Crítica | O Amuleto
Direção de Jeferson Dê, do outrora premiado Broder, O Amuleto é a nova empreitada do realizador que optou corajosamente por executar cinema de gênero no Brasil, ainda que suas boas intenções não tenham alcançado um nível de excelência minimamente aceitável. A temática fantástica do roteiro de Dê e Cristiane Arenas, se assemelhando demais aos aspectos de fandom vistos na literatura de André Vianco e seus pares, ainda que a temática de bruxos e o nível das cenas em flashback sejam muito mais parecidos com os filmes de época mal feitos.
Os primeiros momentos de tela remetem à Inquisição, misturando elementos do pretérito com uma edição videoclíptica de músicas indie, estabelecendo a moda como cerne para sua historieta. As pernas à mostra da bela Bruna Linzmeyer demonstra a sutileza nula do filme ao retratar a sensualidade, aspecto típico da figura das feiticeiras, mas extremamente mal explorada neste. Apesar de alguns sinais esquisitos, Diana é mostrada como uma jovem normativa, que se perdeu em meio à mata após – supostamente – ter sofrido uma noite regada a álcool e muitas drogas, no primeiro momento de seu retorno à pacata cidadela onde nasceu.
As atuações são tão irreais quanto a direção de arte, que produz jornais completamente artificiais e não críveis com manchetes que idiotizam a trama. Os diálogos semelhantes a vozes de dublagens antigas só fazem piorar a situação, tornando praticamente impossível levar o filme a sério. Até o sotaque carregado de Maria Fernanda Cândido e Michel Melamed é forçado, se assemelhando a peças de comédia, distante da intenção que os produtores procuram passar.
A abordagem que o roteiro dá aos conflitos e tramas macabras é ridícula, grotescamente emulando teatros colegiais. A obviedade só foge na maquiagem que esporadicamente funciona. A maldição hereditária passa longe de ser digna de ser levada a sério, piorada com os recorrentes merchandisings e engessamento do argumento original, que tolamente acha que disfarçará os predicados negativos com um formato que relembra a modernidade da era dos telefones que executam vídeos.
O Amuleto vai de encontro ao típico público do recente exploitation de literatura fantástica que acometeu o Brasil, especialmente na falta de qualidade na urdição da história. O gore, limitadíssimo, não contém impacto visual, e o terror carece de atmosfera de sustos. Mesmo os palavrões parecem completamente difusos na oralidade, como um grão perdido em uma boca banguela. Só não mais desnecessário e fake do que todo o envolvimento dos personagens.
Engraçado como forças ocultas, supostamente incorpóreas, têm autonomia e discernimento para executar gravações em celulares. Interessante também é notar como a iniciação em magia é velada a ponto de ter zero construção de paradigma, o que faz não ter qualquer empatia pelas belas figuras mostradas em tela, até por serem pessoas monotônicas, somente capazes de gerar sensações fúteis e reações óbvias. Sequer as obsessões de Diana garantem qualquer reação que não seja o absoluto tédio ou risadas involuntárias graças ao medo da morte que se aproxima. Ao menos ao espectador, sobra o medo de o filme não ter fim, um terror absoluto.
O diretor tenta em vão gerar ângulos estranhos para a filmagem, mas o renovo jamais chega, graças à pobreza do script. Ao final, tudo parece esdrúxulo e bestificado. A quantidade de absurdos é um acinte. Praticamente nenhum aspecto funciona em O Amuleto, nem mesmo a boa intenção de retratar um mistério ligado à bruxaria, já que até o assunto é subalterno diante da estupidez que é filmada. O sobrenatural é subaproveitado, só tendo momentos em vultos e aparições vagas, que não acrescentam em praticamente nada.
O final tenta apelar para uma sobriedade ancestral e tradicional, que é completamente banal diante das palhaçadas exibidas. A boa intenção de retratar as bruxas como criaturas altruístas também não garante acréscimo de qualidade, já que até ali o estrago já havia sido instaurado. O caso arquivado é uma síntese do que deveria ter sido feito com a premissa desde o início, jamais executando a feitoria fajuta de vingança anunciada.