Tag: Quadrinhos Disney

  • Resenha | Pato Donald por Carl Barks: A Mina Perdida do Perneta

    Resenha | Pato Donald por Carl Barks: A Mina Perdida do Perneta

    Pato Donald: A Mina Perdida do Perneta é um dos volumes que a Editora Abril lançou com foco na compilação das historias clássicas e originais de Carl Barks. Esse volume é escrito e desenhado pelo autor com um trabalho de cores assinada por  Tom Ziuko e em outras historias por Rich Tommaso. Essa coleção tinha um bonito visual com capa dura, verniz localizado, com os personagens em destaque. Foi descontinuada por motivos comerciais da Abril Jovem e retomada depois pela Panini Comics mantendo o design. As historias são bem curtas, em torno de 10 páginas cada, a maioria com Donald como protagonista com seus sobrinhos trigêmeos Huguinho, Zezinho e Luisinho e algumas contando com o Tio Patinhas.

    Barks foi mais que apenas um ilustrador da Disney. Apesar de Donald não ser uma criação sua (assim como os sobrinhos) é dele a autoria a respeito de Patópolis, onde se passam as aventuras, além da maioria dos seus habitantes como Patinhas, Gastão, Irmãos Metralha, Professor Pardal e Maga Patalójika. Ou seja, boa parte da mitologia dos patos é inventada por ele, como visto também em A Coroa Perdida de Gengis Khan e A Cidade Fantasma. Nestas histórias se percebe alguns eventos bem curiosos, como Donald se referindo a si mesmo como um homem e não um pato, fato que fortalece de certa forma a Teoria do Filtro, conceito criado por fãs que consiste em afirmar que os animais antropomorfizados são humanos na verdade, e que têm um “filtro” de animais como aparência. Isso explicaria por exemplo Pluto ser um animal de estimação e Pateta um ser bípede e inteligente. Mas há tantas outras possíveis razões para Donald se enxergar como mais esperto e soberano sobre os animais irracionais, basicamente como se nesse universo fossem os patos e outros mamíferos que evoluíram a condição humanoide, e não os símios.

    Outro aspecto digno de nota é a inventividade e engenhosidade dos meninos, que resolvem questões adultas bem sérias, pensam em trabalhar e se mostram muito preparados para além do que segue o famoso Manual do Escoteiro Mirim. Eles são bem mais espertos que seu tutor. Na maior parte das vezes, isso é tratado bem ao estilo dos quadrinhos Disney, de forma engraçada, bem humorada e obviamente escapista.

    As diferenças de personalidade e conduta entre Gastão e Donald são bem exemplificadas nas histórias protagonizadas pelos dois. Além da óbvia rivalidade entre os primos, é ressaltada a diferença de personalidade, com um sendo mostrado como um sortudo e preguiçoso, sem mérito algum, enquanto Donald é esforçado e obstinado, apesar de ser resmungão. A expansão dessa personalidade e caráter é muito bem vinda, pois nos curtas produzidos por Walt Disney ele não tem tanto espaço para mostrar quem realmente é. E aqui ele fala tanto que chega a ser verborrágico em alguns pontos. Barks o mostra como alguém articulado, diferente do visto nos curtas.

    O roteirista-ilustrador trabalha muito bem a relação de desentendimento entre tio e sobrinhos,  e faz isso de maneira leve e convidativa para possíveis novos leitores. As revistas dessa coleção são um bom ponto de partida para quem quer conhecer ou meros leitores casuais. Além das histórias, há um bom número de extras no final, com textos complementares de professores e especialistas em quadrinhos da Disney, enquanto na narrativa, não há sequer uma história que não seja pelo menos engraçada e incapaz de alegrar quem as lê.

  • Resenha | Peninha: Coleção Completa das Histórias Feitas por Seus Criadores – Volume 1 de 2

    Resenha | Peninha: Coleção Completa das Histórias Feitas por Seus Criadores – Volume 1 de 2

    Se Hollywood hoje aposta tudo e mais um pouco em caríssimos derivados de sagas consolidadas, os quadrinhos já fazem isso desde o início dos tempos, e talvez o super carismático Peninha seja um dos exemplos mais bem sucedidos. Para quem não sabe, um derivado (ou spin-off, no termo original) é aproveitar um personagem que deu certo em uma franquia, como Star Wars e Harry Potter, e colocá-lo em arcos próprios de histórias em que finalmente pode ser o protagonista. Para as icônicas criações de Carl Barks, todas dentro do universo do Pato Donald na sua bela cidade de Patópolis, a Disney sempre tentou expandir a família, dando prioridade para o Tio Patinhas, o professor Pardal, Gastão e cia., sempre sob o ponto de vista de uma família divertida, e mais ou menos tradicional. Não havia nenhum elemento estranho na mesa. Não havia nenhum, digamos, subversivo na mais famosa árvore genealógica dos gibis.

