugar de origem dos dois formou caráter, e é evidente que pessoas com poucas oportunidades tendem a ser mais amargurados e magoados. Aos poucos o filme se torna mais explícito na exploração das oportunidades, e mostra que por mais que o destino dos amigos tenha mudado e por mais que seus anseios sejam diferentes, ainda há uma ligação de alma ali, e o ambiente social não os enfraquece, e sim os fortalece, os torna mais duros na queda e mais resistentes as humilhações que a vida os impõe, por serem negros, por terem origem humilde e por se atreverem a não mais uma na multidão que se enxerga como coitado.
O script tem fragilidades, e apela algumas vezes para o emocional, e os momentos finais são carregados disso, de um melodrama que acerta quando é sucinto e erra demais ao ser demasiado emocional. Mas as cenas de jogo superam isso, e a atuação de Mackie como o vingativo e justiceiro amigo dos seus amigos faz todo o restante valer a pena. Crossover tem muita alma, em alguns pontos, exagera na questão emotiva, mas não é um objeto genérico, é carregado de espírito e caráter.
Após uma longa carreira de sucessos, Steven Soderbergh passou a fazer filmes cada vez mais segmentados. Em A Toda Prova ele e Gina Carano fizeram um filme da ação com personagem feminino, e em 2018 lançou Distúrbio (ou Unsane, no original), seu primeiro longa filmado com iPhone, e este ano, em parceria com a Netflix, ele entregou High Flying Bird, um filme dramático, que utiliza o esporte apaixonante que é o basquete para pavimentar sua historia, baseada no roteiro de Tarell Alvin McCraney, o mesmo que fez o argumento de Moonlight.
Começa com falas de jogadores recentemente draftados, em uma sala vazia e com fotografia em preto e branco, onde entrevistados falam abertamente sobre dificuldades em viver como calouros das dificuldades da Liga, e aos poucos, fala sobre o cotidiano de Ray Burke (André Holland), um agente esportivo em dificuldades financeiras que vê zero possibilidade de sair dessa situação graças a briga entre donos de franquias da NBA, a Liga e jogadores, fato que ocasionou um locaute e uma greve de empresários.
Enquanto o filme corre, há mais inserções desse jovens jogadores falando de sua experiência, enquanto Ray tenta organizar a carreira de um primo, Eric Scott (Melvin Gregg) seu que quer ser jogador, enquanto convive com a bela Samantha (Zazie Beetz), e enquanto tenta fazer novas pontes com outros empresários. O personagem tem dificuldade em se reinventar e o maior mote do filme é esse, a forma como ele lida com parente mimado, com a imprensa e com a possibilidade de arruinar não só sua carreira como a de Scott.
Holland é um bom ator, e é cercado por um elenco talentoso, que fortalece seus dotes. Além dos já citados, Bill Duke faz Spence, um treinador experiente, que trabalha com crianças e acaba sendo o mentor do mesmo, e é impressionante que, mesmo em meio a crise capitalista e os meandros mesquinhos de empresários e engravatados do basquete, o esporte ainda inspira seus personagens, em especial André. Quando sua crise sentimental se agrava, ele apela para treinar lances livres, a fim de se acalmar.
Sua terapia envolve o ofício dos meninos que ele agencia, e a forma como Holland se derrama em quadra, discutindo com o experiente treinador, e High Flying Bird, além de mostrar obviamente a historia do agente/empresário que tenta ganhar a vida ligada ao esporte, serve como um irmão espiritual de Os Bons Companheiros, prestando aos jovens aspirantes a voz que normalmente não tem, tal qual ocorria aos wiseguys e gangsters menores no filme de Martin Scorsese. Após O Poderoso Chefão, havia a mentalidade de que mafiosos eram pessoas glamourosas e sem preocupações triviais, e o roteiro de Martin Scorsese e Nicholas Pileggi desconstruiu isso, assim como o script que McCraney tem o mesmo espírito, de mostrar que ingressar na NBA é sim o sonho de muitos meninos, e que a maioria deles não tem estrutura emocional e física para lidar com isso, e quase não há para quem eles apelarem.
O drama que Soderbergh propõe é universal, vale tanto para outros esportes como futebol, onde uma minoria ínfima ganha como Messi e Cristiano Ronaldo e outros tantos passam fome, como com outras profissões que são encaradas como sonho de consumo da maior parte da população. Apesar de parecer um pouco insosso em seu início, o filme trabalha bem a idéia de demonstrar o quão frágil é o American Way of Life e o conjunto de necessidades consumistas e metas inalcançáveis que vem a partir dessa mentalidade, causando em jovens uma ansiedade desnecessária e uma corrida do ouro desenfreada que faz capturar muitas mentes e corações para um sonho que deveria ser apaixonado e inspirador mas que soa mesquinho e materialista.
William Friedkin é um diretor diferenciado, capaz de trazer a luz obras como O Exorcista, Parceiros da Noite e Operação França, e em 1994, ele deu a luz a Blue Chips, uma historia sobre o esporte, que começa com um rompante de raiva e loucura do técnico Pete Bell (Nick Nolte), discutindo com os atletas universitários do time da Western University Dolphins. Ele entra no vestiário, começa a gritar, praguejar, agir como um louco, depois sai, deixa todos desesperados, ai volta mais calmo, logo, perde a razão de novo e sai, para fazer esse processo novamente.
O filme registra magistralmente o clima dos campeonatos universitários de basquete, mostrando não só a adrenalina e loucura do jogo, como também o entorno, a atmosfera e todas as pessoas que são envolvidas pela paixão nacional que o basquete ocasiona. Outro aspecto curioso são os motivos em azul e amarelo, as cores do time de Bell, que estão nas fontes dos créditos e demais letreiros dentro do filme e até no material de divulgação. Durante as cenas mais bonitas, Friedkin faz as duas cores predominarem, obviamente, seja pelos jogos em casa ou pela manifestação das torcidas.
