Categoria: Críticas

  • Crítica | X-Men: O Confronto Final

    Crítica | X-Men: O Confronto Final

    O terceiro capítulo da franquia X-Men começa no passado, mostrando duas crianças que faziam parte do quinteto inicial de mutantes treinados por Charles Xavier e Magneto, em uma versão rejuvenescida Patrick Stewart e Ian McKellen terrivelmente animados e artificiais de um modo assustador. Sem saber, Brett Rattner condenaria seu filme e seria mais lembrado por esses erros crassos do que pela boa ação que em alguns momentos apresenta.

    X-Men: O Confronto Final parece a receita de um bolo que não deu certo, apela para uma questão densa em seu início, depois tem momentos de ação bem filmados em uma luta com Sentinelas, mas que não vale de nada, pois ocorria numa simulação dentro da Sala de Perigo – que mais parecia o holodech de Jornada nas Estrelas: A Nova Geração, série que também tinha Stewart como líder dos heróis – e por mais infame que soe a insinuação de roubo de tecnologia do Capitão Picard para seu grupo de mutantes, certamente é algo menos desequilibrada do que a construção feita no começo deste filme.

    Uma versão de Hank McCoy é apresentada, e coitado de Kelsey Grammer, seu intérprete, que tem que agir como um macaco de circo, que lida com as questões do governo relacionadas aos mutantes, como secretário dessa pasta específica. Se as autoridades agem de modo bizarro, o núcleo escolar também, Scott (James Marsden) não superou o luto, mas Marie (Anna Paquin) não, ela age como uma adolescente em fúria, que involuiu de X-Men 2 para este. Mesmo a líder tática Tempestade é desequilibrada, parecendo mais uma criança, para desgosto de Halle Berry, que acreditava que teria um melhor papel nesse.

    Nada justifica a saída de Noturno do elenco (nem a presença de Fera) ou a participação de Ciclope, basicamente porque Marsden aceitou um papel no Superman: O Retorno de Bryan Singer e teve um conflito de agenda. No caso do primeiro, o motivo oficial dado era que Alan Cumming faria uma pequena participação, mas o processo de maquiagem era caro e demorado demais para utilizar em uma cena tão curta, mas o que mais se falou na época é que o público o confundiria com McCoy. No game oficial do filme, se afirma que Wagner abandonou os X-Men por não querer uma vida tão pouco pacífica quanto a de um X-Man. Se houvessem gasto algumas palavras nisso, certamente faria mais sentido.

    Há outra grave adaptação, os Morlocks são reduzidos a um grupo de mutantes que usam roupas da moda, tatuados e que adora fazer amostras gratuitas de seus poderes. O visual neo punk não combina sequer com Callisto (Dania Ramirez), mas piora demais com o restante. Todo o retorno ao Lago Alkali, onde ocorreu a ação do filme anterior é equivocada, primeiro pelo retorno de Jean, que traz uma Famke Janssem com cabelos maiores e mais bela, com uma crueldade primária e inexplicada. Dito assim esses momentos soam patéticos, mas certamente não chegam nem perto da vergonha alheia que a cena em si provoca no espectador mais atento. É tudo muito mal construído, mal orquestrado e ofende até o bom desempenho da personagem no outro episódio da franquia.

    O terceiro longa da série de mutantes não sabe que história contar, e erra em todos os campos que atua. A ideia da cura mutante deveria ser melhor trabalhada, de preferência por um diretor que não fosse especialista apenas em filmes de ação. Não há profundidade, drama ou qualquer grau de complexidade, apenas simplismo. A ideia do doutor Worthington é tão frágil que nem seu filho acredita nela, e aparentemente não é definitiva, visto a cena do xadrez que envolve Magneto no final, além disso, o máximo que se discute a respeito da controvérsia e da opinião pública mutante é que alguns são a favor e outros contra, nada mais é desenvolvido.

    A redução de personagens inclui até Magneto, que em troca de ter mais capangas capazes de falar frases de efeito, abre mão de sua companheira Mística após salvá-lo. O vilão está longe de ser um personagem bidimensional capaz de abandonar sua antiga e mais fiel amiga à toa. Rattner não parece ter conhecimento disso. Tudo que envolve o retorno dos amigos mutantes a casa da pequena Jean é de fato a parte mais podre desse bolo azedo. O fim do Professor X, a transmutação que faz com que Janssen pareça um boneco zumbi, o acolhimento de Magneto, as falas do Fanático, é tudo muito digno de risos, assim como Wolverine ajoelhado, chorando, consolado por Ororo, tudo pífio de um jeito que é impossível não se irritar.

    Lady Letal, Groxo e Dentes de Sabre são três exemplos de personagens introduzidos nos filmes de mutantes para protagonizar bons momentos de ação, mas cada um deles é bem justificado ao menos, ao contrário da montanha de mutantes vistos aqui. É uma sucessão de equívocos, que faz deste filme uma desconstrução de todo o legado que os filmes anteriores tinham, não havia mesmo como continuar a partir desse ponto e a solução que Matt Vaughn encontrou em X-Men: Primeira Classe foi criativa e inteligente.

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  • Crítica | X-Men 2

    Crítica | X-Men 2

    O início de X-Men 2 é eletrizante, e repete o monólogo que Xavier proferiu em X-Men: O Filme levemente modificado, apontando para as estrelas, mostrando que a ambição do filme mudou, assim como prestígio de Bryan Singer. A trama de fato começa na Casa Branca com o presidente dos EUA correndo perigo, ao ser facilmente invadido por um mutante. O Noturno de Alan Cumming é introduzido de maneira selvagem, agressiva e uma violência demoníaca, que combina com sua aparência, magnificada pela música repleta de elementos góticos. Em cinco minutos, Singer demonstra o que poderia ter sido feito em seu primeiro filme, caso tivesse mais dinheiro, e ainda faz a cena de abertura que melhor traduz o heroísmo e o escapismo dos quadrinhos até hoje.

    X-Men 2 não demora a mostrar seu protagonista, Wolverine (Hugh Jackman), achando o Lago Alkali, o lugar que deveria mostrar um pouco de sua origem. Também não há demora em apresentar os outros mutantes, mas claramente a idade pesa sobre Famke Janssen, que está claramente com idade demais para aparentar uma mulher de vinte e poucos anos, mas seu desempenho dramático surpreende. Singer e seus roteiristas eram mestres em por elementos a serem evoluídos, ao passo que não trabalhavam bem com sutilezas.

    O Xavier de Patrick Stewart é mais atuante, ele aparece em ação fora da mansão, e mesmo ao cometer atos antiéticos – quando manipula os pensamentos de pessoas inocentes que viram os seus alunos em ação – há um cuidado grande em mostra-lo como um grande mentor e ideal a ser seguido, ainda que algumas de suas ações sejam discutíveis.

    O roteiro tem bons momentos ao associar a origem de Logan, não resolvida em Alkali com o ataque na Casa Branca. Engraçado que Ororo/Tempestade (Halle Berry) deve uma certa submissão a Jean, e isso pouco se nota de tão sutil que é a cena de encontro com Kurt. Mesmo diante de clichês, como o fracasso com antigos alunos, o filme lida melhor com a carga dramática mais adulta, a exemplo da cena na casa dos Drake onde Bobby (Shawn Ashmore ) tem de ratificar que não escolheu nascer diferente, onde se resume bem a ideia do preconceito embutido na sociedade comum. Outra parte bem trabalhada se dá na cena da invasão da Mansão Xavier, que ocorre com pouco mais de 30 minutos de exibição, sendo esse o momento onde Wolverine pode ser o assassino sangue frio das HQs clássicas, escondendo o sangue nos corredores escuros das instalações.

    A figura de William Stryker (Bryan Cox) como vilão mistura elementos do chefe do projeto Arma X, que injetou adamantium em Wolverine com o personagem homônimo dos quadrinhos, que está em Deus Ama O Homem Mata, um pregador evangélico louco e intolerante. Ele usa os poderes de seu filho para seu próprio anseio maligno. Outro momento interessante e depois reutilizado em Logan, é a pressa em salvar o Professor X de se tornar uma arma de destruição em massa, referenciando ainda que de leve a famigerada saga Massacre.

    Claramente, Singer queria lidar com a Fênix nos filmes seguintes, pois há uma bela evolução de Jean Grey como personagem. Ela que antes só movimentava seringas com a mente agora é capaz de deter mísseis. A aproximação de Magneto com os alunos de Xavier faz uma bela referência as fases que o mestre do magnetismo se bandeou para o lado dos mocinhos, ainda que aqui fique bem claro que ele só se movimenta por interesse próprio. A união dessas forças gera bons momentos, como a cooperação em equipe bem coordenada por Singer, o brilho de Rebecca Romijin como espiã e alívio cômico (sua personalidade impressiona), e claro, as batalhas entre o casal Summers e os detentores do adamantium. O filme não é perfeito, existem algumas conversas complicadas, como a piegas fala entre Noturno e Mística, em que o rapaz a indaga sobre esconder a própria aparência. Esse ponto encontraria eco em X-Men: Primeira Classe, seja nos momentos bregas de demonstração dos poderes dos mutantes ou no clichê de orgulho mutante que Jennifer Lawrence profere.

    A modernização do mito de Frankenstein de Mary Shelley beira a perfeição na relação parental entre William e Jason funcionam como condutores do mal, um maquiavélico e outro tolamente manipulado pelo ideal de um fanático, e o resultado final não poderia ser mais agressivo, em especial na vendetta que Magneto arquiteta rapidamente, demonstrando seu enorme poder mutante, rivalizando ele com sua capacidade intelectual e tenacidade. A forma como os heróis corrigem esses rumos soa um pouco apressada, mas conversa muitíssimo bem com o cânone dos quadrinhos, resultando num belíssimo filme de equipe onde o protagonismo é mais balanceado, mesmo que Jackman tenha muito mais brilho. Janssen é soberba quando exigida, em melhor forma até que Stewart, e seu sacrifício no final faz o ate então inexpressivo James Marsden brilhar. A direção de atores de Singer é exigida e tem muito êxito, exceção a Halle Berry, mais uma vez sub aproveitada.

    Singer claramente queria fechar a trilogia, mas se envolveu em Superman: O Retorno, e a Fox optou por não esperá-lo. Jamais saberemos quais eram seus planos à época para o terceiro filme, ainda que ele tenha retornado a franquia como produtor em Primeira Classe e diretor em X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido e X-Men: Apocalipse. X-Men 2 entrou para história como um dos melhores filmes de quadrinhos, sendo talvez o melhor no quesito ação, contendo um bom trabalho de equipe, oposição aos heróis carismática e bem representada, sacrifícios e um belo gancho para futuras obras, que jamais seriam tão bem urdidas e construídas quanto essa, mesmo com os remendos no reboot da saga anos depois.

    https://www.youtube.com/watch?v=xF9FW5_yDxs

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  • Crítica | X-Men: O Filme

    Crítica | X-Men: O Filme

    O filme que ajudou a inaugurar o exploitation de heróis recentes começa com um monologo, acompanhado de uma abertura em CGI que explora a sinapse cerebral de uma pessoa com gene x. Enquanto emula o início de Clube da Luta, Patrick Stewart empresta sua voz para explicar uma das razões pelos quais ele e os seus são discriminados. Os próximos momentos de X-Men: O Filme de Bryan Singer mostram dois cenários, e a origem de dois mutantes, Erik Lensher e Anna Marie, Magneto e Vampira, e tanto para o vilão quanto para a futura heroína, o mesmo destino, pessoas comuns olhando para eles com olhos vis, claro, em momentos da historia bem distintos, um nos campos de concentração durante o holocausto e outro nos anos 2000.

