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  • Review | Scream – 1ª Temporada

    Review | Scream – 1ª Temporada

    Scream - poster - primeira temporada - TV Series

    Na última década, o cinema, as séries e a cultura em geral viveram uma época declarada na qual observar tempos anteriores faz do revival uma fonte de sucesso. Por um lado, é sinal significativo de que a criatividade está em baixa, necessitando de produtos reconstruídos para atrair o público com produtos já conhecidos. Por outro, quando tais argumentos são bem utilizados, há certo alívio por, ao menos, a continuidade da qualidade.

    O passado iluminado e elogiado tem sido base para muitos argumentos. Na literatura, Stephen King retomou o universo de O Iluminado em Doutor Sono e, recentemente, editores descobriram um manuscrito inédito de Harper Lee, anterior à história de O Sol é Para Todos. Nas séries, Kiefer Sutherland retornou para meia temporada em 24 Horas; Heroes ganhou uma espécie de reboot contemporâneo, além de outras séries, anteriores a retomada, que voltarão em breve, como Twin Peaks e Arquivo X. Exemplos que demonstram que o futuro está no passado.

    A retomada de certos argumentos se baseia em seu sólido sucesso anterior, caso do trabalho do diretor Wes Craven nos cinemas a favor do Terror. Uma carreira baseada em grandes marcos cinematográficos iniciados no fim da década de 70 com Quadrilha dos Sádicos e, em seguida, com A Hora do Pesadelo, seguida de reinvenções como em 1996 e o Pânico. A narrativa do assassino Ghostface, que originou mais três filmes, sendo um deles uma releitura contemporânea no conceito de revival, transformou o gênero do terror ao inserir humor de maneira explícita e uma metalinguagem como base de desenvolvimento de sua história. O sucesso da quadrilogia Pânico foi definitivo e talvez após este marco nenhum slasher filme tenha alcançado sucesso posterior devido a uma fórmula saturada simultaneamente a partir do momento em que o found footage, aliado a crianças japonesas representando o terror psicológico e o estilo sádico conhecido como tortune porn, entrou em voga.

    Lançado pelo canal americano da MTV, a série Pânico surge com base no sucesso dos filmes e semeando a vertente do revival, provando que argumentos reciclados podem ser mais eficientes que uma série original. O conceito e a produção executiva de Craven estão presentes, mantendo uma assinatura diante de um novo produto, mesmo em um novo universo. Apresentada em 10 episódios, a série consegue ser fiel a sua tradição e respeitar o conceito dos filmes slasher, mesmo perventendo-o em uma série de longa duração em relação aos breve filmes de terror

    Scream - Panico - série

    Fiel aos tempos presentes, o primeiro conflito da trama é um vídeo filmado às escondidas que surge na rede mostrando a adolescente Audrey Jensen beijando outra garota, fazendo do cyberbulling uma constante na escola de Lakeside. A escolha de adolescentes como personagens centrais é perfeita para simular um pequeno microcosmo de uma sociedade de tipos diversos que agem com um misto de inocência e malícia, ajudando a estabelecer a incredulidade dos fatos e o universo do terror slasher em que nem sempre a inteligência e o medo iminente são um fator presente para seus personagens.

    Neste aspecto, o gênero sempre produziu um universo à parte, e mesmo que a morte esteja à espreita, a história continua sem nenhum trauma profundo, como se as personagens estivessem tão acostumadas com a violência que não mais se importassem com ela de maneira eficiente. Mesmo que a duração de uma série aparente corromper a urgência de uma trama de um assassino serial mascarado, a metalinguagem surge para subverter esse conceito logo no primeiro capítulo. Diante de uma tradição gigantesca de filmes com assassinos, é interessante que até seus personagens saibam como naturalmente se desenvolve tais histórias e, assim, entreguem de antemão ao público o motivo pelos quais a série deve ser considerada. Através da personagem de Noah Foster, o fanático por terror da vez, reconhecemos como a história é estruturada para que cada um conquiste o público, para lamentarmos suas futuras mortes e torcemos pelos heróis com mais afinidade.

    O argumento da série tem semelhança com a estrutura dos filmes ao utilizar um acontecimento passado como um marco negativo na cidade. Um massacre ocorrido no baile de formatura envolvendo um enlouquecido garoto deformado. É este o ponto de partida para a geração futura viver sob o peso de uma série de assassinatos. Quando uma nova morte surge, é este passado que vem à tona e deve ser redescoberto e reescrito para que as verdadeiras intenções – e o próprio assassino – se revelem.