O roteiro de Ron Shelton (o mesmo que conduziu pouco tempo antes Brancos Não Sabem Enterrar) mostra um homem obcecado desesperado, que não tem qualquer estabilidade financeira e mental, que não consegue sequer manter-se calma a beira de quadra, e não consegue manter seu casamento vivo. Quando ele retorna do jogo, tenta dormir na casa de sua ex-esposa, Jenny (Mary McDonnell), que prontamente o coloca para fora e relembra o quanto ele é insuportável na convivência comum.
Ao perceber que seu time era muito ruim, Pete resolve apelar e fazer uma prática contra as regras, contratando jogadores que seriam pagos por fora para atuar em seu time como se estudassem em sua escola, ele então passeia pelo país, em paisagens diferentes e interioranas e traz três, Neon Boudeaux (Shaquille O’Neal), Butch McRae (Anfernee ‘Penny’ Hardaway) e Ricky Roe (Matt Nover), os três seriam o diferencial no time perdedor, a promessa de algo mais dentro da mediocridade dos campeonatos.
O curioso realmente é onde eles encontra os moços, com um ele simula o jogo na sala de estar com as irmãs deles (duas crianças), a mãe e a avó, no caso do terceiro ele vai até a fazendo, e com o personagem de Shaq, ele vai a uma quadra clandestina, ver ele jogando, e percebe no gigante de 2,16 metros a possibilidade de um pivô infalível, mesmo que ele seja burro e praticamente analfabeto. Friedkin quis colocar atletas de verdade pois ao ver atores fazendo jogadores novatos, não se convencia de seus movimentos, e é curioso, pois Shaq estava em começo de carreira, foi draftado em 1993 (o filme é de 94) junto a Hardaway, que foi para o Orlando Magics – Shaq foi para o Magics e Hardaway para o Golden State Warriors, depois o time foi convencido pelo gigante a trocar com o GS. Essa escolha ocorreu enquanto eles filmavam Blue Chips, e a dupla teve o feito de eliminar o Chicago Bulls de Michael Jordan, na temporada 94-95, pouco após o filme ser lançado. Já Nover se tornou jogador e jogou um bom tempo na Europa, entre Itália, Espanha, Portugal etc, e também na Austrália.
Não há o que reclamar da atuação ou da entrega de Nolte, ele faz um treinador dedicado, parece realmente ter noções táticas e dos fundamentos básicos do basquete. Ele se preparou para o papel acompanhando o técnico Bobby Knight durante a temporada de 92 em Indiana e absorveu bem o espírito, tudo isso para traduzir bem como teria sido parte da personalidade de Tates Locke, o treinador da Clemson Univerty de 70 a 75 – Locke também foi para NBA, no Buffalo Braves num período curto entre 76-77. A virada que ele tem que fazer, ao aceitar finalmente pagar os jogadores por fora mostra um homem com espírito quebrado, mas que já havia ido longe demais para voltar atrás.
A trilha sonora, repleta de sucessos de Rock internacional embala boa parte das curvas dramáticas pelas quais passam Bell, e apesar de Blue Chips conter um caráter bem moralista, e isso não é à toa, pois para muitos estadunidenses, o basquete é o mais manipulável dos esportes populares, seja no caso de apostas (jogadores são proibidos de praticar apostas, por exemplo) e também no caso de manipulação de resultados ou de uso de drogas.
Friedkin acerta demais na composição de personagem do treinador que Nick Nolte vive, um homem nervoso, irascível, que briga muito pelo que acredita e que é sobretudo apaixonado demais pelo esporte, não conseguindo fugir disto sequer quando se auto denuncia, e essa essência e beleza de caráter é muito bem exemplificada no filme, que além de toda essa discussão ética, ainda mostra um jogo de basquete muito bem feito e verossímil, com méritos totais ao seu realizador.
Bacurau é o filme nacional mais esperado do ano, ao lado de Marighella de Wagner Moura, e a espera para a chegada dele ao seu país foi de muitas sessões de prés lotadas, a espera do thriller supostamente fantasioso de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles. O que se assiste logo no inicio é um petardo, começando por um caminhão-pipa que carrega uma passageira de volta para sua casa. Ela é Teresa (Barbara Colen), que retorna a Bacurau, um vilarejo no oeste de Pernambuco que tem muita historia, o motivo desse retorno é o enterro de sua avó.
Algo estranho vem acontecendo ali perto, pois assim que se entra no território próximo de Serra Verde (uma cidade pernambucana mais central e mais populosa que o vilarejo que dá nome ao filme), vê-se um caminhão que carregava caixões tombado, após um acidente com uma moto. Os caixões aliás, se repetem em alguns momentos no filme, como um autêntico signo do roteiro.
A historia se passa em um futuro próximo, e seus elementos são revelados gradativamente, como a procura das autoridades por um traficante local, além de uma representação bem estranha do apego aos bens materiais. O que se nota facilmente é que a região nordestina é quase como um Oásis do mundo louco e retrogrado em que o Brasil está inserido, apesar de não se elucubrar muito sobre os outros territórios fora Pernambuco, mas o pouco que se tem contato faz teorizar que este universo tem muito em comum com o de Divino Amor, filme mais recente de Gabriel Mascaro onde uma sociedade burocrata e conservadora via religião impera. Na localidade de Bacurau isso é bem diferente, como se houvesse ali um redoma ideológica que não permite o reacionarismo imperar.
A experiencia como diretor de arte que Dornelles emprega no filme (ele fez Aquarius e Som ao Redor) é vista em cenas belíssimas. Por mais simples que sejam os figurinos dos personagens e as pequenas casas há um cuidado muito grande para a atmosfera do lugarejo ser diferenciado. Um lugar tão pequeno, mas que carrega muitas historias, muitas particularidades e obviamente precisaria ter uma identidade própria.
A partir daqui pontos substanciais da trama serão discutidos, então se o leitor se incomoda com spoilers, está por conta própria a partir da aqui.