    A cena imediatamente posterior é pouco sutil, há uma apresentação de Jean Grey (Famke Janssen), no senado, interrompida por Robert Kelly (Bruce Davison), um político que usa sua influência para denegrir os mutante. O conteúdo do debate e da discussão entre os antigos amigos, Erik e Charles Xavier é bem explicito, fruto claramente da falta de investimento da Fox que não contratou um roteirista mais gabaritado e não permitiu que esse filme lançasse mão de obviedades para compor seu quadro. Tal qual foi com Star Wars, não se acreditava no potencial deste. O roteiro de David Hayter (baseado no argumento de Tom DeSanto e Singer) é apressado, com dez minutos a maioria dos personagens clássicos já aparecem e dão o ar de sua graça.

    Hoje, discutir Hugh Jackman no papel de Wolverine parece loucura, mas na época houve muita discussão, pelo fato de Logan ser baixo e Jackman ter pouco menos de dois metro de altura, mas fora toda a artificialidade da apresentação e no cenário que ele usa para conseguir alguns trocados em lutas clandestinas de arena, seu desempenho faz lembrar sim os quadrinhos clássicos de Frank Miller. Essa estranheza gritante até faz sentido, esse é um mundo preconceituoso, e Singer como diretor judeus e homossexual tenta passar o espectador um pouco das sensações que tinha ao perceber como as pessoas comuns o viam. A mão é um pouco pesada, mas a mensagem é passada de maneira inteligente.

    Mesmo Anna Paquin não tendo um desempenho espetacular, a condição de orelha não é totalmente descartável, de todas as caracterizações forçadas, a dela é uma das mais tranquilas, e é difícil não achar no mínimo engraçados alguns pontos, como o esconderijo da irmandade de mutantes, que é estiloso, feito por Magneto com um arquitetura terrível e nada prática- com bolinhas de bater que rodam sem cordas e que caem quando o mestre de magnetismo sai – ou a base dos heróis, com letras X por todo lado, exposição das roupas pretas dos mesmos, e acesso livre para Wolverine. Há também de se lembrar que ainda não havia sido lançado Homem Aranha de Sam Raimi e Batman Begins de Chris Nolan, filmes de herói eram comuns na Dc com Superman 22 anos antes e a recém acabada franquia do Morcego, onde Batman & Robin tinha encerrado mal a saga 3 anos antes. Ha muitas criticas injustas ao que Singer fez, mas esse ajudaria a pavimentar o caminho da Marvel, a partir de 2008 e de todo o campo de super heróis, que resolvia misturar a fantasia com algo mais realista. Mais do que isso, universo Ultimate da Marvel, lançado em 2001 bebia muita da fonte aberta por este filme, retribuindo assim as referências aos quadrinhos invertendo a lógica de inspiração e inspirado.

    É louvável que o ponto de partida do filme já tenha em mente a maioria dos aspectos básicos de revistas de heróis. Mesmo Vampira fazendo as vezes de menina desprotegida que Kitty Pride e Jubileu foram nas HQs, mesmo com Wolverine sofrendo explicações sobre o colégio de super dotados, a gênese da luta dos alunos de Xavier já é totalmente explicada com menos de 30 minutos, e a duração de 104 minutos é bem utilizada. Os momentos de ação também são eletrizantes, a Mistica de Rebecca Romijin é deslumbrante não só por conta das curvas da atriz e da forte maquiagem, o efeito usado na sua transformação é sensacional e o uso que ela faz dos pés é algo seminal também.

    O que se nota é que os conceitos e ideais estavam em estágio embrionário, fazendo assim justificado até o livre uso de arquétipos  nos personagens principais. Por mais que não tenham tanto espaço de tela quando Wolverine, são os dois mentores os melhor apresentados personagens. Enquanto Patrick Stewart inspira confiança, Ian McKellen é carismático e exibicionista. Toda a questão expositiva e exibicionista que apresenta tem sentido só por conta de seu desempenho, mesmo quando da show off de suas ideias, personalidade, poderes e habilidades de seus capangas. Ele precisa justificar isso, pois a exibição não é para o público, e sim para seu opositor politico, no caso, Kelly, que é seu prisioneiro. Essa exposição até conflita com alguns conceitos do filme, e claramente eles não são amadurecidos quanto deveriam, mas ainda assim há uma justificativa.

    O exemplo maior dessa fragilidade se vê na invasão fácil que Mística faz a escola, não há nenhuma segurança nem nesses tempos de paranoia e mesmo que isso já tenha ocorrido nos quadrinhos (aliás, o tempo todo), um filme que pretende ser realista precisa identificar isso como prioridade. Isso, unido a questão dos efeitos especiais serem fracos, faz a obra envelhecer mal. É absurdo como quando Singer era prolifico, não havia dinheiro, e hoje com ele em desgraça pessoal, há investimento em detrimento de péssimas historias.

    Falta em Hayter um trabalho mais acurado na adaptação dos roteiros dos quadrinhos, ainda que haja da parte do diretor claramente uma insistência em alguns momentos mais expositivos, no entanto o senso de urgência é grande, e até bem trabalhado, se não fosse tão acompanhado de conversas óbvias e não trabalhasse tanto mal os papeis de James Marsden e principalmente Halle Berry, que é completamente desperdiçada, certamente haveria maior êxito. Tal qual eram as reclamações de Chris Claremont quando roteirista dos Fabulosos X-Men, Tempestade não tem o destaque que merece, enquanto Logan é o centro das atenções, não surpreenderia se esse longa chama-se Wolverine e seus amigos.

    Alguns pequenos absurdos são bem charmosos, como o fato da pista de pouso e lançamento do jato Pássaro Negro ficar embaixo da quadra de basquete, mas dado a pouca verba, esse acaba mesmo sendo um evento engraçado. Dos aspectos técnicos, a música de Michael Kamen é bem icônica(ele aliás, também compôs a música tema do desenho de 1993), e a fotografia trabalha bem os elementos fantasiosos e o uso indiscriminado de CGI. É realmente uma pena o pouco orçamento, que influiu muito nos últimos atos, que careceram de una luta mais elaborada, sobrando apenas a breve batalha de Mistica e Wolverine como algo realmente bom.

    Cabe a Logan a pecha de heroi em sacrifício, o que vai para o combate final com o vilão e o que tenta resgatar a vida da mocinha, dando a Vampira seu poder, mas para cada um dos quatro X-Men há seu momento de brilho na Batalha de Manhattan, mesmo considerando estranho alguns pontos, como a batalha ser na Estátua da Liberdade. X-Men: O Filme está longe de ser perfeito, mas a despeito de todos os infortúnios que passou, certamente é uma bela obra, pavimenta bem a saga para mais filmes e para se tornar uma franquia, mas é auto contido ao ponto de soar bem como adaptação solo, capturando bem o espírito do grupo de alunos de Xavier, além de ter feito historia nos filmes de ação.

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  • Crítica | X-Men: Fênix Negra

    Crítica | X-Men: Fênix Negra

    X-Men: Fênix Negra, dirigido por Simon Kimberg, é o quarto filme após retomada da franquia em X-Men: Primeira Classe, e seu início se dá com um monólogo sobre destino e evolução, emulando um pouco o que Patrick Stewart fez em X-Men: O Filme, só que agora dito pela Jean Grey  (Sophie Turner). Iniciado em 1975, com a infância trágica da narradora que foi acolhida por Charles Xavier (James McAvoy).

    A trama não demora a chegar em seu momento “atual”, no ano de 1992, numa missão dos X-Men no espaço. Xavier e seus  alunos surfam em uma enorme popularidade. A adulação aos mutantes e a discussão ética são bons pontos, mas pouco ou mal explorado. A passagem de tempo para alguns personagens é bastante confusa, Michael Fassbender (Magneto), McCAvoy e Nicholas Hoult (Fera) não tem em suas mutações desculpas para não envelhecer, como a Mística de Jennifer Lawrence (em algumas versões, Magneto também tem envelhecimento retardado, mas nada tão grave quanto aqui), e sinceramente esse passa longe de ser o maior pecado de Fênix Negra.

    As incongruências começam com o estranho salto de poder de Jean. Nos quadrinhos havia o impacto dela ser fraca no início, e repentinamente ganhando poderes e adquirindo onipotência após um encontro cósmico, no entanto, em X-Men: Apocalipse ela já demonstra um grande poder, portanto, há pouco impacto no crescimento da personagem. Há algumas piscadelas para o público, como uma rave da mutante Cristal, um easter egg simpático, mas que faz pouco volume no todo. O foco dramático é evidente e bem óbvio: o envaidecimento de Xavier. Ocorre que isso já foi plantado na versão de Matthew Vaughn mas inflada aqui, e esse pecado é apontado também nos quadrinhos. Dizer que o telepata pôs barreiras mentais em Jean nem pode ser considerado exposição de trama (os trailers deixam isso claro), mas daí a culpar Xavier por isso não faz sentido. Ora, nos filmes anteriores abre-se precedentes a todo momento, tanto no filme de 2011 quanto em X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido: em um ele está em começo de carreira, no outro já é tão veterano que se aposenta e em ambos o líder mutante manipula memórias e pensamentos, mas lá não era problema.

    Os inimigos estrangeiros, também soam confusos. Não se explana nada sobre os D’Bari e nem se cria um mínimo suspense sobre eles, para quem não leu os quadrinhos soam como pura tolice. O roteiro não precisa ser expositivo mas com o pouco que se dá eles parecem apenas malfeitores genéricos, e não as criaturas que vão atrás da Fênix na história clássica, e ainda tem a problemática de subvalorizar Jessica Chastain, que aliás, contraria qualquer teoria anterior.

    Há bons conceitos como a comunidade de Magneto, uma espécie de pré-Genosha, mas seria muito mais legal se tivessem mostrado o desenvolvimento desta (mas vá lá, também não mostraram a guinada rumo a família de Erik no filme anterior). Outro boa ideia mal executada é o sentimento que predomina em Jean ser a rejeição, e não o medo. O fato dela não saber lidar com o poder e a maneira como os mutantes a enxergam como ameaça é um argumento inteligente, pois mostra como a educação que não é libertadora facilmente faz com que o perseguido se torne perseguidor, mas a ideia de ser acompanha por boas cenas de ação é desperdiçada por atuações repletas de frases de efeito, com um desfecho confuso, com pouca ou nenhuma razão factual para ser repleta de viradas morais. Os momentos finais de Fênix Negra são artificiais, mostrando uma nova configuração da escola e do futuro dos personagens, buscando uma aproximação com o que é visto em X-Men: O Filme. A boa construção de texto é escondida com rimas visuais oportunistas que só enganarão o espectador que estiver completamente desatento, se é que até esse abraçará essa obra, visto que é preciso memória e apego aos outros filmes. É uma pena uma franquia como essa termine de modo tão melancólico e vergonhoso, mesmo com possibilidades para um futuro fora do estúdio.

