Autor: Dan Cruz

  • Resenha | Batman/Flash: O Bóton

    Resenha | Batman/Flash: O Bóton

    Preparando terreno para o lançamento de Doomsday Clock, o especial Batman/Flash: O Bóton serve como um “capítulo do meio” para a saga da Editora das Lendas que se iniciou em Universo DC: Renascimento. O crossover entre os dois heróis foi publicado nos Estados Unidos em suas respectivas séries mensais e reunidas depois em um volume único, publicado no Brasil em capa dura pela Panini.

    Escrita por Tom King e Joshua Williamson, a história retoma partes importantes do evento Ponto de Ignição, em que o Flash altera toda a realidade ao tentar salvar sua mãe voltando no tempo. Essa transformação na linha do tempo do Universo DC deu origem ao reboot conhecido editorialmente como Novos 52, e nessa edição vemos que existem resquícios de outras linhas da editora se mesclando à realidade dos personagens. O bóton do título já havia aparecido no final do especial Renascimento, e aqui volta a ter importância, pois mostra que o universo criado por Alan Moore para abrigar a saga Watchmen está se misturando com o das séries mensais de super-heróis.

    A história começa com o vilão Flash Reverso invadindo a Batcaverna em uma luta impressionante com o Batman, na qual cada segundo conta. A invasão ocorreu porque, ao investigar o bóton sorridente, Bruce Wayne o deixou na bancada próximo a outro objeto bastante específico: a máscara do Pirata Psíquico, personagem que ainda se lembrava dos eventos da Crise nas Infinitas Terras (reboot da editora nos anos 1980). Ao ficarem lado a lado, os dois objetos começaram a emanar energia que atraiu o vilão do Flash pra caverna.

    A luta com o Flash Reverso culmina com a revelação da existência uma entidade maior no universo – ou um deus, como o vilão o descreve – e leva a uma investigação sobre  o que realmente está acontecendo. Para isso, Batman e Flash utilizam a Esteira Cósmica para viajar através do Multiverso – e de linhas temporais diferentes – se encontrando com realidades diversas, entre elas a surgida na saga Ponto de Ignição. A dinâmica entre os personagens nessa parte da história é bem interessante, pois mostra um relacionamento entre Bruce e Thomas Wayne que jamais poderia ter acontecido.

    Da mesma forma que Wally West surge da Força da Aceleração em Renascimento, vemos aqui o ressurgimento de outro famoso velocista da DC, que desperta ainda mais questões a serem resolvidas num futuro próximo. Isso porque a história não se conclui de fato, deixando muito a ser desenvolvido na saga vindoura. O Bóton é um interlúdio para a saga que a editora está planejando, e um pontapé inicial para grandes mudanças que virão com O Relógio do Juízo Final.

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  • Resenha | A Nova História e Glória da Dinastia Pato

    Resenha | A Nova História e Glória da Dinastia Pato

    Pouco antes de perder os direitos de publicação dos quadrinhos Disney no Brasil, a Editora Abril lançou o primeiro e único volume de uma série que seria trimestral mas acabou morrendo na praia: tratava-se de Disney Saga, apresentando as seis partes da inédita minissérie intitulada A Nova História e Glória da Dinastia Pato. Continuação da saga italiana semi-homônima dos anos 1970 que mostrava os antepassados do Tio Patinhas, a nova história apresenta seus futuros descendentes.

    Na saga original, Patinhas e seus sobrinhos descobrem um baú com moedas mágicas pertencentes aos seus antepassados e cunhadas em diferentes eras, que ofereciam aos patos um vislumbre do passado ao serem esfregadas com os dedos. Essa premissa se mantém na nova história, porém com o misterioso surgimento de novas e estranhas moedas vindas do futuro. Assim, cada capítulo da série mostra um salto de cem anos pra frente, e acompanhamos o surgimento de novas tecnologias, bem como o avanço da sociedade rumo à colonização do espaço sideral. A cada novo século o valor do dinheiro vai mudando de importância, bem como a forma de se ocupar os espaços – seja na terra, no mar ou por todo o sistema solar.

    A qualidade dos desenhos de Claudio Sciarrone nos salta aos olhos logo de cara. Não temos aqui um traço clássico para os personagens, como os de Don Rosa ou do próprio Carl Barks, mas também não é caricato ao extremo como muitas das produções italianas. Embora em alguns momentos pareça estilizado, não chega a ser desproporcional e a leveza da arte-final combinada com as cores e o enquadramento das cenas dá uma dinâmica ao roteiro invejável a outras produções contemporâneas. Infelizmente, não podemos dizer o mesmo do roteiro em si. Os personagens que deveriam ser descendentes do Tio Patinhas, Pato Donald e dos trigêmeos Huguinho, Zezinho e Luisinho acabam sendo nada mais do que os próprios personagens com roupas diferentes. Não existe nenhum desenvolvimento das personalidades deles, de forma que lá pela metade da edição o leitor percebe ser inútil tentar aprender seus nomes – basta chamá-los pelos nomes clássicos mesmo e está resolvido!

    É evidente que os autores italianos tenham maior liberdade criativa com os personagens Disney, mas chega a incomodar a falta de uma árvore genealógica coerente (como a de Don Rosa). Isso já era sentido na saga original, mas na nova história fica muito estranho. É impossível não se questionar sobre a linhagem de cada um. Como exemplo, podemos observar a primeira história, que se passa no ano 2118. MacPat é o “bisneto” do Tio Patinhas (embora mantenha todas as características do próprio), mas não sabemos mais nada dele. O Tio Patinhas teve filhos então? Com quem? Foi na velhice? O mesmo questionamento vale pros sobrinhos, mas fica ainda mais estranho quando pensamos em Huguinho, Zezinho e Luisinho: os três patinhos nas eras futuras são trigêmeos também ou cada um descende de um dos irmãos? Não sabemos. Não faz diferença, já que todos são, basicamente, os mesmos personagens.

    Lá pelo meio da história temos uma participação especial inusitada do Ultracomissário Mick-Maus que, bem, é basicamente o Mickey mesmo. É interessante vê-lo na história, pois geralmente os universo dos patos não se mistura com o dos ratos, mas aqui o crossover ocorre de forma bastante natural.

    Quanto aos vilões da história, temos a participação dos Metralhas e do Bafo de Onça (como chefe do Mickey), mas o principal é mesmo o Patacôncio, em suas diferentes encarnações. O desfecho da saga retoma algo do começo que, sinceramente, pode passar batido ao leitor casual menos atento (vale até a pena retomar as primeiras páginas para compreender melhor), pois se desenvolveu de forma corrida e pouco original. Ao terminar a leitura, fica aquela sensação de que poderia ter sido melhor, mas os desenhos, cores e enquadramentos são tão agradáveis aos olhos que uma crítica mais pesada pode até parecer injusta. Deve ser a tal da “Magia Disney”, que carrega uma grande carga de nostalgia e permite que relevemos alguns erros em troca da experiência de uma leitura leve e descompromissada.

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  • Resenha | Universo DC: Renascimento

    Resenha | Universo DC: Renascimento

    Após o fim da fase conhecida como Novos 52 e uma breve passagem como DC & Você, a Editora das Lendas resolveu passar um pano em suas publicações, porém sem a obrigatoriedade de um novo reboot. Assim, teve início uma nova fase editorial que prometia trazer de volta toda a grandeza de seus mais icônicos personagens, e seu pontapé inicial deu-se com a publicação do especial Universo DC: Renascimento. Assim, todas as publicações posteriores carregariam o selo “Renascimento” nas capas, e deveriam acertar os ponteiros da bagunçada cronologia da editora.

    O especial em si não traz exatamente uma história, mas apresenta os rumos que o Universo DC iria tomar a partir desse ponto. A história começa com uma clara referência à clássica graphic novel de Alan Moore e Dave Gibbons, Watchmen, que até então nunca havia sido parte oficial do Universo DC (coisa que, alguns anos depois do lançamento desse especial, já sabemos que se alterou). Temos uma narração em off de uma figura misteriosa que parece observar de fora os acontecimentos recentes, e vemos o Batman em sua soturna caverna tentando desvendar o mistério que lhe fora parcialmente revelado em uma saga anterior, a ideia de que existem três Coringas no mundo. Logo descobrimos que o observador (e narrador) misterioso é ninguém menos que Wally West, o terceiro Flash, em sua clássica versão anterior ao reboot. Wally parece estar preso no tecido entre as realidades, e ao se revelar ao Homem-Morcego, começa a desaparecer na Força da Aceleração, pois Batman não se lembra dele.

    Vemos então uma recapitulação da origem de Wally West, com direito a lembranças da primeira formação da Turma Titã e da morte de Barry Allen em Crise nas Infinitas Terras, além de boa parte da aclamada (e negligenciada pela editora) fase do roteirista Mark Waid pelo título do personagem. Wally então percebe toda a mudança ocorrida no evento Ponto de Ignição (Flashpoint), que deu origem ao reboot do universo, e sente que dez anos foram apagados da história.

    A história começa então a nos mostrar pequenos eventos acontecendo com alguns personagens-chave, como Jonny Trovoada, Satúrnia, Átomo e seu pupilo, além de mostrar Ted Kord vivo e sendo mentor de Jaime Reiyes como Besouro Azul. Ficam também estabelecidos conceitos como a sexualidade de Aqualad, a idade do Robin (13 anos), e o início do relacionamento amoroso entre Arqueiro Verde e Canário Negro. Vemos também a personagem Pandora (que permeava toda a fase dos Novos 52) ser desintegrada num beco por uma figura misteriosa. Wally chega à conclusão que, além do tempo, o amor também foi roubado desse universo e sai à procura de Linda Parker, sua esposa na linha temporal anterior. Após muitas idas e vindas, Wally consegue fazer com Barry Allen se lembre dele, o retirando da Força da Aceleração segundos antes de seu completo desaparecimento.

    A história deixa então várias pistas do que viria a acontecer na editora nos anos vindouros. Batman encontra o bótom do Comediante (de Watchmen) na parede da Batcaverna após reler a carta de Thomas Wayne, ou melhor, de sua versão do Flashpoint. Isso e outros acontecimentos teriam repercussão mais pra frente, e o final da edição reproduzindo o diálogo entre o Dr. Manhatan e Ozzymandias preparam o caminho para a saga que possivelmente vai redefinir novamente a editora, a vindoura Doomsday Clock.

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  • Crítica | Sai de Baixo: O Filme

    Crítica | Sai de Baixo: O Filme

    Sabe aquela piada velha contada por um tio bêbado num churrasco de domingo que teria sido engraçada vinte anos atrás, mas hoje em dia se torna apenas algo inapropriado e desconfortante? Pois é isso que Sai de Baixo: O Filme se parece. Um produto fora de sua época, tentando um suspiro de relevância após um tempo que já há muito se passou. O longa traz de volta os personagens centrais da sitcom noventista, adiciona alguns novos e omite outros importantes (ah, Cláudia Jimenez, como fez falta sua Edileuza!), tendo como personagem principal o trambiqueiro Caco Antibes (Miguel Falabella, confortável como sempre no papel).

