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  • O Fenômeno Halloween e a Mitologia de Michael Myers

    O Fenômeno Halloween e a Mitologia de Michael Myers

    Cinco anos atrás, resenhei o primeiro filme da cinessérie Halloween: A Noite do Terror, de John Carpenter, quando essa fez 25 anos. A obra é um marco simbólico para o cinema e talvez nem mesmo Carpenter soubesse o que viria pela frente, ao inaugurar um novo sub-gênero de terror, e ainda dar vazão a uma mitologia controversa em uma franquia repleta de desdobramentos estranhos.

    O Halloween original é ao lado de A Noite dos Mortos Vivos e O Massacre da Serra Elétrica um dos marcos centrais do terror pós-Nova Hollywood. Quanto a Myers, o diretor o teria criado o personagem ao visitar crianças doentes mentais em um hospital no Kentucky. Reza a lenda que ele viu um garotinho com olhar perturbador que sofria de esquizofrenia e isso o marcou de tal forma que fez imaginar um vilão que seria a encarnação de todo o mal. Além disso, ao compor o roteiro junto a Debra Hill, sua corroteirista, acrescentou uma máscara de baixo orçamento, possivelmente inspirada no rosto de William Shattner em Jornada nas Estrelas: A Série Clássica, boato jamais confirmado.

    Para compor esse quadro, era preciso de um adversário à altura para o vilão. O papel de Van Helsing atualizado coube a Donald Pleasance, um ator veterano, vindo de obras como O Diário de Anne Frank, THX 1138Fugindo do Inferno. Os créditos iniciais com a pequena abóbora são singelos perto do terror que viria, aquela lanterna não faria jus ao suspense que o roteiro de Carpenter e Hill trariam, mesmo que esse horror fosse econômico e certeiro, tocando em temas pesados envolvendo insinuações incestuosas e fratricídio.

    A jornada do sanatório Smiths Groove até a cidade fictícia de Haddonfield, em Illinois, no dia das bruxas soa como um retorno de um homem para sua terra, embora seu clã tenha sido varrido dali, sem paredeiro definido ao menos nesse ano de 1978. O diretor faz questão de não mostrar a face de seu personagem principal,  chamada nos créditos como The Shape. Ele aparece na frente de Laurie apenas aos 23 minutos de exibição, e aqui cabe a descrição de outra parte desse fenômeno: a inserção de Jamie Lee Curtis como Scream Queen fundamental do cinema, aproveitando-se evidentemente do pedigree de ter sido herdeira de Janet Leigh. Não à toa, Psicose é um pré-slasher que antecipa parte dos elementos consagrados do estilo.

    Halloween é bem tímido quanto as mortes. A maior parte delas é mostrada de maneira lenta e gradual. Myers parece sofrer de psicopatia que sob definição psiquiátrica é considerada uma constelação de traços disruptivos de personalidade e comportamentos antissociais. Até mesmo por isso, ele não é uma máquina de chacinar nesse início. Existem elementos teatrais demais nesse primeiro momento, como a distribuição dos assassinados pelos armários da casa, a fim de assustar Laurie, espalhando os amigos mortos de maneira quase fantasiosa. Hoje isso soa até risível, mas na época era impactante e causava alvoroço exatamente pelo exagero dramático. A evolução do menino que matou Judith com máscara de palhaço para o adulto deformado e quase sobre-humano faz sentido dentro da lógica criada dentro do próprio filme.

    O sucesso do filme colocou um dilema na mão dos produtores: o filme de custos irrisórios deu muito dinheiro e evidentemente que clamava por uma continuação. Aqui é importante salientar que a mitologia de Michael Myers se divide, e chamaremos elas por Mito para tentar diferencia-la, ainda que Halloween 2: O Pesadelo Continua, de 1981, esteja na maioria das gêneses dessas mitologias diferenciadas.

    Mito 1

    H2 começa imediatamente após o primeiro. Rick Rosenthal conduz o filme, escrito pela mesma dupla anterior. Reza a lenda que a sequência não era o desejo de Carpenter e nem de Debra Hill. O diretor iniciante claramente não tem o mesmo cuidado para transmitir a história em comparação ao primeiro. A aura fantástica evita qualquer sutileza e escancara intenções. A fala de Loomis de que Michael não era mais humano faz sentido, pois ele se tornou um super-homem. Aqui o gore ainda é moderado e nos apresenta cenas sem coerência, como quando o assassino joga a cabeça da vítima em água fervendo mas não machuca as mãos.