O povo de Bacurau é igualmente diferenciado, tal qual toda a arte que envolve o filme. Há um DJ de aspecto urso, que é literalmente um mestre de cerimônias da cidade, os vigias/ fogueteiros são transexuais, e o lar de Lunga, o personagem de Silvero Pereira é uma represa, que ninguém faz ideia de que há bandidos ali. Aliás, o modo como Lunga é mostrado é sui generis, sua composição é algo absurdo, e a cidade é tão diferenciada que uma figura que normalmente seria encarada como vilã, é ovacionada. O lugarejo evita a policia tradicional, seus cidadão são diferenciados e bem informados em sua maioria, e enxergar até autoridades como Tony Junior (Thardelly Lima), o prefeito de Serra Verde, como um oportunista terrível. O modo como eles demonstram sua rejeição a ele é engraçado, tal qual a arrogância e petulância com que eles tratam isso. Aparentemente, nessa comunidade, o comunismo funciona, o comércio basicamente só ocorre para os de fora, e mesmo assim os preços são muito baixos.
Um dos signos mais estranhos é o fato de as casas serem sempre cheias de moscas, em especial as que possuem idosos, como se os corpos dos mortos ainda habitassem o lugar. Paralelos com fantasmas e com a memoria comum ao homem sempre são feitos em filmes modernos, mas desse modo é um evento mais raro. Toda a contemplação típica dos filmes do Novo Cinema Pernambucano é ressignificada, tendo um crescente de agressividade com a aproximação do final, mas ainda mantendo o caráter mais lúdico por boa parte do filme.
O isolamento “forçado” de Bacurau só faz sentido para quem não entende a mística do lugar, para quem não sabe como aquelas pessoas e as gerações anteriores sobreviveram até chegar nessa época. O pensamento retrogrado dos opositores misteriosos, liderados pelo personagem de Udo Kier (Michael) os faz soar arrogantes, e faz eles subestimarem os mais simples, intuindo de maneira tola que são todos tolos e ingênuos. Mesmo pouco se sabendo sobre as origens desses antagonistas, se percebe traços de reacionarismo e barbárie ligadas a pensamentos de extrema direita, além de um discurso supremacista e racista.
As mortes são poéticas especialmente quando o filme se aproxima de seu fim. Os vilões perecendo sobre os olhares dos retratos dos que habitavam o passado de Bacurau tem um peso simbólico imenso, assim como o uso do sangue como objeto redentor e de limpeza de espírito, que passa perto de redimir o banditismo, em especial para os que defendem a aldeia dos bárbaros que se aproximam. Essa vida fora da lei aliás é abordada de forma que foge tanto do maniqueísmo que faz perguntar se a redenção deles é por conta dos crimes cometidos até então, ou do perdão liberado da cidade para os foras da lei, que finalmente podem retornar ao lugar que sempre amaram.
A miríade de influências é tão grande que, além de evocar os filmes de ação ultra violentos dos anos 80 e 90, também faz paralelos com os contos de Robert E. Howard, em especial os de Conan e Kull, onde as conquistas dos homens que estavam em desvantagem de condições era o moto narrativo. A modernização dessa perspectiva traz bons momentos, e a crueza de ambas obras ressoa como se uma fosse uma espécie de releitura moderna da outra, por mais que seus universos sejam bem diferentes entre si.
A sociedade de Bacurau é evoluída o suficiente para não encarar os homens armados do poder paralelo como inimigos, o maniqueísmo, ao menos naquele pequeno pedaço de chão não existe, homens, mulheres, crianças e idosos são todos iguais, inclusive no uso de uma droga que amplia seus sentidos, fazendo com que todos sejam entorpecidos pela fúria e pela fome por vingança, por justiça, mas não uma justiça de via fácil, e sim a legítima defesa dos que nada fizeram para sofrer esse infortúnio.
O filme que Mendonça e Dornelles propõe é forte, resgata um Brasil do interior, com uma identidade própria e capaz de revidar preconceitos, selvageria e intolerância. Suas cenas são belíssimas, há uma poesia muito forte na demonstração dos cenários naturais e o uso da luz faz com que a fotografia seja muito potente, é um filme quase irretocável do ponto de vista tecnico e com um apelo pop muito grande, agudo, violento e realista, mesmo com toda a suspensão de descrença a que ele apela.
Libelo do cinema soviético lançado no ano de 1965, Fascismo de Todos os Dias (conhecido anteriormente como Fascismo Ordinário) é um filme de Mikhail Romm, narrado de maneira bem óbvia e elementar, para demonstrar até ao espectador mais desatento e incauto como funciona o pensamento e modus operandi segregador do pensamento extremista via direita. Seu começo é tímido, mostra pessoas comuns, pela ruas, em registro sem cores, se elucubra um pouco sobre a classe média, as relações, trocas de caricias e sensação de pertencimento aos grupos sociais.
Antes de mergulhar em qualquer argumento político que fuja do geral e genérico, são mostrados desenhos infantis, em homenagem as mães dos pequenos, mostrando a admiração inconteste dos filhos a suas progenitoras, para logo depois, mostrar corpos desfalecidos de judeus, que morreram com suas famílias. Esse trecho não contem falas, as imagens mostram por si só que ter família não fazia com que os descentes de hebreus fossem vistos como entes detentores de humanidade.
O filme é dividido em capítulos, e um deles se dedica a falar de Minha Luta (Mein Kampff), livro de Adolf Hitler. Nesse momento, a narração do próprio Romm se permite o humor de dizer que caso ele tenha sido lido antes, pelos que votaram na Alemanha, certamente o Fuhrer não se tornaria chanceler, e por mais irônico que seja, é real também. O filme claramente tem um viés e um lado político anti nazista, de esquerda e comunista e não tem receio de não ser assim, e até por ser extremamente livre de isenções e opinativo, serve bem a desconstrução do pensamento raso, que falaciosamente associa o Nazismo a esquerda.
