Resenha | Boneshaker – Cherie Priest
Cherie Priest publicou seu primeiro romance em 2003, com o título original Four and Twenty Blackbirds – que ainda não chegou ao Brasil. Em 2009, deu início às aventuras dentro de um universo próprio, alcunhado como Clockworck Century Universe, e este Boneshaker é a o primeiro volume da série.
Indicado ao Prêmio Hugo, o romance narra a história centrada num núcleo familiar, e já mostra que o relacionamento dos parentes é conturbado em virtude do falecido progenitor. Blue Leviticus foi o responsável pela construção de uma perfuratriz mineradora – intitulada Boneshaker –, mas um terrível acidente mergulha a Seattle do século XIX numa catástrofe, transformando inúmeros habitantes em zumbis. Um muro é construído ao redor da cidade para conter tal ameaça. Tudo está bem, até que Zeke – um infante, herdeiro do falecido construtor – resolve cruzar o muro e ir em direção à parte proibida da cidade, enquanto Briar (viúva de Blue) vai ao encalço do garoto, como o instinto materno manda.
O background apresentado é muito rico, e dá sentido à estética steampunk. O roteiro é quase documental, mostrando em alguns flashbacks como era a vida das pessoas antes da Praga e como elas reagiram à desgraça, desde a construção do muro até o método utilizado por elas para sobreviver. Um problema muito presente é a escassez de água; é preciso um enorme tratamento para consumi-la, para o qual se usa toda a tecnologia do vapor.
Há um clima investigativo, que lembra um estilo Noir, principalmente nas partes em que se acompanha a trajetória de Briar. Priest faz o leitor acompanhar duas jornadas, mãe/filho. Briar corre em missão de resgate, acha que o rapaz é indefeso diante das situações que aquele Novo Mundo impõe – o que serve de metáfora para a dificuldade em romper-se o cordão umbilical. Enquanto Zeke resolve se aventurar por Seattle, a fim de fazer justiça – ao menos aos seus olhos – e de retornar com o orgulho perdido por sua família. Ambas as motivações são críveis.
Briar é desencorajada em continuar sua busca, com o argumento de que qualquer tentativa de ultrapassar o muro atrás de uma criança fugitiva é fútil, mas ela ainda recebe favores de pessoas que têm dívida com seus familiares. Há uma preocupação genuína – e por vezes até desnecessária – da autora em explicar suas “licenças poéticas” no contexto histórico. O esmero em passar com fidedignidade o clima e a aura de Seattle nos anos 1800 é recompensado com uma atmosfera bastante farta e rica.
Boneshaker é basicamente uma história de resgate e reencontro, e a estética steampunk serve mais à história como ambientação do que como mote. Apesar de alguns pontos importantes serem ligados intimamente ao “uso do vapor”, os dramas se encaixariam em qualquer outro estilo, o que garante universalidade à temática da obra. O trabalho gráfico da Editora Underworld é um primor, diagramação, capas etc. O livro será adaptado para o cinema, ainda sem previsão de lançamento, e será produzido pela Hammer Films.