    Mas o mundo muda, e encontrar uma fórmula para agradar a todos os tipos de públicos sempre foi prioridade nos quadrinhos que, nas suas historinhas irreverentes, conseguiam dialogar entre gregos e troianos nessa tão ampla linguagem universal da diversão. Confiantes disso nos anos 1960, o roteirista Dick Kinney e o desenhista Al Hubbard ajudaram a Disney a criar personagens para o mercado internacional, com atenção especial para a Europa e América Latina. É claro que o amalucado Peninha foi o primeiro a cair no gosto de todos, pois era o símbolo catártico do anticonvencional que já começava a surgir com força nas sociedades dos anos 60. Aquele parente típico que chega para fazer tudo virar de perna para os ares, revolucionar, revirar, e ir embora após servir a seu motivo de desestabilizar a normalidade. Peninha vestia esse manto junto dos seus inconfundíveis suéter e gorrinho vermelhos, e através de suas invenções doidas que faziam o pobre pato Donald e seu gatinho Ronrom querer escapar de Patópolis – sem olhar para trás.

    Ninguém está seguro com o primo Peninha por perto, ele e suas “geniais” ideias mirabolantes. Tal qual um Professor Pardal imaturo e inconsequente, quando ele não chega para fazer magia e apavorar geral no mais banal dos dias, Peninha se mete na carreira de costureiro, de taxista, de advogado, e bota tudo a perder – ou a explodir. O engraçado é que ele sempre convence Donald a participar de suas loucuras, pois como bom malandro, Peninha é um manipulador nato. Assim, ele faz seu reservado primo mergulhar em mil confusões na cidade, na praia e no campo, sendo que sua primeira aventura publicada no Brasil em 1965 foi justamente um corre-corre danado no velho-oeste americano, com direito a chapéu de cowboy e uma inesperada perseguição cheia de perigos. E Donald achou que aquele seria um passeio calmo e tranquilo. Seria mais fácil esperar isso junto de Huguinho, Zezinho e Luisinho. Afinal de contas, Peninha não é para amadores, e mesmo assim o amamos como qualquer outro parente da família dos patos.

    De qualquer forma, em uma visão mais aprofundada às histórias coloridas e eletrizantes de Kinney e Hubbard, nota-se o quanto Peninha representa o futuro caótico que é sempre especulado pelo público mais saudosista e conservador, de cada época. A dupla de artistas criou um personagem que é a causa da insegurança das pessoas, uma vez que o amanhã é imprevisível e causa desconforto para quem não gosta nem de pensar em mudanças. Em outra análise deste compilado de histórias do Peninha, publicadas entre 1964 e 1965 em um belíssimo trabalho gráfico da editora Abril, evidencia-se que, mesmo visando (e talvez exatamente por isso) o público fora dos Estados Unidos, em um período pré-globalização na indústria do entretenimento, a glorificação da cultura dos EUA se intensificou em seus processos de exportação, em algo que pode ser chamado de “imperialismo cultural”, um conceito que o país do Capitão América sabe reproduzir como nenhum outro. E Peninha foi um dos veículos perfeitos para isso já que todo mundo tem um parente maluquinho desses para amar, mesmo após tantas ciladas homéricas. Família é família.

    Compre: Peninha – Volume 1 de 2.

  • Resenha | Ducktales: Os Caçadores de Aventuras (2)

    Resenha | Ducktales: Os Caçadores de Aventuras (2)

    Originalmente concebido como uma telessérie em 1987, Ducktales: Os Caçadores de Aventuras foi uma estratégia da Disney para popularizar seus famosos personagens que, nos anos 80, já não tinham mais um grande apelo com o público. Agora, junto do quaquilionário tio Patinhas, o sovina mais adorável e detestável de toda a Patolândia, e seus sobrinhos Huguinho, Zezinho e Luisinho, a TV ficaria pequena para tanto corre-corre ao redor do mundo – quase sempre motivado no começo por dinheiro, e no final, pelo amor que Patinhas sente por seus sobrinhos, sempre metidos em mil e uma peripécias. A série foi um enorme sucesso nos Estados Unidos, e logo retornou para os quadrinhos, agora com o grupo de aventureiros mais unidos do que nunca, enfrentando velhos e novos inimigos, e contando com novas caras para figurar uma nostalgia e uma diversão que Walt Disney criou e tanto priorizou, junto do seu lendário time de talentos herculanos.

