Autor: Dan Cruz

  • O Esquadrão Suicida: Melhor filme da DC?

    O Esquadrão Suicida: Melhor filme da DC?

    Vamos aos fatos: por mais que eu seja um grande fã dos quadrinhos da DC e tenha sempre torcido para que seu universo cinematográfico fosse tão bem-sucedido quanto o da Marvel, todos concordamos que a casa de grandes personagens como Batman, Superman e o Esquiador Escarlate vem patinando em suas adaptações live action. Fica muito claro que, para se afastar da concorrente, a DC apostou em retratar seu universo de forma mais realista, sombria, séria… O que se mostrou ser uma tremenda de uma bomba, já que seu universo capitaneado pelo “visionário diretor Zack Snyder” se mostrou muito aquém do esperado. O Homem de Aço, primeiro filme desse universo estendido, mostra um Superman confuso e sombrio, o oposto do que ele deveria ser e representar. Estaria tudo bem se isso fosse arrumado na continuação, mas Batman vs Superman: A Origem da Justiça consegue ser ainda mais confuso e fora de propósito. Os fãs, evidentemente, esperariam que tudo se encaixasse no Liga da Justiça, de 2017, e a lambança foi ainda maior! Para que esse universo faça algum sentido, foram precisas uma versão estendida de BvS e um novo corte de 4 horas de Liga da Justiça de Zack Snyder. Ainda assim, é muito mais fácil acompanhar vinte e tantos filmes da Marvel do que ter que fazer um curso de várias semanas para entender minimamente o tal Universo Estendido da DC.

    Mas aí vieram uns pontos fora da curva. Aquaman deu uma banana marinha pra essa linha darkzêra e nos mostrou um filme extremamente colorido e divertido, com uma história aventureira que fez com que o herói mais zoado dos Superamigos se tornasse cool nos dias de hoje! Shazam! foi outra grata surpresa, trazendo um quê de Ben 10 pro personagem e imediatamente criando identificação tanto com o público infantil quanto adulto (que viu ali aquele clima nostálgico do Tom Hanks em Quero Ser Grande, só que com poderes). Arlequina e as Aves de Rapina também foi um filme muito divertido, tendo como principal qualidade o fato de irritar nerdolas que reclamam de “lacração” (hahahahahahahahahaha, eu não me aguento! Hihi!). E logo depois, no mesmo ano, a diretora Patty Jenkins provou que mulheres podem, sim, estar no mesmo patamar de diretores homens que fazem filmes ruins, lançando Mulher Maravilha 1984, que inovou em seu estilo sendo uma bomba de qualidade inversamente proporcional a do primeiro filme da Amazona, de 2017.

    E aí temos O Esquadrão Suicida!

    Voltemos no tempo um pouquinho antes de falar dessa novo filme. Esquadrão Suicida, filme de 2016 que nos apresentaria pela primeira vez nos cinemas a Força-Tarefa X, foi um fiasco! A história que chegou aos cinemas quase não fazia sentido, a equipe pequena deixava claro que quase ninguém morreria (exceto o injustiçado Amarra) e a ameaça que eles enfrentaram era risível (uma feiticeira rebolante). Fora o Coringa, que andava pelo entorno do filme sem propósito algum para a trama e que não faria falta alguma se fosse completamente limado do corte final. Aliás, dizem que existe um “snydercut” do filme do David Ayer que seria melhor do que aquilo que vimos. Bobagem, não tem conserto não! Mas por alguma razão que ninguém sabe qual (cof, cof, Arlequina, cof), o filme acabou caindo nas graças da galera do marketing e rendeu boas vendas de cadernos, camisetas e tatuagens de palhacinhas. Esquadrão Suicida, afinal, era uma excelente ideia, só que porcamente executada. Merecia uma segunda chance. E aí veio o filme de 2020.

    Os primeiros 14 minutos de O Esquadrão Suicida é tudo que o filme inteiro de 2016 deveria ter sido! Uma missão secreta de infiltração com vilões altamente dispensáveis, ação, traição, mortes e execução por deserção, tudo está ali! Em CATORZE minutos! Não é preciso muito tempo de tela pra se explicar do que se trata a Força-tarefa X, nem por quê eles têm o apelido de Esquadrão Suicida, nem muito tempo explicando o background de cada personagem, porque eles são descartáveis. Um cara russo que é proficiente em arremesso de dardos, um que ninguém sabe quais são os poderes, outro que é, literalmente, uma doninha… Ótimo, vamos pra ação!

    Uma coisa que vemos muito em filmes de heróis é a economia de personagens, principalmente vilões. Geralmente, não usam muitos para não desperdiçar o que poderia ser usado mais tarde, ou apenas mostram um vislumbre, como foi com o Darkseid no Snydercut, para que se plante a semente de um filme futuro que, na real, nunca acontece. James Gunn faz o oposto disso. Nunca usaram o Starro como vilão em nenhum filme da Liga? Bora botar ele aqui! Pacificador, Sanguinário, Bolinha…? AH, MANDA PRO PAI! Não tem nenhuma vergonha de se utilizar de personagens que, vamos ser sinceros, não teriam outra chance de aparecer no cinema mesmo! Diferente de Snyder, que parece ter vergonha de personagens galhofa como o Jimmy Olsen (que ele matou na versão estendida de BvS), Gunn abraça a estética dos comics em todos os elementos de seu filme, seja nos uniformes bregas como o de Dardo ou do Pacificador, seja na própria narrativa. O diretor não tem vergonha de colocar dois personagens em CGI totalmente irrealistas para os padrões Snyderescos, e nos brinda com Doninha e Tubarão-Rei, sendo esse segundo o mais carismático de todo o filme (com voz do Garanhão Italiano Sylvester Stallone).

    O Esquadrão Suicida é um filme que não tem vergonha de suas origens nos gibizinhos. Ao contrário, abraça todo esse absurdo, conta com a suspensão de descrença do público e nos entrega diversão amalucada e violenta da mais alta qualidade! Claro que, passada algumas semanas de seu lançamento, já sabemos que o filme flopou nas bilheterias. Infelizmente, isso se dá mais por questões externas, como o marketing confuso (é uma sequência, um remake ou um reboot?), a classificação indicativa alta, o elenco com grande número de personagens desconhecidos e, obviamente, a pandemia que impossibilita a lotação das salas de cinema. Ainda assim, é possível que o filme tenha lançado algumas das sementes que germinarão nos próximos filmes da DC, tanto no tom quando na estética e, esperamos, com bons roteiros e direção ousada. Pode não ser o melhor filme da DC de todos os tempos, mas com certeza é o mais importante dessa década!

  • Crítica | Shaun, o Carneiro: O Filme – A Fazenda Contra-Ataca

    Crítica | Shaun, o Carneiro: O Filme – A Fazenda Contra-Ataca

    Em 2007 o mundo conhecia uma nova série de animação em stop motion derivada do estrondoso sucesso de Wallace e Grommit. Spin off do episódio “Tosa completa”, o carneirinho Shaun ganhou seu próprio universo de aventuras, vivendo em uma fazenda com outros carneiros e ovelhas e sendo pastoreado pelo cãozinho Bitzer. A série fez sucesso entre as crianças e logo ganhou o mundo, com seis temporadas até agora e uma nova série derivada, voltada para um público ainda mais infantil. Tamanho sucesso rendeu ao carneirinho o filme Shaun: O Carneiro em 2015 e uma sequência lançada em 2019, intitulada Shaun, o Carneiro: O Filme – A Fazenda Contra-Ataca.

    O novo filme de Shaun, dirigido por Will Becher e Richard Phelan,  é muito mais do que uma simples sequência de esquetes ou um episódio comprido da série. Ele apresenta os personagens de forma bastante orgânica para aqueles que ainda não estão familiarizados com os bonequinhos de massinha, de forma leve e divertida. Logo de cara, espectadores mais velhos e atentos podem perceber referências a clássicos da ficção científica em easter eggs espalhados pelo cenário (a loja de pneus “H.G.Wheels” é uma delas) e pela própria trilha sonora. A pacata cidadezinha de Mossingham se torna alvo de olhares curiosos devido ao avistamento de um disco voador nos seus arredores. E é na fazenda que o contato imediato de terceiro grau ocorre, quando Shaun descobre a existência de Lu-La, o simpático alienígena perdido na Terra.

    Temos então alguns núcleos de personagens cujas histórias são contadas em paralelo. Vemos Shaun e Lu-La interagindo e buscando uma volta ao lar para o ET, o governo caçando evidências de OVNIs e o fazendeiro tentando de alguma forma lucrar com o novo interesse dos seus conterrâneos em ficção científica. Tudo é feito com muito humor e gags visuais, já que não existe diálogo algum em seus 86 minutos de exibição.

    Becher e Phelan conseguem trazer para um longa-metragem toda a diversão da série animada, porém de forma mais grandiosa e cheia de detalhes. Tudo parece ser muito bem pensado para funcionar nesse universo, e por vezes a excelência nos detalhes nos fazem acreditar que esse mundo é de verdade, seja nos objetos cênicos ou nos cenários muito bem elaborados. O desenrolar da trama também se faz presente nesses detalhes, seja através da iluminação ou do timing correto de uma piada, passando pela trilha sonora, é realmente impressionante a qualidade do material exibido. Shaun, o Carneiro: O Filme – A Fazenda Contra-Ataca é um ótimo filme para crianças e, apesar de se escorar em um tema bastante clichê, também tem seus atrativos para o público mais velho, que  poderá notar uma boa releitura de elementos já considerados batidos em outras produções, mas que aqui se torna bastante agradável.

  • Resenha | Superman: Identidade Secreta

    Resenha | Superman: Identidade Secreta

    Ouça nosso podcast sobre Superman: Identidade Secreta.

    Como seria a sua vida se você tivesse o mesmo nome do mais famoso super-herói da ficção de todos os tempos? Ou ainda: o que aconteceria se, por motivos desconhecidos, você acabasse descobrindo ter os poderes desse super-herói? Essa é a premissa básica da minissérie Superman: Identidade secreta, de Kurt Busiek e Stuart Immonen. Clark Kent é um adolescente de Picketsville, Kansas, que cresceu tendo seu nome associado aos gibis do Superman, ganhando brinquedos e todos os tipos de quinquilharias com o personagem estampado em todos os seus aniversários. Clark nunca gostou de ter o mesmo nome do personagem, nunca se sentiu à vontade com as piadas que faziam no colégio e até mesmo sofria bullying por isso. Assim, o garoto se tornou bastante reservado e apreciava mais redigir ensaios em uma velha máquina de escrever do que socializar com outros de sua idade. Até o dia que o impensável acontece: Clark descobre, em meio a um isolado acampamento, que tem exatamente os mesmos poderes do personagem fictício que lhe emprestava nome e sobrenome!