O filme debocha de figuras de poder do Partido Nacional Socialista, principalmente Hitler, ao analisar uma imagem sua, bem populista, cavando um buraco de terra numa obra, em um movimento que claramente não é o de quem está acostumado a pôr a mão no arado, em uma pá ou em qualquer instrumento de trabalho braçal. Isso faz um paralelo com a atualidade, com atitudes de lideranças pseudo carismáticas, que praticam muitos atos supostamente populares para angariar afeição do público e do eleitorado. A tática é velha como o mundo, comum não só a figura de Hitler, mas de tantos outras lideranças, e agride os olhos de quem é minimamente atento.
A parte 2 do documentário começa mostrando crianças com brinquedos, na rua, variando entre jogos lúdicos, desenhos, e até provas onde as mesmas fazem sinais da suástica, ou colocam a saudação Heil Hitler textualmente em provas ou nos simples desenhos que fazem. Para boa parte da gritaria geral atual sobre as escolas partidarizarem ou não seu ensino, certamente os métodos do Ministério da Educação alemão fariam escandalizar caso fossem implementadas, no entanto os outros métodos de tática fascista que são empregados pela parte reacionária e mais radical da população e dos governos que pensam assim não assusta, especialmente quando o alvo são os ditos adversários políticos desses. Aparentemente a humanidade não evoluiu tanto quanto se pensava ou imaginava, especialmente no que tange o flerta com o fascismo em versões teoricamente mais suavizadas.
O capitulo XX tem o título de Fascismo Ordinário, e utiliza uma música alegre para mostrar os corpos dos judeus e o deboche que as tropas nazistas tinham com esses adversários, variando entre cenas de violência física e sexual, com mulheres sendo humilhadas, crianças sendo maltratadas, e idosos em posições péssimas, com cenas dos militares nas praias, recreando. Enquanto uma parcela da população brinca e se diverte (mesmo com a guerra ocorrendo), outros tem toda sua liberdade destruída e toda sua dignidade zerada. Não há o que se reclamar em relação a panfletarismo, Romm acerta demais no didatismo das informações que traz, é preciso mesmo expor a fraude que o Reich era, e é desolador encontrar parelelos disso com a atualidade.
O final de Fascismo de Todos os Dias é perturbador, envolva a narração de uma criança, sem legendas, invocando uma linguagem de impossível compreensão para adultos, variando as imagens entre as vitimas do holocausto, lembrando que a aura de normalidade permeou o governo nazista, e nem por isso o estrago e a chacina foram freadas. Por mais sensacionalista que o filme seja, é totalmente valido que ele seja assim, afinal, é importante denunciar as novas faces desse tipo de pensamento e ideologia, até para que se evite repetir essa historia.
É impossível começar a ver Crime Desorganizado e não lembrar do filme anterior da dupla de protagonistas, Jon Favreau e Vince Vaughn em Swingers– Curtindo a Noite, seja cena imediatamente após a abertura, que conta com uma montagem musical guiada por um clássico de Frank Sinatra. Aqui, o diretor e roteirista Favreau vive Bobby Ricigliano, e Vaughn é Ricky Slade, dois trambiqueiros, que são unidos por um laço de amizade e que ganham seu sustento num serviço de obras que simplesmente odeiam, por conta das constantes humilhações que sofrem.
A outra parte do sustento de ambos vem de trambiques, ou do trabalho da mulher de Bobby, a bela Jessica (Famke Janssen), que trabalha como stripper, e ganha uns trocados fazendo lap dance, fato que bate de frente com a personalidade esquentadinha de seu marido, pois ele é ciumento e não suporta que os clientes toquem nela. A cena que mostra isso é engraçada, pois o expõe um fato óbvo, a mulher certamente se safaria sozinha, mas é atrapalhada e agravada a situação exatamente por sua cena patética de ciúmes. O roteiro que Favreau escreve tenta já no início mostrar que Bobby e Ricky não são os personagens de Swingers, mesmo com todas as semelhanças visuais e com a repetição do elenco.
Bobby recebe uma ordem de seu superior, o empregador que o coloca nos trabalhos de construção civil, Max (Peter Falk), um sujeito poderoso, orgulhoso e que dá as missões que quer para quem lhe presta serviço. Ele pede ao protagonista para ir a Nova York fazer um serviço e ele não quer ir por conta de sua esposa e da filha dele, mas acaba aceitando quando vê a possibilidade de com o dinheiro do trabalho, começar um novo estilo de vida, onde o dinheiro das danças da esposa não são necessários.
Crime Desorganizado é bem mais engraçado que Swingers, a demonstração do quanto a dupla é inábil, inútil e nada moldada para o crime é engraçada, assim como a tentativa dos dois de viver sobre uma normalidade. Há duas cenas que registram bem como os dois são péssimos no que fazem, a primeira é numa loja de cerâmica, onde Ricky fuma diante de uma criança, fala um monte de besteiras, como se estivesse em um bar quando o cenário é o extremo oposto disso, e a outra é quando ambos brigam ao esperar um contato, que vem a ser uma gangue de motoqueiros, depois de passar vergonha em uma briga que parece a de dois moleques, eles tem de ir de carona agarrados a cintura.
Por mais cru e imaturo que o roteiro pareça – e sim, tem muitas fragilidades – se nota uma franca evolução por parte de Favreau, e sua direção é bem mais econômica e menos forçada que a de Liman por exemplo. Seu filme é claramente menos pretensioso que Swingers, mostra uma historia cotidiana, de um grupo de bandidos fracassados, não tratando os personagens como se fossem super preciosos, ou dignos de qualquer admiração, ao mesmo tempo que eles tem muita humanidade em cada um de seus pequenos e grandes atos.
O filme do brasileiro Vicente Amorim, diretor de Corações Sujos e do recente Motorrad, começa com uma viagem de John Halder, o personagem de Viggo Mortensen, que viaja para Berlim durante o ano de 1937 para um encontro cientifico do Reich. O idioma predominante do longa é inglês, tal qual a maioria esmagadora maioria das adaptações estadunidenses a historias passadas na Europa.