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  • Crítica | O Pianista

    Crítica | O Pianista

    A trama de O Pianista começa lúdica, no ano de 1939, Wladyslaw Szpilman tem sua música povoando as imagens polonesas em preto e branco antes mesmo de seu interprete Adrien Brody aparecer em Warsaw, destilando seu talento musical em um restaurante chique que abriga não só judeus como toda a aristocracia gentia. Entre os acordes que faz, a realidade não demora a aparecer, com bombas ocorrendo por todo o território do país inclusive perto da onde ele trabalha, enquanto o musicista recebe visitas de fãs, que compõem para si uma doce ilusão de normalidade e prestígio, em um país que é cada vez mais severamente atacado por extremistas de direita.

    Seu núcleo familiar começa unido e feliz, mesmo com os ataques ocorrendo e com os rumores da perseguição aos judeus também nesse país. A trama aqui é tão otimista que faz lembrar os bons núcleos de novelas globais, eles comemoram o apoio francês aquela época, fato que para o espectador soa engraçado, no sentido da curiosidade e do infortúnio que em breve recairá sobre os Spilzman e demais membros da comunidade hebraica polonesa.

    Apesar da atmosfera ser construída aos poucos, e do idioma ser majoritariamente em inglês é impossível não emergir neste drama, seja pelas atuações do elenco que cerca Brody – com Emilia Fox, Frank Finlay, Michael Zebrowski – ou pela clara decepção do protagonista, que vê proibições de entrar em bares e cafés, rareando cada vez mais as oportunidades de trabalho. Para ele não é surpresa a humilhação que em breve sua família e o mesmo passarão, mas a câmera de Polanski não poupa o espectador mesmo com a previsibilidade do destino, pois todos os membros do clã são enquadrados, esmurrados, perseguidos e humilhados.

    Em pouco mais de 15 minutos, todo o otimismo de Wladek de que as prisões demorariam pouco e de que a família ficaria bem desaparecem, como a água que invariavelmente escorre pelo buraco da pia. Os muros em volta dos campos são levantados muito rapidamente (ao menos essa é a sensação do protagonista), as ruas e calçadas tomadas de lama, os tons das roupas passam a ser predominantemente cinza, remetendo a miséria existencial dos concentrados. Ainda neste contexto, existe alguma aristocracia hebraica, gente que conseguiu manter seus tostões e que ainda tem algum luxo mesmo nesse cenário, e Wladek trabalha nesses guetos, produzindo alguma boa musica para os mais abastados.

    A proibição de lazer, cultura e os roubos as economias dos judeus conversam bem com a atualidade, onde a economia mesmo quase um século envelhecida segue segregando os mais pobres, roubando-lhes o pouco que tem. Por mais que os governo autoritário de direita não tenho o mesmo poderio e inteligência que Hitler e os seus tinham na Alemanha dos anos 30 e 40, percebe-se a mesma intenção de desmonte e de terror. No filme, há um belo cuidado em mostrar sinais pequenos, como as luzes das casas onde o horror vai predominar se acendendo, poeticamente tratando do fim da vida de alguns com cenas cruéis de exterminio, que representam bem a barbárie e maldade desses, que insistem em tentar retomar seu poder na onda conservadora que invade países pelo mundo, entre eles, o Brasil.

    O retrato da situação judia que o diretor propõe em seu roteiro  passeia por boa parte das instâncias de sofrimento que os filhos de Israel passaram, mesmo os que não se envolviam politicamente com a resistência aos nazistas. Os soldados opositores eram implacáveis com os que estavam no lado “adversário”, e esses só eram assim vistos por conta de uma condição de nascença, por terem sido eleitos por intolerantes como alvos de perseguição. Olhando pelo ponto de vista dos segregados, soa quase impossível um sujeito como Hitler ter tanta adesão popular e tantos apoiadores, e a maquina de propaganda de Joseph Goebbels ajuda a explicar a aderência ao discurso nazi fascista. Para quem sofre do outro lado, é bem fácil notar as fragilidades dos comerciais e dos discursos, mas para quem está no contexto dos privilegiados de fato, é sedutor ter seu ego afagado e suas vontades cumpridas, além de incentivos aos preconceitos que eram obviamente compartilhados pelo povo, sendo assinados pelos poderosos. De fato é preciso que a educação liberte o povo de seus grilhões movidos pelo pensamento, para que este povo perceba que também é explorado e que não faz sentido a perseguição ao diferente, mas tanto nos anos 30 e 40 do século XX quanto na atualidade, é difícil desconstruir essa mentalidade.

    A fotografia de Pawel Edelman ajuda demais a compor esse cenário de calamidade, assim como a total entrega de Brody, que passa por fases físicas severamente diferentes no período em que é perseguido, a forma como o filme trata o nível de desespero dele e de outros homens impressiona, um artista, com intenção de brilhar é reduzido a somente um homem que busca sobreviver, que se esgueira por casas pequenas, caçando migalhas e pedaços de pão, farelos e sobras de refeições passadas, que encontra antigos amores agora com outros pares e que não sabe se viverá mais um dia ou se encontrará de novo os seus. Todo esse desespero é facilmente traduzido a quem assiste, e o destino de Wladek parece ser mesmo o de sofrer. A guerra de fato só chega nos quarenta minutos finais, e ele é invadido pelo desespero, tendo o pouco refúgio que tinha sendo bombardeado.

    Mesmo quando o drama soa fantasioso ou sentimental, há um pé na realidade visceral que a guerra proporciona muito forte. A proximidade do conflito o faz regredir ao estágio mais básico da vida, incapaz de falar ou de fazer qualquer coisa que não seja buscar suprimentos. Ele interrompe essa existência quase neandertal quando tem um encontro com um oficial da Gestapo, em um dos momentos mais tensos da historia. Quando ele pode tocar piano, o faz com afinco, como se sua vida dependesse disso e de certa forma, depende mesmo. Esse oficial é um dos mais intrigantes personagens, pois apesar de ser nazista ele é humanizado, simpático, quase benevolente, convencendo a si mesmo de que faz o bem, ainda que seja só um oportunista, percebendo que seu fim chegará. Por mais que O Pianista trate o exercito soviético como uma cópia dos nazistas – em um paralelo raso e breve, aliás – seu intuito de valorizar a historia de Spilzman é absurdamente exitosa, compondo esse uma obra prima de Roman Polanski, em alguns momentos superando até a obra de sua filmografia como um todo, facilmente entrando no panteão de O Inquilino, O Bebê de Rosemary e Repulsa ao Sexo, as obras máximas do cineasta, sendo um filme repleto de camadas e significados.

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  • Crítica | Aladdin (1992)

    Crítica | Aladdin (1992)

    Tomando elementos do cultural oriental como base, seja a mitologia árabe ou contos chineses ancestrais, Aladdin, animação de 1992 comandada por John Musker e Ron Clements (que já haviam feito As Peripecias do Ratinho Detetive, A Pequena Sereia e mais tarde conduziriam Hercules) adapta um dos contos das 1001 Noites, ao menos um que não estava nos escritos originais, mostrando a historia de um pequeno ladrão nas ruas de Agrabah que é muito mais do que aparenta ser, um diamante bruto.

    Nesse clássico da famigerada renascença da Disney há alguns sinais narrativos bem curiosos, como o narrador/comerciante conversando diretamente com o publico, apelando para a historia do rapaz que dá título ao filme para manter a atenção do espectador. Pouco tempo depois, se revelou que o personagem era o mesmo gênio dublado por Robin Williams, lembrando que nos anos noventa tais informações tão básicas não eram tão presentes na internet, que aliás, engatinhava a essa época.

    Neste ponto se notam coisas incríveis, como um moralismo abstrato na Caverna dos Tesouros, além da  óbvia questão de que mesmo roubando para se alimentar, Aladdin não é considerado como impuro, mostrando que essa balança moral é bem dúbia. Os filmes do estúdio sabiam brincar com o nonsense e com os exageros, mas ainda assim, se nota uma sentença pesada para o personagem, de que ele morrerá ladrão pois assim nasceu, e essa talvez seja a maior diferença para a versão de Disney do mito. Outro fator diferencial é a carga de sensualidade implícita, que é aplacada claro pelo fato de ser uma animação, mas que é bem presente neste, o que faz com que a obra seja bastante ousada para os padrões cronológicos.

    Da parte dos outros personagens, há também pouco apego ao material literário original. Seu par romântico é uma linda garota rica que se vê pobre de aventuras mesmo com todas as regalias que tem por ser da realeza. Seu futuro sogro é um rei bonachão que é facilmente manipulado e seu opositor é um bruxo afetado, acompanhado de uma arara/papagaio que por sua vez, funciona até como motor de uma máquina que dá paradeiros de pessoas. Os animais do filme aliás são um caso à parte, pois são espertos, com um macaco indiano que (praticamente) fala, um tigre ciumento, além de uma arara/papagaio que não se limita só a falar, mas também a maquinar planos, roubos e ainda faz um sem número de piadas. A formula mistura humanos inteligentes e civilizados com figuras antropomórficas e claro, criaturas mágicas.

    O status quo é modificado após a saída da Caverna, onde Aladdin encontra um tapete mágico, que funciona como um animal de estimação, ou um pet. Aos 36 minutos, o co-protagonista finalmente aparece, o Gênio da Lâmpada, um ser azul de poderes cósmicos e fenomenais, mas que também é um sujeito louco que brinca com arquétipos de transformistas. A inventividade do personagem é demonstração suficiente de que ele é a frente do seu tempo, de que não é movido pelos preconceitos de época alguma. Curioso é que, apesar dos predicados positivos, ele ainda não é maduro, sendo até passivo agressivo quando seu amo o recusa. De fato, o Gênio é esperto e vê em Aladdin um alguém inteligente e altruísta, capaz de ludibriar o novo amigo mas também de abrir mão de sua vontade pelo bem de outro.

    Apesar de tudo positivo que cerca esta versão de Aladdin, ela obviamente não é perfeita, tem efeitos em 3d artificiais (em especial na saída da caverna), que se misturam com outros muito bons (quando chega a lava), então as partes não se mesclam bem. Ainda assim, seu humor é afiado, há uma forte mensagem de desconstrução da mentalidade da realeza, desdenhando da figura soberana de Agrabah, mostrando o sultão como um bobo alegre, além de conter um vilão que transborda carisma e que é o perfeito político corrupto e enganador. Por mais que seja um filme para crianças, há muitas camadas adultas na animação, além de um trabalho fenomenal não só com as animações, mas com a trilha, com músicas compostas por Alan Menken que marcaram sua época e que fizeram o longa entrar para a historia não só da Disney, mas da sétima arte como um todo, sendo um belo espécime dos filmes de contos de fadas mesmo sem o padrão eurocentrista em sua formula.