    A história de Busiek e Immoen procura emular o mundo real, no qual vivemos, e como um adolescente tímido agiria nessa descabida situação. Clark tem muitas dúvidas sobre a origem de seus poderes, mas ainda assim os esconde da melhor forma que pode, a fim de evitar problemas para as pessoas ao seu redor. O jovem passa a usar suas extraordinárias habilidades para fazer o bem, salvar pessoas, evitar catástrofes – mas atuando nas sombras e nunca se revelando. Até o dia em que uma grande enchente assola o Kansas, e ele se vê obrigado a agir em plena luz do dia. As pessoas passam a falar sobre ele nas ruas e nos jornais, muitos e muitos boatos são espalhados e o xará do Superboy precisa tomar uma decisão: mostrar-se ao mundo ou continuar nas sombras.

    Se essa primeira parte da história mostra sua adolescência no Kansas (e por isso o capítulo é sabiamente intitulado Smallville), a segunda parte mostra sua vida numa grande metrópole. Seja por ironia do destino ou não, Clark se torna um grande escritor – embora não queira ser repórter – e vai trabalhar numa redação. Os paralelos com a vida do Superman continuam, quando ele conhece Lois Chaudhari (mais uma piada de seus amigos tentando formar um casal “Lois & Clark”). Contudo, Lois se torna realmente sua companheira, melhor amiga, namorada e por fim, esposa, tendo com ela uma vida longa e feliz. É realmente muito bonito vermos, em um quadrinho adulto, um casamento longevo baseado no amor, na confiança e no respeito mútuo dessa forma. O casal se mostra muito bem entrosado nos capítulos a seguir criando suas filhas gêmeas com amor e dedicação.

    Durante toda a história, existe obviamente um conflito de bastidores. Afinal, de onde veem os poderes de Clark? O governo norte-americano parece muito interessado em capturá-lo, e as maiores cenas de ação da HQ consiste nas tentativas dos militares de alvejá-lo, com armamento cada vez maior. Clark, já assumindo o manto do kryptoniano como sua identidade secreta, precisa enfrentar bombas e mísseis, burlar radares e satélites. Mesmo quando capturado, Busiek não nos dá muita pistas de como os poderes surgiram. Vemos um laboratório bastante suspeito, corpos de possíveis outros “supermen” (inclusive bebês), mas nada de concreto. O mistério na história é acertado, e não faz diferença para a trama não termos tudo mastigado. Deixar a origem em aberto foi uma excelente decisão do autor.

    Em uma trama bastante introspectiva, vemos esse super-homem envelhecer com suas dúvidas, incertezas – mas também mantendo-se íntegro e fiel aos seus princípios. A arte de Immonen é impressionante ao passar para o leitor essa atmosfera de “mundo real”, ainda que bastante estilizada em vários momentos. As páginas duplas são impressionantes, e diferente de outras obras da DC Comics que mostram vários personagens ao mesmo tempo lutando entre si, aqui Immonen se empenha em refletir na paisagem a solidão de Clark Kent. Não temos um grande vilão como Lex Luthor, Brainiac ou Sr. Mxyzptlk para enfrentar o personagem, mas eles não fazem falta nessa história. Temos sim, um antagonista, mas nem de longe um vilão burlesco com planos mirabolantes. Tanto que seu relacionamento com Clark acaba sendo um acordo de cavalheiros em determinado momento. Vemos um Superman muito realista, humano e sentimental, em uma história bastante contemplativa que faz justiça ao nome do maior super-herói de todos os tempos.

    Superman: Identidade Secreta já foi publicado no Brasil em três momentos diferentes. Em sua primeira versão, em 2005, a Panini lançou a HQ na forma de minissérie em quatro edições, encadernada em uma única edição no ano seguinte. Já no aniversário de 80 anos do personagem, a obra ganhou um encadernado de capa dura à altura de sua grandeza, com um selo comemorativo e cartões especiais acompanhando a edição.

  • Felipe Morcelli, do Terra Zero e ComicPod, falece em SP

    Felipe Morcelli, do Terra Zero e ComicPod, falece em SP

    Foi com muito pesar que recebemos a notícia do falecimento do editor-chefe e fundador do site Terra Zero, Felipe Morcelli, na noite dessa quarta-feira (12) em São Paulo, devido a complicações de uma pancreatite.

    Morcelli foi um grande nome nos meios de divulgação da cultura pop, em especial dos quadrinhos. Escreveu os livros Fazendo o Homem Acreditar, sobre a trajetória editorial do Superman e A Caminho da Justiça, sobre o Batman. Estava também desenvolvendo um livro sobre o personagem Shazam, que esperamos que seja publicado agora. Na podosfera, Morcelli era um dos responsáveis pelo ComicPod, e foi um grande colaborador do nosso site, contribuindo em várias participações especiais em nossos podcasts da Agenda Cultural e VortCast.

    Grande fã do Superman, Morcelli era um entusiasta dos quadrinhos e produções da DC Comics e nos deixou um grande legado de informações e análises sobre a editora, tanto em textos quanto em podcasts. A equipe de editores e redatores do Vortex Cultural lamenta profundamente sua partida tão prematura, e se solidariza com sua família e amigos.

    Deixamos aqui também a homenagem escrita pelo colega Pablo Sarmento e o lindo texto do nosso camarada Delfin, ambos do Terra Zero, além emocionante live do amigo Daniel HDR. Nos vemos no multiverso!

    Arte de Daniel HDR para o livro “Fazendo o Homem Acreditar”.
  • Resenha | Tio Patinhas por Carl Barks: A Coroa Perdida de Gengis Khan

    Resenha | Tio Patinhas por Carl Barks: A Coroa Perdida de Gengis Khan

    Após a saída dos quadrinhos Disney da editora Abril Jovem, ficou a dúvida entre os leitores se as coleções dedicadas a Carl Barks e Keno Don Rosa teriam continuação em alguma outra editora, uma vez que a Culturama assumiu apenas as edições mensais das revistas. A aflição passou quando a editora Panini anunciou ter assumido a publicação dessas e de outras séries em capa dura da Disney. Assim, continuando de onde a editora anterior parou, a Panini lança Tio Patinhas por Carl Barks: A Coroa Perdida de Gengis Khan primeiro volume da série a abordar o tio do Pato Donald tanto no título quanto nas histórias. Embora tenha Tio Patinhas no título e no conteúdo, não se trata de uma nova série, e sim do volume 16 da chamada “Coleção Carl Barks Definitiva”, que não é publicada em ordem cronológica.

    Para uma edição de estreia na casa, a Panini acertou em cheio na escolha do material. O livro traz as histórias publicadas originalmente em Uncle Scrooge nos anos de 1956 a 1961, e apresenta verdadeiros clássicos que já foram revisitados por outros artistas e outras mídias. Além da história que dá nome ao volume (que aliás, é uma história bem pequena se compararmos a outros épicos da edição), temos vários clássicos de Barks que valem a pena serem lidos.

    Fabricantes de terremotos é um desses clássicos que atingiram outras mídias. Além da excelente adaptação no desenho Duck Tales de 1987, os habitantes rechonchudos do subterrâneo de Patópolis apareceram em videogames (no antigo Nintendinho e na remasterização para PlayStation 3) e no reboot dos Caçadores de Aventuras de 2017. Na história, Patinhas descobre uma civilização responsável pela criação de terremotos, e teme pela sua caixa-forte.

    Em Qual o mais rico do mundo? vemos a primeira aparição do Pão-Duro Mac Mônei, o “duplo do mal” do Tio Patinhas. Diferente de suas aparições em Duck Tales, Mac Mônei é originalmente sul-africano, e não escocês (algo que o reboot de 2017 resolveu de forma inteligente). Essa história é bem interessante por mostrar que, apesar de tudo, Patinhas não é inescrupuloso e mantém ainda alguns princípios morais – coisa que seu rival não apresenta nem de longe.

    A edição ainda conta com pérolas como O elemento mais raro do mundo e A fantástica corrida de barcos, mas talvez a melhor ou mais importe história seja Os índios Nanicós. Nela, Patinhas demonstra que nem tudo deve ser lucro – embora seu espírito capitalista mantenha-se presente o tempo todo, o velho rico percebe que, embora possa extrair recursos naturais de uma reserva florestal, talvez ele não deva fazê-lo. Talvez hoje a história traga alguns problemas com a retratação estereotipada dos nativos-americanos, mas a mensagem final é boa, num saldo geral. Vale notar o cuidado que o tradutor Marcelo Alencar teve ao adaptar a fala dos índios, que no original é toda rimada como num poema de Henry Wadsworth Longfellow – diferente do que a tradução da Abril havia feito em sua continuação na coleção de Don Rosa.

    Ainda sobre tradução, um ponto a se destacar é a decisão da editora de manter alguns termos que talvez não façam mais sentido nos dias de hoje. Traduzir dólar por “pataca” talvez fizesse sentido décadas atrás, quando as revistas eram regionalizadas e nosso dinheiro mudava de nome como o Donald muda de emprego, mas hoje com internet e tudo mais, podemos esperar que as crianças entendam que Patópolis não fica no Brasil e sim nos Estados Unidos. Da mesma forma, manter o sobrenome de Tio Patinhas como “Mac Patinhas” ao invés de “McPato” é uma decisão um tanto polêmica, já que o segundo se assemelha mais ao original. Além disso, o personagem é chamado de Patinhas McPato nas duas séries animadas de Ducktales, nos quadrinhos da Culturama e até mesmo nas próprias novas publicações da Editora Panini. O tradutor Marcelo Alencar explicou em suas redes sociais que manteria Mac Patinhas apenas nas coleções de Barks e Rosa, por se tratarem de continuações da outra editora e que, em possíveis reedições da série completa, haverá alteração nesse detalhe. Outra mudança significativa na troca de “casa” foi o letreiramento, que passa a ser de responsabilidade do Studio Animatic. Nas edições da Abril as letras ficavam a cargo da veterana Lilian Mitsunaga, sempre extremamente competente e que faz falta nessa nova empreitada. Ainda sobre os diálogos, chega a incomodar muito os erros de revisão dos textos, que não são poucos.

    O formato do álbum se mantém o mesmo, e o padrão de qualidade gráfica não se altera, o que nos dá uma sensação tranquila de continuidade. Para o fã de quadrinhos Disney e, mais especificamente, de Barks, fica o alívio de não ter sua coleção definitivamente interrompida, mas também a esperança de vê-la, num futuro próximo, em uma nova reedição, com formato maior e mais parecido com o original da Fantagraphics.

    Compre: Tio Patinhas por Carl Barks: A Coroa Perdida de Gengis Khan.

  • Resenha | Bolland Strips!

    Resenha | Bolland Strips!

    Brian Bolland é um artista britânico muito conhecido pelos leitores de quadrinhos norte-americanos devido à sua incrível participação na graphic novel A Piada Mortal, de Alan Moore para a DC Comics. Nela, Bolland captura o texto pesado e sombrio de Moore para uma história do Batman com o Coringa em traços detalhados e ricos em expressões faciais, além dos excelentes contrastes de luz e sombra. Talvez essa riqueza de detalhes seja a marca característica de Bolland, que começou sua carreira profissional anos antes de ir para a DC, trabalhando em publicações inglesas como 2000 A.D., principalmente nas histórias do Juiz Dredd. Por seu traço exímio, Bolland fez carreira nos Estados Unidos desenhando principalmente capas, visto que sua arte leva um tempo muito maior para ser produzida do que o habitual para revistas mensais. Ainda assim, grandes obras como Camelot 3000 constam no seu currículo.