    Após uma temporada na cadeia, Caco retorna ao Arouche para descobrir que sua família está ainda mais falida do que nunca, morando escondidos no velho apartamento de Vavá (Luís Gustavo, que por ordens médicas não pôde participar mais do que em uma ponta no filme) – que foi aberto à visitação pública para venda – e são obrigados a dividir o teto com o porteiro Ribamar (Tom Cavalcanti, ainda mais caricato que na série). Para conseguir melhorar sua situação financeira, tanto Caco como Magda (Marisa Orth) acabam aceitando uma missão secreta de contrabando de pedras preciosas para fora da fronteira do Brasil.

    O filme então descamba para uma road trip sem sentido,na qual uns poucos momentos podem arrancar um sorrisinho do espectador – em especial as quebras da quarta parede, quando Caco revela alguns problemas dos bastidores das filmagens. As interpretações estereotipadas e caricatas ao extremo de Tom Cavalcanti, principalmente ao retratar a tia nordestina de Ribamar, soam anacrônicas e sem graça. Por incrível que pareça, a única coisa antiga que continua atual é o horror de Caco Antibes a pobres e seu discurso altamente elitista, um reflexo de uma classe média falida que come ovo frito e arrota caviar, parecendo estar alheia de sua própria realidade sócio-econômica. Caco é trapaceiro, egoísta e hipócrita ao extremo, apresentando-se sempre como baluarte da honestidade, um “cidadão de bem” preconceituoso e rasteiro.

    Dos novos personagens, destaca-se a prima Angelita, interpretada brilhantemente por Lúcio Mauro Filho – que faz também o papel de seu irmão gêmeo, e Caquinho, que já foi um boneco animatrônico no palco e no longa é interpretado por Rafael Canedo. Já Cibalena, personagem de Cacau Protásio, não é nada lá muito original e apenas cobre o papel que seria de Edileuza.

    Muitas piadas se perdem para quem não era assíduo telespectador da série original, como alguns bordões e piadas internas – principalmente sobre o laquê de cabelo de Aracy Balabanian. No resto, a trama se perde em cenas sem sentido e tem um desfecho clichê , mas que ao menos nos dá o gosto de ver a película chegar ao fim. No final das contas, o longa é uma piada velha, que talvez fosse melhor não ter sido recontada.

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  • Resenha | Lendas Disney n°01 – Superpato Original

    Resenha | Lendas Disney n°01 – Superpato Original

    Em janeiro de 2018, a Editora Abril lançou o que seria uma nova série dedicada aos maiores personagens dos quadrinhos Disney. Com capa cartonada e formato diferenciado, a série não chegou sequer ao seu segundo número – que seria dedicado aos 70 anos do Ganso Gastão – graças à crise editorial e perda dos direitos de publicação dos quadrinhos Disney no Brasil. Contudo, o primeiro e único volume da série mostra que a premissa seria bem interessante se não fosse interrompida por questões contratuais da empresa. Lendas Disney n°01 – Superpato Original apresentou as três primeiras histórias do personagem, sem cortes e sem censura, reunidas em uma só edição.

    Antes de falar sobre as histórias em si, cabe aqui uma contextualização histórica. As histórias em quadrinhos Disney são produzidas em diversos países, como Itália, Dinamarca, Holanda e Brasil (embora hoje não exista mais produção nacional, esta foi muito forte nos anos 1980), e o Superpato é uma criação da Disney italiana, fruto de uma ideia da editora Elisa Penna e do roteiro de Guido Martina, com desenhos de Giovan Battista Carpi em 1969. Em terras brasileiras, a publicação do personagem se deu pela primeira vez em 1973, porém sofreu diversos cortes e alterações, tanto na arte quanto nos roteiros, tendo páginas suprimidas e final totalmente refeito no Brasil. Isso se deu por conta da forte censura da ditadura militar, na época sob o comando do general Emílio Garrastazu Médici. Nas histórias publicadas na íntegra nessa edição, vemos um Donald bastante diferente do que conhecemos, com caráter mais do que duvidoso, infringindo a lei e agredindo policiais – coisa que jamais passaria pelos censores dos anos de chumbo no Brasil. Quem leu essas histórias na época, no saudoso Almanaque Disney, pode entender nesse volume o motivo de tantas incongruências entre elas. Aqui, vemos em ordem cronológica e com um certo respeito à linha narrativa, tendo um background bem estabelecido para o alter ego do Pato Donald.

    A primeira história se chama Superpato, o diabólico vingador. Nela vemos a origem do herói – opa! Herói não! Em seus primórdios, Superpato nada mais era do que um fora-da-lei, uma persona criada por Donald para se vingar dos desmandos de seu tio muquirana (que nas histórias italianas é ainda mais sovina e até mesmo cruel do que o Tio Patinhas retratado por Barks e Rosa). Cansado de ser humilhado, Donald se apropria indevidamente de uma vila nas colinas com um casarão abandonado (que deveria ter sido doada a seu primo Gastão). Ali ele conhece a história de Fantomius, um fora-da-lei do passado e usa sua vestimenta e apetrechos para se vingar do seu tio pão-duro, roubando-lhe o colchão recheado de dinheiro enquanto o velho pato dormia. O interessante nessa história de origem é ver o quanto Martina retrata Donald como mau-caráter e aproveitador, incriminando pessoas inocentes apenas para atingir seus objetivos mesquinhos, muito diferente do personagem que conhecemos.

    Em A fabulosa noite do Superpato, também de Martina mas com desenhos de Romano Scarpa e arte-final de Giorgio Cavazzano, vemos o desenrolar dos eventos ocorridos na história anterior. É interessante notar uma certa preocupação com fatos estabelecidos anteriormente, principalmente o destino da Vila Rosa no desfecho da história anterior. Donald continua obcecado por vingança, e está disposto até mesmo a roubar todo o dinheiro arrecadado em um baile filantrópico para atingir seus objetivos. Merece destaque a participação do Professor Pardal, que não só prepara um arsenal e um bunker para o vingador mascarado como também cria um álibi perfeito para si próprio ao desenvolver o caramelo cancelador de memórias.

    O museu de cera é a terceira e última história da edição, produzida pelo mesmo trio da anterior, e continuamos vendo o Superpato como um bandido, porém seu desfecho é um pouquinho mais altruísta do que nas outras duas. Chega a ser irritante ver a hipocrisia de Donald quando ele se indispõe com quem desconfia de que ele seja o Superpato, chegando até mesmo a agredir seus sobrinhos fisicamente por simplesmente estarem certos. Dessa vez, inconformado por ver seu tio se apropriar de uma ideia sua, o herói rouba o museu de cera do milionário. Sem dúvida alguma Donald é um criminoso nessas HQs, mas ao menos em seu desfecho o roteiro começa a sinalizar uma mudança no status quo do personagem, que de tanto sucesso passou a ser realmente um super-heróis nas histórias vindouras.

    Superpato Original nos apresenta um personagem totalmente diferente daquele que conhecemos. Inicialmente uma paródia de um personagem famoso na Itália (Diabolik, de onde vem o nome original italiano Paperinik), ganhou público e crítica, mudou seu conceito, teve reboot e séries mensais dignas de heróis da Marvel ou DC e conquistou gerações. Uma pena que Lendas Disney tenha sido interrompida tão precocemente em sua primeira edição.

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  • Resenha | Batsuman: Ano Um (e dois também)

    Resenha | Batsuman: Ano Um (e dois também)

    Paródias de super-heróis não são uma novidade, e vemos aos montes por aí. Mas o que faz Batsuman: Ano Um (e dois também) se destacar dentre as demais é a forma como foi concebida e finalizada pelo seu autor Thiago Yoshiharu Itice, no estúdio Lobo Limão. Originalmente, Batsuman era uma piada nas aulas de japonês do então adolescente autor, que rabiscava tirinhas no seu caderno ao fazer um trocadilho com o nome do Cavaleiro das Trevas e a palavra nipônica para “algo que está errado”. Desde então, Yoshi Itice não parou de desenhar essa brincadeira que acabou se tornando uma série de web-tirinhas em 2010, no site do estúdio, e quatro anos depois ganhou uma edição impressa através de financiamento coletivo pelo Catarse. Mas isso nunca seria possível se não fosse a qualidade do material e a genialidade por trás de piadas aparentemente simples, que brincam com todo o universo do Batman sem poupar ninguém.

    Batsuman é nada mais nada menos que “um Batman errado”. Ele não dá trégua para o crime e espanca suspeitos pelas ruas – mesmo sem prova alguma – o que trás mais confusões do que ajuda para a polícia. Ao mesmo tempo, se der na telha, o vigilante mascarado abandona qualquer atividade para curtir uma viagem com a nova estagiária ou apenas ficar sentado vendo televisão. Sim, ele é instável, e essa volatilidade é justamente o que o torna interessante. Se num momento é o espancador de possíveis vilões, no outro resolve se tornar um herói “politicamente correto”, no outro deixa seu parceiro Robin à beira da morte por pura preguiça. Nada é certeza na série, nem mesmo se o herói permanecerá vivo até o fim!

    A galeria de coadjuvantes do Batman se faz presente sem que os personagens tenham seus nomes alterados (como o do protagonista). Vemos o comissário Gordon, sua filha, o Coringa, o Charada, o fiel mordomo James (ou melhor, Alfred, em uma sacada hilária) e até o Bat-cão. Nada é sagrado e tudo pode virar motivo de chacota nesse universo, incluindo o título da revista, que parodia uma das mais influentes HQs de todos os tempos. O material extra conta com os nomes de todos os apoiadores da obra, esboços, um histórico da criação do personagem e arte dos pôsteres produzidos para a campanha de financiamento, que satirizam os mais clássicos momentos do Cruzado Encapuzado.

    Batsuman: Ano Um (e dois também) é uma HQ divertida e despretensiosa, que garante boas risadas e instiga a curiosidade de saber um pouco mais sobre o universo desse heróis às avessas.

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  • Crítica | Christopher Robin: Um Reencontro Inesquecível

    Crítica | Christopher Robin: Um Reencontro Inesquecível

    Não é de agora que  a Disney resolveu fazer remakes ou releituras de suas obras clássicas com atores reais. Nos anos 90, tivemos 101 Dálmatas e um filme obscuro de O Livro da Selva, do qual ninguém se lembra (nem a Disney faz questão). Mas desde o lançamento de Malévola, o estúdio do camundongo tem se empenhado para trazer versões realistas de seus personagens, seja na forma de uma refilmagem quase quadro a quadro (como A Bela e a Fera), seja em reinterpretações (como Alice Através do Espelho). Christopher Robin: Um Reencontro Inesquecível entra nessa segunda categoria. O filme do diretor Marc Foster não é sobre as aventuras do Ursinho Pooh e sua turma no Bosque dos Cem Acres, tampouco uma cinebiografia do verdadeiro Christopher Robin (filho do autor A. A. Miles, criador dos personagens). O que vemos na tela é uma história sobre amadurecimento e as preocupações da vida adulta do personagem-título, forçado a deixar sua infância cedo demais e incapaz de enxergar um mundo mais feliz ao seu redor, em consequência de seus traumas e contexto histórico das grandes guerras do início do século XX.