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  • Crítica | A Mansão do Inferno (1980)

    Crítica | A Mansão do Inferno (1980)

    Dario Argento e seu Suspiria, de 1977, marcaram a história do cinema de horror e o filme sobrevive como um grande clássico até hoje, mas o que muita gente não sabe é que o cineasta continuou essa história no desejo de criar uma trilogia. O segundo longa foi o A Mansão do Inferno, de 1980, esse que prometia expandir a mitologia criada por Argento a partir do livro Suspiria de Profundis (Thomas de Quincey, 1845) mostrando a segunda mãe das Três Mães, responsáveis por afundar o mundo em suspiros, lágrimas e trevas, residente em uma Nova York sinistra e barroca.

    Mesmo que o filme pareça ser dividido em três momentos e em três personagens, pode-se dizer que  sua trama principal se inicia quando a jovem Rose Elliot (Irene Miracle), que mora em um misterioso prédio na cidade de Nova York, compra o livro de um arquiteto que diz ter construído um lar para cada uma das bruxas intituladas Três Mães, desconfiada que está morando em uma dessas construções ela pede a ajuda de seu irmão Mark (Leigh McCloskey).

    É interessante perceber que o longa acaba repetindo os erros e acertos do teu antecessor, o apreço visual é ainda mais presente e refinado, enquanto o roteiro parece não se resolver nunca.  Cores invadem os cenários e fazem com que tudo pareça um pesadelo sedutor que se materializa em ambientes muito bem projetados para criar uma Nova York diferente, um pouco envelhecida e fantasmagórica. Os efeitos práticos nesse novo capítulo também se destacam, um belo trabalho de maquiagem deixa as cenas de violência mais trabalhadas e detalhadas, acabam satisfazendo os mais loucos por sangue.

    Já a trama não sabe para onde ir, é possível ter o longa em uma perspectiva que a narrativa não seja o real objetivo, e sim a megalomania da violência e as matanças dessas bruxas, como um bom filme trash, mas se o longa se inicia aprofundando na mitologia dessa história é impossível não esperar um roteiro no mínimo coerente. As ações das personagens são duvidosas, as histórias entrelaçadas não fazem sentido e no fim parecem um desperdício de tempo, além do final apressado, tal qual Suspiria.

    Ao desfecho de A Mansão do Inferno a sensação que fica, felizmente, não é negativa, pelo contrário, mesmo tendo esses tropeços de roteiro o filme ainda é bastante divertido. Sendo visualmente bem acabado e tendo uma trilha-sonora eficaz em criar uma atmosfera singular, o segundo capítulo da trilogia das bruxas de Argento pode acabar se tornando o preferido de alguns e respeitado por muitos, acaba sendo uma pena perceber que ele carrega um potencial não alcançado.

    Texto de autoria de Felipe Freitas.

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  • Crítica | Rocketman

    Crítica | Rocketman

    Cine biografias compõem talvez o mais polêmico dos sub gêneros da sétima arte atualmente, especialmente quando os biografados estão vivos. Pois bem, sabendo disso, Dexter Fletcher foi incumbido de dirigir Rocketman, um musical bem ao estilo teatral que fala sobre Elton John, e já em seu início ele ousa, quebrando a quarta parede ao mostrar o seu Elton Hercules John na rehab, em um grupo de apoio semelhante ao alcoólicos (ou narcóticos anônimos), onde o astro fala um pouco sobre sua vida, e sobre seu passado, como Reggie Dwight. Incrivelmente, tanto Taron Egerton (que inclusive contracena com o cantor em Kingsman: O Círculo Dourado) quanto Matthew Illesley representam as duas versões principais do musicista.

    Já nesse início é mostrado o personagem mentindo para os outros, e um pouco para si, ao falar de sua família, mas a sinceridade invade a trama quando assume que Reginald utilizava a música para ser aceito. Nessa gênese é dado o caos de sua família, e é entre uma interpretação bem caricata de Bryce Dallas Howard, que faz sua mãe. Mas mesmo diante desses erros, os números musicais são magistrais. Esse quadro aliás só melhora no terço final, com alguns reencontros repletos de amargura, e aí assim, com significado e fatos a discutir além da simples rejeição gratuita.

    O roteiro de Lee Hall não é perfeito, mas remonta bem a popularidade da Rockabilly, além de lidar bem com os clichês de clássicos como Juventude Transviada, trazendo essa abordagem para a atualidade de uma forma transgressora, pervertida e em alguns momentos, encantadora. Há uma fluidez temporal absurda e Fletcher usa e abusa da montagem videoclíptica, que aliás, beira o brilhante em Pinball Wizard, mergulhando nas fases da música de Elton John, mas sem parecer ter pressa em passar pela discografia do sujeito, que aliás, é tão resumida, que faltaram hits.

    Etergon segura um mundo de emoções em seus olhos, garganta e expressão facial, a todo momento parece estar prendendo seus sentimentos, segurando o fôlego e fingindo ser feliz e nesse ponto, a obra que o cineasta apresenta serve também como catarse, um exercício de desapego e desabafo, além de um descarrego em uma cine biografia nada chapa branca, mesmo que endeuse seu objeto de estudo e apele para algumas pieguices típicas dessas biografias, ao contrário da maioria dos seus pares, este possui alma, e muita alma.

    Rocketman representa a vida do astro nos intervalos das epifanias e insights nos poucos respiros que o personagem tem nas obrigações de ser uma estrela, e nesse ponto ele acerta demais, além de não ter medo de ser uma peça cantada queer,  ao contrário do que foi Bohemian Rhapsody, fugindo da pecha de filme família, mostrando a sexualidade do cantor, seu abuso dos vícios (lembre-se que a primeira cena é nessa toada) e não há pudor em mostrar personagens tridimensionais, realistas e palpáveis.

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  • Crítica | Godzilla II: Rei dos Monstros

    Crítica | Godzilla II: Rei dos Monstros

    O que aconteceu em 2014 em São Francisco, na versão de Godzilla que Gareth Edwards conduziu entrou para historia como um 11 de Setembro com horror atômico e monstros, ao menos dentro desse universo compartilhado e Godzilla II: Rei dos Monstros perde boa parte do seu tempo num drama familiar, capitaneado por Mark (Kyle Chandler) e Emma Russell (Vera Farmiga), que estão na cidade durante o ataque. Os pais perdem um filho, e logo é mostrado que eles são especialistas nas criaturas gigantes, e a transição para essa especialidade é zero, não há qualquer menção disso.

    Esse início mostra muito do caráter do filme, as cenas com os monstros, tem escalas enormes e Michael Dougherty manda muito  bem, como havia feito em Krampus, intercalando isso com uma inutilidade de trama humana, que traz uma empresa boazinha, chamada Monarca e que é comandada pelo caricato oriental sábio Dr. Ishiro Serizawa (Ken Watanabe) e por uma equipe terrível, formada pela dra. Ling (Ziyi Zhang) e outros personagens genéricos e sem personalidade, uma mais irritante e raso que o outro, lembrando em alguns momentos o recente Cloverfield Paradox.

    No presente, a filha do casal é vivida por Millie Bobby Brown, a Eleven de Stranger Things e sua personagem, Maddison (ou Maddie) é uma menina inteligente e destemida. Por mais que suas ações sejam irreais, é mais passável ver ela discutindo com sua mãe, tentando colocar algum juízo na cabeça da adulta do que assistir todos os “veteranos” e cientistas tentando dar importância a péssima explicação sobre como os “titãs” (os monstros são tratados por essa alcunha) ajudariam a humanidade ou ajudariam a preservar a vida no planeta. Há todo um núcleo de eco terroristas, liderados pelo personagem Jonah Alan (Charles Dance), que aliás, faz lembrar uma motivação meio Thanos, mas muito capenga. Tanto Jonah quanto seus capangas são ridículos, e não servem sequer para dar alguma importância aos humanos que certamente morreriam nas brigas dos monstros. É tudo melodramático e o roteiro subestima o espectador, fingindo que os inocentes conseguiriam evacuar a maior parte das cidades.

    Ao menos, da parte dos animais gigantes, há muita ação, embora haja menos tempo de tela que todo o resto do lenga lenga. A trama mostra Ghidora, Mothra, Rodan e outros monstros antes de  enfim estabelecer o retorno de Godzilla. Isso ocorre com pouco menos de uma hora de exibição. O quadro tinha chances de melhorar, mas obviamente a crescente é interrompida por mais dramas humanos desnecessários, chegando ao cúmulo de um dos cientistas “culpar” Mark por uma das derrotas do lagarto radioativo, basicamente porque ele torcia contra o monstro que matou seu filho caçula. Tirando toda essa baboseira, as lutas são ótimas, não há mais tanto predomínio de lutas em lugares escuros ou com fumaça/névoa e a tensão ocorre ao menos pela expectativa de destruição, pois se importar com os humanos beira o impossível.

    Godzilla II: Rei dos Monstros peca onde o novo O Predador acerta e tem êxito onde o filme de Shane Black fracassa. Se os personagens genéricos do longa de ação estivessem aqui, certamente seria um acerto e faria mais sentido dentro do desnecessário acréscimo de homens e mulheres como condutores da trama. O filme é desnecessariamente longo e dá vazão a teorias da conspiração bem risíveis, e termina com alguns bons ganchos para o conflito entre Godzilla e King Kong, mas a realidade é que este é menos justificado em trama que o anterior e que Kong: A Ilha da Caveira. Seria mais honesto dar mais tempo aos duelos entre titãs, e esquecer toda a perfumaria dos humanos, e espera-se que ocorra isso no próximo capítulo da saga que está agendada para 2020. É esperar para ver.

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  • Crítica | Defying The Nazis: The Sharps’ War

    Crítica | Defying The Nazis: The Sharps’ War

    Documentário de 2016, dirigido por Ken Burns e Artemis Joukowski, Defying the Nazis: The Sharps’ War apresenta a historia de um religioso abnegado, Waitstill Sharp e sua esposa Martha Sharp, duas pessoas que ajudaram refugiados a fugir das garras dos nazistas alemães nos anos quarenta. Munidos de um diário lido durante a execução do filme por Tom Hanks, os horrores do III Reich são acompanhados de imagens dos políticos poderosos da época, pontuados pela musica de Sheldon Mirowitz.

    O tom do filme é um pouco piegas, mesmo o trabalho de Mirowitz é mal encaixado e faz o sensacionalismo sobressair ao falar da associação de Sharp com os pastores dos Estados Unidos, bem como sua infância/adolescência. Ao mesmo tempo, detalha bem a trajetória do reverendo, mostrando que em 1933 ele foi ordenado ministro, e que esse foi coincidentemente o ano que Hitler ascendeu ao posto de chanceler na Alemanha, e a partir daí houve uma caminhada de descendentes alemães rumo a sua Terra, novamente.

    Todo o processo de ajuda que Sharp prestava aos judeus refugiados é muito bem detalhado, e sua historia de solidariedade faz lembra um bocado da biografia de Oskar Schindler, embora seja bem menos famosa a história. O filme sofre com uma dramatização um pouco porca, tudo soa meio melodramático e sensacionalista e a falta de apego a realidade faz sofrer um pouco a jornada audaciosa de Waitshill e Martha Sharp, mas o fato de exagerar nessa carga demonstra um bocado do receio que os judeus tinham em serem pegos.