    Bolland Strips é uma coletânea publicada pela Editora Nemo em 96 páginas em preto e branco, com miolo em couché e capa dura, trazendo material autoral e muito longe das histórias de super-heróis. O álbum conta com a íntegra de sua série A Atriz e o Bispo e das tirinhas autorreferenciais do Sr. Mamoulian. É interessante notar a diferença de estilo entre as duas obras, onde A Atriz e o Bispo contém o traço característico de Bolland enquanto Sr. Mamoulian é mais experimental e despojado, às vezes tosco.

    A Atriz e o Bispo conta a história desse improvável casal e é praticamente centrada na quebra de expectativas do leitor. A Atriz nos é apresentada graficamente com características de dançarina burlesca, com seu corpo altamente voluptuoso – em várias cenas de nudez – e figurino extravagante, como se estivesse sempre em cena. Enquanto isso, o Bispo jamais tira suas vestes sacerdotais e carrega seu báculo, casula e mitra mesmo ao fazer suas necessidades fisiológicas ou, simplesmente, dormir. Representado como um velho gordo e abatido, temos na história do Bispo a tal da quebra de expectativa que permeia o texto: nada é exatamente o que parece, e o religioso tem um passado com máculas das quais ele não consegue se libertar, e que molda também o seu caráter, sua mais que aparente falta de fé e a hipocrisia de quem tem tudo aquilo que deseja bem em sua cama, mas ainda não se esquiva de um rabo de saia. O personagem é, sobretudo, uma caricatura de um conservadorismo religioso tacanho que, mesmo longe de suas afirmadas convicções, não consegue se desapegar das aparências de fachada. Uma crítica aos costumes e morais religiosas que vemos se repetir na edição mais adiante.

    A personagem da Atriz traz também essa quebra de estereótipo que o próprio autor definiu. Se sua representação desenhada é de uma mulher com todas as características de uma meretriz sem talento e aproveitadora de um velho rico, sua personalidade está um tanto longe disso. A Atriz se mostra extremamente habilidosa em vários aspectos, seja fazendo malabarismos com facas ou simplesmente preparando o jantar, mas é válido notar o quão culta ela é. Sempre lendo um livro ou aprendendo uma nova língua, a personagem não se resume a profundidade de um pires que se faz entender no início do conto. A relação entre os dois – apesar de uma escapada com alguém nas sombras que com certeza é o Alan Moore! –  é feita de afeto, carinho e cuidado. Talvez o leitor se frustre com o final que, novamente, quebra uma expectativa criada durante toda a história, mas o desfecho segue a linha do autor de se afastar da fantasia e deixar o leitor tirar suas próprias conclusões.

    Já a segunda parte do álbum conta com as tirinhas do Sr. Mamoulian, e é onde Bolland se sente mais livre para dizer aquilo que pensa, ou simplesmente não dizer nada! No texto introdutório ele afirma que se forçou a fazer suas páginas como se estivesse escrevendo uma carta, e que do jeito que saísse, ficaria. Assim, ele afirma ter vários erros, tanto de desenho quanto de escrita (que a tradução talvez não tenha repassado para o leitor), mas que seria algo fluido e sincero. Não se trata de uma grande ensaio sobre a vida, mas algumas reflexões do autor ficam evidentes. Ele continua criticando o conservadorismo tal qual na primeira parte do livro, mas aqui ele também tece ácidas críticas ao pós-modernismo e a posições progressistas. Se em A Atriz e o Bispo ele quebra a expectativa ao representar a figura feminina, aqui ele faz exatamente o oposto: sua personagem Cara de Merda é um completo estereótipo negativo de feminista masculinizada com posições incoerentes. Aliás, todas as personagens mulheres da série são estereótipos, o que nos faz pensar que o autor tenha algum tipo de problema em se relacionar com o sexo oposto (na verdade, em mais de uma ocasião, o próprio alter ego de Bolland chega a afirmar isso).

    Fecha a edição algumas hqs de uma página, com uma representando um trecho cruel da Bíblia apresentado no Livros dos Reis, e umas ilustrações que vale a pena parar para ver os detalhes (principalmente os escondidos na estola do Bispo), que mais uma vez aponta para uma crítica à religião. Bolland Strips! não é um quadrinho convencional e muito de seu conteúdo é aberto a interpretações. O trabalho de tradução está realmente muito bom, principalmente na primeira parte onde a adaptação dos versos está impecável. É nítido o esforço da Editora Nemo em trazer um material muito bem revisado e com o esmero merecido para a obra de um artista tão aclamado entre leitores de quadrinhos.

    Compre: Bolland Strips!.

  • Resenha | Donald Jovem

    Resenha | Donald Jovem

    O Pato Donald é um dos mais populares personagens dos Estúdios Disney, ofuscando até mesmo o camundongo mascote do conglomerado – principalmente quando pensamos no legado deixado pelas histórias em quadrinhos. São 86 anos desde a criação do personagem até os dias de hoje, e sua trajetória passa por desenhos animados, videogames, álbuns de figurinha e toda e qualquer mídia imaginável. Porém, diferente de seu tio ricaço e avarento, não temos muito material considerado “definitivo” sobre seu passado. Não existe nada equivalente à Saga do Tio Patinhas, de Keno Don Rosa, para contar como e por quê Donald é o que ele é hoje. O personagem vive num eterno presente, sendo um homem comum, vivendo uma vida comum – ou ao menos tentando. Ainda assim, existem diversas pistas, mesmo que algumas sejam contraditórias, sobre partes de seu passado. Sabemos, por exemplo, que ele cresceu no campo, conforme mostrado em seu curta animado de estreia, A galinha sábia, de 1934. Várias hqs fazem referência à essa época, e mesmo desenhos animados das década de 1930 e 1940, bem como um especial do programa Disneylândia, que inclusive mostra a Vovó Donalda. Também podemos dizer que é canônico o fato de Donald ter crescido sem conhecer o seu Tio Patinhas, criação de Carl Barks na história em quadrinhos Natal nas montanhas, de 1947.

    Tomando essas e mais algumas pistas deixadas por roteiristas do pato durante décadas, Donald Jovem é uma minissérie em oito partes publicada no Brasil pela Culturama em um volume único de capa dura. Escrita por Francesco Artibani e Stefano Ambrosio, a série tenta preencher esse espaço de tempo em que Donald deixa o sítio da Vovó para estudar na cidade e acaba conhecendo seus amigos mais famosos. Porém, diferente do que Don Rosa fez na Saga do Tio Patinhas, aqui não vemos um período histórico acurado com todo o repertório anterior. Ao contrário, o pato adolescente vive suas aventuras nos dias de hoje, jogando videogames e salvando músicas em pendrives.

    O primeiro capítulo mostra justamente elementos de sua primeira aparição em Silly Symphonies, como o clubinho-barco no riacho e seu amigo Porcolino – que na hq é mais um espertalhão do que o preguiçoso do desenho. A dupla passa todo o tempo jogando videogame e aprontando confusões, que levam a um desastre ambiental no campo, o que faz com que Donald seja obrigado a deixar a vida na roça e ir para a cidade. Assim, Patinhas garante a caríssima mensalidade que permite ao seu sobrinho estudar em um colégio interno de Ratópolis. Duas coisas são interessantes de se notar: a primeira é a forma como Patinhas McPato monitora a vida de seu sobrinho remotamente sem que Donald saiba – afinal, eles apenas se conheceriam em Natal nas Montanhas. A segunda curiosidade é ver que, nessa edição, Ratópolis é uma cidade diferente de Patópolis, visto que nas traduções nacionais da Editora Abril ambas eram uma só cidade – mas pode ter sido apenas um deslize da tradução.

    No colégio, Donald conhece seu colega de quarto: ninguém menos que o próprio Mickey Mouse, em uma versão de franjinha emo que já nasceu datada (ainda existem emos hoje em dia?). Mickey parece ser o personagem mais descaracterizado de todos. Ao invés do jovial ratinho aventureiro, mostrado nas tiras de Floyd Gottfredson, aqui ele é tímido e inseguro. Afinal, o foco da história, pelo que os roteiristas deixam claro, deve ser unicamente o Pato Donald. Conhecemos também o Pateta, em uma versão também de franja, porém mais voltado para o estilo nerd/hipster. Causa estranhamento ver essa versão mais “inteligente” do Pateta, que curte ficção e mestra RPG para seus amigos. As meninas estão presentes também, sendo que Margarida é uma esportista que a princípio ignora Donald, que se apaixona por ela à primeira vista, e Minnie mantém um crush secreto pelo Mickey – que é recíproco, mas ambos não percebem.

    Uma personagem que aparece de forma um tanto surpreendente é a Tudinha, que nos quadrinhos italianos é a parceira romântica de João Bafo de Onça, mas na série é uma garota que sofre bullying de seus colegas de escola por gostar de coisinhas fofas, como uma mochila de coala. Bafo, por sinal, não aparece e, pra dizer a verdade, faz falta na história. Ao invés disso, temos um valentão genérico na escola chamado de Nero, que poderia muito bem ser Bafo. Foi mesmo uma oportunidade perdida.

    As histórias têm vários furos de roteiros, personagens  mal construídos e inconsistências que saltam aos olhos. Como Donald conhece Mickey, Pateta e a turma toda no colégio que deveria ser de ultra-ricaços? Seriam eles também de famílias de milionários? Por onde anda Dumbella, irmã gêmea de Donald? Eles não deveriam ter crescido juntos? Jamais saberemos…

    Para leitores mais puristas, a série pode não agradar por fugir muito de algo que se possa considerar canônico, além do design “moderno” dos personagens que reflete o que pessoas de meia idade imaginam que seja a representação do jovem de hoje. Para leitores mais jovens, por outro lado, pode ser uma excelente leitura, pois o texto flui com o dinamismo sempre presente nas hqs Disney italianas, com quadros grandes e balões de fala enxutos. A arte varia bastante do bom para o médio, mas as cores vivas (mas não saturadas) e o “movimento” das cenas a torna bastante agradável. Algumas piadas parecem um tanto forçadas e até escatológicas (Donald parece não se importar com a limpeza do banheiro ao dividir o quarto com Mickey), outras até mesmo previsíveis. Donald Jovem pode não ser a Saga definitiva do pato encrenqueiro, mas serve como uma boa diversão – principalmente para crianças na faixa dos dez anos de idade. O que acaba sendo uma vantagem, no fim das contas, pois serve para apresenta-las ao incrível mundo dos quadrinhos Disney.

    Compre: Donald Jovem.