Ja no início percebe-se que Halder fica pouco a vontade com os ritos nazistas. A saudação Heil Hitler que ele faz a Bouhler (Mark Strong) é completamente torta. É curioso como a sua rotina, de professor e pai de família cuja clã passa longe da nobreza é completamente diferente da postura totalitária e supremacista dos tiranos nazistas, dos membros de alto, médio e baixo escalão. Sua disciplina, literatura, prima pela cultura, e a câmera mostra antes dele ter todo o seu conjunto de estudos mudado a força – recomenda-se que ele ministre Marcel Proust – ele vê a força policial empilhando livros na rua, para a queimada que era comum ao Regime, e que foi bem apontada como prática estatal da utopia de Ray Bradbury, Fahrenheit 451. Não demora nem 10 minutos para perceber o quanto ele não encaixa naquele estilo de vida.
Halder está escrevendo um romance, e se refugiar na literatura ou em outra arte é o ideal para ter alguma alternativa mental e ideológica que faça esquecer um pouco da situação terrível pela qual passa o país. Maurice, interpretado por Jason Isaacs verbaliza isso, essa sensação de infortúnio e agonia, e acrescenta adjetivos a figura do chanceler e líder da nação que Adolf Hitler foi, isso tudo antes até do conflito da Segunda Guerra ocorrer.
Halder, sob pressão, acaba se afiliando ao Partido Nacional Socialista, fato que deixa Maurice nervoso, apreensivo e decepcionado com ele. É curioso como a ascensão política do protagonista se dá exatamente quando ele dá vazão a um relacionamento extra conjugal com uma aluna. John se acha justificado ao lado dos conservadores exatamente por ir na contra mão da tradição, família e propriedade, sendo infiel em seu matrimônio, no entanto essa super correção afeta diretamente seu melhor amigo, uma vez que Maurice tem origem hebraica.
O homem bom do titulo brasileiro – não muito diferente do original, Good – se refere ao quão frágil e mentirosa é a caracterização do cidadão de bem, já nos anos 30 do século XX, como atualmente. O comportamento conservador e de alto controle sobre os atos da população esconde uma postura hipócrita de super correção para terceiros onde os poderosos e mandatários não praticam as mesmas coisas. John ao se aliar ao partido e ao permitir ter seu nome vinculado a SS, mesmo que simbolicamente, o faz padecer de um apoio a tirania de maneira irrestrita quase. O silêncio dos bons aumenta o coro dos maus, e ser conivente com o intolerante além de fortificar essa intolerância, endossa o completamente de uma forma que em ultima analise se torna também uma forma de exclusão e opressão também.
Muitos críticos defenestraram Um Bom Homem por associar uma indiscrição sexual amorosa com o flerta ao fascismo, no entanto a associação que o roteiro de John Wrathall (baseado na peça C.P. Taylor) claramente não parece ter essa intenção, e sim de demonstrar o quão egoísta o homem pode ser e o quão hipócrita é a faceta dos moderados ou pseudo moderados que apoiam regimes extremistas em troca de benefício próprio. John é mesquinho e egocêntrico, mesmo começando o filme com ótimas intenções. A confusão mental pelo qual ele passa nos últimos 25 minutos é uma boa prova disso, que ele se deixou corromper pela benesses do poder, incluindo aí a facilidade em esconder um caso que teve e que com o tempo, simplesmente perde importância para si.
O maior legado do filme é denunciar como não se pode subestimar em momento nenhum o poderio e o fascínio que o fascismo faz com quem está no poder, tampouco achar que as autoridades que se munem desse pensamento e ideologia são inofensivas. Não há banalidade ou humor nessas posturas absolutistas, e o preço para quem não fica vigilante e para quem se isenta de responsabilidades, é o de ser igualado em caráter e comportamento aos executores. Toda essa mensagem é bem traduzida graças a entrega de Mortensen e Isaacs, mas também ao cuidado de Amorim com a sua incursão no cinema estrangeiro, conseguindo trazer um filme equilibrado, driblando até a questão obvia do melodrama absurdo, denunciando o autoritarismo com uma carga sentimental bem forte.
Na versão clássica de Brinquedo Assassino, Andy Barclay é um menino que aparentemente é perturbado, um ilho único e de mãe solteira, que recebe de presente um boneco Good Guy amaldiçoado, com a alma de um assassino serial. Nesta versão dirigida por Lars Klevberg, sai a empresa Play Pals Toys Company, e entra a Kaslan,uma multinacional de eletrônicos, que comercializa toda sorte de novas tecnologias. A empresa lança Buddi, um boneco que se conecta a basicamente a todos os equipamentos via nuvem, e ajuda a controlar esses aparelhos e acessorios sendo não só um boneco, mas um controle universal de aparelhos conectados.
Já em seu início, o script de Tyler Burton Smith comenta sobre hiper vigilância, apego a tecnologia e dependência da mesma, preocupação essa bem diversa do Don Mancini (criador da saga original, e diretor de 3 dos 7 filmes lançados até 2017) apresentou em praticamente todos os antigos filmes da franquia, e por mais estranho que soe, a mudança é bem positiva, pois não parece mera copia do que foi feito, ao contrário do que normalmente ocorre com remakes de filmes de terror. O cenário não demora a mudar, mostrando uma fábrica do Vietnã, onde ocorre o motivo da nova origem do boneco “amaldiçoado”, em um evento que impessoaliza um pouco o caráter vil do brinque, ao mesmo tempo que dá sinais de que haverá uma forte crítica ao capitalismo, mas o roteiro vai em outra direção, que não anula essa visão negativa sobre a necessidade de acumular bens e a precarização de trabalho decorrente do sistema capitalista, e vai mais na direção do Complexo de Frankenstein, embora não seja tão maniqueísta quanto parece na citação simples dessa premissa.