    Mesmo na frivolidade de uma história focada em adolescentes com atores que não parecem cientes do próprio drama – uma dúvida que a série nos traz entre uma interpretação mal executada ou o universo incrédulo dos filmes slasher –, a condução do roteiro é envolvente e apoia-se na tradição encantadora e mortal do gênero. Diferentemente dos assassinos da década de 1980, que surgiam como uma ameaça iminente a todo momento, o novo Ghostface, de máscara reformulada, porém com a mesma voz ameaçadora, mantém um contato direto com a rainha do grito desta versão. Graças à evolução tecnológica, o assassino não só liga para a vítima como envia e recebe mensagens em momentos chave da narrativa. Um dinamismo que segura o prolongamento da tensão em dez episódios que mantém o suspense focado no assassinato, mas que também não deixa de explorar outros segredos da cidade. Os clichês se apresentam como de costume e a metalinguagem trazida pela série Pânico transforma-os em riso como se tais personagens soubessem que a ficção e a realidade são um misto de repetições imutáveis.

    O sucesso inesperado desta primeira temporada foi suficiente para o anúncio do segundo ano, no ano que vem. Se seguir a tradição cinematográfica, a paródia se tornará ainda mais presente e fará dos assassinatos um momento para estabelecer uma crítica entre adolescente frívolos, verdades iminentes e outros aspectos deste universo próprio do terror, em que mascarados com suas facas afiadas não resistem a lindas e inocentes mocinhas gritando enlouquecidamente.

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  • Crítica | Flores Raras

    Crítica | Flores Raras

    flores raras

    “Poucas mulheres escrevem boa poesia. Somente quatro delas se equiparam aos nossos melhores homens. Emily Dickinson, Marianne Moore, Elizabeth Bishop e Sylvia Plath.”
    Robert Lowell

    Baseado no livro Flores Raras e Banalíssimas, de Carmen Lucia de Oliveira, o filme dirigido por Bruno Barreto aborda o relacionamento entre a ganhadora do prêmio Pulitzer de 1956, Elizabeth Bishop (Miranda Otto), e a “arquiteta” carioca responsável pela idealização e construção do Parque do Flamengo, Lota de Macedo Soares (Glória Pires).

    Inicialmente, o roteiro parece focado no relacionamento entre as duas e até começa bem, enfatizando suas personalidades opostas: Lota, extrovertida, segura de si e confiante; Elizabeth, introvertida, retraída e tímida. Enquanto a primeira mostra orgulhosamente sua casa recém-construída, gabando-se de ter idealizado tudo sozinha; a segunda sente-se quase envergonhada quando um dos convidados, Carlos Lacerda (Marcelo Airoldi), declama um dos poemas que ela recusa terminar, na tentativa frustrada de fazê-la sentir-se mais à vontade.

    Antes da chegada de Elizabeth, Lota vivia com Mary Morse (Tracy Middendorf) e com a mesma rapidez que o roteiro apresenta esse relacionamento, forma-se o triângulo amoroso entre elas. Com essa mesma rapidez ele é desfeito – ou quase desfeito – pela pragmática Lota. A superficialidade dessa abordagem tira a credibilidade dessas relações. É difícil para o espectador comprar a ideia de que o grau de envolvimento entre Lota e Elizabeth justificaria sua separação de Mary. Aliás, essa veracidade é comprometida também pela forma com que o amor entre mulheres é tratado. Com exceção do sarcasmo com que o pai de Lota se refere a ela, o excesso de naturalidade com que se encara a homossexualidade é pouco verossímil.

    Já que o relacionamento não é bem explorado, seria de se esperar que o roteiro se aprofundasse mais no momento político do Brasil na época. Porém isso também não acontece. A amizade de Lota com Carlos Lacerda e seus correligionários e seu apoio ao golpe não passam de pano de fundo. Acompanhamos Lota dando vida a sua empreitada de construir o Parque do Flamengo, enquanto o país é abalado pelo golpe e enquanto seu relacionamento com Elizabeth começa a se deteriorar, tudo en passant, sem aprofundamentos.

    Apesar de as atrizes personificarem muito bem as diferenças de personalidade entre as personagens, falta paixão no relacionamento entre elas. Vale notar que Glória Pires conseguiu se mostrar à vontade num papel difícil, tanto pela necessidade de atuar em inglês e ainda assim parecer natural, quanto pelas cenas de teor homossexual. Mas, mesmo estando muito bem, é Miranda Otto que domina a tela sempre que contracenam. A atriz encontrou a medida certa entre a genialidade e a sensibilidade da poeta sem cair no clichê e sem ser caricata

    A fotografia é beneficiada pela natureza exuberante de Petrópolis e os enquadramentos enfatizam as divisões e oposições que ocorrem na história: o contraste entre a cidade e a serra, a separação gerada pelo idioma – inglês versus português -, a oposição entre política e arte, a divisão de Lota entre a paixão por Bishop e a segurança da amizade de Mary.

    Infelizmente, o roteiro não se sustenta e os pontos positivos não bastam para fazer de Flores Raras um filme memorável. Vale por apresentar ao público duas personalidades interessantes, apesar de retratadas superficialmente, e por incutir no espectador a vontade de mergulhar na leitura tanto do livro de Carmen Oliveira, para saber mais a respeito do romance, quanto dos livros de Bishop, principalmente o que foi escrito durante sua estadia aqui, North and South.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.