    O longa é protocolar e formulaico, possui muitas entrevistas de vítimas dos desmandos e da crueldade dos nazistas, no entanto, mesmo dentro dessa obviedade há êxitos, em especial no que toca remontar a memoria de pessoas que foram abnegadas. O conceito de heroísmo normalmente é associado a quem luta fisicamente com algo ou alguém maléfico, e não com quem resiste ou presta apoio aos flagelados, e desconstruir esse conceito é algo importante para os diretores. Se em toda a forma há equívocos, nesse intuito não há nada de errado.

    Incrivelmente, próximo do final o filme ganha um novo fôlego, com os relatos de Sharp como planejador de fugas. Ele usa ardis para despistar os soldados de Hitler na Europa, e acerta a maioria deles, de certa forma associando esse tipo de comportamento com os de muitos membros da guerrilha durante a época da Ditadura Militar no Brasil, que também tinha que improvisar planos no intuito de manterem-se vivos.

    A colaboração dos dois foi voluntária, e sequer seus filhos sabiam desses atos até um certo tempo, só foram descobrir com o biografo que estudou a carreira eclesiástica do pai, dado que ambos faziam segredo. Ambos foram muito marcados por isso, e vieram a ter atritos que resultou num divorcio nos anos cinquenta, mas o ideal cristão dos dois os fez serem honrados pelo Estado de Israel, o mesmo que hoje desperta fascínio de boa parte da extrema direita, que não enxerga na perseguição aos judeus nenhum paralelo nem com sua ideologia e nem com os métodos pregados por boa parte de suas lideranças ou da parte dos que são admirados pelos mesmos, como o Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra. Ao menos, o filme valoriza pessoas que lutaram de fato contra a opressão dos fracos e desvalidos, e é dedicado aos que não escaparam das mãos dos extremistas da direita alemã.

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  • Crítica | Death Note (2006)

    Crítica | Death Note (2006)

    Cabe destacar logo de início que este filme, dirigido por Shusuke Kaneko, foi lançado em junho de 2006, ou seja, é posterior à conclusão do mangá e anterior ao anime. É um ponto curioso, visto que, em muitos casos, as versões live action são produzidas após o mangá e anime. Isso poderia justificar as boas doses de originalidade deste filme.

    Death Note conta a história de Light Yagami, um estudante japonês genial. Certo dia, ele encontra um misterioso caderno que pode matar qualquer pessoa, basta escrever o nome dela enquanto mentaliza seu rosto. Com esta ferramenta macabra, Light quer se tornar uma espécie de deus e limpar o mundo dos criminosos e pessoas ruins, subjugando-as de acordo com seu senso torto de justiça.

    O genocídio se espalha pelo mundo, e a polícia se vê obrigada a pedir ajuda a L, um detetive anônimo que já solucionou casos complicados. A partir de então, Light tem um algoz  de extrema inteligência e precisará tomar o máximo de cautela possível, caso contrário será descoberto.

    Este filme conseguiu utilizar a essência da obra original, sendo fiel nos pontos principais ao mesmo tempo que modificou algumas coisas sem desvirtuá-la. Light consegue passar um ar de intelectual e psicopata de uma forma menos intensa que no anime, o que é positivo, caso contrario poderia soar um tanto caricato. Mérito para o ator Tatsuya Fugiwara, que anos antes protagonizou o mórbido Battle Royale (confira nossas análises do filme e do livro). Fugiwara conseguiu dosar suas emoções e ficou bem convincente, porém diferente do Light do anime. O mesmo podemos dizer de Kenichi Matsuyama, que deu vida a L. Ele manteve os trejeitos do personagem de forma menos exagerada, e funcionou bem. Sua aparência também remete ao original. O shinigami Ryuk é feito em computação gráfica de qualidade decente para a época, e o ator responsável por sua voz, Shido Nakamura, seria o mesmo do anime posteriormente. O Ryuk do filme é um pouco mais “humano” que na obra original, e por vezes fica pasmo com as atitudes de Light. Não que isso inexista no original, mas aqui ele demonstra um pouco mais de emoção.

    Ao invés de seguir à risca a trama do mangá, o filme preferiu modificar algumas coisas. Por mais que o resultado leve ao que o original criou, os trâmites mudaram e ficou ótimo. O roteiro se valeu, inclusive, de algumas regras específicas do caderno para que Light executasse seu plano de forma brilhante e cruel. As principais artimanhas de Light e L estão ali, mas por vezes modificam alguns detalhes. Certos momentos carecem de mais detalhes e desenvolvimento, mas considerando que o tempo do filme é escasso, não há muito do que reclamar. O ritmo é muito bom e as duas horas passam rápido.

    Diferente da versão americana de 2017, este filme pode ser uma boa porta de entrada para conhecer Death Note. A essência da obra original está aqui, e para quem não gosta de animações, esta versão em live action poderá suprir este obstáculo. A história termina em um ponto muito importante, deixando um belo gancho para a continuação, que sairia poucos meses depois, no mesmo ano.

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  • Crítica | Homem de Ferro 2

    Crítica | Homem de Ferro 2

    O segundo filme de Jon Favreau com o personagem do Homem de Ferro começa com a declaração do protagonista, Tony Stark de Robert Downey Jr. assumindo ser o alter ego do herói robótico, assistido por um senhor idoso que está a beira da morte em país europeu, acompanhado por seu filho, o inventivo Ivan Vanko (Mickey Rourke), conhecido nas revistas como Chicote Negro, que aparentemente quer dar a Stark uma lição.

    É nesse mistério que Homem de Ferro 2 começa, sabiamente apelando para um pouco de drama, para só depois mostrar as presepadas engraçadas de Tony, agindo como Homem de Ferro, pousando de terno embaixo da armadura, em um evento onde é esperado como um popstar. O diretor equilibra bem uma situação mais engraçada com outras mais sérias e esse equilíbrio é talvez seu maior mérito como realizador nessa duologia, isso inclusive faria muita falta não só nos filmes do personagem, mas em outras obras da Marvel Studios pós compra da Disney.

    Existe uma escalada de importância em um dos temas que é apenas arranhado no primeiro filme, que é a questão armamentista, e embora seja mais pretensiosa e arrogante aqui – até um pouco reducionista – explorar esse argumento aqui faz algum sentido, embora todo o envolvimento dos personagens de Sam Rockwell, Justin Hammer, nem o de Don Cheadle, Jim Rhodes. Os personagens inclusive são mostrados de maneira um pouco gratuita, e um deles prossegue apresentado sem qualquer importância maior.

    O filme se perde um pouco nos show offs de ação que faz, tanto no momento em que mostra uma briga entre Happy (personagem de Favreau que ganha mais minutos de tela) com a bela Natasha Rushman, de Scarlett Johansson, que a essa altura não é mais surpresa para ninguém sua identidade com Viúva Negra (isso inclusive torna mais palatável a gratuidade de sua aparição e disfarce), mas no caso da exibição de Tony como piloto de corrida, interrompida pelo vilão Chicote Negro há só preciosismo mesmo, uma desculpa para mostrar outra variação de armadura. A sequência ao menos termina bem graças ao caráter massa veio que ela toma, mas as piadas envolvendo Pepper Potts de Gwynett Paltrow soam vazias e infantis demais para um filme desse porte.

    Outro ponto fraco é o quão caricato é Vanko, falando em russo, com seus cabelos com mechas brancas artificiais e com um palito na boca, parece  saído de um filme de brucutu de Stallone ou Van Damme, com características e clichês típicos dos anos oitenta e noventa, assim como Rockwell também faz uma caricatura de milionário mal intencionado, que se apóia e alguém fisicamente forte.

    Isso, somado as cenas que Stark faz uma festa e dança bêbado, munido de sua armadura não combina em nada com o resto do tom do filme, e mesmo ao tratar da questão do alcoolismo do personagem, que existe nos quadrinhos, é aqui tratada como uma simples piada infanto juvenil, mesmo que hajam algumas tiradas engraçadas. O tom debochado faz imbecilizar todo o restante da trama, e piora demais quando Rhodes utiliza o traje protótipo de Máquina de Guerra. Em alguns momentos a luta é tão artificial que parece um gameplay de Virtua Fighter onde ambos players escolhem Dural, a chefe do primeiro jogo da franquia, com a obvia diferença de que estes não são personagens pixelados.

    Nota-se um desgaste  da formula do primeiro filme, apesar de novas participações do Agente Coulson (Clark Gregg), de Nick Fury (Samuel L. Jackson) e da Viúva, as piadas e tiradas de Tony soam repetitivas, não só em comparação com o filme um, mas também com o personagem em si. Ele se leva pouco a sério, mas o filme continua se levando muito a sério, e isso causa um problema de identidade grande.

    Sam Rockwell consegue ser ainda menos sutil do que foi Bridges no primeiro filme, alias o arco de Rhodes não faz sentido, além da mudança do ator aparentemente foi trocada também sua mentalidade e código ético. Jim jamais se voltaria contra Stark, mesmo com os erros do milionário. Mesmo em sequências de acerto, o filme teima com algumas gags desnecessárias. Após uma cena eletrizante de ação com a Viúva, há uma discussão de relação totalmente desnecessária entre Tony e Pepper, em mais um escapa cômico bobo, que ao menos, termina com outra boa cooperação entre Rhodes e Stark, contra os capangas robóticos de Hammer.

    O final é um pouco piegas, além de também ter uma cena pós crédito gratuita, como foi em O Incrível Hulk, que faz referência ao próximo filme do estúdio, Thor, mas ainda assim há boas sequências de luta, e o carisma de Tony e Natasha ainda dão  alguns motivos para celebrar a obra, é uma pena que os produtores tiveram pressa em lançar logo um segundo filme, pois se tivesse um roteiro um pouco menos apressado, Homem de Ferro 2 teria ainda mais méritos do que tem. Ao menos serviu para solidificar a ideia do personagem como o ponto de partida desse novo universo compartilhado, melhorando bastante o nível do que ocorreu no filme do Hulk.

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  • Crítica | Um Faz de Conta Que Acontece

    Crítica | Um Faz de Conta Que Acontece

    Longa em live action da Disney, Um Faz de Conta que Acontece é uma historia lúdica, sobre o jovem Skeeter Brosnon, o filho de uma familia cujo pai Marty é bem amoroso e atencioso, um belo contador de histórias feito por Marty Prince. Com o tempo, o garoto cresce, sua realidade muda, uma vez que adulto ele não consegue repetir os bins feitos de seu, trabalhando como faz tudo do hotel que seu pai ja foi dono. Nesta fase, ele é interpretado por Adam Sandler, e ele tem esse trabalho basicamente por pena, além disso, ele tem uma irmã, da qual é um pouco distante.

    Sandler ganhou uma fama de ator de filmes péssimos, muito gracas ao que sua produtora a Happy Madison costuma produzir, os populares “filmes de Adam Sandler” normalmente mostram o personagem do ator agindo como um idiota, que de repente se vê aprendendo uma lição ou recebendo uma mensagem transcental, que o faz encontrar sua real essência e o faz se tornar sedutor para belas mulheres. O curioso, é que o filme de Adam Shankman se utiliza desse signos, mas tem uma qualidade que o diferencia desses outros.