  • Resenha | Coisas Frágeis – Neil Gaiman

    Resenha | Coisas Frágeis – Neil Gaiman

    Dentre os grandes autores britânicos a trabalhar com histórias em quadrinhos estadunidenses a partir de meados dos anos 1980, Neil Gaiman é com certeza um dos que mais se destacou. Sua obra mais conhecida, Sandman, ainda hoje é reverenciada por milhões de fãs através do mundo, e continua sendo reeditada em encadernados de luxo ou versões comemorativas de aniversário. Nada mais justo, pois os textos do autor trazem não só uma incrível imaginação quanto uma forma sóbria, ora fantástica de se contar histórias. Com textos que abordam a vida humana através da ótica do sobrenatural, Coisas frágeis é uma coletânea de contos do autor escritos e publicados em diversas ocasiões diferentes, que recheiam um volume que, mesmo não utilizando recursos gráficos das histórias em quadrinhos, fazem o leitor imaginar cada cena como algo bastante complexo e, ao mesmo tempo, agradável de se ler.

    Em suas páginas, Gaiman brinca com estilos diversos, chegando a fazer um crossover, logo no primeiro conto, entre o universo de Sherlock Holmes e o mito do Grande Cthulhu, seguindo de certa forma o que seu conterrâneo Alan Moore fez anos antes com A Liga Extraordinária. O autor se utiliza de elementos conhecidos por leitores de várias gerações e que já estão em domínio público para reimaginar Baker Street numa trama que nem mesmo o maior detetive de todos os tempos poderia sequer imaginar.

    De forma mais ou menos similar, vemos claramente em seus contos elementos “emprestados” de outras histórias – sem, contudo, ferir os direitos autorais de seus respectivos autores ou proprietários. Gaiman escreve uma história de ficção científica ambientada no universo de Matrix, outra sobre uma personagem de As Crônicas de Nárnia, e por aí vai. Contudo, a forma com que o autor aborda cada universo retratado é única e diferente, levando o leitor a refletir sobre temas pesados e importantes de forma inédita. Fazer algo novo de velhos e conhecidos conceitos parece ser uma especialidade inerente a Neil Gaiman.

    Dos nove contos apresentados no volume, talvez o que mais denuncie o estilo consagrado de Gaiman seja A vez de Outubro. Aqui, seres elementais da natureza – os meses do ano – ganham características humanas, algo que ele fez com os Perpétuos durante toda a saga de Sandman. Os meses conversam ao redor de uma fogueira e contam seus anseios, medos e incertezas, além de seus próprios mitos e lendas.

    Assim como o personagem Sonho o consagrou nos quadrinhos, foi também em um sonho que o título do livro surgiu para Gaiman: “Acho… que prefiro me lembrar de uma vida desperdiçada com coisas frágeis, a uma vida gasta evitando a dívida moral”. Coisas Frágeis foi publicado pela Editora Conrad no Brasil, e é uma excelente coletânea de contos de Neil Gaiman tanto para aqueles que já conhecem o consagrado escritor quanto para quem ainda não leu nada escrito por ele.

  • Resenha | Legião: Origem Secreta

    Resenha | Legião: Origem Secreta

    Um dos principais supergrupos da DC, a Legião dos Super-Heróis tem uma questão editorial um tanto complicada. Após a Crise nas Infinitas Terras ficou estabelecido que Superman jamais teria sido o Superboy na sua adolescência, quebrando assim a principal motivação dos heróis do futuro para se unirem. Houve uma tentativa, nos anos 1980, de criar um Universo Compacto onde teria existido uma versão jovem de Kal-El, e que essa versão teria se aventurado com os legionários. Mas com a aproximação do reboot conhecido como Novos 52, ficou mais fácil resolver esse tipo de questão.

    Lançado sem o selo Novos 52, Legião: Origem Secreta foi escrita por Paul Levitz e traz de volta todo o clima que as aventuras dos jovens heróis do futuro sempre teve. Conhecemos aqui o século XXXI e nos deparamos com muitos termos científicos “inventados” (as tecno-baboseiras), que dá o clima da ambientação do cenário de forma leve e divertida. A história mostra os bastidores da formação da equipe: após salvarem o milionário R.J. Brande de um assassinato, Cósmico, Relâmpago e Satúrnia formam a Legião, mas essa passagem é mostrada de forma muito rápida no início da série. Levitz parece querer mais mostrar os elementos políticos envolvendo os Planetas Unidos do que a própria interação entre os membros da equipe.

    Algo que faz muita falta nessa edição é a relação entre a Legião e seu amigo do passado e inspiração maior, o Superboy – ou o Jovem Superman, como foi batizado na série animada da equipe. Claro que isso se deve a vários motivos, como os problemas judiciais envolvendo os direitos do personagem de Siegel e Shuster, e as constantes reformulações do próprio passado do Superman, que vez ou outra teria ou não assumido uma identidade heroica na juventude. Nesse ponto, Geoff Johns foi muito mais assertivo em sua Origem Secreta do Azulão, fazendo com que o Superboy tivesse parte na história mesmo sem ter assumido esse nome em nossa época.

    Chris Batista se mostra muito competente na arte e seus desenhos estão cada vez melhores durante a edição, casando perfeitamente com o texto de Levitz. Porém por questões editoriais, a série não foi pra frente e logo foi cancelada. Origem Secreta entra pra História das HQs da Legião como uma boa oportunidade perdida, que se esvaiu graças aos constantes reboots pelos quais a Editora das Lendas passa. Fica, então, como uma boa curiosidade para quem é fã do grupo de heróis adolescentes do futuro.

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  • Resenha | Holy Avenger: Paladina

    Resenha | Holy Avenger: Paladina

    Na última semana de novembro a Jambô Editora anunciou seu último lançamento do ano para a linha Tormenta, a mais bem sucedida franquia de RPG nacional. Em um ano de estrondoso sucesso da campanha de financiamento coletivo da nova edição do livro básico do cenário, com quase 2 milhões de reais arrecadados em pouco tempo, parecia que nada mais poderia surpreender os fãs do RPG de fantasia mais querido do Brasil. Pois a surpresa veio com o anúncio de Holy Avenger: Paladina, há poucos dias da CCXP em São Paulo. Mesmo tendo sido lançada poucos dias depois do anúncio, a primeira leva de exemplares presentes no estoque do stand da Jambô na convenção simplesmente se esgotou antes do último dia do evento.

    A série original foi publicada mensalmente no país de 1999 a 2003, com 40 edições, dois capítulos extras, seis especiais e mais vários derivados, como livro de referência com regras para o antigo sistema de Dungeons and Dragons 3ª Edição (o d20 System). Das páginas da revista especializada em RPG Dragão Brasil, Holy literalmente foi parar no outro lado do mundo, sendo reconhecida pelo ministro da cultura do Japão como um legítimo mangá. Com toda essa bagagem, o roteirista e co-criador de Tormenta Marcelo Cassaro retorna ao texto junto com a mangaká Erica Awano, que novamente assume os desenhos. Quem também retorna é o artista André Vazzios para dar vida e cores à exuberante arte da capa de Awano. Com essa equipe original, seria possível repetir o sucesso de Holy Avenger vinte anos depois? Tudo indica que sim!

    A história se passa no tempo atual do cenário de Arton, o que significa que pode haver alguns spoilers para quem não leu outros materiais da casa, como os romances de Leonel Caldela e Karen Soarele. Nada que estrague a diversão de quem não se importa em ser atualizado aos poucos ou de quem está entrando em contato com o material pela primeira vez. Na verdade, parece haver um certo didatismo não exagerado para que iniciantes possam apreciar a obra sem ter que enfrentar 20 anos de material publicado. Aqui descobrimos a história de uma velha conhecida dos leitores das seções de cartas da Dragão Brasil e da extinta Dragon Slayer: a Paladina! Assim como o Paladino era apenas um personagem cômico que respondia as cartas dos fãs da revista antes de se tornar o ser poderoso das histórias em quadrinhos originais, a Paladina é apresentada aqui como muito mais do que um estereótipo de personagens femininas. Ela tem carisma e personalidade, um background que justifica seu nome peculiar e muita atitude! Seu coadjuvante, Francis, também é bastante peculiar: um bruxo da Tormenta que nasceu com a mácula da invasão infernal que dá nome ao cenário.

    Uma grata surpresa é ver velhos conhecidos de volta, mesmo que na forma de easter eggs pelas páginas. Uma das personagens originais também está de volta já nesse primeiro volume, porém bastante modificada para fazer mais sentido tanto com a lore do mundo de Tormenta quanto com as regras do RPG – algo banal pra quem não joga, mas essencial para os fãs mais ardorosos. O livro é dividido em cinco capítulos, cada um como se fosse uma edição da antiga revista mensal, com 22 páginas. Todo o clima das aventuras originais está ali, inclusive as eventuais aparições das versões chibi de Awano e Cassaro (encarnado no Capitão Ninja), fazendo divertidas considerações sobre a história. Também é interessante ver aparições pontuais de personagens de outras mídias, como a Guilda do Macaco –  mesa de RPG oficial da editora, transmitida via streaming ao vivo no Twitch e mais tarde publicado no YouTube.  É também muito interessante a nova interpretação que Cassaro dá ao Deus da Justiça, Khalmyr, aqui apresentado em sua versão mais legal de todos os tempos! (Sim, Khalmyr pode ser legal! Deixem de ser implicantes com personagens ordeiros, que coisa!)

    Com 128 páginas e capa dura, Holy Avenger: Paladina é uma grata surpresa nesse fim de ano e já prepara o terreno para a nova versão de Arton que veremos a partir de 2020. É uma excelente porta de entrada para iniciantes, mas também de passagem para aqueles que já conhecem os personagens e querem se aventurar de novo pelas terras artonianas.

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  • Crítica | Playmobil: O Filme

    Crítica | Playmobil: O Filme

    Quem nasceu ou foi criança durante a década de 1980 deve se lembrar com bastante nostalgia de dos bonecos Playmobil (ou ao menos se lembra de ter brincado com alguns desses na casa daquele vizinho que tinha os brinquedos mais descolados). Desde então, a marca ficou meio que esquecida em meio a gigantes do mercado com licenças de produtos com maior apelo midiático, como Playskool/Hasbro e sua linha Marvel, Imaginext/Mattel com seus diversos playsets da DC e uma variada linha de produtos do Batman, e a gigantesca Lego, que tem licenciado em seu catálogo aproximadamente tudo que existe. Sendo assim, com o sucesso dos filmes baseados nos bloquinhos de montar da Lego, talvez fosse uma boa ideia para a Playmobil ter um filme que desse um upgrade nas vendas de seus bonecos e cenários.

    Com uma produção complicada, entre adiamentos de data de lançamento, troca de estúdios e falência de distribuidora, Playmobil – O filme chega aos trancos e barrancos aos cinemas em dezembro de 2019 e não decepciona quem já imaginava que seria um filme fraco. Com um roteiro clichê e desenvolvimento da trama totalmente previsível, o filme sequer consegue acertar no marketing, já que a marca Playmobil sequer aparece durante suas 1h e 50 min de duração. Em um filme que funciona como um grande comercial de brinquedo isso é bastante estranho, por vários motivos, sendo o principal a dificuldade de associação por parte do público infantil. O próprio design dos personagens lembra muito pouco os bonecos da marca, principalmente devido as expressões faciais e os olhos, muito diferentes dos brinquedos.