O Andy de Gabriel Bateman tem um problema de surdez, fato que dá novas camadas a sua dificuldade de convivência com outros garotos e garotas. Ele é anti social, mal sai de casa, tem fobia de convivência, e isso é uma bela diferença pro original, uma vez que a Karen Barclay de 88 era super protetora por ser mãe solteira, já a personagem feita por Aubrey Plaza não, ela até se permite namorar, mesmo que isso incomode seu filho. Ela vive sua vida, mas não tem receio em se entregar na função de mãe e parceira de seu filho. A quebra de expectativa é positiva e dá um fôlego bom pro filme, uma vez que é uma família sem todos os integrantes comuns a um clã, imperfeita e que não se vê como anormal por isso, afinal, se está em 2019, e não mais em 1988, quando divorcio e viuvez ainda era um forte tabu.
O filme é hilário, tem otim as passagens até mesmo antes do gore se fazer presente. O personagem do detetive Mike Norris (Brian Tyree Henry) e sua relação com a sua mãe (vizinha dos Barclays) prima por esse tipo de abordagem, e incrivelmente casa bem com as intenções de Mancini com os ultimos que a franquia de Chucky tomou. Há referências mil a filmes de terror, como as óbvias de Massacre da Serra Eletrica 2 (que inclusive aparece literalmente no filme, além de Re-Animator, e passagens até de Brinquedo Assassino 2 – no sentido da paranoia de Andy – e até O Filho de Chucky, ainda que desse último haja menos menções.
O Chucky de Mark Hammil é carismático demais, um boneco que apresenta avarias não só de programação mas de recursos básicos. Ele erra o próprio nome, e apresenta características que fazem lembrar o sub gênero literário recente denominado New Weird, principalmente por brincar com os conceitos do Vale da Estranheza. Essa característica do boneco que Buddi é causa evidentemente incomodo, o Good Guy era bonitinho, esse não – a situação piora com Buddi 2, que pode ser loiro, ou até um ursinho furry – e obviamente por incomodar boa parte do público tende a estranhar toda essa abordagem. Caso o espectador não tenha muitas frescuras com filmes de horror, isso certamente não é um incômodo, até porque o comportamento de Chucky é muito bem explorado, ele tem dificuldade de entendimento de nuances, é passivo agressivo e muito carente, e para cumprir sua obediência, é capaz até de ferir seres vivos, podendo matar caso perca a noção de sua própria força. Isso faz sentido, afinal, um brinquedo não tem o mesmo pensamento que um ser humanos formado, ainda que este seja bastante passional.
O mais bizarro e positivo de toda essa historia, é que o brinquedo só passa realmente a matar quando tem o aval de seu dono. Mesmo quando ele se descontrola, há uma boa explicação desse motivo. Suas travas morais e éticas só são expandidas pós rejeição de seu “grande amigo”, e seu comportamento passivo agressivo é uma resposta a negativa que recebe. Isso tudo humaniza o serial killer / slasher, e sua evolução é muito bem explorada nos 90 minutos de fita, mostrando ele evoluindo de um assassino principiante com indícios de sociopatia e psicopatia que machuca animais, para um ceifador de vidas frio e calculista na hora de cometer homicídio, mas extremamente sentimental e temperamental.
O fato de ser muito humano é um artificio bom do roteiro, no entanto perde um pouco da força no final, quando ocorre uma espécie de revolta das máquinas. Ora, se Chucky é capaz de aprender, e tem uma motivação pessoal para cometer seus pecados, não faz muito sentido ele se tornar um líder revolucionário, que declara guerra a toda uma classe, no caso, os humanos, ainda que sua caracterização faça lembrar algumas lideranças políticas antigas, das mais ressentidas e que em um montante de motivos (entre esses, rejeição de suas expressões mais profundas, entre elas a arte), resolveram atacar a um grupo amplo de pessoas, deixando algo que seria um ataque individual, em algo macro. Essa é uma leitura possível, mas ainda assim, apelativa e pretensiosa demais para uma simples refilmagem de filme de terror oitentista.
Os momentos finais fazem lembrar It: A Coisa e Stranger Things 3, ao mostrar as crianças revidando a violência que lhe é imposta. Infelizmente toda a sequência de ação no Zed Mart é bem fraca perto do potencial de discussão que o longa traz antes, e a redução da psique de Chucky/Buddi para uma espécie Grande Irmão (do livro 1984, de George Orwell) em uma versão mais modernosa soa repetitiva e um bocado furada, mesmo que amarre as referências a Robocope O Culto de Chucky de maneira orgânica.
Mesmo com todas as ressalvas, O Brinquedo Assassino é uma refilmagem bem honesta, que se vale de muitos aspectos do original, pega emprestados alguns dos (poucos) conceitos que funcionaram nas (péssimas) continuações modernas, sem ofender o trabalho anterior de Don Mancini e de Brad Dourif, ainda que tenha abertura para possíveis novas continuações, fato que sempre preocupa a quem gosta e acha cara uma franquia de filmes de horror.
Em 1940 uma produção britânica da United Artists estreava, um filme underground baseado em lendas orientais pegava emprestado elementos visuais e místicos árabes, tendo um conto chinês como base, além de refilmar um filme homônimo de 1924. O Ladrão de Bagdá tem uma aura mística dentro e fora das telas, a obra de Ludwig Berger, Michael Powell e Tim Whelan é conhecida não só por conta de sua historia inusual, que serviu de base para boa parte do roteiro da animação Aladdin, mas também por ser o primeiro filme de cinema a usar chroma key e fundo verde, proporcionando portanto escalas que em tela ficam bastante engraçadas.