    Shankman tem tradição em trabalhar com musicais, em Hairspray – Em Busca da Fama ele já havia mostrado isso, mesmo depois de Um Faz de Conta Que Acontece ele conseguiu outros filmes legais, cuja carga emocional se faz muito presente, seja em Rock of Ages – O Filme ou no seriado  Glee, e essa experiência serve muito bem a história de Skeeter, sobretudo pela química que o sujeito tem com os seus sobrinhos. Mesmo que o elenco adulto seja irritante (principalmente pela participação de Richard Griffiths e Russell Brand), as crianças Jonathan Morgan Heit e Laura Ann Kesling fazem o encanto do filme sobressair, enquanto ouvem as historias fantasiosas do seu tio, cuja criatividade é tão nula que ele basicamente repete os fatos de seu dia ali. A mágica começa a partir do acréscimo deles, e faz com que o sujeito ascenda a novas posições na disputa por uma promoção em seu trabalho.

    Mesmo com a face de bobo alegre, muito repetida, a forma como o roteiro de Matt Lopez e Tim Herlihy faz toda a fantasia fazer sentido, mesmo quando os amigos do astro aparecem. Rob Schneider tem talvez a participação mais acertada dos últimos anos em filmes de Sandler, seu momento é bem comedido, assim como os dos outros “empregados” da Happy Madison.

    A trajetória de Skeeter tem uma evolução, que ocorre principalmente pelo medo de repetir os erros de seu pai, e gradualmente a historia lida com questões pesadas, como divorcio, ainda que não deixe de lado a abordagem ao estilo dos estúdios Disney. Mesmo com personagens bidimensionais, principalmente no quesito opositores, é natural que em uma história tão repleta de arquétipos eles sejam assim, pois este é um filme que toma emprestado elementos dos contos de fadas e filmes de princesa. Apesar de cafona a vingança de Skeeter é bem feita, e em mio a tantos filmes com a mesma formula, Um Faz de Conta Que Acontece se destaca por sua docilidade e por não apelar tanto para os clichês das comedias de seu ator principal.

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  • Crítica | Vivendo no Limite

    Crítica | Vivendo no Limite

    “Cala a boca, você vai morrer, mas ele não, entendeu?!”

    A dona morte sempre rondou os filmes de Martin Scorsese, espectro onipresente e visível nas ações de todos, e por trás de tudo que faz parte do cosmos urbano e violento que o cineasta naturalmente adotou, para si. Aqui, é possível notar uma certa redenção para esse espírito de decadência física e moral que os filmes do diretor de Cabo do Medo e Depois das Horas tanto debateram. É como se, pela primeira e possivelmente única vez, Scorsese fosse investigar os efeitos de um anjo vindo salvar as almas perdidas de Nova York, transitando incólume (ou nem tanto, assim) numa exígua viatura paramédica entre a podridão, a escuridão, e a danação que existe nas ruas e esquinas da maior selva de pedra desse mundo.

    Vivendo no Limite é sobre uma espécie de salvação religiosa que pode ou não resistir, bravamente, fora de um âmbito católico. Jogados ao mundo, as esquinas encardidas e a pessoas que carregam “problema” escrito nas suas testas, pergunta-se: é possível salvar alguém? Essa dúvida é personificada nos olhos de Nicolas Cage, numa das suas melhores atuações da carreira do famoso ator, e aqui metaforizada na sua profissão: salvar vidas dentro e fora de uma ambulância, na fornalha nova iorquina do começo dos anos 90. Desta vez, em meio as andanças da viatura que só avança pela noite, entre vivos e mortos, a cidade é retratada como uma versão mais fria e menos perturbada que a metrópole sem leis e prostituída dos anos 70. Scorsese parece entender as diferenças e as abraça, então, sem nenhuma nostalgia aparente.

    Sofrendo com a pressão do trabalho, e deixando-se impactar por ele em sua vida pessoal, Frank Pierce faz a ronda noturna enquanto se pergunta a finalidade do seu trabalho. O divino está na sua visão, não como esperança para o homem do desfibrilador, mas como algo que está à espreita das almas perdidas que vagam pelas ruas, e que não se mostra devido o véu da perdição que assola as áreas violentas de Nova York. Logo, logo, eles vão precisar de Frank para checar seus batimentos, quando a vida se provar frágil e não mais imbatível para drogados, e prostitutas. Eles só andam, gente da comunidade, gente de uma noite comum; almas penadas que Scorsese filma como contraponto a missão altruísta de Frank: salvar. Quem, ele não sabe, mas lembra-se de todos – principalmente daqueles que não conseguiu resgatar dos mortos.

    Por 48 horas, na trama, ele e seu amigo de ambulância Larry Verber (John Goodman, sempre um prazer) compartilham das dores e loucuras do projeto sarcástico e dramático de Cinema de Scorsese, mas desta vez com a garantia de que as mortes violentas de uma história serão combatidas não apenas pelo dever de uma equipe médica, mas pela nobreza de uma vida que precisa ser lembrada, principalmente numa selva impiedosa com os seus animais. Se Frank atendesse Travis Bickle após o tiroteio final em Táxi Driver, por exemplo, Frank deixaria o motorista punk falecer, engasgado no próprio sangue? E se a ambulância chegasse ao clímax de Os Infiltrados, logo após a chacina do filme de 2006, suas vidas seriam salvas? Se dependesse dele, sim, pois esse é o certo, o humano, o justo, independentemente dessa ser uma moral cristã, ou não.

    Do primeiro ao último atendimento, geralmente frenéticos e bem-humorados, a fotografia de Vivendo no Limite deixa seus tons brilhantes explodirem na tela, sendo o branco a cor mais presente nesse mural explícito e objetivo sobre o sentido da vida urbana, e a fragilidade dela quando encarada pela ceifa da morte. Num hospital que parece um purgatório em que almas, várias, chegam e retornam em desespero, rebeldes e errantes como só, com novos casos rolando a cada dia, ou melhor, a cada noite, ninguém garante que o cenário existe numa outra dimensão, espiritual talvez, ou mesmo na nossa, aonde a realidade das ruas dá licença a preservação da vida; aonde o som de um tiro, dá lugar ao bipe de um batimento cardíaco. E não se engane: Nicolas Cage é o cara, sempre foi, e junto de Scorsese realizaram aqui um dos melhores filmes americanos dos anos 90. Peça rara e que só melhora ao passar dos anos.

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  • Crítica | Rindo À Toa: Humor Sem Limites

    Crítica | Rindo À Toa: Humor Sem Limites

    Rindo a Toa é um documentário do trio Cláudio Manoel, Álvaro Campos e Alê Braga, o mesmo que havia feito Tá Rindo de Que?. Esta obra é parte da trilogia que estuda o humor e comédia no Brasil, portanto é continuação do anterior citado, e seu ponto de partida é a abertura política do Governo Militar, nos anos oitenta, e a saída dos militares do governo, gradualmente.

    A partir desse momento histórico, de abertura, pode-se finalmente fazer humor que não era o de costume ou ao menos era isso que se pensava e alguns movimentos ganharam espaço e notoriedade, como o Planeta Diário, que só existiu graças ao Pasquim e ao fato de alguns dos seus redatores terem passado pelo outro jornal, e outro grupos de comunicadores, que tinham entre eles Marcelo Tas e Fernando Meirelles, que culminaria aí na criação do repórter Ernesto Varela. As origens destes dois causos são bem desenvolvidos, falado um pouco sobre os problemas dos mesmos, que às vezes extrapolavam nas brincadeiras, e que contavam ainda assim com uma boa paciência dos alvos das piadas, por conta da antiga censura, com medo de que ela voltasse.

    Já os membros da antiga Casseta Popular afirmam que tinham  influência de  Monte Python e misturavam esse estilo com a troça que faziam com o Partido Comunista (o Partidão), do qual boa parte deles era afiliado. A junção deles com o Planeta Diário é revelada como ideia de Paulinho Albuquerque que sugeriu a eles  um show de humor com musicas, esquetes e piadas sobre a atualidade, se exibindo no Jazz Mania, e depois no Teatro Ipanema e Canecão.

    A parte que se fala do teatro que Asdrúbal fez e suas manifestações na televisão, com Tv Pirata, Armação Ilimitada e Programa Legal misturam também a cena de rock’n roll, a carioca, com a Blitz, e a de São Paulo com o Ultraje a Rigor. É legal que o filme se debruce sobre tantos assuntos, mas nota-se que alguns segmentos são melhor estudados que outro, não só por soarem mais interessantes, mas também porque algumas delas tem análises mais profundas. Entender como a Globo digeriu a ideia da TV Pirata e como pensou-se em fazer esquetes sem bordões – mesmo com reclamações de Chico Anysio e outros veteranos da comédia – é bem mais curioso que a contribuição que Roger Moreira e seu Ultraje a Rigor fizeram. Poderia se dedicar um pouco mais de tempo a Joelho de Porco ou Premeditando o Breque, brevemente citados por Marisa Orth. Ainda assim, há de se valorizar o esforço dos documentaristas em fazer todo o panorama da graça popular brasileira.

    Na parte em que se analisa Hermes e Renato, dois dos integrantes destacam não só o caráter de Self Made, de um humor sem muito peso cultural, pois não eram os rapazes de Petrópolis, ditos pelos próprios como “humor de pedreiros”, e nesse ponto é que abre outra discussão, a respeito do politicamente correto e se o humor tem ou não lado político. Manoel, Campos e Braga sabem equilibrar bem os lados. O formato mais clássico do documentário permite a tentativa de soar isento, deixando os humoristas falando o que querem, deixando o público decidir seu ponto. Apesar de não ousar tanto, Rindo à Toa tem o mesmo clima leve do primeiro, e acerta os mesmos pontos de Tá Rindo de Quê?, expandindo bem o estudo e causando curiosidade sobre como serão os rumos do próximo capítulo da trilogia, que ainda há de ser rodado, um desafio que certamente exigirá que seja esse sim mais ousado que estes dois, especialmente no que tange o fato do humor ficar datado e/ou anacrônico, fato que dificilmente ocorrerá dado que os dois outros são bem chapa branca.

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  • Crítica | Inferninho

    Crítica | Inferninho

    Inferninho é o novo filme de Guto Parente e Pedro Diógenes, e começa sua história justamente por seu nome, que varia a alcunha entre a questão de inferno pessoal e o nome popular que se dá a pequenos bordéis, onde por sua vez, ocorrem pequenos shows. O longa mostra o ambiente do bar cearense, comandado pela trans nipônica Deusimar (Yuri Yamamoto), que recebe a chegada de seu antigo amado, Jarbas (Démick Lopes), também conhecido como Marinheiro.

    O filme não dá sua história de maneira fácil ou didática, os sonhos e motivações dos personagens são desenvolvidos paulatinamente, assim como são mostrados os números musicais do local. As performances variam entre o mambembe e o vagabundo, com pessoas se esgoelando fora do ritmo, acompanhadas de uma música eletrônica que não faz muito sentido com o que se profere pelo cantor ou cantora, mesmo levando em conta a estética do tecnobrega. No entanto, isso em momento nenhum soa pejorativo, ao contrário, ajuda a dar charme e personalidade não só as pessoas, mas também ao lugar.