    No início somos apresentados ao “Menino Cristóvão” (ou “Paulo Roberto”, em dublagens mais antigas) que já conhecemos de produções anteriores da Disney. Christopher Robin (Ewan McGregor, na versão adulta) vive feliz em suas brincadeiras com seus bichinhos de pelúcia nos arredores do condado de Sussex, Inglaterra, quando precisa se despedir dos brinquedos para estudar em um colégio interno. O clima de melancolia já começa a se desdobrar a partir de então, quando acompanhamos o crescimento do garoto e sua difícil vida que segue, com a perda do pai e os horrores da guerra. Os primeiros 12 minutos do longa já nos mostra que o garoto imaginativo de então não seria mais o mesmo ao encarar a dura realidade da vida.

    Já como adulto, as preocupações com o trabalho o afastam de sua vida familiar. A relação com sua esposa e filha (que nasceu enquanto ele estava na guerra) é bastante fria, e ao deixar de passar um fim de semana na casa de campo com elas para resolver problemas do trabalho, seu antigo urso de pelúcia surge para lembrá-lo de uma vida mais amena e feliz. Não existe nenhuma explicação para o fato de Pooh ser um ursinho de pelúcia falante, ou de como se chega ao mundo bucólico do Bosque dos Cem Acres, e isso não é um defeito do filme. Pooh apenas aparece, e isso faz com que Christopher reviva momentos de sua infância com Leitão, Tigrão, Coelho, Ió, Corujão, Dona Can e Guru, reencontrando a criança perdida dentro de si e criando novos laços com sua esposa e filha mais tarde.

    A produção acerta em cheio em basear o design dos personagens do Bosque dos Cem Acres em bichos de pelúcia reais, e a fotografia transmite os sentimentos necessários durantes diferentes partes do longa, sendo mais sombria em momentos tensos e colorida nas cenas alegres. A imersão do espectador e o sentimento de nostalgia se torna ainda maior ao ouvir a trilha baseada no tema original, tocada ao piano em diferentes momentos do filme. Embora existam alguns escorregões na trama (em certos momentos, as atitudes de Christopher servem apenas para dar prosseguimento ao roteiro), temos uma história que fala muito mais para os adultos do que para as crianças, nos lembrando de que o que mais importa na vida são as coisas simples. Sim, é uma “moral da história” bastante clichê, mas que funciona dentro da proposta do longa.

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  • Resenha | John Constantine, Hellblazer: Assombrado Vol. 1 – A Mulher Escarlate

    Resenha | John Constantine, Hellblazer: Assombrado Vol. 1 – A Mulher Escarlate

    John Constantine teve algo muito próximo do que podemos chamar de uma “vida feliz” durante a passagem do roteirista Paul Jenkins nos sete volumes de Hellblazer publicados pela Panini durante a fase Demoníaco. Infelizmente para o mago, o leitor não é apresentado a histórias tão interessantes quando sua vida é cercada por amigos e uma namorada companheira. Assim, logo no fim de sua fase, Jenkins trata de dar um fim a essa vidinha feliz e John, como sempre, põe tudo a perder, abrindo caminho para Warren Ellis assumir o título em seguida com a curta fase batizada de Assombrado.

    Ellis faz um excelente trabalho nesse volume ao pegar um ponto de partida para o personagem que não deixa para o leitor novato a necessidade de ter lido a série anteriormente. O primeiro arco de seis histórias conta como a vida de John Constantine é jogada na sarjeta quando ele investiga o brutal assassinato de sua ex-namorada Isabel Bracknell. Ao se aprofundar no submundo do crime londrino, John recebe uma surra de “aviso” dos comparsas do assassino — que também é um mestres das artes ocultas — e passa boa parte do volume se recuperando e planejando sua vingança. Isso porque o fantasma de Isabel continua se manifestando em Londres, o que significa que sua alma está atormentada e ainda não conseguiu concluir a passagem para o além.

    O texto de Ellis é maduro e bastante sóbrio, o que faz com que certas passagens de extrema violência se destaque — principalmente sob o lápis de John Higgins, que consegue retratar um Constantine quarentão de forma bastante acertada. Aliás, é interessante como a passagem do tempo é retratada pelo roteirista, que faz questão de mostrar que o personagem segue envelhecendo normalmente e não está congelado no tempo como outros personagens da DC Comics, que nunca saem da faixa dos trinta. A ambientação também faz claras referências ao final da década de 1990 (em que a história foi publicada), com Friends passando na televisão ou jornais anunciando homenagens póstumas à Lady Di. Além disso, temos um excelente trabalho de pesquisa sobre ocultismo realizado pelo autor, que faz seu vilão ser um seguidor de Aleister Crowley. O assassinato de Isabel teria fortes ligações com a obra de Crowley e faz com que o vilão seja muito verossímil, assim como a magia nesse arco está longe de ser feitiços lançados com pirotecnia, como na versão de Constantine dos Novos 52.

    Essa ligação de Ellis com acontecimentos atuais, na época, acabou resultando no cancelamento prematuro de sua passagem pelo título. Devido ao massacre de Columbine em 1999, uma de suas histórias acabou sendo censurada pela DC/Vertigo, e o roteirista interrompeu seu trabalho na editora. Por esse motivo, a fase Assombrado tem apenas dois volumes (diferente dos sete ou oito das fases de outros autores). Uma pena, pois A Mulher Escarlate é uma das melhores histórias de Constantine já publicadas.

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  • Resenha | Alice no País das Maravilhas – Lewis Carroll

    Resenha | Alice no País das Maravilhas – Lewis Carroll

    Publicado pela primeira vez em 1865, Alice no País das Maravilhas continua sendo até hoje um clássico da literatura infantil, tendo gerado inúmeras representações em diversas mídias, como cinema, televisão, quadrinhos e videogames. Escrito por Lewis Carroll e ilustrado por John Tenniel, a obra já está em domínio público há um bom tempo (tanto o texto original quanto as gravuras) e por esse motivo temos inúmeras traduções e adaptações por editoras diferentes disponíveis no mercado. Essa resenha leva em consideração a edição da L&PM Pocket, facilmente encontrada nas livrarias e com preço bastante acessível.

    O livro conta a história de como Alice, em meio a devaneios de uma tarde de verão, acaba caindo em uma terra onde as leis da física e da lógica não funcionam como deveriam. Após seguir um ansioso e atrasado Coelho Branco por uma toca, Alice se vê em meio a animais falantes, objetos que aparecem e desaparecem do nada, comidas e bebidas que a fazem mudar de tamanho e os mais estranhos personagens que a literatura poderia conceber até então. O que ocorre no assim chamado País das Maravilhas é uma sucessão de cenas desconexas, que não formam um roteiro sólido ou previsível – ao contrário, tudo é caótico. Assim como o leitor, Alice tenta racionalizar o que está acontecendo, mas nem mesmo o pensamento racional faz sentido quando números e palavras mudam de significados. Alice busca respostas com os personagens que encontra pelo caminho, como a Lagarta, o Chapeleiro ou o Gato de Cheshire (em outras traduções, Gato Que Ri ou Gato Risonho). Talvez o único fio condutor da narrativa seja a busca pelo Coelho Branco, que a leva para o julgamento final com a malvada Rainha de Copas. E isso não é nem de longe um ponto fraco do livro, que se sustenta em suas cenas absurdas e diálogos improváveis, com o típico humor britânico. Infelizmente, muitas das piadas e trocadilhos se perdem na tradução, que na edição da L&PM não parecem bem adaptadas para o público brasileiro.

    Se hoje em dia nada irrita mais um leitor do que o manjado final do tipo “foi tudo um sonho”, na história de Carroll esse artifício literário se encaixa muito bem. Desde o começo já está implícito que aquilo que Alice vivia não era real, seja logo no segundo parágrafo onde ela se sente “muito sonolenta e estúpida”, seja quando ela não consegue recitar um conhecido poema ou fazer uma simples operação matemática. A ideia que que tudo era um sonho também é aproveitada na sequência do livro, Alice no País do Espelho, que é praticamente a mesma história com outros personagens.

    Alice no País das Maravilhas é um livro infantil, mas para melhor apreciá-lo devemos lembrar de seu contexto histórico: foi escrito para crianças inglesas do final do século 19. Uma criança brasileira da segunda década do século 21 jamais entenderá a maioria das referências e trocadilhos do livro, como por exemplo a corrida-caucus, a Tartaruga Falsa ou os poemas estranhos. Ainda assim, vale a leitura pelo carisma dos personagens e o absurdo das situações.

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  • Crítica | O Grinch (2018)

    Crítica | O Grinch (2018)

    A clássica história do Dr. Seuss sobre como um ser desprezível tentou roubar o natal da Quemlândia ganhou em 2018 um remake dos estúdios da Ilumination – mesma empresa responsável por Meu Malvado Favorito e Minions: O filme. O conto de natal, que já havia sido adaptado para televisão em 1966 e para o cinema no ano 2000, é apresentado nessa nova versão de uma forma mais fofinha e colorida. O Grinch segue a linha de outros filmes animados do estúdio, com um roteiro pouco imaginativo e com mudanças cruciais nos personagens do livro.

    Claro que certas mudanças e adições ao roteiro são necessárias, pois o livro original é bem curto – afinal, é feito para crianças – e o filme deixa muito espaço para se preencher em seus 90 minutos além da história básica. No entanto, muito do que foi acrescentado está lá apenas para fazer volume ao longa, como a rena Fred, que não faria falta alguma se fosse retirada do filme. O personagem título é bastante diferente de sua concepção original. No livro e nas duas outras adaptações, Grinch é um ser cruel e detestável, que odeia o natal com todas as suas forças. No novo filme, nem tanto. Grinch não parece odiar o feriado, mas sim guardar um ressentimento devido a um trauma de infância, o que faz com que desde o começo o público possa se identificar melhor com o personagem. Não odiamos o Grinch nesse filme, temos empatia por ele. Ele demonstra o tempo todo querer participar do natal, e isso se reflete em suas expressões faciais, seu olhar e seu esforço para odiar algo que claramente ele deseja. O Grinch do estúdio dos minions é menos rabugento e mais “recalcado”.