    Rosenthal abandona por completo a ideia de thriller psicológico e parte para um banho de sangue. O desfecho é simbólico, mostrando Myers chorando sangue ao ser atingido por sua irmã, Laurie – aqui, foi revelado que Strode era na verdade uma Myers, escondida de todos, pondo uma camada de sensacionalismo barato na trama.

    O fogo que consome o paciente doente e o doutor resume a falta de sutileza de roteiro e direção. Porém, o desfecho continha um sentimento definido por parte dos criadores de não querer continuar a história, tanto que em Halloween 3: A Noite das Bruxas, de 1982, o filme sequer toca na mitologia de Myers. A ideia seria usar o nome forte da marca para mostrar outras histórias, o que não ocorreu. O fracasso fez com que Carpenter e Hill abandonassem a produção da franquia.

    O mito 1 continua com Halloween 4: O Retorno de Michael Myers, lançados seis anos depois. Moustapha Akkad decide retomar os elementos que fizeram as partes 1 e 2 serem exitosas, trazendo Myers de volta, exatos dez anos depois dos acontecimentos do filme original, tanto em tela quanto fora dela. Incrivelmente, nem Michael nem o doutor Loomis morreram no incêndio do hospital em 1978, pois até mesmo Pleasance retorna. Só quem fica de fora é Curtis, que se poupa tanto do roteiro quanto de um possível fracasso, já que se tornou uma estrela de cinema.

    O assassino desperta na ambulância que o transferiria para um novo hospício ao ouvir que tem uma sobrinha pequena, de nome Jamie, interpretada por Danielle Harris. O diretor Dwight H. Little tinha dirigido pouca coisa na época (anos depois faria Rajada de Fogo, com Brandon Lee), e na realidade é incapaz de traduzir em tela nada próximo a tensão e senso de urgência do clássico. Ao menos, o final abre a possibilidade para um legado de terror familiar que… não se cumpre.

    Halloween 5: A Vingança de Michael Myers é feito no ano seguinte em um covarde retorno ao status quo. Havia um roteiro que prosseguia com os elementos levantados no filme anterior em que Shem Bitterman mostra Jamie como assassina. Mas no lugar disso, se tenta fazer uma tola aproximação de Loomis e Michael, basicamente para aproveitar uma última participação de Pleasance no papel.

    Michael retorna após cavar pela terra em sua cova, feita próxima de um rio. Para se salvar, entra em uma velha cabana de um pescador e desmaia sem causar mal ao homem. O assassino e o homem então convivem bem por um ano de maneira inverossímil, como se Myers tivesse “liberação” para matar somente no mês de outubro. No roteiro de Shem o pescador seria um homem místico de alcunha Dr. Morte, que faria um processo de ressurreição com influência de runas e rituais druidas, mas tudo foi descartado para esse novo roteiro capenga, levemente alterado na parte 6. O final mistura sentimentalismos com nostalgia em um desfecho fraco, mais uma vez postergando o real fim de Myers.

    Halloween 6; A Última Vingança,  de 1995 começa com um rito, envolvendo feitiçaria e crianças. Jamie é sequestrada e depois ocorre um salto temporal de seis anos. A menina cresce e está grávida e o roteiro de Daniel Farrands tenta explicar que um mal ancestral é base para a crueldade presente no sangue dos Myers. Segundo a seita, o serial killer está envolvido com a maldição de Thor, um antigo druida que, na noite de Samhaim, deveria usar sua família como sacrifício para o culto e assim a tribo tivesse vida. O objetivo dessa seita é continuar trazendo o mal à luz, e por isso trabalham com genética, para o surgimento de novos bebês que iriam se tornar assassinos e Michael passa a ter uma obsessão por seu sobrinho-neto.

