Crítica | Virgínia (2010)
Dirigido por Dustin Lance Black – em seu segundo trabalho como diretor, cujo currículo de roteirista inclui Milk: A Voz da Igualdade – o drama foca na personagem título, Virgínia (Jennifer Connelly), uma mulher de meia idade, residente de uma cidade pequena que é acometida de uma doença mental. Tal instabilidade a faz regredir anos, até a época quem que esta tinha um caso com Dick Tipton (Ed Harris), chefe da polícia local. A narrativa envolve a geração posterior a dos personagens citados e toca em questões primordiais para os envolvidos em sua trama, de um modo pessoal e tocante.
A chamada nos créditos iniciais com uma animação 2D insere o espectador em um ambiente semelhante ao de um conto de fadas, a sensação é prolongada pela primeira música da trilha, executada em cima de imagens que exploram a área restrita de ocorrência criminal. A fotografia de Eric Edwards lembra muito alguns trabalhos de Gus Van Sant (não à toa, pois este é o produtor executivo) e de Sam Mendes, especialmente em Foi Apenas Um Sonho, onde as questões primordiais ligadas a discussão da sanidade mental são semelhantes, mas abordadas de modo e de ângulos diferentes, visto que em Virgínia a moralidade é aventada na questão da transa sexual de uma pessoa mentalmente débil com uma sã – julgada pela câmera – e a mesma transa entre pessoas de diferentes credos – esta interpretada pela mentalidade juvenil de Emmett (Harrison Gilbertson), filho de Virgínia.
A perversão que ocorre, bem próxima dos olhos do menino, influi e muito no que ele entende passar com sua mãe. Ele enxerga a reluzente figura do xerife de forma bastante diferente do que a opinião pública costuma julgá-lo. Tipton é candidato a senador estatal, e a explanação de tal polêmica seria um desastre para a sua campanha.
A multiplicidade de narradores/personagens mostra que a história tem muitos ângulos de análise, e a situação passa longe de ser simplória. Emmett busca incessantemente a identidade de seu anônimo pai, e ela passa pela pessoa de Tipton, o confronto entre os dois é extremo e o embate envolve até o entendimento de ambos sobre o Divino.
A paranoia de Virgínia não é tão injustificada e muito menos pautada em suas sandices, suas preocupações ligadas a interceptação de sua correspondência (por exemplo) é evidenciada como algo real. A única pessoa genuinamente preocupada com o seu bem-estar é Emmett. O ego ferido da mulher tem iguais proporções (ou até piores) ao de uma mulher abandonada cuja sanidade é plena, Virgínia passa a declarar estar grávida para os populares da cidade, sem pensar na preservação da imagem de Tipton, já que este não a enxerga como ela pensa ser merecido: como uma segunda esposa. As ações da protagonista ganham contornos de uma variação demente da Gata Borralheira.
A revelação da anormalidade de sua mãe não é uma total surpresa, visto que ele há tempos observava o seu comportamento “incomum”, mas a verificação do óbvio o faz com que seus planos de fuga sejam antecipados. O regime emergencial também atinge o seio familiar dos Tipton, a certeza da infidelidade abala a matriarca, que reage também de forma fugitiva. O desfecho é confuso, o que deveria ser um arremedo de inconsequência unido a tentativa de redenção da protagonista, acaba sendo um momento que carece de um maior aprofundamento, arranhando somente na superfície da questão proposta, faltou um pouco de esforço em pensar numa resolução melhor dos crimes cometidos, uma pena, visto que a primeira metade do filme é interessantíssima.