    A história começa no dia 20 de novembro, quando toda a Quemlândia está animada se preparando para o natal, enfeitando as casas e ensaiando corais. O tempo de cinco dias para o natal acaba sendo desnecessariamente longo e faz com que tenhamos várias cenas de café da manhã, que servem basicamente para mostrar a subserviência do cãozinho Max – muito mais jovem e ativo do que suas outras versões. Nesse meio tempo, Grinch visita a vila dos Quem e, ao invés da aversão odiosa aos elementos natalinos, ele parece ter algum tipo de fobia, fugindo de um grupo de coristas. Suas “maldades” não passam de pequenas traquinagens pueris – talvez com uma dose bem pequena de sadismo – mas ainda assim insignificantes. Quando Grinch finalmente resolve “roubar o natal”, ainda temos um bom tempo de tela sendo preenchido com os planos e um arco sobre a rena Fred que, como já citado, não leva a nada.

    Talvez o roubo do natal seja a parte mais interessante do filme, pois é seu momento mais criativo. O Grinch dessa película é uma espécie de “engenhoqueiro”, e utiliza todos os tipos possíveis de gadgets para realizar a façanha. Em paralelo, acompanhamos a história da família da pequena Cindy-Lou Quem e seu plano para prender o Papai Noel – a quem ela tem um pedido importante a fazer que acaba sendo o motivo da redenção final do personagem título.

    O ritmo alucinante deixa pouco tempo para introspecção e dá a impressão de que a história não pareça tão esticada. A trilha sonora assinada por Danny Elfman acerta poucas vezes, na maioria ao emular as faixas apresentadas na versão de 1966 – embora a versão de You’re a mean one, Mr. Grinch, do rapper Tyler, tenha ficado bastante dissonante com o restante. Quanto às vozes, nada que justificasse o alarde em torno de Benedict Cumberbatch ou do brasileiro Lázaro Ramos na versão dublada. Embora ambos tenham realizado um bom trabalho, essa versão não apresenta uma voz tão marcante e com tantos trejeitos quanto a do filme de 2000.

    Claramente, a Illumination criou sua própria estética visual baseada nos livros do Dr. Seuss, mais alegre e fofinha. Nisso, o filme se aproxima muito de outras obras do estúdio baseadas no autor, como Horton e o Mundo dos Quem e O Lorax: Em Busca da Trúfula Perdida. Temos então uma versão fofinha, limpinha e sanitizada do personagem que deveria ser asqueroso e rabugento. O Grinch da Illumination é um cara legal que está um pouquinho confuso, demonstra afeto e carinho ao seu fiel companheiro Max e respeita uma rena caçada nas montanhas. Adultos devem facilmente se cansar do filme, mas para o público infantil, O Grinch pode se tornar um novo Meu Malvado Favorito.

  • Os 10 Melhores Momentos do Mickey Mouse

    Os 10 Melhores Momentos do Mickey Mouse

    Em novembro de 2018 o camundongo mais famoso do mundo completa 90 anos de sua primeira exibição ao público norte-americano. Entre altos e baixos, com produções memoráveis e outras nem tanto, Mickey Mouse permanece como um símbolo da Walt Disney Company até hoje e influencia até mesmo as leis de direitos autorais através de lobby no governo dos EUA. Em homenagem a essas nove décadas, preparamos uma lista com os melhores momentos do ratinho na televisão, cinema e videogames!

    10. O Point do Mickey (2000)

    Especial de Dia das Bruxas de House of Mouse, Os Vilões da Disney fez sucesso em home video

    Em último lugar nessa lista, o desenho animado House of Mouse ficou conhecido no Brasil por uma gíria que não sobreviveu à metade da primeira década do século 21. O tal “point” era uma espécie de clube ou casa noturna da qual Mickey era sócio junto ao Pato Donald na série. O clube era frequentado por praticamente todos os personagens animados Disney, desde os clássicos Pateta, Pluto, Minnie e Clarabela até personagens de filmes como O Rei Leão, Pinóquio e Dumbo. Era possível ver na mesma cena o urso Balu, a sereia Ariel e os Sete Anões. A maioria dos personagens não tinha fala, apenas faziam uma ponta – a não ser que o roteiro assim pedisse. No palco, Mickey apresentava segmentos de desenhos clássicos e novos, alternadamente, dando uma sobrevida ao programa anterior que havia sido cancelado, Mickey Mouse Works (no Brasil, com o péssimo nome OK Mundongo da Disney). A série seguiu esse formato por quatro temporadas e 52 episódios, sendo que os episódios de natal e halloween são até hoje reprisados com certa frequência. Embora a animação das cenas no “point” seja bastante limitada, a série merece entrar nesta lista por apresentar material antigo – e de qualidade – a um público novo.

    09. A Casa do Mickey Mouse (2006)

    Mickey e sua turma conquistam pais e filhos com programa educativo

    Seguindo a linha de programas educativos para crianças bem pequenas, como Dora, a Aventureira, A Casa do Mickey Mouse fez um estrondoso sucesso também com os pais. Fofinho, colorido e mantendo o visual clássico dos icônicos personagens, era também uma novidade por ser um programa feito completamente em computação gráfica. Os roteiros são bem infantis e os personagens se envolvem em situações que só parecem problemas reais para crianças de cinco anos, mas isso é o suficiente para manter olhinhos atentos na tela. Para resolver os problemas, Mickey conversa com a câmera representando as crianças, e espera um tempo para que elas respondam em casa, num exercício de quebra da quarta parede pra pato nenhum botar defeito (“É mole?”, diria um certo penoso semi-famoso nas redes sociais). Para ajudá-lo a resolver os problemas, Toodles surgia com os Mickey Objetos – que sempre vinham a calhar e nunca eram inúteis.

    A Casa do Mickey Mouse, embora não tenha um primor de roteiro para aqueles que já são alfabetizados, ganha lugar de destaque nessa lista pelos seus 125 episódios que, disputando com o fenômeno nacional Galinha Pintadinha, manteve o interesse da criançada no personagem.

    08. Hora de viajar! (2013)

    Passado e presente, juntos na mesma animação

    No final de 2013, uma “febre congelante” avassalou as crianças do mundo inteiro com o longa animado Frozen. O que poucos comentam, contudo, é que antes do lérigou foi apresentado nos cinemas um dos curta-metragens mais divertidos do Mickey desde a sua criação. Hora de viajar! mistura animação clássica em preto e branco com o que há de melhor em efeitos visuais 3D. Em uma sequência alucinante, a impressão que temos é que os personagens realmente saem da tela e interagem com a sala de cinema. Talvez por isso esse curta seja tão pouco lembrado, pois só quem assistiu no cinema e em 3D obteve a sensação de imersão necessária, nunca reproduzida totalmente em home video.

    07. Castle of Illusion (1990/2013)

    Diversão eletrônica

    É impossível falar de Castle of Illusion sem citar suas duas versões: a clássica, de Mega Drive e Master System dos anos 90, e o excelente remake de 2013 para PlayStation e XBox. Ambas as versões seguem a mesma história: Minnie foi sequestrada pela bruxa Mizrabel. O jogo apresenta todos os clichês presentes em jogos de plataforma como Mario ou Sonic, mas aposta em um personagem igualmente carismático e imensamente mais popular.

    Cada fase do jogo apresenta um tema diferente do universo mágico da bruxa, sendo florestas sombrias, bibliotecas encantadas, casa de brinquedos e até doces e guloseimas os cenários que, magicamente, se escondem no castelo de ilusões de Mizrabel. Os chefões das fases não são muito difíceis de derrotar, apresentando uma certa lógica bastante previsível em seus movimentos. Diferente de DuckTales Remastered (que usou exatamente o mesmo jogo de NES com uma roupagem gráfica moderna), a nova versão reformulou completamente as fases, mecânicas e jogabilidade do cartucho original, e é ainda hoje uma excelente experiência tanto para o público mais novo quanto para os saudositas.

    06. Epic Mickey (2010)

    Clima sombrio marca retorno de personagem esquecido

    Epic Mickey é um marco não só nos videogames como também na história recente dos Estúdios Disney por reintroduzir na empresa o primeiro personagem de Walt Disney: Osvaldo, o Coelho Sortudo. Walt havia perdido os direitos do personagem pouco depois de criá-lo, e por muito tempo o coelho ficou nos estúdios de Walter Lantz, o mesmo da turma do Pica-Pau. O personagem faz nesse jogo seu retorno triunfal, antagonizando seu “irmão” Mickey numa terra de personagens esquecidos ou rejeitados que é uma paródia sombria aos parques temáticos da Disney, incluindo animatrônicos defeituosos de personagens como Pateta e Margarida. O jogo foi lançado para Nintendo Wii e utilizava-se da tecnologia de captura de movimentos que era novidade na época com o Wiimote, que servia para simular o pincel mágico que Mickey “emprestou” do feiticeiro Yen Sid (o mesmo de Fantasia).

    O jogo tem um roteiro deslumbrante e gráficos espetaculares, mas apresenta alguns problemas de jogabilidade, principalmente com os ângulos de câmera, que ficaram ainda mais limitados na sua sequência direta, Epic Mickey 2: The Power of Two. O jogo ainda rendeu uma adaptação em quadrinhos roteirizada por Peter David (conhecido por sua longa fase no Hulk, da Marvel e pela revitalização do Aquaman na DC nos anos 90).

    05. Mickey Mouse (2013)

    “O meu amor está no Carnaval!”

    Também chamada popularmente de Curtas do Mickey, essa série mantém o ritmo alucinante e o espírito aventureiro e jovial dos primeiros desenhos em preto e branco do camundongo. A série mistura design clássico com humor nonsense e a agilidade das mais modernas animações de comédia para revitalizar os personagens de forma estranha e hilária ao mesmo tempo. Os episódios são totalmente independentes entre si, e não mantém nenhum compromisso com cronologia ou mesmo tempo e espaço. Vemos Mickey e sua turma morando e trabalhando na França, na Rússia ou em qualquer parte do globo, e nesses episódios eles falam a língua local, sem precisar de dublagem localizada (com exceção dos episódios no Brasil que foram redublados, talvez para não causar estranheza ao ouvir o Mickey falando português com outra voz que não seja a do seu atual dublador, Guilherme Briggs).

    Os roteiros também não se intimidam em fazer piada com nada. Em um episódio, Pateta é um zumbi em decomposição, rodeado por moscas. Em outro, descobrimos que Donald nunca foi marinheiro! Nos dois episódios ambientados no Brasil (o primeiro sobre futebol e o segundo, claro, carnaval) temos a aparição rápida, porém pontual, do nosso representante no Universo Disney, Zé Carioca, e são episódios muito divertidos. A série está, atualmente, em sua quinta temporada.

    04. Runaway brain (1995)

    Ah, os anos 90!

    Um dos melhores curtas já feito, Runaway Brain trouxe o Mickey dos anos 1940 para os anos 1990. Tudo nele lembra seus episódios clássicos, mas aqui ele come pizza e joga videogame. O roteiro é bastante sombrio para um desenho do Mickey, com referências a diversos filmes de terror – sendo os mais evidentes O Exorcista e Frankenstein. Mickey tem seu cérebro trocado com o de um monstro com a cara do Bafo de Onça ao tentar arrumar um jeito de agradar sua namorada Minnie. O curta apresenta vários easter eggs, desde um jogo de videogame estrelado pelo Dunga, de Branca de Neve e os Sete Anões, até a aparição de um certo mordomo real da Pedra do Rei. Apesar de esquecido do grande público, merece um lugar bem perto do topo na nossa lista de grandes momentos!