Narrada como um.dos contos de 1001 Noites de Sherazade, o rei Ahmad aponta para seu cachorro, e diz que ele foi o jovem ladrão Abu, personagem que obviamente daria ideia do nome do macaco do heroi da Disney, mas qiw também era o pobre, destemido, com um senso de justiça enorme que vivuva na grande cidade árabe. Dentro dessa mitologia, há também o vizir real Jaffar ( Conrad Veidt dos expoentes máximos do cinema mudo, estrela de O Homem Que Ri e Laboratorio do Dr Caligari) um sujeito que usa o medo como forma de invocar poder, ganancioso, e ludibriador do poderoso mandatário do país. O caminho dos dois se cruza, na prisão, tal qual foi claramente copiado no filme de John Musker e Ron Clements.
Abu (vivido por Sabu), como um bom plebeu, reclama dos poderosos, mas não demora a se submeter a Ahmad (John Justin) quando descobre seu sangue azul, obviamente é esperto o suficiente para fingir fidelidade quando precisa. Um outro rei se aproxima, em determinado ponto da trama. Ele é obeso, usa barba grisalha e é aficionado por brinquedos, tal qual o sultão do longa animado da Disney. Ele é facilmente ludibriado por Jaffar, que deseja unir os dois reinos ao casar com a bela filha dele.
Apesar de ser essa uma historia fantasiosa, os elementos de real magia demoram a aparecer, tanto por parte do vilão, que ludibria o sultao, quanto de Abu, que encontra um gênio na garrafa. A aparição do personagem de Rex Ingram é grandiosa, ele tem a altura de una montanha, e dado que a tecnologia do chroma era embrionária, seu efeito especial é até surpreendente. O ser praticamente onipotente causa medo em seu amo. Ha aliás de se destacar o pouco maniqueísmo e a imprevisibilidade da historia, o Gênio não é mal só por conta de suas unhas longas das mãos e feias e mal cortadas dos pés , ele tenta enganar Abu o tempo todo, talvez surgindo daí a ideia do Mestre dos Desejos, franquia de terror b que já teve 4 filmes. No entanto, o ladrão é mais ardiloso e esperto, usando a experiência que teve na rua para manipular o djinn, e fazer ele o levar a um lugar cheio de tesouros se gastar um dos três desejos. Não há receio em mostrar malandragem em quaisquer personagens, bons ou maus, exceto é claro o virginal rei, mas há de se lembrar que o nome do filme remete ao fora da lei e não a majestade.
Ha alguns elementos legais que o clássico da Disney pegou emprestado, como o quase beijo da princesa no vilão, a prisão do heroi, o uso de um tapete magico (ainda que aqui haja parcimônia) e claro, a valorização real de um ladrão desafortunado até então (diamante bruto), mas Ladrão de Bagdá tem ainda mais mensagem que seu primo rico e oscarizado da Disney. Se faltam musicas, sobra adornos, e referências aos mitos da Arábia, mesmo o white washing é moderado, mesmo o famigerado final feliz é discutível, pois alem de ter uma morte violenta ao vilão, ainda tem Abu renegando o papel de calmaria na nobreza de Bagdá.
Lançado em 1967, Roberto Carlos: Em Ritmo de Aventura é um filme de Roberto Farias, a época ainda não era diretor da Embrafilme, ainda que agradeça os esforços da Junta Militar já no início do longa-metragem. Seus créditos iniciais tem desenhos do mocinho vivido pelo Rei, onde toca sua musica Olha dentro dos meus olhos em versão instrumental, e já tem ação desde o começo, ao mostrar o herói numa Ferrari vermelho, tocando Eu Sou Terrível ao fundo.
Não demora ao roteiro mostrar suas características básicas, de quebra da quarta parede, uma vez que Roberto reclama com o diretor sobre os rumos da trama. Além disso, ele emula 007, – até cita que não é James Bond – tal qual os Trapalhões faziam com blockbusters, tal qual a Jovem Guarda fazia com os sucessos do Rockabilly e Classic Rock internacionais.
Além de ser um (belo) pretexto para tocar as músicas do disco homônimo do cantor e astro, o filme brinca demais com sua formula. O herói liga para o diretor, perguntando os rumos de sua vida,mostrando o roteiro sendo formado bem as poucos. É uma pena que ele não tenha sofrido uma re-masterização digna, pois o nível da produção era alto, as cenas filmadas no Rio de Janeiro, em São Paulo, com capangas do tal vilão misterioso imitando os estereótipos dos filmes de ação, além de ter um câmera nervosa, que acompanha a ação do protagonista e os movimentos dos possantes que o sujeito bonzinho conduz.
Mesmo o papel de José Lewgoy é discutido, ele afirma que fez mais de 50 bandidos no cinema, sempre entrando pelo cano, e morrendo no final, e seu desejo é conseguir derrotar o mocinho. O desenrolar da trama não segue tão bem construído quanto seu início e ideia. A realidade é que o filme parece um bocado trash, pois ao tentar repetir os clichês das fitas antigas de ação e espionagem, se esbarra em um orçamento nada pomposo em comparação com as versões de Sean Connery para o agente criado por Ian Fleming.
A ausência de trilha fora as músicas de Roberto faz com que o filme aparente ser vazio de ação em alguns momentos, mas não demora a ocorrerem novos números de cantoria. O filme se leva tão pouco a sério, que o final é desconstruído, mostra o maniqueísmo dos filmes de ação indo por água abaixo, em um empate entre forças positivas e malévolas, com direito a entrada de tanques de guerra, paraquedistas etc, fato que de certa forma, justifica o agradecimento as forças armadas brasileiras. Há quem defenda que esse filme critica o período da Ditadura Militar recém instituído, graças não só ao final, que é completamente anti bélico, mas também por sua característica de desconstrução metalinguística, incluindo ainda Reginaldo Farias fazendo o papel de seu irmão Roberto, o diretor do filme, mas ao menos numa leitura mais simplista, Roberto Carlos Em Ritmo de Aventura é só uma comédia com pitadas de inteligência, mas sem intenção de ser uma crítica ao período político do país nos anos 60.