    Para piorar há uma subtrama, envolvendo Tommy, que no filme original era a criança cuidada por Laurie e que aqui é vivida por Paul Rudd. Ele se tornou um freaky, obcecado pelos assassinatos envolvendo os Myers e os Strodes. Loomis por sua vez é mostrado como um eremita aposentado. Ao menos, essa parte se assume como um filme gore mesmo. A qualidade visual parece ser bem melhor que a dos dois últimos capítulos. Há duas versões dessa parte, a do diretor Ted Chapelle, que foi para o cinema, e a de Moustapha Akkad, que leva em conta mais eventos envolvendo o Doutor Loomis. Essa outra versão explica, por exemplo, que o doutor fez uma cirurgia para consertar as marcas em seu rosto, provindas dos filmes anteriores, mas ainda assim segue bem medíocre, e se o leitor quiser saber mais dessas versões, pode acessar aqui.

    Toda ideia dos filmes slasher é discutir a moralidade americana, focando nos adolescentes e no pensamento conservador do cidadão, exagerada ao ponto de ser encarada como força assassina e essa última parte da mitologia abre mão disso, para focar suas justificativas em um tema espiritual.

    Mito 2

    Antes de o conceito de reboot ser tão alardeado, Akkad já fez uma espécie de reset em sua franquia. Para comemorar os vinte anos do clássico, foi chamado Steve Miner, de A Casa do Espanto, Sexta-Feira 13 – Parte 2 ,Sexta-Feira 13 – Parte 3, Warlock, entre outros, para dar à luz a Halloween H20, lançado em 1998. Sem Pleasance, a série recrutou novamente sua scream queen, Jamie Lee Curtis, que agora assume o nome Keri Tate, tentando a todo custo esconder-se do irmão.

    Apesar de prestar reverencia e homenagem a Pleasance, o roteiro de Robert Zappia e Matt Greenberg ignora tudo exceto o primeiro e segundo filme. Não há menção a Jamie ou a outros retornos de Michael que não em O Pesadelo Continua e, para sobreviver a tantas outras franquias de terror, o filme tece um estilo mais moderno, claramente tomando emprestado elementos visuais e dramáticos de Pânico, franquia que ao lado de  Eu Sei O que Vocês Fizeram no Verão Passado e Lenda Urbana revitalizaram o interesse dos adolescentes por terror, além de inspirar novas continuações de Brinquedo Assassino e uma refilmagem de Psicose.

    Produzem o filme Akkad e os irmãos Bob e Harvey Weinstein. O mito de Michael pouco evolui, uma vez que o roteiro é esvaziado e repleto de clichês. Segura-se o ímpeto de violência para dar lugar a mais suspense e sustos, além da condução mais acurada. Miner faz boas cenas, com planos inteligentes e menos genéricos que as parcas continuações. A realidade é que o resto é de fato fraco, mas se o espectador for menos exigente com qualidade textual, certamente H20 soará ao menos divertido, além de apresentar uma nova tentativa de Laurie seguir sua vida, tendo filho, uma nova ocupação como diretora de escola e ainda assim sendo atormentada pelo passado.

    A oitava e até então última parte da saga de Myers começa 3 anos após o fim de H20. Halloween: A Ressurreição tem a gênese em um sanatório. Enfermeiras conversam sobre Laurie Strode, mais uma vez feita por Curtis que, aparentemente, decapitou outro homem que não Michael no final da sétima parte. A heroína segue viva e paranoica, não toma os remédios tarja preta que são prescritos e vê a figura de Michael em todos os lugares possíveis. Não se sabe por alucinação ou realmente pela presença do slasher. A ideia de mostrar receio e paranoia se misturando é maravilhosa, mas tudo que se segue após isso é de um equívoco tremendo. A franquia tenta soar cool ao pegar emprestado elementos de reality shows e uma estética parecida com a dos filmes da série Premonição, resultando em um tiro no pé que não agrada nem fãs antigos e nem novos.

    Curiosamente, a ideia de mostrar pessoas filmando em primeira pessoa os assassinatos foi utilizado em Panico 4, ainda que para Wes Craven essa ideia de filmar em found footage seja uma besteira completa. O filme foi produzido por Malek Akkad, filho de Moustapha Akkad, e que seguiu também como produtor das refilmagens. No entanto, quase não há acertos nesse desfecho. Há boatos de que houveram 3 finais alternativos, mas nenhum salva a mediocridade desse que tenta ser metalinguístico. A desculpa para introduzir Curtis nessa nova trama é quase inexistente e sua participação acontece, a despeito da trama principal, e termina em um quarto de hora aproximadamente. Nem a direção de Rick Rosenthal que também assinou H20 ajuda.