    03. Fantasia – O aprendiz de feiticeiro (1940)

    Com grandes poderes…

    Segmento de Fantasia,  terceiro longa animado de Walt Disney, O aprendiz de feiticeiro é talvez o mais importante papel que Mickey já atuou em todos os tempos. Prova disso é a constante volta a essa história em outras mídias, como no especial de halloween Os vilões da Disney, ou em videogames, como o já citado Epic Mickey e o mundo aberto de Disney Infinity.

    No curta, Mickey é ajudante do feiticeiro Yen Sid (nome digno de personagens de rpg pouco inspirados, como Namtab, Alucard ou Redav Htrad) e descobre poderes cósmicos fenomenais ao colocar o chapéu mágico de seu mestre. Claro que os grandes poderes a ele concedidos fogem ao seu controle e o ratinho precisa lidar com as consequências da magia ilimitada! A trilha sonora de Paul Dukas, baseada na obra de Johann Wolfgang von Goethe encaixa perfeitamente com a magistral animação e o primoroso roteiro de um dos maiores clássicos Disney.

    O curta está entre os top 3 dessa lista por um motivo curioso: o Mickey roubou o papel que seria de outro personagem Disney famoso na época! A princípio, o aprendiz de feiticeiro seria interpretado por Dunga, de Branca de Neve e os Sete Anões. Aparentemente, o senhor Mouse deve ser um ator influente nos estúdios, roubando até mesmo alguns dos trejeitos e parte do figurino do anão para esse filme…

    02. Uma cilada para Roger Rabbit (1988)

    Miska, muska, o que que há, velhinho?

    Uma cena épica no cinema aconteceu no longa de Robert Zemeckis Uma Cilada para Roger Rabbit: quando o detetive humano Eddie Valiant cai de um edifício em Toontown (ou Desenholândia, dependendo da dublagem), dois paraquedistas aparecem para ajudá-lo (mais ou menos). Trata-se do primeiro encontro entre Mickey Mouse e Pernalonga da história!

    O filme em si já foi um marco, tanto pela técnica que misturava cenas reais com animação quanto pela quantidade absurda de personagens de estúdios diferentes em cena ao mesmo tempo. Mas a cena do paraquedismo com Mickey e Pernalonga é realmente icônica, pois ambos os personagens são considerados os maiores representantes de seus respectivos estúdios. Os estúdios Disney e Warner, após longa negociação, concordaram em ceder os dois personagens, desde que tivessem o mesmo tempo de tela. O resultado não poderia ter sido mais satisfatório, e merece o segundo lugar nessa lista!

    01. Steamboat Willie (1928)

    Clássico é clássico!

    Em primeiríssimo lugar, não poderia ser diferente! O barco a vapor foi lançado em 18 de novembro de 1928 e é um marco da animação mundial! Aqui, vemos um Mickey muito diferente do que estamos acostumados nos dias de hoje: embora já fosse aventureiro e enfrentasse problemas muito maiores que ele mesmo, o Mickey desse curta é também atrapalhado como o Pateta seria mais tarde e se irritava com facilidade da mesma forma que o Pato Donald!  Essas características seriam diluídas anos mais tarde entre seus dois co-protagonistas, e se perderiam com o tempo, dando espaço apenas ao bom-mocismo do personagem-símbolo da Disney. Mas em seu primeiro trabalho, Mickey se mostra mais disposto a burlar regras, como trazer sua namorada à bordo do barco com um anzol ou desrespeitar o comandante. O design do personagem também não era algo original , pois emprestava muitas características do Gato Félix e do Coelho Osvaldo. O desenho também não foi o primeiro a ser produzido com o ratinho: Plane Crazy surgiu antes, mas com o advento do cinema sonoro, O barco a vapor viu as telas e o público antes e fez história! Hoje, o segmento em que ele pilota o timão do barquinho enquanto assobia se tornou a vinheta de abertura dos longas animados do estúdio. E assim se vão 90 anos do camundongo mais famoso do mundo! Parabéns, Mickey Mouse!

  • Resenha | Superman: Alienígena Americano

    Resenha | Superman: Alienígena Americano

    Embora o Superman seja um dos personagens mais populares da DC Comics (afinal, é o primeiro super-herói), existe uma dificuldade muito grande em encontrar autores que saibam trabalhar com o personagem sem torná-lo enfadonho para novos leitores – principalmente aos que já torcem o nariz para o herói naturalmente. Em sua série regular, geralmente temos o feijão-com-arroz que, se não traz nada de realmente progressista para o personagem, ao menos apresenta uma qualidade razoável de ação e aventura que mantém sua base de leitores fiéis até hoje, há 80 anos. Porém, sempre que alguém tenta inovar nos roteiros acaba correndo um risco muito grande de não agradar nem seus fãs, nem os não-fãs. Mesmo as obras mais aclamadas pela crítica, como Grandes Astros: Superman, de Grant Morrison e Frank Quitely, encontra certa resistência para o leitor que não aceita o lado mais fantasioso (e icônico) do herói. Por outro lado, algumas abordagens mais realistas como Lex Luthor: Homem de Aço, de Brian Azzarello e Lee Bermejo, pode parecer cínica e desesperançosa demais para quem quer apenas ler uma boa aventura do azulão, sem se preocupar com questões filosóficas.

    Superman: Alienígena Americano, de Max Landis, abraça ambos os conceitos, criando sete histórias sobre Clark Kent, cada uma com um estilo diferente de arte e narrativa. Mesmo contemplando os superpoderes do personagem e todo o lado fantástico, Landis conta a história pela ótica do próprio Clark, em momentos diferentes de sua vida que vão da infância em Smallville até sua consagração como herói de Metrópolis. Embora não seja necessariamente uma nova história de origem, vemos o jovem Kent aprendendo a lidar com seus poderes, conhecendo suas limitações éticas e morais, cometendo erros que qualquer um de nós também cometeria se estivesse no lugar dele. Talvez seja por isso que é fácil se identificar com o Clark Kent nessa série, porque ele é muito mais que apenas um estranho visitante de outro planeta. Ele é um de nós que, por acaso, não é da Terra.

    Se a princípio podemos nos lembrar da telessérie Smallville e suas cansativas dez temporadas, logo na segunda história vemos que este Clark é um tanto diferente do retratado por Tom Welling. Aqui, o Clark adolescente demonstra já ter usado seus poderes para proveito próprio (principalmente a visão de raios-x), bebe cerveja escondido com seus amigos Pete Ross e Kenny Braverman (que em nenhum momento demonstra traços de sua versão dos anos 90 que se tornou o vilão Conduíte), se passa por um famoso milionário em uma festa num iate e, já na vida adulta, tem um conturbado namoro com Lois Lane. Ainda assim, procura fazer o que é certo, mesmo tendo que lidar com as consequências (ou às vezes não). Vemos seu pai adotivo ajudando-o a usar seus poderes quando criança, seus vizinhos e autoridades locais ajudando a manter seu segredo – e a preocupação que eles têm com Clark quando ele assume o alter-ego de Superman. Temos uma explicação simples e tão genial sobre o disfarce dos óculos que me pergunto como nenhum autor pensou nisso em 80 anos! Os mais icônicos vilões do kryptoniano fazem parte da história, vemos um Lex Luthor muito próximo de algo que poderia ser sua versão definitiva, e a história de uma página do Sr. Mxyzptlk é, ironicamente, a mais realista de todas! Temos comédia, ação, drama, aventura, ficção… Tudo se encaixa e mostra que é possível contar histórias tão variadas com um mesmo personagem quanto a imaginação e competência do escritor puder permitir.

    A edição nacional da Panini Books, em capa dura, traz o logo comemorativo de 80 anos do personagem na capa, além de cartões com as artes de algumas capas como brinde. Superman: alienígena americano é tudo que se propõe ser: uma história do homem por trás da capa vermelha. Já nasceu como a melhor história do Superman desta década, conseguindo cumprir a difícil tarefa de ser uma leitura interessante para quem já é fã do Superman e para quem ainda não é.

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  • Resenha | Arlequina: Se Jogando na Cidade

    Resenha | Arlequina: Se Jogando na Cidade

    Reformulada após o início da fase Os Novos 52 da DC Comics, a personagem de maior sucesso na editora dos últimos tempos ganhou uma revista mensal solo em novembro de 2013 nos EUA, e seu primeiro arco de nove edições foi publicado por aqui no encadernado de capa dura Arlequina: Se Jogando na Cidade. A revista foi uma das mais bem-sucedidas no mercado norte-americano, tendo várias reimpressões e uma nova série com a chegada da fase Renascimento. O sucesso dessa fase da ex-namorada do Coringa (ops, vítima de relacionamento abusivo) se deve à talentosa roteirista e artista Amanda Conner, com eventual participação de seu marido Jimmy Palmiotti. Conner entrega uma Arlequina altamente carismática, ao mesmo tempo fofa e psicótica, com uma violência extrema em certos momentos que, paradoxalmente, nos fazem rir.

    A Arlequina desse gibi já superou seu passado com o Príncipe Palhaço do Crime (embora tenha alguns deslizes de paixonite que servem apenas como alívio cômico), e é uma personagem completa e independente. O estilo de humor utilizado no texto e as situações absurdas em que os personagens são colocados não combinam com o restante dos títulos com o selo Novos 52 na capa, o que nem de longe é um defeito. O ambiente em que as histórias se passam permite que o leitor não precise de mais nada para compreender e se divertir com o encadernado, e parece por vezes nem mesmo fazer parte do Universo DC regular. a primeira história, publicada no número zero da revista americana, brinca com todos os estereótipos possíveis da indústria, inclusive com a hiperssexualização de personagens femininas e desenhistas que não conseguem cumprir prazos, e cada página é desenhada por um artista diferente (os maiores nomes da DC na atualidade). Na história seguinte começa o arco propriamente dito.

    Harleen Quinzel ganha uma herança de um falecido paciente psiquiátrico, e precisa se mudar para Coney Island – o lugar perfeito para ela. Ela se torna a senhoria de um prédio que abriga uma trupe de freak show, nos apresentando personagens bizarros que se tornam seu elenco de apoio. Enquanto tenta uma vida normal como Dra. Quinzel, seu alter-ego precisa enfrentar uma série de caçadores de recompensa que querem um prêmio oferecido pela sua cabeça, velhinhos espiões de uma guerra há muito encerrada, disputar partidas no time local de roller derby e lidar com… cocô de cachorro! Sim, esses são os tipos de problemas que surgem – e sobra até pra equipe criativa da própria DC em determinado momento. Harleen ainda ganha uma coadjuvante de peso quando Pamela Isley (a Hera Venenosa) passa a integrar o elenco como sua melhor amiga (às vezes, com benefícios).