Baseado em um quadrinho da VertigoThe Kitchen (no Brasil, A Cozinha – Rainhas do Crime), o longa-metragem de Andrea Berloff tem o terrível nome traduzido para Rainhas do Crime, e mostra três mulheres de meia-idade, Kathy (Melissa McCarthy), Ruby (Tiffany Haddish) e Claire (Elisabeth Moss), que apoiam seus maridos e sofrem de clichês bem apelativos, como maus tratos, violência doméstica e humilhações mil, denunciando clichês apelativos. O filme sofre demasiadamente como chavões e lugares comuns de filmes que tem mulheres como protagonistas, e faz isso de maneira bem atabalhoada.
Berloff tem uma carreira como roteirista, fez adaptações de bons textos, como Straight Outta Compton e outras mais complicadas e moralistas, como Torres Gêmeas de Oliver Stone, e entre os dois, essa nova adaptação lembra mais a segunda, principalmente no problema que é a total falta de sutileza, especialmente quando fala sobre os abusos que as mulheres sofrem. Há algumas semelhanças narrativas com As Viúvas, de Steve McQueen, mas qualquer comparação fora o plot soa ofensiva para esta obra citada.
As mulheres, na falta de dinheiro, resolvem tentar pegar as coletas de seus três maridos, mas a estratégia delas é ridiculamente inverossímil demais para uma adaptação que quer parecer realista. Não é trabalhado em nada o modo como elas se organizaram, nem um nível mínimo, no entanto, elas passam a competir com os gangsteres irlandeses veteranos e essa aura falsa piora quando o escopo de mafias aumenta, com os judeus e italianos.
Não se convence em nada que o trio de personagem controla os meandro do crime na Cozinha do Inferno. Quase não há esforço, nem por parte delas nem por parte do roteiro de Berloff. Há muitos atalhos que apela para o lugar comum, e tudo fica incongruente, ao ponto de ter até um personagem que se vale de Deus Ex Machina, aparecendo convenientemente para causar impacto e sensacionalismo, e pior, se apela para um “quase” gore gratuito, que só está lá para a trama parecer adulta.
Os antagonista são fracos, a rivalidade na família criminosa idem e os personagens secundário não tem qualquer tridimensionalidade – pudera, pois até Moss e McCarthy tem falas dignas de riso, e justificativas das mais pobres para a maioria de suas ações, a exceção aí é Ruby, embora sua interprete não seja muito boa além da beleza. A HQ não é bem traduzida, a questão de que o crime organizado é preconceituoso demais para aceitar mulheres mandando é bem trabalhado no gibi, aqui, não, tudo prima pela superficialidade.
As passagens de tempos e falas sobre a duração pena dos três maridos soam confusas demais, há contradições e falas bem crassas sobre esse assunto, até porque não faz qualquer sentido elas como parentes ficarem surpresas sobre o retorno a liberdade dos mesmos, até porque o script quer fazer crer que elas são super inteligentes. O discurso feminista perde força com os clichês do roteiro, cenas que deveriam ser icônicas, como quando Claire se “batiza” não tem impacto, pois são repetidas ao longo do filme e não tem peso. O humor normalmente é fora de hora, e várias atitudes dos bandidos não faz sentido, nem as mudanças de gênero, tipo físico e personalidade das heroínas é sub aproveitada, a questão da mulher negra é arranhada superficialmente.
Rainhas do Crime acaba soando moralista e muito banal, desdenha de maneira ingênua e pueril sobre o discurso progressista que defende, soando em alguns pontos como uma piada de mal gosto, e todas as boas intenções politicamente corretas do filme se diluem, não consegue entreter ou divertir tampouco faz se importar com as personagens, o que é uma pena, pois a historia original tinha um belo potencial.
Inocência Roubada é um filme francês, de Andrea Bescond e Eric Métayer, que trata da vida de Odette La Nadant, uma moça que na vida adulta é vivida pela própria diretora e na fase infantil é Cyrille Mairesse. A vida de Odette é difícil, ela é uma pessoa com dificuldades de relação, e que não é muito a vontade com seu próprio corpo, mesmo não tendo visualmente nenhuma trava ou algo que a faça parecer estranha segundo os padrões vigentes de beleza.
Os problemas psicológicos da protagonista são explorados aos poucos, ela toma aulas de dança, de balé e tem algumas complicações de aprendizado, principalmente quando se trata de dançar com um par que a toque, mas o filme é conduzido de um modo que não deixa explicitas as dificuldades da personagens, tampouco subestima o seu espectador, ao contrário.
O drama mostra Odette conseguindo se relacionar sexualmente com as pessoas, e varia entre os momentos de apogeu, nos palcos, com muita luz, música e uso contínuo de alucinógenos, e na preparação para os espetáculos, com rotinas de viagens e ensaios maçantes, e essa mudança severa de rotina obviamente afeta a mulher, que não sabe como conviver com estilos tão diferentes de vida que abarcam a prática que a faz se sentir um indíviduo, pois mesmo em meio a essa correria.
A metade final se dedica a desdobrar a montanha russa emocional que envolve o julgamento dos culpados. Tudo que não toca Odette é muito frio e específico, prima pela legalidade ou pela busca de justiça, que vez ou outra carrega emoção mas que vive predominantemente no campo da argumentação. Odette não, seu corpo é um canal para a arte, seu extravaso envolve a dança e a música, mostrando uma clara evolução da personagem, pois o mesmo receptáculo que antes foi alvo de assédio e vilipêndio, agora é receptor de algo inspirador, bonito e comovente, a dor não é mais predominante ali e o filme faz questão de descartar qualquer possibilidade de afirmar que o estupro pode fortalecer a mulher, obviamente.
Inocência Roubada é um filme emocional cujo início não é tão empolgante, mas melhora drasticamente do meio para frente, a participação de Bescond como diretora e protagonista funciona bem e só se crê no drama que se estabelece por conta da participação dela e da composição de Odette, uma vez que o filme contem somente essa nota.