    O filme conta a história da jovem Marla (Anya Taylor-Joy) e seu irmão caçula Charlie (Ryan S. Hill aos seis anos e Gabriel Bateman aos dez). A garota sonhava em viajar e conhecer o mundo, enquanto brincava com seu irmão com os bonecos genéricos de vikings e centuriões romanos, quando uma tragédia interrompe seus projetos futuros e ela se vê obrigada a tomar as rédeas da própria vida muito cedo, além de ter que criar Charlie sozinha. Isso faz com que Marla tenha muito cedo um peso nas costas que tira dela toda a alegria de viver, enquanto Charlie ainda cobra pelas aventuras que vivia com a irmã mais velha. Ao tentar se reconectar com o irmão, os dois são transportados ao mundo mágico de suas brincadeiras de infância, e são transformados nos bonecos com mãos de pinça e pernas pouco ou nada articuladas. Aliás, essa é uma das inconsistências do filme que chegam a incomodar: Marla tem muita dificuldade para andar devido às pernas de Playmobil (que têm movimento muito limitado), mas isso serve apenas como uma gag no começo de sua jornada: poucos minutos depois ela já está correndo feito uma maratonista.

    Ao contrário de Marla, que surge como uma boneca comum no mundo dos brinquedos, Charlie se encarna em um guerreiro bárbaro, extremamente forte e com visual “maneiro”. Em uma luta entre viking e piratas, Charlie acaba sendo separado de sua irmã, que inicia uma espécie de road trip para encontrá-lo novamente e assim voltar para a casa. Com isso, ambos passam por diversos cenários de brinquedo que variam desde pré-história até faroeste e Império Romano. No meio do caminho encontram alguns personagens interessantes, como Del (Jim Gaffigan), um entregador de “feno mágico” que aceita ajudar em troca de moedas de ouro de brinquedo, Rex Dasher (Daniel Radcliffe), um James Bond genérico, a Fada Madrinha (interpretada por Meghan Trainor) e o imperador romano interpretado por Adam Lambert. Ao final, Marla aprende uma importante lição sobre a vida e assim pode voltar pra casa com seu irmão (como em centenas de outro filmes parecidos).

    O filme dirigido por Lino DiSalvo não empolga, não se mantém consistente e chega a ser entediante durante o segundo ato, além de ter um final bastante previsível e clichê. Seus momentos de humor variam bastante entre o pastelão e piadas mais adultas (que “feno mágico” é aquele que deixa quem o come mais alegre e purpurinado?), e o roteiro esquecível não traz grandes surpresas. Talvez seja uma boa opção pra distrair as crianças no período de férias, mas apenas porque os pequenos assistem a qualquer coisa mesmo.

    https://www.youtube.com/watch?v=6cvakjSglZw

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  • Resenha | O Universo de Sandman: Lúcifer – Volume 01

    Resenha | O Universo de Sandman: Lúcifer – Volume 01

    Dentro da nova e ousada empreitada da DC Comics de reavivar os personagens da linha de Sandman, criada por Neil Gaiman entre o fim dos anos 1980 e início dos anos 1990, um velho conhecido surge em um título próprio. Trata-se do Capiroto em pessoa, o mau e velho Lúcifer Estrela da Manhã, que estreia um título mensal escrito por Dan Watters, autor conhecido por trabalhar em séries de mistério como O Sombra. As primeiras edições da série mensal foram lançadas por aqui pela Editora Panini em um encadernado reunindo seus seis números iniciais, sob o título O Universo de Sandman: Lúcifer – A infernal comédia. Essa edição de capa cartonada é a última da série que ainda carrega a marca DC/Vertigo na capa, pois as outras revistas do mesmo universo lançadas logo depois vieram com o novo selo DC Black Label.

    Com o relativo sucesso da série televisiva de Lúcifer, essa edição pode ser uma boa porta de entrada para leitores iniciantes, embora o capeta aqui seja um tanto quanto diferente do interpretado por Tom Ellis na televisão. Lúcifer aqui é um velho fraco e sem memórias, preso em um vilarejo no meio de lugar nenhum, com delírios de grandeza. Uma boa sacada, pois nos faz imaginar o que teria acontecido com o anjo caído para que ficasse em tão deplorável situação. Paralelamente, temos a história do detetive John Decker, que tem lidar com a perda da esposa enferma e acaba caindo no meio de uma conspiração de demônios em um asilo.

    A história tem um ritmo frenético, vários personagens nos são apresentados em pouquíssimo tempo, mas aos poucos ela vai se ajustando e começamos a entender o que está se passando. Lúcifer, com seu corpo praticamente se decompondo a cada momento, vai desenterrando (literalmente) os esqueletos de seu passado. Uma ou outra dica já tinha sido nos dada na história inicial de O Sonhar – que se repete nessa edição, assim como nas outras duas revista da linha – e confirmamos a principal aqui: Lúcifer tem um filho abandonado, chamado Calibã. A história desse filho, de sua mãe e de como ele foi concebido é uma das melhores partes do livro.

    A arte de Max Fiumara e Sebastian Fiumara torna a revista ainda mais imersiva no contexto infernal da história, chegando a realmente assustar em momentos mais introspectivos do personagem John Decker ou no horror bestial dos demônios quando necessário, e a paleta de cores utilizada dá o exato tom que o roteirista quer nos passar. A história é realmente surpreendente, e deixa um gancho no final para que o leitor não se aguente mais em esperar a próxima edição (spoiler: o retorno de Lúcifer acaba provocando a ira dos Céus!).

    A infernal comédia é um ótimo título de terror pra quem quer começar a ler os quadrinhos adultos da DC, além de apresentar personagens novos juntos com velhos conhecidos, e ainda faz parte de algo maior, uma história contada por várias mãos em séries diferentes da editora.

    Compre: O Universo de Sandman: Lúcifer – Volume 1.

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  • Resenha | Zero Hora: Crise no tempo

    Resenha | Zero Hora: Crise no tempo

    Quando comecei a ler quadrinhos da DC Comics, lá pelos idos de 1994, uma das primeiras coisas que eu deveria saber era que uma tal Crise nas Infinitas Terras tinha acontecido. Um evento cósmico catastrófico que destruiu o Multiverso e reiniciou a cronologia dos super-heróis do zero. Como eu era uma criança de onze anos, achei o máximo! Não precisaria me importar com histórias de 50 anos atrás, tinha pouca coisa pra eu absorver. Então, quando Zero Hora – Crise no tempo foi anunciada, claro que fiquei bastante empolgado! Eu poderia acompanhar um evento parecido com a Crise, mas não em reedições ou por revistas velhas em sebos, e sim durante seu lançamento! A expectativa era grande!

    Zero Hora foi lançada pela editora Abril Jovem em cinco edições com numeração retroativa (começando no nº4 e terminando no zero) entre agosto e outubro de 1996. Além dessas edições, todas as revistas da casa tinham interligação com a trama principal (os chamados tie-ins), o que dava um sabor a mais no desenrolar do evento na época. A promessa era de que Zero Hora iria revolucionar a cronologia da DC da mesma forma que a Crise tinha feito. Olhando hoje em retrospecto, foi só decepção…

    A história de Zero Hora é bastante confusa. Começa com um vilão misterioso matando o Senhor do Tempo em um futuro distante. O vilão afirma ter poder para destruir o tempo e controlar a entropia e “endireitar as coisas”. Quem acompanhou as revistas mensais da época tinha visto o surgimento do vilão Extemporâneo, uma evolução do ex-herói Rapina, o Monarca de Armageddon 2001. Nos editorais, dizia-se que o vilão de Zero Hora seria um ex-herói, então fazia todo sentido imaginar que fosse o Extemporâneo. Surpreendentemente, fomos enganados! Extemporâneo estava sendo manipulado por um novo vilão, que se revela na penúltima edição. Até a grande revelação, a história é bastante confusa, com versões dos heróis de linhas do tempo diferente aparecendo e interagindo com suas versões da época. A linha do tempo estava sendo apagada com energia cronal (seja lá o que isso for), e todas essas versões dos personagens corriam o risco de desaparecer para sempre — algo muito parecido com as infinitas Terras da Crise original.

    Durante a Crise no Tempo, vemos o Flash/Wally West morrer quase da mesma forma que seu tio Barry, só que sem emoção e com fraco desenvolvimento de roteiro. A Sociedade da Justiça da América se desfaz, com vários membros morrendo de velhice, e o Gavião Negro… Ah, cara, melhor nem perguntar! Fizeram uma lambança com o Gavião que não levou a lugar nenhum! O importante é que descobrimos quem é o vilão: Hal Jordan, o ex-Lanterna Verde da Terra, agora assumindo o nome de Parallax. Jordan quer “consertar” o universo, mas para isso ele teria que destruí-lo primeiro. Ao absorver a energia da bateria central de Oa em Crepúsculo Esmeralda, Hal ganhou poderes semelhantes aos de um deus.

    Assim, os heróis da casa se unem pra derrotar o antigo aliado, com a interferência divida do Espectro, e Hal é alvejado no peito por uma flecha de seu melhor amigo, o Arqueiro Verde. Com a ajuda de Metron, Tempus e do Espectro, os heróis viajam no tempo até o Big Bang e assistem à recriação do Universo, seguindo a ordem natural das coisas, com mudanças sutis em alguns pontos. Ao final da história, temos pontos em aberto que levariam às edições mensais, como o destino amargurado de Oliver Queen, a viagem pela Força de Aceleração de Wally West e o novo staus quo do Lanterna Verde/Kyle Rayner.

    A minissérie é praticamente incompreensível sem a leitura dos tie-ins, e as mudanças editoriais que gerou duraram pouco tempo, com exceção da posição de Hal como vilão recorrente nos próximos anos e todo o pano de fundo da Tropa dos Lanternas Verdes (que foi extinta). A arte de Dan Jurgens oscila entre o espetacular e o regular, e vemos claramente a influência do arte-finalista Jerry Ordway nas melhores cenas. Zero hora completa 25 anos de sua publicação original nos EUA e ganha uma republicação pela primeira vez em capa dura no Brasil, mas não envelheceu bem e vale ser lida apenas como registro de uma época.

  • Resenha | O Universo de Sandman: O Sonhar – Volume 1

    Resenha | O Universo de Sandman: O Sonhar – Volume 1

    Embora a DC Comics já tenha anunciado que esse será o último ano do selo Vertigo (que a partir de janeiro de 2020 mudará para DC Black Label), um dos carros-chefe da marca voltou com força total apresentando nada menos que quatro títulos mensais levemente conectados entre si: é o Universo de Sandman, criado por Neil Gaiman no fim dos anos 1980 e começo de 1990. Gaiman já havia revisitado seus personagens em Sandman: Prelúdio, mas agora volta como curadoria para que novos autores brinquem no seu fabuloso playground onírico.

    A edição lançada pela editora Panini sob o título O Universo de Sandman: O Sonhar – Volume 1 apresenta uma história introdutória que nos dá um panorama do que iremos ver nos quatro títulos que vem pela frente, além do primeiro arco de seis edições do título The Dreaming, que fala especificamente sobre o reino de Morfeu. Então, temos uma visão mais geral do que vai acontecer logo no início, e sabemos que Daniel – o Mestre do Sonhar atual – simplesmente desapareceu. Lucien, o bibliotecário, se torna guardião do Reino dos Sonhos até que seu mestre retorne. Temos um deslumbre do que vem por aí, com destaque para uma nova versão de Tim Hunter (qualquer semelhança com Harry Potter é mera coincidência), além de novos personagens baseados nas tradições vodu de New Orleans. Após essa introdução, começa o arco do Sonhar em si.