    A arte de Conner é estupenda em suas capas, e muito competente no desenrolar da história, com algumas oscilações compreensíveis para uma série em que a função de roteirista é acumulada com a de desenhista. As cenas de página inteira ou duplas são um deslumbre, e a Arlequina de Conner é ao mesmo tempo engraçada e sexy. Conner já disse em entrevistas que procura dar à Arlequina um visual que, embora atraente, possa ser usado facilmente por cosplayers em convenções de quadrinhos sem necessariamente hiperssexualizar a personagem. Esse pensamento só é possível por ter uma roteirista/desenhista mulher, garantindo a diversidade em seus títulos e empatia com o público feminino, que pode ler sem medo de objetificação. Ponto pra DC! Dito isso, é interessante notar o quanto o clima das histórias nos lembra o de outro personagem da DC que não tem absolutamente nada de inclusivo ou feminista: o Lobo! Sim, o tipo de violência misturada com comédia é bastante parecido com as edições mensais do Flagelo da Galáxia publicada nos anos 1990, por mais estranho que isso possa parecer (inclusive, mais tarde, os dois personagens co-estrelariam um crossover na casa). Arlequina: Se jogando na cidade pode não vir a ser um clássico, tem seus defeitos, mas faz algo que é o mais importante para uma história em quadrinhos: diverte seu leitor como nenhuma outra série em andamento!

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  • Resenha | Batman: Faces da Morte

    Resenha | Batman: Faces da Morte

    Em novembro de 2011, a DC Comics realizou um feito impensável até então para suas duas mais antigas publicações, Action Comics e Detective Comics, renumerando-as com novas “primeiras edições” sob o selo Novos 52. Detective Comics (cuja sigla nomeia a editora hoje) apresentou um novo arco de histórias do Batman, escrito e desenhado por Tony Salvador Daniel que lançou as bases do que viria a seguir nos próximos números. Diferente de sua revista irmã Action Comics, porém, Detective Comics não começou uma história do zero. Ao invés disso, seguiu mais ou menos a linha editorial que já vinha sendo estabelecida antes do evento Ponto de Ignição (Flashpoint), que redefiniu (também mais ou menos) o Universo DC. Aparentemente, em time que está ganhando não se mexe (muito), e a DC resolveu não rebootar (muito) o universo do Batman, da mesma forma que não alterou (muito) a cronologia do Lanterna Verde. (Esses “muitos” entre parênteses são mesmo necessários, pois embora Os Novos 52 apresentassem novas histórias e um reboot de vários personagens, Batman e Lanterna permaneceram praticamente intactos, com algumas mudanças sutis em suas cronologias.)

    As primeiras sete edições foram compiladas em 2016 pela Panini em um volume de capa dura intitulado Batman: Faces da Morte. O encadernado acaba sendo um pouco confuso, pois apresenta algumas ideias e linhas de histórias que não se fecham. O maior exemplo disso é o Coringa, vilão que aparece na capa e na primeira história, mas não tem maior desenvolvimento além de um cliffhanger para uma edição futura (A Morte da Família), deixando toda  a pele de seu rosto arrancada e pendurada em uma parede. O vilão da trama é o Criador de Bonecas, que utiliza partes de pessoas mortas para recriar outras, como um Doutor Frankenstein moderno. Batman precisa salvar seu amigo Comissário Gordon das mãos do vilão e ainda lidar com a opinião pública no meio do caminho.

    Na quinta edição, mudamos de arco e agora outro icônico vilão, o Pinguim, aparece… para também não ser o antagonista! Assim como o Coringa na primeira história foi apenas um chamariz de leitores, o Pinguim aqui apenas serve para estabelecer seu Cassino Iceberg como cenário para a caçada a outro vilão, o Pele de Cobra. Além disso, vemos o desenrolar de mais um interesse amoroso de Bruce Wayne que acaba servindo como vítima, sem surpresa alguma. Isso fica ainda mais banal se levarmos em conta que, na mesma época, um arco de histórias contra o Chapeleiro Louco também usa uma namorada como vítima para dar seguimento ao roteiro. Aparentemente, as mulheres do Universo DC continuam sendo colocadas na geladeira pelo “bem” da trama!

    Batman: Faces da Morte não é um clássico do Homem Morcego e tampouco serve para iniciar novos leitores aos quadrinhos do Cavaleiro das Trevas. Seu maior ponto positivo é a arte de Tony Daniel, sempre exuberante e garantindo o ritmo da ação, lembrando em muito os quadrinhos dos anos 90 nas quais o roteiro ficava sempre em segundo lugar.

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  • Resenha | Superman & Batman: Os Melhores do Mundo

    Resenha | Superman & Batman: Os Melhores do Mundo

    Existe uma rivalidade saudável, quase pedagógica, no meio dos fãs da DC Comics que se dividem entre aqueles que gostam mais do Batman e os que preferem o Superman. Essa dualidade não é algo apenas de fãs: a própria editora se esforçou para que os antigos Superamigos se tornassem personagens bastante diferentes entre si, afastando-os da leveza característica do clássico desenho dos estúdios Hanna-Barbera e levando-os cada vez mais próximos de suas origens do fim dos anos 1930. Após a megassaga Crise nas Infinitas Terras, que reformulou todo o Universo DC, os dois heróis já haviam se encontrado algumas vezes em histórias que mostravam o quanto eram diferentes um do outro. John Byrne retrata brevemente essa dualidade em sua minissérie O Homem de Aço, enquanto Frank Miller a reforça e acentua ainda mais no clássico O Cavaleiro das Trevas. Mas talvez a melhor representação da relação entre o Homem do Amanhã e o Cruzado Encapuzado tenha saído das mãos de Dave Gibbons e Steve Rude em 1990, com a minissérie em três partes Superman & Batman: Os Melhores do Mundo.

    Gibbons traz em seu roteiro o melhor que sua nostalgia poderia elaborar, reconstruindo sua diversão de infância em algo adulto, maduro e não menos divertido. Diferente de Miller, o texto de Gibbons não toma partido pra nenhum lado, e reforça nos dois heróis aquilo que eles têm de melhor, dentro de suas próprias características. Luz e sombra, dia e noite, cinismo e esperança não são conceitos antagonistas na trama. Pelo contrário, eles se completam. Batman é mostrado como um verdadeiro senhor da noite, agindo em silêncio nas sombras e despertando o medo no coração dos bandidos, mas ainda é um herói e passa longe das versões psicóticas que vieram depois. Superman é otimista e desperta a confiança nos cidadãos de Metrópolis agindo em plena luz do dia, e se preocupa tanto com grandes crimes quanto com pequenas coisas que fazem a vida das pessoas comuns um pouco melhor e mais esperançosa. Os dois heróis não entram em um confronto nessa história; eles unem suas forças, cada um dentro do que melhor sabe fazer, para enfrentar seus maiores vilões.

    Coringa e Lex Luthor são retratados como eram nas revistas mensais de então: o primeiro um louco caótico para quem o mundo é uma enorme piada; o segundo como um poderoso homem de negócios inescrupuloso, motivado pela inveja por alguém mais poderoso que ele. Os dois antagonistas trocam suas bases de operações, o que faz com que Superman tenha que trabalhar em Gotham e Batman vá até Metropólis. A dinâmica dessa troca de cenários é interessante, mas os heróis percebem que somente se unindo conseguem evitar um terrível mal que ameaça o mundo recém-saído da Guerra Fria. Os personagens secundários dos dois universos estão muito bem apresentados, principalmente quando interagem nas festas do orfanato (que esconde um segredo sombrio), desenvolvendo excelentes diálogos.

    A dupla de heróis é desenhada da forma mais icônica possível. Superman tem seus traços claramente inspirados no desenho dos Irmãos Fleischmann, da década de 1940, enquanto o Batman está muito ao que David Mazzuchelli retratou em Ano Um. A arte de Rude é simplesmente fantástica. Transita entre o simples e o detalhado, a luz e as sombras, o estilizado e o complexo. As expressões faciais que o artista transmite são parte fundamental da compreensão da história e, se por vezes parecem um tanto caricatas, funcionam muito bem na maior parte da obra. Rude e Gibbons prestam homenagens durante a minissérie aos grandes nomes da comédia do início do século passado, e as referências a Abbot & Costello, Groucho Marx, Stan Laurel e Oliver Hard (O Gordo e o Magro) saltam aos olhos do leitor mais atento. Aliás, Rude recompensa aqueles que prestam atenção nos detalhes de seus cenários colocando algumas cenas picantes ou propositalmente “sexy por acidente” em seus quadros.

    A edição da Panini, lançada em 2017 num encadernado de capa dura, faz justiça ao material original, e embora os extras sejam apresentados ao fim da edição de forma um tanto confusa, é uma ótima forma de eternizar um clássico que já está às portas de sua terceira década de publicação. Uma pena que os filmes da DC de Zack Snyder não beberam dessa fonte e acabaram por mostrar um Superman tão sombrio e deprimido quanto o Batman. Gibbons e Rude mostram que Batman e Superman não são iguais, mas também não são incompatíveis. São dois lados da mesma moeda. São os melhores do mundo!

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  • Resenha | Lendas do Universo DC: Darkseid

    Resenha | Lendas do Universo DC: Darkseid

    A Editora Panini vem publicando há algum tempo uma série de encadernados em capa cartão que se propõe a apresentar histórias consideradas clássicas dos maiores personagens da DC Comics. Após várias séries bem-sucedidas com o Batman de décadas passadas, Superman e Mulher-Maravilha também ganharam sua coleção lendária. Em 2017, os leitores foram pegos de surpresa com o título Lendas do Universo DC: Darkseid, primeiro da série dedicado a um vilão e desenhado por John Byrne. O que o título da edição deixou escapar é que tratava-se de uma republicação da minissérie Lendas, um marco inicial para várias séries da DC após a reformulação desencadeada em Crise nas Infinitas Terras. A importância de Lendas para a cronologia DC parece ter sido colocada em segundo plano, já que foi o nome do vilão da trama que estampou a capa da revista.

    Infelizmente, ler a saga hoje sem o contexto histórico da época pode ser frustrante para quem não acompanhou o desenrolar das reformulações pós-Crise. Escrita por nomes de peso como John Ostrander e Len Wein e desenhada por Byrne com arte-final de Karl Kesel, Lendas foi o primeiro crossover da DC após o turbilhão que arrasou o multiverso de seus personagens em Crise nas Infinitas Terras. A minissérie principal, apresentada nesse volume, tem seis partes, mas desenrola-se por outros 22 capítulos nos títulos mensais da época. Isso faz com que ler o encadernado traga a sensação de que algo está faltando – e realmente está! Somos apresentados a conceitos que não se desfecham e desfechos que não vimos o desenrolar. Ainda assim, é divertido ver os maiores heróis da época juntos em uma mesma aventura.