    Mito 3

    O Mito 3 começa em Halloween: O Início, de 2007. Um reboot. Ainda que essa parte do mito de Michael Myers não seja tão positiva, é melhor que a maioria dos filmes que foram rebootados na época. Os dois filmes dirigidos por Rob Zombie, assim como a versão de 2018 tem produção de Malek Akkad.

    A grande questão é que a lenda envolvendo o boogye man ou o bicho papão de Haddonfield parece ser muito maior que a vontade dos Akkad em tentar fazer dinheiro com o combalido sociopata de Illinois, ainda que até isso tenha sido freado, vide o crossover com Pinhead de Hellraiser que jamais ocorreu, uma falha positiva, visto a falta de qualidade de Freddy Vs. Jason e Alien Vs. Predador.

    As marcas registradas do personagem, como o uso de armas brancas entre facas, cutelos e machados foram utilizadas a exaustão, além de um sem número de modos de matar bem bobos.

    Recentemente, abriu-se um Mito 4, lançando outra linha temporal em que somente o filme seminal de Carpenter faz parte. Dirigido por David Gordon Green que também assinou o roteiro ao lado de Danny McBride e Jeff Bradley, o suspense é refeito de forma semelhante ao original com uma linguagem atualizada e ligada a paranoia. Ao menos algum cineasta parece ter entendido o que Myers significa e o ícone segue vive, mesmo tendo sido tão maltratado pelos roteiros, esfaqueado, alvejado, queimado e sobrevivendo sempre de maneira surpreendente de acordo com as conveniências dos roteiros.

    Contudo, mesmo nos momentos ruins pelos quais os roteiristas, produtores e diretores fizeram-no passar, Myers seguia forte com sua caracterização muda, incapaz de pronunciar qualquer palavra ou expressão, com o rosto sempre coberto por sua máscara – que aliás, se confundia com a sua própria pele, dada a intimidade do homem com o objeto – e também como o menino que se tornou ainda mais perturbado após matar sua irmã mais velha.

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  • Crítica | Sexta-feira 13 – Parte 3

    Crítica | Sexta-feira 13 – Parte 3

    Jason Voorhees é, indiscutivelmente, um dos personagens mais queridos dos filmes de terror. Entretanto, o motivo para isso pode ser um tanto difícil de entender. Se for comparado a outros ícones do horror moderno, como o diabólico Freddy Krueger ou o assustadoramente divertido Chucky, Jason é, na verdade, meio bobo. Não é sutil, não é inteligente, não é sarcástico, nem mesmo diabólico. Então, por que será que ele é tão assustador? Talvez as pistas para entendermos o medo e admiração que sentimos pelo personagem está na segunda sequência de sua franquia, Sexta-feira 13 – Parte 3.

    O filme, lançado em 1982, foi marcado por ser o primeiro em 3D da Paramount Pictures em quase trinta anos. De certa forma, o 3D alavancou a bilheteria do filme na época, inclusive derrubando o lugar de E.T. – O Extra-terrestre no fim de semana de estreia. Assistindo a ele, hoje, em home video, percebemos como esse 3D era gritante e às vezes sem sentido. Muitas coisas apontadas para a câmera – que vão desde um taco de beisebol até um globo ocular, passando por um baseado e um ioiô – com o simples intuito de impressionar o espectador, não acrescentam em nada à trama ou ao modo de contar a história. Ainda assim, parece mais honesto do que a maioria dos filmes picaretas convertidos ao 3D que vemos hoje em dia.

    A história começa no dia seguinte ao último filme, o que faz com que, tecnicamente, seja um “sábado 14”. Jason sobrevive e ataca uma loja local, ganhando novas roupas. Depois, somos apresentados a um novo grupo de jovens que estão à procura de diversão e vão passar uns dias no campo. Tal qual o filme anterior, todos são perseguidos e mortos por Jason, restando apenas uma garota ao final do filme (Chris Higgins, interpretada por Dana Kimmell). O que difere dos dois filmes anteriores é a forma mais elaborada com que as mortes são retratadas. Um dos rapazes é cortado ao meio enquanto andava “plantando bananeira”, em uma das cenas mais bizarras da película. Em outra cena, um rapaz tem a cabeça esmagada até os olhos saltarem das órbitas – embora hoje seja possível notar a cabeça falsa e o cabo que puxa os olhos, na época deve ter rendido um bom susto pra quem a assistiu em 3D.