    Aqui fica interessante ver como o roteiro de Simon Spurrier casa perfeitamente com a proposta de Gaiman. A arte da brasileira Bilquis Evely é incrivelmente atual e nos brinda com easter eggs genuinamente brasileiros (uia! Cangaceiros!), que nos faz sentir ao mesmo tempo que estamos lendo algo moderno e já conhecido.

    Entre personagens já conhecidos, como Mervyn Cabeça-de-Abóbora, Lucien, Abel e seu eterno algoz e irmão Caim, acompanhamos a jornada de uma personagem nova com a qual facilmente nos identificamos: Dora. Ela é uma criatura incompreendida, que consegue saltar de sonho em sonho e não entende sua verdadeira essência. Dora é boca-suja e impetuosa, e incrivelmente adorável – mas também é um monstro horrendo! Ela é o fio que nos conduz à história do destino do Sonhar.

    Não é necessário nenhum conhecimento prévio para apreciar essa nova obra-prima dos quadrinhos atuais. Todo o background necessário está explicado na própria história. Mas ainda assim, a edição é muito mais aproveitosa para quem já tem afinidade com o material de Gaiman na Vertigo, pois expande esse universo de forma magistral. Aguardemos ansiosamente as próximas edições, tanto do Sonhar quanto dos outros títulos, antes que a Vertigo vire marca de uísque de vez!

    Compre: O Universo de Sandman: O Sonhar – Volume 1.

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  • Resenha | Prince of Thorns – Mark Lawrence

    Resenha | Prince of Thorns – Mark Lawrence

    Quando lemos um livro, logo de cara queremos nos identificar com o protagonista da história, por pior que ele seja. Buscamos em suas atitudes, sejam elas certas ou erradas, algo em que acabamos por nos espelhar ou ao menos refletir o que faríamos se estivéssemos na mesma situação. Essa empatia, esse sentimento de ter algo em comum com o personagem que nos é apresentado em uma história, é um dos fatores essenciais para que o leitor se sinta preso à narrativa e compartilhe das emoções que o autor quer passar através de sua obra. Mas como isso pode acontecer quando o protagonista é simplesmente asqueroso, ao ponto de não causar sequer um momento dessa identificação com o leitor?

    Prince of Thorns é o primeiro livro da Trilogia dos Espinhos, lançada pela Darkside Books, editora especializada em livros com temática mais sombria e violenta. Escrito por Mark Lawrence, esse primeiro volume nos apresenta o jovem príncipe Honório Jorg Ancrath e sua escalada obsessiva ao poder. Jorg foge de casa muito novo após uma tragédia familiar que o traumatizou. Sua mãe e irmão mais novo foram brutalmente assassinados e ele foi deixado à beira da morte em meio aos espinhos de uma roseira. A ira em sua mente cresce ainda mais ao perceber que seu pai nada fez para evitar o massacre (encabeçado por um rei rival) devido a questões políticas. Isso é parte do que faz dele um ser tão amargurado e sedento por sangue. Ainda criança, Jorg liberta os piores prisoneiros do castelo e junta-se a esse grupo de homens que guerreiam através de vários vilarejos em busca de poder. O que vemos a partir de então é uma pessoa sem qualquer moralidade cometendo os mais cruéis atos de barbárie e liderando um bando de homens bem mais velhos que ele.

    Jorg tem 14 anos no desenrolar da história, mas é inescrupuloso e sua ambição é se tornar rei aos 15 anos, mesmo que se utilize dos mais cruéis meios para atingir seu objetivo. Quando a idade limite auto imposta começa a chegar, o Prince dos Espinhos decide que é hora de enfrentar seu pai e tomar o trono para si. É interessante notar como no gênero dark fantasy, o foco é na violência crua e intrigas políticas, embora também exista magia no mundo, mas não tão colorida como em outros universos literários young adult. Aqui, tudo é sombrio e violento ao extremo, fazendo com que Game of Thrones pareça uma peça infantil em comparação. Jorg é psicopata, violento, estuprador, e não há remissão alguma para o protagonista na história. Essa é o principal motivo de não nos identificarmos com ele. Diferente de outros vilões da cultura pop, não existe nenhum momento em que podemos dar razão a ele, mesmo a história sendo contada em primeira pessoa e todas as motivações de Jorg nos sendo apresentadas tão explicitamente.

    O livro tem uma excelente qualidade técnica, com uma excelente encadernação em capa dura e papel de miolo com ótima gramatura. A leitura acaba sendo facilitada pelo formato do capítulos, geralmente bastante curtos e separados por páginas pretas com citações que nos dão uma pista do que irá acontecer em seguida. Obviamente, não é uma leitura que agrade a qualquer pessoa, e para aproveitar ao máximo a história o leitor deve deixar de lado a estranheza que um protagonista amoral e nada ambíguo pode causar. E esse é apenas o primeiro volume…

    Compre: Prince of Thorns – Mark Lawrence.

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  • Resenha | Lanterna Verde: Crepúsculo Esmeralda

    Resenha | Lanterna Verde: Crepúsculo Esmeralda

    Era a década de 1990 e a DC Comics resolveu esculhambar de vez com seus maiores heróis. O Superman tinha morrido, Batman estava numa cadeira de rodas enquanto Azrael insanamente ocupava o seu lugar e, mais tarde, Diana perderia seu lugar como Mulher-Maravilha e Flash atravessaria todos os limites da Força de Aceleração. Mas havia ainda um herói para ser mais estragado ainda do que os demais: Hal Jordan, o Lanterna Verde. Assim, dentro de um tie-in da saga O retorno do Superman, o Lanterna Verde do setor espacial 2814 enfrenta o vilão Mongul, que havia ajudado o Superciborgue a transformar Coast City em uma cidade-motor, matando seus seis milhões de habitantes no processo.

    Esse foi o pontapé inicial para a saga que redefiniria o Universo DC de então. Crepúsculo Esmeralda foi publicada pela primeira vez no Brasil em formatinho pela editora Abril, mas também já foi republicada em encadernados pela Panini e Eaglemoss (em ambas com a continuação intitulada Novo Amanhecer). Escrita por Ron Marz e desenhado por Bill Willingham, Fred Haynes e Darryl Banks, a história começa logo após os eventos que levaram à destruição de Coast City, na cratera onde outrora ficava a cidade. Os heróis da Liga da Justiça resolveram afundar o que sobrou da Cidade-motor no oceano (tirando antes todas as impurezas que pudessem poluir o lar do Aquaman, claro) e ergueram um monumento para homenagear os mortos. Após a cerimônia, Jordan vê-se sozinho onde antes era o seu lar. Ainda com o braço quebrado pela batalha com Mongul e com o psicológico bastante alterado pelo momento de luto, o herói resolve trazer de volta todos os seus amigos e familiares que pereceram na cidade. Usando toda a sua força de vontade, o Lanterna Verde da Terra reconstrói a cidade com suas memórias e seu anel de poder, criando construtos altamente detalhados feitos de luz sólida. O protagonista então passeia pela cidade e encontra-se com suas criações representando as pessoas que ele mais amava. Quando Jordan e seu pai estavam finalmente conversando, o poder do anel se esvai e a ilusão se desfaz. Um guardião está em sua frente para adverti-lo e retomar seu anel, por tê-lo usado para benefício próprio.

    O herói não se intimida e ataca seu superior, sugando toda sua energia para si. Nesse momento, o Lanterna Verde percebe que não tem poder suficiente para salvar Coast City e sai em uma jornada pelo universo com um objetivo: mergulhar na bateria central de Oa e tomar todo seu poder para si. Assim, o Gladiador Esmeralda enfrenta toda a Tropa dos Lanternas Verdes, matando um a um seus antigos amigos e apossando-se de seus anéis. Uma das cenas mais emblemáticas foi sua luta com Killowog, seu antigo treinador, parceiro e amigo, a quem ele mata sem titubear. Porém, antes que ele alcance a bateria central, os Guardiões têm uma última arma: Sinestro é libertado para deter seu antigo pupilo. A luta entre os dois deveria ser justa e portanto, o responsável pelo setor 2814 se livra de todos os outros anéis, ficando apenas um contra um. Nem mesmo o maior vilão da Tropa foi páreo para o enlouquecido Hal Jordan e finalmente ele chega na bateria e absorve todo o seu poder. Surge então o maior vilão da DC dos anos 90.

    A saga toda tem um tom bastante massavéio, típico das HQs da época. Violência extrema, páginas duplas, personagem principal malvadão, tudo que estava na moda se encaixava ali. A trama em si é bastante simples, e suas páginas são ocupadas por briga após briga até Hal chegar na bateria e concretizar seu objetivo. Mas essa história aparentemente simplória serviu para pavimentar todos os rumos do Universo DC da época ao transformar em vilão um de seus maiores heróis, extinguir a Tropa dos Lanternas Verdes e os Guardiões do Universo. Seu desenrolar na revista mensal do Gladiador Esmeralda, Novo Amanhecer, apresenta o substituto de Hal e da Tropa inteira, Kyle Rayner, que seria o único Lanterna Verde durante muito tempo. Em suas primeiras histórias (reapresentadas nos encadernados da Panini e Eaglemoss), Rayner tem que aprender a usar os poderes do anel e enfrentar o Major Força, que o confunde com seu antecessor e mata sua namorada, esquartejando-a e guardando-a na geladeira. Esse começo de carreira bastante pesado fez com que Kyle amadurecesse mais rápido e, no mundo real, levou a vários questionamentos sobre o papel das mulheres nas revistas de heróis, sempre como vítimas que sofrem para que o arco heroico do protagonista homem se desenvolva. Gail Simone se destacou com o blog Women in refrigerator, que faz referência direta à essa cena tão impactante e violenta e hoje é uma das maiores roteiristas da indústria. Após esse trágico início, as histórias de Kyle Rayner passam a ter uma pegada mais leve e muito parecida com as do Homem-Aranha, da Marvel.

    Crepúsculo esmeralda tem muitas falhas, mas não deixa de ter sua importância histórica e editorial por ser o marco de uma época que só se encerraria dez anos depois, com a volta de Hal Jordan ao panteão de super-heróis da DC.

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  • Resenha | Mandrake: O Mundo do Espelho e Outras Histórias

    Resenha | Mandrake: O Mundo do Espelho e Outras Histórias

    Criado por Lee Falk, o mágico Mandrake é uma daquelas figuras que quase todo mundo já ouviu falar, porém quase ninguém nos dias de hoje realmente conhece. Provavelmente nossos pais ou avós se depararam com revistas do ilusionista encartolado ou, puxando pela memória, podemos lembrar dele do desenho animado Os Defensores da Terra, da década de 1980, onde ele formava uma equipe com Flash Gordon e o Fantasma. Mas poucos com menos de 40 anos podem dizer que realmente acompanharam suas aventuras em quadrinhos quando criança.