    A trama apresenta o vilão-título com um plano para acabar com os super-heróis fazendo com que o povo da Terra passe a desconfiar dos justiceiros de collant. Para isso, Darkseid envia ao nosso planeta o Glorioso Godfrey, que aqui se torna um líder político carismático, que ganha seguidores através de bravatas e discurso de ódio contra as minorias e seus defensores. Distorcendo a visão de seu público sobre os chamados super-heróis, Godfrey consegue uma legião de seguidores fanáticos que o vê como uma espécie de messias que vai libertar o povo de uma ameaça que apenas ele vê. Seus seguidores fanáticos enxergam nele uma aura quase mítica, de alguém que “fala o que pensa” e “conta a verdade”, mas precisa lidar com um governo que, segundo ele, estaria contra o povo do seu país. Com esses pensamentos extremos, consegue convencer o presidente Ronald Reagan (sim, ele está na história) a expedir um Ato Institucional proibindo as atividades dos super-heróis, fazendo com que a Liga da Justiça e os Novos Titãs se tornem ilegais.

    O restante da história se divide em como os heróis lidam com a situação até se unirem para desmascarar o vilão e em ganchos para as dezenas de subtramas que não aparecem na revista. Vemos a Liga da Justiça  de Detroit aparecer e, mais tarde ficamos sabendo que ela foi desativada para, então, uma nova Liga surgir ao final. Vemos o legionário Cósmico em apuros logo no início, mas jamais sabemos o que houve com ele, pois seu desfecho aconteceu em uma série própria. O único tie-in apresentado na edição é o do Superman em Apokolips. Ainda assim, é interessante ver o surgimento do Esquadrão Suicida (uma vez que atividades heroicas estavam proibidas), o ressurgimento do Capitão Marvel (quando seu nome ainda não tinha sido editorialmente mudado para Shazam) e o primeiro encontro da Mulher-Maravilha com outros heróis (também deslocado, graças à reformulação da personagem que o próprio Wein desenvolvia, à época, com George Perez).

    Lendas do Universo DC: Darkseid pode ser uma aventura divertida, mas depende muito de conhecimentos prévios do leitor ou de certo desprendimento das questões editoriais. Byrne está em sua melhor fase, e seus desenhos são bonitos de se ver, mesmo que caricato às vezes ou com soluções fáceis (como desenhar apenas as cabeças de personagens ao retratar uma multidão). Uma leitura leve, descompromissada, possivelmente datada, mas com alguns temas que, se vistos como metáfora, ainda nos parecem muito atuais.

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  • Resenha | Tio Patinhas e Pato Donald: “Volta a Quadradópolis” – Biblioteca Don Rosa

    Resenha | Tio Patinhas e Pato Donald: “Volta a Quadradópolis” – Biblioteca Don Rosa

    O segundo volume da série Biblioteca Don Rosa, Tio Patinhas e Pato Donald: “Volta a Quadradópolis” é um dos livros mais interessantes publicados pela recém-extinta divisão de quadrinhos Disney da Editora Abril. Nele, vemos uma época da carreira de Keno Don Rosa em que embora ele estivesse mais confortável com os personagens, histórias e arte, também precisou passar por questões editoriais alheias à sua vontade. As histórias desse volume datam de outubro de 1988 até junho de 1990, e foram publicadas por editoras diferentes e em países diferentes, o que fez com que o autor tivesse que se submeter a alguns contratempos que, mais tarde com a carreira já consolidada, ele provavelmente não aceitaria. Assim, temos histórias que contam com o talento de outros artistas e escritores, em uma co-produção inclusive com o próprio Carl Barks!

    A primeira história, “O caçador de crocodilos”, segue a fórmula favorita de Don Rosa, que é a de aventuras de exploração e caça ao tesouro. A trama contém várias referências às histórias antigas de Barks, incluindo o incrível zoológico do Tio Patinhas mostrado na edição Em Busca do Unicórnio,  da coleção O Pato Donald por Carl Barks, publicada pela mesma editora. Na trama, baseada em uma ilustração de capa feita por Barks, Donald e os sobrinhos partem em uma aventura no Egito para encontrar um raríssimo crocodilo. Em seguida, temos Fortuna nas rochas, uma história curta em que Don Rosa usa seu conhecimento sobre geologia adquirido na faculdade para fazer piadas e trocadilhos com pedras (que se perdem na tradução). Mas a terceira história é a que, de longe, chama mais a atenção!

    Volta à Quadradópolis é a primeira continuação direta de uma obra de Barks, dando sequência à história Perdido nos Andes (também publicada na outra coleção). Vale notar o cuidado da tradução em manter os mesmos termos usados na coleção Carl Barks, incluindo a música que Donald havia ensinado aos nativos de Quadradópolis (corrigindo um equívoco ocorrido na última republicação das duas histórias, em Disney Big nº 05). A família Pato retorna aos Andes – dessa vez acompanhados de seu rico tio – para devolver as galinhas quadradas ao seu habitat natural, mas são perseguidos pelo Pão-Duro Mac Mônei, mais uma vez brilhantemente usado como vilão da história. É interessante a forma como Don Rosa representa o impacto cultural que pode ser gerado quando uma inóspita tribo é visitada por membros do chamado “mundo civilizado”, e o quanto de aculturação pode resultar do processo.

    Entre as outras histórias do volume (algumas curtas, centradas em uma piada), vale destacar mais quatro: Um pato vendo estrelas, Sua majestade Patinhas, Viagem no tempo e Ratos, sigam-me!, cada uma por um motivo diferente e igualmente interessante.

    Um pato vendo estrelas nunca foi finalizada, e é apresentada em sua forma de roteiro, com os esboços do próprio Don Rosa. Trata-se de uma peça publicitária, onde Donald e os Sobrinhos visitam o parque Disney-MGM. É a única história de Don Rosa em que Mickey aparece, aqui como uma celebridade dos cinemas (o universo do camundongo não existe nas histórias de Rosa). A história foi engavetada na época e é apresentada de forma crua, possibilitando ao leitor entender como o autor trabalha seus roteiros.

    Sua majestade, Patinhas mostra um pouco do passado de Patópolis quando o Tio Patinhas resolve transformar o Morro Matamotor, onde reside sua Caixa-Forte, em um país independente. A história lida com questões de imigração e impostos, e embora sua premissa seja ingênua à princípio, vemos várias camadas de assuntos sérios e relevantes sobre economia, geopolítica e sociedade, disfarçados de piadas infantis. Alguns elementos dessa história seriam reapresentados mais tarde na épica Saga do Tio Patinhas.

    Viagem no tempo é  uma história bobinha de quatro páginas que merece atenção por algumas curiosidades. Primeiro: não foi desenhada por Barks, o que nos salta logo de cara. Segundo: carrega a marca DuckTales, e apresenta os personagens de uma forma muito diferente do que Don Rosa estabeleceu em suas publicações. Em várias entrevistas e em matérias autobiográficas, Rosa afirma que apenas escreve histórias que possam ser uma continuidade do que Barks fez, recusando a desenhar personagens como o Peninha, por exemplo, que não foi criado pelo Homem dos Patos. Pois bem: nesta história ele escreve para nada menos do que TRÊS personagens criados para a série de TV! O mordomo Leopoldo, o garoto pré-histórico Bubba e o atrapalhado Capitão Bóing, além da Mansão Patinhas abrigar os sobrinhos como estabelecido na série. Aparentemente, Don Rosa é um homem de plenas convicções artísticas apenas quando não precisa de dinheiro…

    Em Ratos, sigam-me!, vemos algo singular: o autor se apropria de um antigo roteiro não finalizado de Carl Barks e desenvolve sua trama, baseada no clássico O flautista de Hamelin. Assim, essa é a única história feita, de certa forma, em conjunto pelos dois grandes artistas!

    Tio Patinhas e Pato Donald: “Volta a Quadradópolis” é um daqueles volumes cheios de gratas surpresas e curiosidades, que remonta a uma fase um tanto conturbada na carreira do autor e mesmo assim prende nossa atenção, tanto pelas ótimas histórias quanto pelas curiosidades de bastidores.

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  • Resenha | Quiral

    Resenha | Quiral

    Houve um tempo em que se acreditava que a internet iria acabar com as histórias em quadrinhos, principalmente as de produção nacional. Com a proliferação de scans ilegais, a produção de hqs se tornaria inviável, fazendo que aos poucos o mercado fosse morrendo. Felizmente, essa fatalidade não aconteceu. Embora cópias piratas de revistas sejam encontradas facilmente pela internet, a tecnologia também permitiu que autores e leitores tivessem uma maior aproximação, o que fez com que parte do público entendesse que é preciso, sim, garantir que seus artistas favoritos possam produzir e receber por isso. Assim, é cada vez mais comum vermos sites como o Apoia.se e o Catarse hospedando campanhas de crowndfunding para quadrinhos independentes. É esse o caso do álbum Quiral.

    Com recursos captados através de uma plataforma de financiamento coletivo, Eduardo Damasceno e Luís Felipe Garrocho (responsáveis pelas excelentes Achados e PerdidosBidu – Caminhos) lançaram essa singela história de dois personagens vivendo no mesmo mundo, separados pelo tempo. A narrativa e a arte não podem ser separadas, uma servindo ao propósito da outra magistralmente. Todos os elementos gráficos, desde as cores, linhas, traços e forma dos balões de fala, estão a serviço da narrativa, ao mesmo tempo em que o texto deixa muita coisa em aberto para que o leitor possa exercitar sua imaginação.

    Quiral conta a história de dois personagens cujos nomes não nos são apresentados. Um capitão e uma mulher, apenas. Ambos viveram no mesmo lugar, mas em épocas diferentes, uma vila litorânea na qual a principal atividade econômica é a caça de monstros marinhos. A única conexão que os dois têm entre si é um diário, escrito pelo capitão e lido pela mulher no decorrer da história. As cores em tons de sépia são usadas para diferenciar as épocas, sendo o passado apresentado com cores mais escuras e o presente, mais claras. Apenas os monstros marinhos são apresentados com cores vibrantes, para realçar o elemento fantástico da história que nos é apresentada.

    Embora saibamos pouco sobre os personagens, suas personalidades nos são apresentadas tanto pelos traços da arte quanto pelas suas falas. O capitão é determinado, e carrega em suas costas o peso de seus fantasmas do passado, mas sabe que tem um dever a cumprir e que esse fardo é todo dele. Já a mulher é jovem e deslumbrada com esse mundo maravilhoso além-mar, e é movida pela curiosidade de desbravá-lo e seguir os passos do autor do diário que ela lê assiduamente. Personagens diferentes, com motivações diversas, mas com algo em comum. Não sabemos muito sobre ambos, nem suas origens ou seus rumos. Sabemos apenas que a veia heroica está pulsante nos dois.