    Em determinado momento, Deusimar sonha que está com seu par – viajando por um chroma key dos mais caricatos – dando um pouco da dimensão dos pensamentos das pessoas que ali estão, gente que se enxerga como fracassada, que não vê muitas perspectivas de futuro, mas que ainda assim seguem sendo quem são, sem medo ou vergonha. Por esses motivos, a comparação com filmes como Paraíso Perdido parecem mal encaixados e reducionistas. O que se vê é uma boa influência do cinema de Rogerio Sganzerla e do recente Ralé, de Helena Ignez, especialmente, no modo de tratar os personagens e no espírito que eles transmitem ao público.

    Já o visual de alguns dos entes que o filme exibe  remete a clássicos da ficção cientifica e estética noir, além de pegar emprestado um pouco do caráter do western para o cenário de seu sertão. Os personagens fazem lembrar a literatura de Phillip K. Dick e Frank Herbert, reunindo semelhanças narrativas com os filmes como Vingador do Futuro, No Mundo de 2020, Blade Runner, além de lembrar também A Montanha Sagrada, e sua versão do faroeste norte-americano, El Topo.

    Inferninho poetiza a melancolia e inevitabilidade do destino, mostrando as curvas da vida de forma cruel e direta, sem deixar temas importantes de lado. Sua abordagem prima por urgência e desespero em fechar ciclos e começar novos, e tem em Deusimar o maior símbolo disto. Seus personagens faz do filme um espécime com uma identidade bastante corajosa.

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  • Crítica | Era Uma Vez Um Deadpool

    Crítica | Era Uma Vez Um Deadpool

    Que a campanha de marketing do universo cinematográfico de Deadpool é fantástica, nós já sabemos. Assim como o personagem cartunesco da Marvel, o mercenário tagarela das telas rompe diversas vezes a quarta parede, se dirigindo diretamente ao espectador, seja nas telas do cinema, seja pelas redes sociais. O empenho de Ryan Reynolds com o personagem fez com que o ator se reerguesse e se reencontrasse nas telas e tudo vem sendo alegria desde então, mesmo com a violência absurda e o linguajar pesado e obsceno, recheado de cinismo, ironia e humor negro, que o anti-herói prolifera sem nenhum tipo de pudor, deixando constrangido até mesmo o mais “mente aberta” dos seres, fato este que provou que o cinema pode ser violento, quase sem limites, o que abriu as portas para outras produções que tentaram alcançar o mesmo nível, como é o caso do excelente Logan e o controverso Venom.

    Pelo fato de ser uma produção para maiores, obviamente, os mais jovens teriam que ficar de fora, afinal, a violência explícita e o conteúdo quase sempre falando de sexo e drogas, não é mesmo para todo tipo de público. O problema é que os jovens adoram o personagem e não gostariam de ficar de fora dessa “experiência Deadpool”. Assim, os produtores resolveram criar uma nova versão do corte original, retirando todo o sangue possível, trocando piadas, “bipando” outras e adicionando cenas inéditas não aproveitadas, além de ter inserido o filme nos mesmos moldes de um conto de fadas, uma maneira interessante de novamente vender o filme para o público no melhor estilo Deadpool.

    Alguém aqui se lembra de um filme lançado em 1988, chamado A Princesa Prometida? Na trama, um avô lê para seu neto uma história da vida de uma princesa. O menino é vivido pelo ator Fred Savage, mais conhecido aqui no Brasil como o protagonista Kevin Arnold da série Anos Incríveis. Pois bem, sequestrado por Deadpool e colocado exatamente no mesmo quarto do filme oitentista, o ator é forçado a conhecer a história do mercenário tagarela, o que deixa a experiência um pouco mais interessante.

    Era Uma Vez Um Deadpool, para os fãs “normais”, tem cheiro forte de caça-níquel. Primeiro porque as mudanças no corte e cenas inéditas, embora estejam presentes, não acrescentam muito à experiência, principalmente se você é adulto e já assistiu Deadpool 2. E segundo que, se você se encontra inserido no primeiro por que, provavelmente não irá assistir ao filme novamente e procurará assistir somente às mudanças e pesquisará a respeito das comparações pela internet (lembrando que isso não é uma regra).

    Caso você seja um fã mais “hardcore”, a experiência será completa, porque parte divertimento, será comparar as cenas com o filme original. O mesmo é dito para os menores de idade, que poderão assistir ao filme sem medo, sendo que essa, de fato, é uma ótima saída para tornar o filme palatável para quase todo o tipo de público.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

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  • Crítica | Aladdin (2019)

    Crítica | Aladdin (2019)

    O live action de Aladdin que Guy Ritchie dirigiu finalmente chegou aos cinemas, e sua recepção foi mista, de maneira justificada, dado se tratar de um filme irregular. A dúvida a respeito da fidelidade com o material original é respondida rapidamente, pois seu começo é diferente da animação, se situando em um navio e não no deserto, em uma variação interessante do conto inicial visto no longa de 1992.

    A ação segue com semelhanças enormes com a franquia de games Prince of Persia, tanto na encarnação do jogo clássico de 1989 quanto em suas reformulações pós-anos 2000. No entanto, em seu desenvolvimento dramático existe uma enorme pressa no tocante as conexões sentimentais, trabalhando essas relações apenas posteriormente. O texto é pouco inteligente, faz até estranhar em algumas de suas decisões, possivelmente causando confusão no espectador que não tenha a história do filme original fresca em sua memória, errando na maioria de suas escolhas ao refilmes as primeiras cenas que remetem aos momentos clássicos da animação.

    Mena Massoud se atrapalha um pouco ao tentar fazer um herói encantador e incompreendido, mas não compromete tanto, já Marwan Kenzari até tenta, mas o roteiro não permite muito além do clichê de vilão maniqueísta e didático. Naomi Scott brilha em praticamente toda cena que surge, sua Jasmine foge do estereótipo fútil de garota rica e apresenta uma mulher cheia de resoluções e ambições políticas, buscando entender os anseios e necessidades das camadas mais populares, nem que para isso ela precise romper com tradições milenares. Sua presença é soberba, melhorando até mesmo as interpretações de Massoud quando juntos. O desconcerto de Aladdin diante dela também é visto no desempenho dos atores, até porque o desejo da moça é expandir, conhecer novos mundos e pessoas, e não ficar restrita aos mesmos cenários, enquanto a dele, é provar ser mais que um simples larápio.

    Jafar é o calcanhar de Aquiles da produção em matéria de narrativa, tem um passado interessante, mas seu comportamento é mal desenvolvido e não justifica em nada toda sua oposição ao sultão, ao palácio e a Agrabah. Sua obsessão por poder é mal explicada. Pior, seu parceiro, Iago, que no original é engraçado e o segundo melhor alívio cômico, é sub aproveitado, não tendo qualquer graça ou um mínimo de carisma.

    Apesar de o começo tropeçar na falta de identidade que Ritchie insiste em colocar em seu filme, não decidindo entre ser uma cópia literal do outro filme, como foi A Bela e Fera, ou uma nova versão do conto (aliás, quando apela para isso o filme soa muito mais maduro), do segundo terço em diante há uma enorme melhora, não à toa isso acontece após a aparição de Will Smith como Gênio da Lâmpada. Sua animação em computação gráfica prossegue estranha em alguns momentos, mas é aceitável na maioria. Ele é divertido, carismático, faz piadas com linhas de tempo diferentes e é metalinguístico. O Gênio da Lâmpada rouba a cena sempre que aparece e faz uma versão inspirada, ainda que diferente da hiper cartoonizada que Robin Williams emprestou a voz na década de noventa. Smith é puro carisma, um verdadeiro mestre de cerimônias,  encantador como há muito tempo não era.

    A problemática mora na questão de quando não estão presentes Gênio ou Jasmine em tela, todo o resto empobrece, e perde as cores. Nem Aladdin e os outros coadjuvantes são inspirados, o que é uma pena, pois o desenho antigo era repleto de bons personagens, ainda que contassem com pouquíssimo tempo de tela. Dentro dessa mentalidade de comédia, a cena de dança em que Ali Ababwa é ao mesmo tempo tosca e maravilhosa, e resume bem o espírito que o filme tem, ou ao menos o que ele tenta alcançar, não se levando a sério ao mesmo tempo que é feito com muito esmero e carinho.

    Esta versão de Aladdin varia entre o épico, com Jasmine e sua ideia de governar para o povo, e o patético com Jafar e sua obsessão pelo poder, repleto de textos expositivos e contando com um vilão unidimensional que não faz o expectador crer em nada, e é nesse meio termo difícil que o filme tenta se equilibrar, ainda que seja muito mais divertido e animado, legitimando a pecha de filme de princesa, para o bom sentido, inclusive invertendo o protagonismo quando quer, e é nesses momentos, que o filme de Ritchie mais é exitoso.

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  • Crítica | A Lista de Schindler

    Crítica | A Lista de Schindler

    Em uma primeira olhada, presunçosa e preguiçosa, é difícil afirmar que a mesma pessoa que dirigiu Tubarão, E.T. e os quatro Indiana Jones, é o mesmo diretor por trás de A lista de Schindler, clássico que volta a cinemas selecionados, numa curta duração de tempo, para se comemorar seu aniversário de 25 anos. Porém, um olhar mais profundo revela o reflexo e o uso ativo de boa parte da engenhosidade que Steven Spielberg, um dos criadores do que hoje chamamos de cultura pop, usou na avalanche de blockbusters que comandou, e que também aplica, aqui. É claro que, também em 1993, ao lançar a revolução técnica que foi o primeiro Jurassic Park, é claro que a bilheteria maior ficou para o impressionante filme dos dinossauros. Porém, ao pesar os dois filmes, isso seria justo?

    Ao abraçar a temática do holocausto, Spielberg mostra-se novamente um mestre em manipular a nossa atenção, agora apostando na magnífica fotografia preto e branco de Janusz Kamiński para dar o tom a sua obra, uma de suas maiores. Em primeiro lugar, essa em questão não é – e muito menos deseja ser – “mais um” filme do holocausto. O roteiro de Steven Zaillian é épico, e Spielberg trabalha tão bem em cima do contexto que ficaria quase impossível não resultar num épico de três horas de duração. É provavelmente mais longo do que realmente necessita para explorar o potencial de suas temáticas acerca da sobrevivência das vítimas de uma perseguição política implacável, mas a história é concisa em toda sua glória narrativa e seu poder de impacto sobre o espectador é inquestionável.

    Spielberg é judeu, entende desse universo e seus dramas reais apresentados na tela, e acima de tudo, faz aqui o seu trabalho-chave como cineasta. O modo como dirige o espetáculo não é imparcial, mas envolvente enquanto brutalmente elegante. Uma direção intacta de alguém que sempre está no controle, e sabe o que quer. Não usa de presunções baratas como tanto fez em O Resgate do Soldado Ryan, mas é sensível o bastante para não julgar judeus ou nazistas, deixando que nós, do outro lado da tela façamos isso – e não é o que fazemos? Se por trás da câmera Spielberg prova que não é só um diretor puramente comercial, o que nós vemos por suas lentes – no sentido literal – é o embate entre Liam Neeson e Ralph Fiennes, dois monstros que conseguem ofuscar tudo quando estão juntos.