    Entre outubro de 2013 e junho de 2015, a editora Pixel Media publicou uma série de três encadernados com histórias do Mandrake, adaptando o formato de tiras de jornal para acomodá-lo à forma de revista. Publicado em capa cartão e papel do miolo de alta qualidade, Mandrake: O mundo do espelho e outras histórias é a primeira das três edições da Pixel a apresentar ao público de hoje as histórias da época.

    O álbum apresenta quatro histórias do personagem, sendo as duas primeiras maiores, com 40 páginas e as duas últimas com cerca de 20 páginas cada. O mundo do espelho do título da edição é a primeira história, e nela Falk se vale de uma antiga lenda que diz que tudo refletido no espelho é, na verdade, parte de uma outra dimensão. Nessa dimensão, todas as noções de bem e mal, certo e errado, são invertidas. Entre um show de mágica e outro, Narda (noiva e assistente do mágico) percebe que há algo errado do outro lado espelho. Mandrake e seu fiel amigo Lothar acabam descobrindo um meio de visitar esse mundo invertido e frustrar os planos de dominação de suas contrapartes malignas. Como de praxe em uma história da época, fica impossível saber se a aventura realmente aconteceu ou “foi tudo um sonho” (spoiler: aconteceu mesmo, pois existe uma continuação).

    Na história seguinte, O Colégio de Mágica, aprendemos um pouco sobre o passado de Mandrake quando ele faz uma viagem astral ao santuário místico tibetano onde aprendeu as artes do ocultismo. Devido a um ataque sofrido pelo Colégio, Mandrake se vê obrigado a viajar até o local para ajudar. É interessante notar algumas resoluções de roteiro da época que hoje soariam bastante estranhas, como o próprio Lothar que é um estereótipo ambulante, um homem negro que não só é servo do protagonista branco como também perambula por aí sem camisa e com “trajes tribais”. Além disso, estar armado em um avião comercial, saltar de paraquedas no meio da viagem e matar um exemplar de um dos grandes felinos em extinção não parecem ser atitudes condenáveis na história.

    As outras duas histórias do especial não são movidas pelo protagonista, mas trazem esse ar de inovação que era necessário na época. As histórias do Mandrake dessa edição são praticamente todas baseadas em close-ups, o que pode facilitar a vida do desenhista, mas atrapalha em muito a compreensão da trama, que fica presa aos diálogos. É sempre bom lembrar que é um produto de sua época, mas mesmo assim não parece agradar aos mais jovens devido à trama fácil, rápida e, em alguns momentos, rocambolesca.

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  • Resenha | Homem-Borracha #1

    Resenha | Homem-Borracha #1

    Em um mundo em que a Marvel se tornou referência para heróis coloridos e escapistas, enquanto a DC virou sinônimo de trevas e seriedade, é reconfortante encontrar algum material da casa do Superman que se permite ser leve e divertido. Assim como nos gibis da Arlequina, Homem-Borracha tem um tom muito mais caótico e descontraído do que qualquer outro título da casa, lembrando em muito a antiga série mensal do Lobo por prezar pelo humor e pela sátira ao Universo DC como um todo.

    Escrito pela sempre excelente roteirista Gail Simone e lindamente ilustrado pela brasileira Adriana Melo, a minissérie em seis edições foi publicada no Brasil pela Panini em um encadernado de volume único e capa cartão de 140 páginas. A trama nos apresenta a reinvenção da origem de Eel O’Brian, atualizada para a nova cronologia pós Ponto de Ignição. O’Brian é um bandido que vê sua vida virar de cabeça pra baixo após ser baleado, coberto de produtos químicos e descartado por seus parceiros gângteres. Ganhando estranhos poderes plásticos de se esticar e transformar em qualquer coisa que imaginar, assume a identidade de Homem-Borracha e passa a fazer o bem para tentar se redimir de seu passado criminoso.

    Na história, o Homem-Borracha se depara com uma organização criminosa conhecida como A Cabala, ao mesmo tempo que se vê como tutor de uma criança de rua gender fluid, além de conciliar tudo isso com seu trabalho numa boate com a temática de super-heróis, onde strippers fazem  lap dance fantasiados de Batman, Mulher-Gato ou Supergirl. Paralela à trama central, vemos o surgimento de uma nova vilã – que infelizmente não surgiu em ação até o fim da minissérie, plantando a semente para ser desenvolvida em futuras aparições do herói.

    A arte de Adriana Melo consegue dialogar muito bem com o roteiro, além de mostrar acertadamente a influência de alguns elementos de mangá. Ela consegue demonstrar força, ação e fofura nos momentos adequados, e seria ótimo vê-la novamente em uma possível série mensal do Homem-Borracha. Claro, como nem tudo é perfeito, em uma cena em que Eel se transforma na Arlequina (assim como ele incorpora diversos outros personagens DC), houve um certo desentendimento com alguns membros  da comunidade trans, que viram na representação (tanto visual quanto textual) algo ofensivo. É interessante notar que Gail Simone prontamente se manifestou em sua conta pessoal no Twitter, procurando entender os motivos do desagrado e se desculpando, de uma forma digna e que dá uma lição em muitos produtores de conteúdos que, em situação semelhante, saem atacando o suposto “politicamente correto” ao invés de tentar entender onde errou e melhorar como ser humano.

    Homem-Borracha é uma ótima edição, e embora tenha alguns problemas de interação com alguns núcleos de personagens no roteiro, mostra a força que um personagem da década de 1940 pode ainda ter nos dias de hoje quando bem trabalhado.

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  • Resenha | Superman 80 Anos: Action Comics Especial

    Resenha | Superman 80 Anos: Action Comics Especial

    Em junho de 2018 a revista norte-americana Action Comics atingiu a incrível marca de mil edições além de completar 80 anos em que o Superman surgiu em suas páginas, já no primeiro número. a DC Comics então a publicou como uma edição especial comemorativa, com mais páginas e histórias que o habitual, com muitas capas variantes feitas por diversos artistas que trabalharam com o personagem ao longo dos anos. Pouco tempo depois, em dezembro do mesmo ano, a Panini lança no Brasil Superman 80 Anos: Action Comics Especial, que seria a versão nacional de Action Comics #1000.

    Em 132 páginas e capa cartão com reserva em verniz, a edição embora histórica não apresenta nada muito importante ou novo. Logo de cara, vemos a republicação da primeira história história do herói, vista em 1938 na lendária Action Comics #1, que é um tanto confusa por começar da metade da história (apenas um ano depois, em Superman #1,  a história seria reeditada de forma correta). A seguir começam as histórias inéditas do volume, sendo a primeira delas escrita e desenhada por Dan Jurgens – veterano do meio que vem trabalhando com o Azulão desde os anos 1990 – e mostra um evento em Metrópolis em homenagem ao Superman. É estranho ver a reação de Clark, que mesmo após tantos anos não se sente confortável nessa situação. Era de se supor que ele já estivesse acostumado e entendesse principalmente o quanto esse reconhecimento é importante para as pessoas de Metrópolis. Jurgens mantém seu belo traço, embora em alguns momentos pareça bastante apressado e cometa alguns deslizes, típico das vezes em que o autor acumula as funções de desenhista e roteirista.

    A terceira história é interessante por se valer de diversos pin-ups de página inteira, retratando diferentes épocas e visões do Superman, para costurar uma história em que Kal-El enfrenta o vilão Vandal Savage através do Hipertempo. Peter J. Tomasi engana bem no fim das contas, e a miscelânea acaba parecendo uma história bem construída, mesmo quando as imagens não conversam entre si e dependem exclusivamente do texto para fazer algum sentido dentro da trama. Mesmo assim, os desenhos de Patrick Gleason são muito bonitos e conseguem emular de forma satisfatória os diferentes períodos que retratou.

    Em seguida temos mais algumas histórias curtas, sendo que uma delas utiliza-se da arte de Curt Swan para uma remontagem inédita. Na história de Loise Simonson e Jerry Ordway temos o exato clima dos anos 1980, na fase logo após a saída de John Byrne do título do personagem. Temos também uma história sobre o carro verde que ilustra a icônica página da primeira edição e algumas histórias mais intimistas, que explora a psiquê do personagem e uma divertida aparição de Sr. Mxyzptlk de Paul Dini e José Luis García-López.

    A parte mais esperada da edição é a estreia de Brian Michael Bendis no roteiro da última história, que pareceu bastante jogada na edição. Começa já no meio e termina antes do fim, mas deixa ao leitor um aperitivo do que há por vir na nova minissérie O Homem de Aço – que seria publicada nas revistas mensais do personagem por aqui.

    Fechando a edição, uma galeria com todas as capas variantes lançadas nos Estados Unidos. Infelizmente, falta material adicional e a revista não parece estar ao alcance da importância da sua marca histórica. A redação brasileira da Panini se limitou a colocar um selo de 80 anos na capa. A edição vale mais pelos pin-ups e fac-símiles das capas do que pelas histórias em si, mas ainda é uma edição histórica que fãs e colecionadores não podem deixar de fora.

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  • Resenha | Tesouros Disney

    Resenha | Tesouros Disney

    Seguindo a onda de encadernados luxuosos de capa dura para um público de nicho, a Editora Abril lançou em 2017 o volume intitulado Tesouros Disney, que se propunha a publicar histórias raras e inéditas no Brasil. A publicação acabou sendo um tanto confusa. Afinal, o que faz de uma história em quadrinhos um “tesouro”: sua raridade ou a qualidade do conteúdo?

    Entre as escolhas editoriais do volume que podem gerar certa confusão temos, logo de cara, a pintura à óleo sobre tela de Carl Barks representada na capa. Embora a arte seja belíssima e tenha ficado ótima com a reserva de verniz, nada tem a ver com o conteúdo do miolo, que não apresenta nenhuma história do Homem dos Patos. Ao invés disso, temos várias histórias comerciais, criadas para promover o turismo nos parques temáticos de Walt Disney, crossovers pouco ortodoxos e uma história que causou um incidente diplomático no mundo real. Tudo isso em quase 400 páginas de quadrinhos em um excelente papel couché – que infelizmente é subaproveitado devido a decisão de manter as cores originais de época, claramente inferiores ao potencial da obra.

    A história que abre a edição, O fantasma da Montanha Canibal, apresenta Mickey e Pateta numa clássica aventura de mistério. Publicada originalmente em 1951, não escapa aos clichés da época sobre o funcionamento de materiais radioativos, mas tem uma ou outra solução criativa tanto para o roteiro quanto para os desenhos (representar as silhuetas dos personagens no escuro quase como em um anúncio de neon foi uma sacada genial!). Em seguida, temos a primeira história de Pluto como protagonista, que acaba sendo longa demais para o que se propõe. Pluto funciona melhor com histórias mais curtas, mas isso acabou sendo desenvolvido com o tempo a partir dessa primeira empreitada, que já apresentava os elementos clássicos das hqs do cachorro do Mickey (narração em off, Pluto como personagem mudo, agindo como um cão agiria em diferentes situações). A edição tem mais algumas histórias do Mickey com o Pateta que seguem mais ou menos o mesmo padrão, sempre com João Bafo-de-Onça como antagonista.