    Entre as diferenças em relação ao filme anterior está a música de abertura, agora com uma pegada eletrônica para parecer mais moderna. Além disso, há a presença de uma gangue de motoqueiros punks, o que deixa o filme ainda mais datado. Mas o grande diferencial mesmo é a adoção da máscara de hóquei pelo assassino Jason – até então, ele usava um saco de pano na cabeça. Um dos rapazes é um loser estereotipado, infeliz com sua aparência e rejeitado pelos seus colegas, que extravasa seus sentimentos pregando peças nas pessoas ao seu redor. Em uma dessas “pegadinhas”, ele aparece usando a famosa máscara de hóquei, que Jason passa a utilizar depois de matá-lo. Não existe nenhuma explicação para isso, Jason apenas passa a usar a máscara e pronto!

    O duelo final acontece no celeiro, onde Jason é enforcado, mas sobrevive para ser morto, logo depois, com um golpe de machado na cabeça desferido por Chris. Realmente, essa é uma das cenas mais tensas e o clímax do filme. Ao final, tal qual a sobrevivente do primeiro filme, Chris foge de barco pelo lago e dorme até o amanhecer. Ao acordar, ela vê o assassino sem a máscara correndo em direção ao lago para atacá-la, quando do nada surge das águas… a mãe de Jason! Esta parte do filme é bastante confusa, pois logo em seguida vemos Chris com os policiais, o corpo de Jason no celeiro, ainda com a máscara e o machado na cabeça, deixando claro que foi uma alucinação. Mas então por que usar a mãe de Jason nessa cena se ela não apareceu durante o filme? E sua cabeça não estava separada do corpo no filme anterior? Seria essa cena apenas uma homenagem ao filme original? Não ficou claro o propósito, e o filme termina assim mesmo.

    Sexta-feira 13 – parte 3 é melhor que seus dois antecessores. O filme consegue criar bons momentos de tensão, nos dá personagens com quem podemos facilmente nos importar e é a gênese da máscara de hóquei mais famosa do mundo. Mas seu maior mérito talvez seja responder à pergunta do começo deste texto. Jason é assustador não por alguma qualidade marcante, mas por ser a encarnação da morte. Cada aparição do personagem, cada close-up na máscara, cada take de câmera em que ele aparece nos dá a certeza de que alguém vai morrer. Jason, neste filme, ainda não é um zumbi extremamente poderoso tal qual se tornou nos últimos filmes da franquia. Sua aparência é mais humana e não menos perturbadora. Um psicopata, uma criança fragilizada em um corpo de adulto, um assassino frio e sanguinário. Não há propósito algum em seus atos, e é isso que dá medo.

  • Crítica | Sexta-feira 13 – Parte 2

    Crítica | Sexta-feira 13 – Parte 2

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    Em 1981, o cinema ganha a continuação do slasher que havia feito certo sucesso no ano anterior. Sexta-feira 13 – Parte 2 começa como sequência direta dos eventos do filme original. Alguns meses após os eventos ocorridos no acampamento Crystal Lake, a única sobrevivente do massacre luta para ter uma vida normal e superar o trauma pelo qual passou. Essa sequência de abertura traz uma série de flashbacks recontando toda a história para quem não assistiu ao primeiro filme, e é a mais longa introdução de toda a franquia, com quinze minutos. Pela primeira vez, Jason Vorhees (interpretado por Warrington Gillette) é o assassino da saga, mas ainda não usa a icônica máscara de hóquei. Jason não parece, a princípio, um morto-vivo como nos filmes mais recentes da série. Embora sua cabeça esteja coberta com um saco de pano, vemos frequentemente suas mãos, que não estão em decomposição e nem nos dão nenhuma dica de que ele seja um ser sobrenatural. Pela aparência de sua roupa (camisa xadrez, macacão jeans, botas), Jason surge com um visual de “caipira”. De alguma forma, ele encontra e mata a sobrevivente do filme anterior, que tinha cortado a cabeça de sua mãe, Pamela Vorhees. Após essa longa introdução, o filme começa de verdade.