    Eu poderia dedicar este parágrafo, até mesmo um parágrafo para cada atuação desses dois atores subestimados por Hollywood (Neeson só ganhou o reconhecimento geral com seu Ra’s Al Ghul, em Batman Begins, e Fiennes ao interpretar Voldemort, em Harry Potter), mas vou limitar-me a informar que, para quem ainda não assistiu ao filme, saiba que é um embate moral antológico entre Oskar Schindler, que representava a esperança para os judeus, e Amon Goeth, porta-voz da “paz” hegemônica para os nazistas. Enquanto Oskar empregava judeus em sua fábrica para deixá-los viver, gerar emprego e lucrar ao mesmo tempo com isso, Amon os matava por esporte do alto de sua fortaleza. A concepção dos seus personagens é tão forte quanto pode ser, quanto o que eles mesmo fazem. Homens no seu limite, lidando com uma humanidade doente.

    Não diria que A lista de Schindler é de fato o filme definitivo sobre o holocausto; Vá e Veja continua imbatível décadas depois. Ambos usam do realismo do fato para chocar, revoltar e propor reflexões básicas, contudo, a obra de Spielberg usa de bons momentos para superar outros filmes inteiros – e consegue. O Pianista, de Roman Polanski, por exemplo, anos antes de sua estreia já tinha sido resumido em A lista de Schindler em apenas uma cena, o que é simplesmente incrível. Além disso, o uso de simbolismos de guerra é astuto e precisamente adequado ao contexto que a fotografia preto e branco, belíssima, nos expõe – é claro que a parte técnica não poderia decepcionar, sendo ela, aqui, uma das mais inventivas e instigantes da carreira do cineasta.

    John Williams é um titã que expressa sua grandiloquência em forma de música, e temos um privilégio enorme de habitarmos o mesmo planeta que ele. Um dos melhores compositores do mercado, um gênio que chegou a compor uma trilha de suspense usando apenas duas notas, realizou aqui um trabalho singelo, suave, para tocar corações realmente. Fico imaginando, então, que muitos entraram nas salas de cinema esperando ver algo divertido e inusitado, como nos habituamos ver algo de Spielberg, e muitos se decepcionaram ao verem um filme muito mais profundo, algo historicamente tocante, e surpreendentemente ambíguo quanto a algo tão moralmente desafiante. Algo que mostra do que o cinema pode ser capaz quando se propõe a ser grande.

    https://www.youtube.com/watch?v=x3CEN6lIRyU

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  • Crítica | Gangues de Nova York

    Crítica | Gangues de Nova York

    “Não era uma cidade. Estava mais para uma fornalha.”

    Costuma-se dizer que só dois cineastas conseguiriam fazer o filme definitivo sobre Nova York, e esses filhos da Big Apple com certeza já tentaram fazê-lo, uma porção de vezes: Woody Allen e Martin Scorsese. O primeiro só com Manhattan e Annie Hall já resumiria com todo humor e irreverência possíveis os conflitos que seres-humanos, adoravelmente imperfeitos, conseguem enfrentar em suas estripulias e pequenas aventuras cômicas num caos urbano sempre ironizado nas paranoias de Allen. Já o caos de Scorsese é visto pelos olhos da noite dos becos e ruas perigosas onde o bom-humor nem sempre dá o tom. Conhecido pela sua violência e realismo dramáticos, a Nova York de Scorsese só pode ser embalada pelo jazz (como de fato é, mas só em Nova York, Nova York) quando se propõe a tirar os pés do chão, e viver seus sonhos que só acontecem mesmo na Broadway.

    E nós já sabemos disso. Gangues de Nova York é o resultado frenético da progressão de Scorsese sobre os olhares da megalópole em que nasceu. Se essa ótica começou com grande propriedade em Caminhos Perigosos, evoluiu ao longo de décadas de filmes sempre a mostrar uma cidade ou no auge dos seus problemas, ou que merece ser homenageada por uma época que já virou um passado recente. No caso do épico de 2002, filme rodado na Itália e dependente, em absoluto, da sua ambiciosa e grandiloquente ambientação, uma iconografia decadente e ao mesmo tempo atraente, como se a Nova York do filme fosse um cenário primitivo ainda a ser explorado, Scorsese quis mostrar as raízes da sua cidade e seus habitantes pra aqueles que rejeitam ideais romantizados.

    Para isso, faz questão de lavar nos primeiros minutos seu chão de sangue, e é nele que as pessoas vão se banhar, e os prédios irão se erguer – com o povo já “civilizado” de Se Meu Apartamento Falasse substituindo a barbárie do séc. XIX. Logo em seguida, após o massacre que iria mudar para sempre a vida de Amsterdan Vallon, o garoto volta para NY, já homem, e antes de pisar na cidade, joga fora a bíblia que levava consigo. Não há mais lugar para o divino. Numa trama de vingança de Amsterdan com Bill – o Açougueiro, homem poderoso e influente que assassinou seu pai a sangue frio naquela tarde em que a neve das ruas ficou vermelha, o filme acaba sendo mais longo do que poderia ser, uma questão (e muitas vezes um problema) recorrente dos filmes de Scorsese, um eterno apaixonado por Cinema e pela arte e as artimanhas de fazê-lo.

    E é nessa duração excessiva que o cara por trás de Touro Indomável deita e rola, agora com Leonardo DiCaprio sendo seu novo pupilo e não mais Robert de Niro, nos entregando uma versão ainda inédita sobre uma cidade sem glamour algum. Suja, nojenta, e que só não nos lembra uma Londres vitoriana no auge da peste negra devido os tons mais quentes do visual, e a falta de sotaque britânico nos personagens. Gangues de Nova York evidencia a promessa amaldiçoada que a cidade foi, por muito tempo, muito por causa da violência do seu povo. A violência mora na alma predadora dos americanos, diz Scorsese em cenas chocantes como a do teatro, em que Bill percebe o plano de Amsterdan e combate sua vingança com grande fúria, mostrando em público o motivo de ser respeitado, e chamado de O Açougueiro.

    A edição brilha, os cenários mais ainda, mas os atores ainda mais. Daniel Day-Lewis é um titã, mestre irrefreável que desaparece nos seus personagens de forma assombrosa, sujando e chupando o sangue do rosto do seu Açougueiro como se ambos tomassem banho nele toda noite – e não duvidamos disso. Se Lewis é um monstro, tendo aprendido a usar facas e machados igual sua nova persona agressiva, DiCaprio e Cameron Diaz não deixam o nível da atuação ser inferior. Um apenas quer vingança, e a outra alguém a quem confiar para ganhar a vida em meio a uma selvageria masculina e uma brutalidade sem fim. Scorsese sempre extrai o melhor das atrizes e atores sob sua demanda, e Gangues de Nova York é mais um ótimo exemplo disso. A adaptação do livro de Herbert Asbury ganhou as telas pelas mãos certas, porém de forma um tanto excessiva, refletindo a cobiça do cineasta que tomou conta da história. Um tratado inconsistente, ainda que absurdamente expressivo sobre as raízes da América.

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  • Crítica | Kundun

    Crítica | Kundun

    Quando Martin Scorsese, no distante 1988 veio com A Última Tentação de Cristo, tínhamos um nova yorkino da gema saindo da sua zona de conforto em busca de Jesus. Ficou de costas para os prédios, becos e táxis, e voltou-se as montanhas, fogueiras, ritos e rios. Fora da maior megalópole americana, e sua sinfonia inconfundível, Scorsese pareceu um patinho fora da lagoa onde cresceu e se firmou como homem, e cineasta, cuja visão cronicamente urbana custou a sua autonomia em âmbitos distintos. Somos o nosso meio ambiente, em muitos aspectos, em especial quando nele nos deixamos enraizar, e o filme com Willem Dafoe nunca consegue ignorar, ou muito menos subverter a fortíssima sensação de ser uma realidade (ainda que anistórica a vida de Cristo) filmada pelo viés de um turista curioso.

    E com Kundun temos a mesma impressão, tão latente quanto – muitos críticos aliás consideram-no o menos scorseseano da produção do mestre. Discordo, em partes: Kundun é uma experiência mística não revelada em toda a sua glória para o público através de suas imagens, e aposta qualquer traço de intensidade e profundidade que essas imagens poderiam ter na simples, e por vezes barata admiração com a cultura, os valores e a sociedade tibetana, ao norte da cordilheira do Himalaia. Scorsese tenta ao máximo viver e conectar suas imagens quentes e vibrantes à sintonia das cores, do vento e da beleza asiática ao redor, com seus monges, sinos e folclores extraordinários, ainda que tudo continue a se integrar, principal e insistentemente, numa perspectiva de admiração estrangeira.

    Aqui, Scorsese mostra demais porque não sabe no que focar, e amplia sua observação tal um turista passageiro, cuja estadia ainda vai durar um longo tempo naquelas bandas, sem pressa alguma. Um tanto perdido na cultura local, mas que a saboreia com a elegância de um sommelier atento na sua performance, o diretor de Táxi Driver narra, com uma belíssima fotografia do gênio Roger Deakins, a trajetória de um menino considerado a reencarnação do décimo terceiro Dalai Lama, e a sua consagração, já aos dois anos de idade, como o novo Buda, tendo que enfrentar o governo chinês contra à apropriação das terras sagradas do Tibete. Uma vez crescido, a guerra vem, e o pequeno país faz resistir como pode. O vermelho púrpuro e empoeirado dos trajes dos monges já alerta o que vem por ai, enquanto a paz parece descer, dia após dia, pelo vão de uma ampulheta.

    Resta ao jovem Buda, então, ser a figura do equilíbrio necessário, mas que o filme não torna, jamais, interessante. “Religião é veneno”, diz um general chinês ao encarar, com um falso sorriso diplomático, o exato oposto para o seu militarismo predatório de sempre. Kundun é inseguro, por vezes frágil, tanto no roteiro original de Melissa Mathison quanto na direção de Scorsese, após o ótimo Cassino, em expandir as suas possibilidades interpretativas, mantendo sempre o mesmo nível de calmaria e tranquilidade que impedem a biografia sobre o décimo-terceiro Dalai Lama, e de um notável período histórico da Ásia, de alçar voos maiores. Na tensão da iminência de um conflito bélico inevitável, o filme, que apela para um naturalismo agradável em sua concepção artística, se desenrola por longas duas horas em busca, ao final, de um lugar-comum que nunca realmente tentou abandonar.

    Obra inconvincente, ao todo, uma vez que, de tão vastas que são suas possibilidades cinematográficas, estas são renegadas como que por vergonha de assumi-las, e não pelo certo conformismo que a maturidade traz às coisas. Com o simbolismo aqui sendo parcialmente despretensioso, Kundun é quase que medíocre, no melhor uso da palavra – rascunho de luxo de um quadro mais potente, e que por pouco não tivemos acesso. Não por isso, o filme de 97 contém cenas belíssimas de grande impacto, como a clássica sequência de Dalai, jovem e sensível como o orvalho, de pé entre centenas, senão milhares de corpos de monges massacrados. Nisso, o doutrinador se pergunta o que fazer diante desse imperialismo selvagem e desumano, enquanto um cineasta, fora da sua zona de conforto, indaga-se como extrair o melhor de um universo tão rico de mensagens, e propósitos sem iguais. Valeu a tentativa.

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