    Os crossovers da edição são bastante estranhos. Branca de Neve e Pinóquio se encontram numa história na qual não fica claro em que tempo/espaço ocorreu. Ela ainda mora com os anões e Pinóquio ainda é um boneco de madeira e isso foge do que foi estabelecido para os personagens em seus próprios filmes. Também é estranho ver na mesma história o Capitão Gancho, Tio Patinhas e Irmãos Metralha, ou o grande encontro de vilões que une esses a João Bafo-de-Onça e Lobão, de forma totalmente aleatória. Provavelmente um fan-service da época, já que essas são histórias que servem pra apresentar elementos da Disneyland. Além disso, como foram extraídas de uma revista específica, essas histórias contam com a apresentação da fada Sininho (nessa edição, traduzida como Tinker Bell para se adequar ao mercado atual) ou de uma página com Donald e seus sobrinhos de férias comentando a história antes dela começar. É estranho notar que, após essa miscelânea, temos duas ótimas histórias do Peninha escritas por Dick Kinney, seguida por uma das primeiras histórias do Donald desenhadas pelo mestre Giorgio Cavazzano.

    A última e mais longa história da edição é uma adaptação para o formato revista da série de tirinhas do Mickey Mouse de 1937, o Monarca de Medioka. Nessa aventura, após ganhar uma fortuna em dinheiro, Mickey acaba substituindo o rei de um país europeu falido. Como carapuças sempre servem em alguém, o governo da antiga Iugoslávia se sentiu profundamente ofendido e a história levou à proibição do camundongo no país! A história é bem divertida e realmente brinca com vários estereótipos da época, mas a polarização política da Europa de então viu a obra como subversiva e perigosa num mundo às portas da Segunda Guerra. Vale notar que essa mesma história foi republicada cerca de sete meses depois no nono volume da coleção Os Anos de Ouro de Mickey, no formato original. Por mais que a história seja boa, é impossível não pensar que as mais de cem páginas foram desperdiçadas com um material que já estava nos planos de ser publicado em outra coleção.

    Tesouros Disney é uma edição com altos e baixos, que pode decepcionar quem espera encontrar as melhores histórias da casa do Mickey em um volume, mas apresenta material raro e curioso que muito provavelmente não será republicado nas décadas vindouras.

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  • Culturama e os Novos Quadrinhos Disney

    Culturama e os Novos Quadrinhos Disney

    Após o hiato em que ficaram os quadrinhos Disney no Brasil devido ao cancelamento do contrato com a Editora Abril, finalmente os fãs de Mickey, Donald e toda a turma tiveram contato com o material da nova casa das aventuras de Patópolis. A editora gaúcha Culturama lançou em março suas cinco revistas mensais, todas com histórias inéditas e com a numeração reiniciando do zero. Além da distribuição avulsa normal em bancas, a editora aposta em outros pontos de vendas para popularizar a leitura de quadrinhos Disney, principalmente entre crianças – por isso, a princípio, não teremos os encadernados de luxo que foram descontinuados pela editora anterior, que era mais caro e voltado ao público adulto. Também está disponível um sistema de assinatura que, ao invés de oferecer um desconto ao assinante, oferece brindes exclusivos como canecas, chaveiros e miniaturas exclusivas. A Culturama oferece ainda uma terceira modalidade de venda: o box contendo as cinco edições e uma cartela de adesivos. Foi com essa caixa que o Vortex Cultural teve contato, e iremos analisar cada uma das edições a seguir. Todas elas têm 68 páginas e apresentam o mesmo texto introdutório, contando um histórico da própria Culturama, das publicações Disney no Brasil e os planos futuros da nova editora.

    *Os textos a seguir são as opiniões pessoais do redator, e não refletem necessariamente a posição dos editores do site.

    Tio Patinhas nº zero

    Comecei a ler pelo título do meu personagem favorito, o que seria o mais lógico a se fazer. O gibi do Tio Patinhas apresenta um formato de publicações de histórias que me pareceu o ideal, e se continuar assim tem grandes chances de ser minha revista favorita. A primeira história é uma publicação italiana, que costumam ser mais longas e com menos quadros por páginas. Pessoalmente, não sou um grande fã da Disney italiana. Embora eu reconheça a liberdade criativa dos autores e desenhistas, o traço mais estilizado típico dos artistas do país da pizza me incomodam às vezes. Mas o que me incomoda sempre é a falta de comprometimento com uma cronologia razoável. Isso fica muito claro na primeira história intitulada O grande amor do Tio Patinhas. Escrita por Bruno Concita e desenhada pelo mestre Giorgio Cavazzano, a história me induziu a um erro logo no título. Eu esperava que fosse sobre Dora Cintilante, a vigarista que roubou o ouro e o coração do velho sovina nos tempos de garimpo no Klondike. Bem, nada disso apareceu, e vemos uma personagem totalmente nova chama Miriam MacGold. Como assim, ela é o grande amor do Tio Patinhas? O que houve com Cintilante? Como eu disse, os italianos tomam certas liberdades criativas e acabam simplesmente ignorando qualquer coisa já feita antes por autores de outras nacionalidades. Mas devo confessar que a história é bem interessante e me peguei rindo em algumas situações. As histórias a seguir são mais curtas (e com mais quadros por página), com um traço mais clássico e consistente, e aparentam estar mais alinhadas com Barks e Don Rosa. Produzidas na Dinamarca, essas hqs apresentam tudo que se espera de um conto dos Patos: Invasão à Caixa-Forte, os Irmãos Metralha, Maga Patalójika, uma viagem ao antigo garimpo do Tio Patinhas… Mas apesar de manter o visual clássico, temos tecnologia atualizada, como smatphones por exemplo. Diferente das histórias de Don Rosa, que se passam em uma eterna década de 1950, os dinamarqueses atualizam o que julgam necessário para dialogar com a nova geração de leitores.

    Pato Donald nº zero

    Eu tinha uma grande expectativa pra ler o novo gibi do Pato Donald. Afinal, foi com ele que começou a publicação mensal de hqs Disney no Brasil, na Editora Abril. Não me decepcionei. Suas 68 páginas foram bem recheadas de histórias que se alternavam entre mistério, aventura e humor, todas elas na média de dez páginas. Me surpreendi ao ler a primeira história com o teor mais sério e atual. Um golpe na Escandinávia mostra Donald e seus sobrinhos de férias em Oslo e retrata de forma bem realista algumas das paisagens nórdicas mais famosas. Mais histórias dinamarquesas seguem a essa, com tom mais leve, e duas histórias italianas (além das gags de uma página estreladas pelo Peninha). Temos Professor Pardal, Metralhas, Gastão, uma história de exploração espacial com Tio Patinhas e claro, o Peninha aprontando das suas! Pra quem gosta de humor leve e descompromissado, ou procura por algo mais infantil, esse gibi é certamente a melhor opção.

    Mickey nº zero

    Após ler as duas revistas que eu mais estava esperando, resolvi tirar logo o elefante da sala. Nunca gostei muito das histórias do Mickey, então resolvi ler de uma vez pra terminar logo. Ah, como eu estava errado! O gibi do Mickey realmente aqueceu meu coração e superou qualquer coisa que meu preconceito com o ratinho pudesse me permitir esperar. Loo na primeira história, aquela surra de nostalgia: Francesco Artibani escreve um conto da juventude de Mickey, Donald e Pateta que remete às primeiras animações do trio, lá do início do século passado. A arte de Lorenzo Pastrovicchio emula perfeitamente o espírito da época, e vemos aquele Mickey aventureiro e cheio de energia dos clássicos animados em uma empreitada com seus amigos como limpadores de chaminés, e enfrentam o Bafo de Onça e cientistas malucos em uma história de 30 páginas que me levou diretamente aos VHS da Video Collection Walt Disney de quando eu era criança. A segunda história não deixou por menos. Contando a história do romance entre Mickey e Minnie desde quando se conheceram (mais uma vez adaptando o estilo ao dos anos 1920 em um flashback), Giorgio Fontana e Massimo De Vita nos mostra como é a vida a dois do casal mais famoso da Disney. Apenas duas histórias italianas nesse gibi e PRONTO! Já não sou mais um hater! Quem diria que um gibi do Mickey iria abrir minha mente para experimentar essas liberdades criativas? (Ou talvez tenha sido justamente o fato de manterem uma cronologia? Veremos nos próximos lançamentos…)

    Pateta nº zero

    Ah, o Pateta! Hahaha, não tem como errar numa revista dessas! É o Pateta, ele é o mais engraçado dos três personagens principais, haha… ha? Oi, como assim, ele não é o personagem principal de sua própria revista? É isso mesmo que estou vendo? Infelizmente, é isso sim. Assim como no título do Mickey, a revista do Pateta apresenta duas histórias longas produzidas na Itália. Mas o Pateta sequer é o protagonista! Nem mesmo secundário ele é na primeira história, que dá mais importância a uma personagem que eu só conhecia de longe (a arqueóloga Eurásia). Já na segunda história, Pateta faz dupla com Horácio (o cavalo, não o tiranossauro herbívoro) para desbaratinar os planos de uma empresária inescrupulosa que descobriu a “água fóssil” e… Ah, cara! Que história genérica, qualquer outra dupla de personagens poderia estar ali que daria na mesma! Podia ser com Donald e Peninha, Mario e Luigi, Cebolinha e Xaveco… A história não mudaria em nada. Espero que as próximas revistas tragam histórias mais curtas ou ao menos mais engraçadas.

    Aventuras Disney nº zero

    Ah, a cereja do bolo! Deixei por último pois sabia que ia gostar, já que lembra o mix de histórias do antigo Almanaque Disney. A revista abre com uma história longa do Superpato, que eu gostei mas confesso não ter conseguido identificar se é a versão clássica ou a nova, futurística, pois pra mim parecia mesclar elementos de ambas. (“Ain, Dan, você tem que pesquisar mais antes de escrever!” – É, eu sei, mals aí! Tô tentando.) A seguir uma história curta do único Lobão que vale a pena prestar atenção, uma história muda do Pardal com o Peninha e um conto de mistério da Vovó Donalda – eu senti um certo orgulho em ter desvendado o roubo antes do desfecho, mas depois me lembrei que é um gibi pra crianças! Pra terminar, uma história do Superpateta bem divertida e leve (meio bobinha até), mas que pode tirar um riso ou outro.

    Conclusão: os italianos são legais, Dan!

    Após terminar os cinco gibis, cheguei à conclusão de que não devo torcer o nariz pras histórias italianas. Elas são divertidas! E as novas revistas estão com uma material muito melhor na Culturama do que na antiga casa. Papel de maior gramatura, capa em couché, excelente impressão. Teve um ou dois errinhos de diagramação nos balões, mas nada que prejudique o resultado final. Resta agora esperar que essa qualidade se mantenha, e que venham também as prometidas publicações diferenciadas, além da retomada da produção nacional. Ah, e tem cartela de adesivos! Todo mundo gosta de adesivos!

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