    O filme se passa cinco anos depois do massacre de Crystal Lake, que ficou conhecido como “Acampamento de Sangue” (ou Camp Blood, no original). Apesar do título, nada indica que a história se passe em uma sexta-feira 13. Mais uma vez, um grupo de jovens se reúne para começar seu treinamento como monitores num acampamento de verão. A fórmula é a mesma do filme anterior, mas dessa vez temos um background se desenvolvendo desde o início. As pessoas falam sobre o massacre, conhecem a trágica história do garoto Jason e sua morte no lago, bem como a vingança de sua mãe. Os personagens desenvolvem até algumas teorias sobre Jason e contam histórias assustadoras sobre ele. Em uma dessas suposições, uma das personagens chega a sugerir que o garoto não morreu no lago e que cresceu sozinho na floresta se alimentando de ódio por tudo e por todos. Essa fala é bastante elucidativa de como, a princípio, o assassino não seria um monstro sobrenatural, mas sim um psicopata deformado.

    A história se desenvolve numa colônia de férias vizinha a Crystal Lake, onde Paul Holt (John Furey) treina os novos monitores. A princípio, não sabemos quem será o protagonista do filme, o que é uma sacada inteligente que se espalhou pela série e tem sua origem no filme Psicose, de Alfred Hitchcock, quando a personagem principal é assassinada logo no começo da película. Gina Field (Amy Steel) aparenta ser uma garota fútil, mas, surpreendentemente, é ela quem termina o filme ainda respirando. Os primeiros personagens a quem somos apresentados são os primeiros a morrer quando o banho de sangue começa. Isso é, de certa forma, uma boa característica do filme, pois ao fazer com nos frustremos com essas mortes, o diretor já deixa claro o ritmo do filme. Ninguém está a salvo.

    Com cenas de morte mais elaboradas, a trama se desenvolve em torno dos assassinatos, conforme vamos descobrindo mais sobre Jason. Em uma cena, descobrimos que ele mora em um barraco improvisado com restos de madeira e materiais de construção, onde mantém um altar adornado com velas acesas ao redor da cabeça de sua mãe. Jason ganha um pouco de profundidade aqui, pois o motivo de sua matança se torna mais claro. O homem com a mentalidade de uma criança traumatizada, que se recusa a aceitar a morte da mãe e faz aquilo que acha que a agradaria. Seus assassinatos são uma espécie de sacrifício em honra à sua sagrada mãe, única pessoa que se importava com ele. Tanto que até mesmo a trilha sonora reproduz essa devoção: o refrão “ki-ki-ki-ki, ma-ma-ma-ma”, assustadoramente sussurrado durante os momentos mais tensos, origina-se na frase “kill her, mommy” (mate-a, mamãe).

    Sua confusão mental é percebida por Gina, que, ao ser encurralada, ao fim do filme, no barraco onde está a cabeça da Sra. Vorhees, percebe a devoção de Jason à sua mãe. Percebendo que ele guarda ainda o suéter de lã da falecida, veste-se com ele, prende o cabelo e se passa por ela, deixando o assassino ainda mais confuso. Jason acata  as ordens de quem ele pensa ser sua mãe, demonstra-se dócil e subserviente, até avistar a verdadeira cabeça sobre a mesa. A fúria assassina volta e Jason ataca, levando aos momentos finais do filme.

    A morte é o motivo do medo nesse subgênero de filmes de terror. Não é a crença em seres do além, não é um terror psicológico e intimista, não é o diabo ou outro ser religioso/mitológico. É a morte, pura, simples e sem sentido, que pode chegar de qualquer lugar e acontecer com qualquer um. Mas a morte nesse filme tem suas vítimas favoritas: jovens que fazem sexo, que bebem, que usam drogas. A morte vem associada a um senso de moral conservadora, que julga e executa aqueles que fazem algo considerado “errado”. E temos em Jason o arauto da morte, uma espécie de Ceifador Sinistro do século XX, punindo aqueles que considera pecadores.

    Sexta-feira 13 – Parte 2 é, para todos os efeitos, o verdadeiro primeiro capítulo da franquia e aproveita-se do sucesso inesperado do primeiro filme para criar um dos mais assustadores e memoráveis filmes de terror de todos os tempos.