    Mais do que apresentar uma narrativa sólida, o livro brinca com as possibilidades de rumos que a história pode tomar na cabeça do próprio leitor, que é encorajado a imaginar as motivações dos personagens, o que pensam e quais seus papéis na sociedade, através das pistas deixadas no caminho. O final em aberto pode decepcionar quem esperava um desenvolvimento mais linear da trama ou alguma conclusão sólida. Em vez disso, deixa um mar de possibilidades e muitas perguntas a serem respondidas.

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  • Resenha | As Tiras Clássicas do Pelezinho – Vol. 2

    Resenha | As Tiras Clássicas do Pelezinho – Vol. 2

    Com os personagens da Turma do Pelezinho já consolidados no primeiro volume, As Tiras Clássicas do Pelezinho – Vol 2 nos mostra uma expansão das possibilidades de piadas sobre futebol, mas também um pouco mais da personalidade de cada integrante da turminha. Obviamente, um ou outro ganha mais destaque que o restante (que seriam mais explorados na revista mensal que começou a ser publicada pouco depois da estreia nas tiras de jornais), e nesse volume vemos muitas histórias com o personagem Frangão. A princípio apenas o goleiro da turminha, Frangão se aventura também como árbitro dos jogos em várias histórias, revezando sua função em campo e sendo bem incompetente em ambas. Óbvio que, tanto como árbitro ou goleiro, as situações que surgem são tão inusitadas quanto engraçadas, e vemos que mesmo apesar de sua inabilidade, Frangão nunca desiste e seu maior sonho é defender um gol do Pelé.

    Cana Braba também tem sua personalidade explorada, e seu temperamento explosivo é ainda mais visível nesse volume. Muitas piadas giram em torno do robusto garoto arrumando briga em campo, não sabendo perder e falando muitos palavrões – devidamente representados pelas cobrinhas e caveiras nos balões, como de costume na época. Já as personagens femininas continuam com os papéis relegados às mulheres nesse período histórico: não entendem nada de futebol, servindo apenas como torcida ou atrapalhando o jogo, além de piadas de teor sexual envolvendo Bonga e gags de cozinha com os terríveis quitutes de Samira.

    Ao personagem-título, ficam as piadas envolvendo seu ultra-potente chute e a capacidade de fazer embaixadinhas com absolutamente qualquer objeto. O carisma do personagem aumenta ainda mais nesse volume, principalmente através dos traços mais “fofinhos” e com as cenas representadas por ângulos diferenciados. Infelizmente, ainda não era costume creditar os artistas devidamente nessa época, sendo tudo considerado apenas obra do Mauricio.

    O final do livro apresenta, novamente, um glossário com os termos usados no futebol, notas contextualizando a época em que foram produzidas as tiras e os termos que não são mais usados nas histórias de hoje por serem politicamente incorretos. Essa segunda edição foi a última das tiras clássicas, que infelizmente não teve mais continuação, deixando muito material ainda sem o devido cuidado gráfico da Panini.

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  • Resenha | Universo DC Renascimento: Arqueiro Verde – Volume 1

    Resenha | Universo DC Renascimento: Arqueiro Verde – Volume 1

    Umas das premissas da fase Renascimento da DC Comics é trazer seus personagens de volta às suas representações mais icônicas. Em Os Novos 52, o veterano personagem Arqueiro Verde foi modernizado, assumindo características mais próximas das suas versões live-action nos seriados Smallville e Arrow, onde ele é representado como um jovem milionário – algo bem próximo de suas primeiras histórias em quadrinhos, que tentavam emular o estilo dos gibis do Batman na época. Mas o Oliver Queen que mais se destaca na memória dos leitores de quadrinhos é o personagem da fase de Dennis O’Neil e Neal Adams, quando o herói apresenta ao Lanterna Verde os problemas reais da classe menos abastada dos Estados Unidos em uma road trip repleta de aventuras e críticas sociais. Um marco para os quadrinhos. Esse estilo foi muito bem retratado na animação Liga da Justiça – Sem Limites, onde ele se define como “um velho esquerdista”.

    Neste primeiro volume da fase Renascimento do Arqueiro Verde, vemos um retorno a essa caracterização. O “riquinho metido” dá lugar ao autoproclamado “Guerreiro da Justiça Social”, voltando inclusive a adotar o cavanhaque típico de Robin Hood. Seu relacionamento com a Canário Negro volta a ser ponto chave da trama, e muito do que foi estabelecido na fase anterior (principalmente seus laços de família) continua sendo explorado.

    O roteiro de Benjamim Percy, por vezes com boas ideias, peca pelo exagero e o cliché. Embora as caracterizações dos personagens estejam coerentes e os diálogos bem sacados (mesmo quando toscos), a narrativa que envolve uma sociedade secreta dominando o submundo – literalmente – de Seattle parece algo não muito condizente com o status de herói urbano do Arqueiro Verde. Embora enfrentar todo tipo de monstros não seja lá algo estranho ao velho Oliver, o teor místico do Nono Círculo (organização secreta que remete ao Inferno de Dante Alighieri) parece forçar a barra. Junte-se a isso a mudança abrupta do estilo de arte no meio do volume e a história parece não ser mais a mesma do início.

    Não que a arte seja ruim, muito pelo contrário! A primeira parte conta com a leveza e o dinamismo da arte de Otto Schmidt, que faz com que o texto de Percy flua de forma natural. Já o estilo da segunda parte – que ficou a cargo de Juan Ferreyra – lembra em muito o visual da série Os Caçadores, clássico do herói nos anos 1980. Apesar de um espetáculo visual, em alguns momentos a ação fica um tanto “truncada” e o ritmo se perde um pouco.

    A decisão da Panini em publicar esse arco – e os outros na sequência – em um volume encadernado está de acordo com a nova estratégia da editora de focar suas mensais nos títulos do Batman e do Superman, evitando os mixes de outrora que deixavam boas histórias perdidas no meio de outras medíocres. Contudo, faltou o conteúdo extra presente na edição americana na qual foi baseada a versão nacional. Embora não seja uma obra prima, esse primeiro volume pode ser, principalmente, um bom ponto de partida para leitores novos ou antigos que se afastaram nos últimos anos.

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  • Resenha | Tio Patinhas e Pato Donald: “O Filho do Sol” – Biblioteca Don Rosa

    Resenha | Tio Patinhas e Pato Donald: “O Filho do Sol” – Biblioteca Don Rosa

    Quadrinhos Disney costumam ser vistos pelo grande público como uma forma de escapismo simples e divertida, sem grandes nuances e, por vezes, até meio ingênua. Vez ou outra surge algum grande artista que resolve colocar um pouco mais de esforço em suas histórias e se dedica a trazer algo além do mero escapismo. Foi o caso de Carl Barks, nos anos de 1940 em diante, que criou grande parte do que conhecemos hoje nas histórias do Pato Donald e marcou gerações de leitores. Seguindo sua linha de narrativa e explorando os personagens desenvolvidos por Barks, nos anos de 1980 desponta aquele que seria aclamado pelo público como seu “sucessor espiritual” nas revistas dos patos. Keno Don Rosa era fã de quadrinhos desde criança, e afirmava ter se preparado a vida inteira para escrever uma única história do Tio Patinhas. Em julho de 1987 essa história foi publicada, e claramente não foi a única: muitas vieram depois e Rosa consagrou-se como um dos grandes artistas Disney!

    Em outubro de 2017 a Editora Abril publicou pela primeira vez no Brasil o primeiro volume da série que se propõe a compilar cronologicamente todas as histórias Disney em que Don Rosa trabalhou. Tio Patinhas e Pato Donald: “O Filho do Sol” – Biblioteca Don Rosa é um álbum luxuoso não só para os padrões de quadrinhos Disney publicados mensalmente no país, mas para o mercado de graphic novels como um todo. O livro apresenta histórias de julho de 1987 a agosto de 1988, com notas do autor e a primeira parte de sua autobiografia. A primeira história é a que dá nome ao volume (O Filho do Sol), e é uma releitura de uma hq que Rosa tinha produzido para um fanzine em sua juventude. A história traz tudo que uma aventura dos patos deve ter: ação, aventura, comédia, uma civilização perdida, tesouros… E um vilão que, nas mãos de Don Rosa, ficou realmente assustador: Pão-Duro MacMônei, que não só usa suas artimanhas e trapaças para ludibriar a equipe do Tio Patinhas como claramente ameça assassiná-los em determinado momento. A cena em que o vilão aponta uma arma para seus rivais em um avião em pleno voo passa uma emoção ímpar aos leitores, e realmente tememos pelas vidas dos protagonistas emplumados.

    Rosa segue à risca a cartilha de Barks, tratando os personagens não como patos verdadeiros, mas como uma representação da condição humana. Sua arte, muito detalhista e um tanto fora dos padrões Disney, dá o tom mais sério das histórias quando necessário. Em suas 200 e poucas páginas, vemos o autor explorar várias nuances de histórias clássicas do Tio Patinhas e Pato Donald, tanto nas histórias longas, nas curtas e nas piadas de duas páginas. Elementos clássicos como o carro 313, os Escoteiros Mirins, o vizinho rabugento Silva e o primo sortudo e presunçoso Gastão ganham o mais próximo de uma versão “definitiva” nas mãos talentosas do quadrinista. Embora esse primeiro volume ainda não apresente uma continuação direta de alguma história de Carl Barks, existem vários elementos do Homem dos Patos apresentados como homenagem, assim como a dedicatória que Don Rosa procurava esconder na maioria das suas histórias (D.U.C.K., sigla em inglês para “Dedicado ao Tio Carl, por Keno”). A preocupação com a continuidade das histórias, como num universo coeso cronologicamente, faz com que todas elas sejam ambientadas aproximadamente na década de 1950, o que se reflete nos hábitos e costumes dos personagens e na tecnologia que é por eles utilizadas – não há computadores ou celulares por perto!

    O último trenó para Dawson é a mais tocante das histórias. Nela, vemos um pouco do passado do pato quaquilionário e sua juventude vibrante, que contrasta muito com a sua personalidade sovina adquirida na velhice. Essa história faz uma ponte com A Saga do Tio Patinhas, épico de Don Rosa que será republicada na coleção.

    O álbum foi editado de forma muito parecida com a versão original, o que deve ter sido um árduo trabalho de negociação com o próprio Keno Don Rosa – que nunca estivera antes satisfeito com a forma que suas histórias eram publicadas. Todas as notas sobre todas as histórias, o prefácio e a biografia do autor foram escritas pelo próprio artista. O trabalho de tradução e letreiramento estão realmente muito bons, embora, por ser uma edição que se propõe definitiva, talvez algumas decisões editoriais como traduzir a moeda americana para “pataca” ou o sobrenome do velho tio para “MacPatinhas” ao invés de McPato (popularizado pela série de TV DuckTales) pudessem ter sido evitadas, como a Panini tem feito com personagens DC que tiveram nomes adaptados no passado. Mas esses são pequenos detalhes que, de forma alguma, alteram a grandiosidade da obra e a importância de sua publicação em terras brasileiras.

    Compre: Tio Patinhas e Pato Donald: “O Filho do Sol”.

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