    Temos em mãos uma trinca de aventuras á lá Indiana Jones inesquecíveis, para todas as idades, em um belíssimo encadernado que a editora Abril lança no Brasil, em um trabalho gráfico caprichado para todos os gostos, em especial dos colecionadores, com uma bela capa dura e um relevo impressionantes. Neste encadernado, as histórias selecionadas fazem justiça ao título da coletânea, ao invocarem principalmente no primeiro e segundo arcos toda a chama e a graça de uma ação sem fôlego que o muquirana tio Patinhas, seus sobrinhos e o atrapalhado capitão Boing sempre se metem, hora para salvar a pele da jovem Patrícia (sua nova sobrinha, criada para a série) de um grande e perigoso sequestro, hora arriscando tudo e mais um pouco para conquistarem um meteoro de ouro maciço que caiu numa floresta, e agora é mais cobiçado que água no deserto. Nisso, é claro que o vilão MacMônei, ainda mais ganancioso que Patinhas, fará todo o necessário para chegar ao meteoro primeiro.

    Reviravoltas dão o tom das histórias, em tramas de narrativa super ágil que remetem a dinâmica eletrizante dos desenhos animados, e aprendemos que a verdadeira piscina de ouro se faz presente para o tio Patinhas na forma de seus sobrinhos, por mais que ele jamais admita isso, uma vez que ele troca até sua moeda da sorte para recuperar Patrícia das garras da cruel bruxa Patalójika – outra antiga antagonista do ícone mais rico do mundo da ficção. Aqui, nota-se a homenagem as clássicas HQ’s escritas pelo mestre Carl Barks do Tio Patinhas, e companhia, na maravilhosa saga A Odisseia do Ouro, de 1991, na qual os heróis e vilões reconhecem que o céu não é o limite para suas confusões. Dividida em sete capítulos como foi publicada no original, a saga se destaca entre Em Busca da Número Um e Legítimos Donos por ser um exemplar perfeito do mais puro e sagaz entretenimento, abrangendo do polo norte aos confins do espaço todo o potencial que existe em uma aventura com essas figuras emblemáticas da cultura pop universal.

    Se a palavra-chave na série era “revitalização” desses personagens, a ausência de Donald e Margarida em Os Caçadores de Aventuras, nesse retorno aos quadrinhos dos anos 80, é justificada pela necessidade de se introduzir uma novidade bem-sucedida as tramas, mas sem perder a irreverência das primeiras histórias ancestrais. No caso, nos é apresentado o hilário capitão Boing, um garanhão que se acha o máximo e sempre comete os maiores erros no céu, no mar, ou em alguma ilha misteriosa. São estes e muitos outros elementos que tornam esta leitura bem mais que um mero passatempo, mas um atestado colorido do que há de melhor na alma das criações atemporais de Walt Disney. Reverenciadas por um sem-número de brilhantes roteiristas e ilustradores a carregar, com absoluto êxito, o legado do mestre através de uma mitologia absolutamente cativante para pais e filhos, ao longo dos séculos.

  • Resenha | Tio Patinhas por Carl Barks: A Coroa Perdida de Gengis Khan

    Resenha | Tio Patinhas por Carl Barks: A Coroa Perdida de Gengis Khan

    Após a saída dos quadrinhos Disney da editora Abril Jovem, ficou a dúvida entre os leitores se as coleções dedicadas a Carl Barks e Keno Don Rosa teriam continuação em alguma outra editora, uma vez que a Culturama assumiu apenas as edições mensais das revistas. A aflição passou quando a editora Panini anunciou ter assumido a publicação dessas e de outras séries em capa dura da Disney. Assim, continuando de onde a editora anterior parou, a Panini lança Tio Patinhas por Carl Barks: A Coroa Perdida de Gengis Khan primeiro volume da série a abordar o tio do Pato Donald tanto no título quanto nas histórias. Embora tenha Tio Patinhas no título e no conteúdo, não se trata de uma nova série, e sim do volume 16 da chamada “Coleção Carl Barks Definitiva”, que não é publicada em ordem cronológica.

    Para uma edição de estreia na casa, a Panini acertou em cheio na escolha do material. O livro traz as histórias publicadas originalmente em Uncle Scrooge nos anos de 1956 a 1961, e apresenta verdadeiros clássicos que já foram revisitados por outros artistas e outras mídias. Além da história que dá nome ao volume (que aliás, é uma história bem pequena se compararmos a outros épicos da edição), temos vários clássicos de Barks que valem a pena serem lidos.

    Fabricantes de terremotos é um desses clássicos que atingiram outras mídias. Além da excelente adaptação no desenho Duck Tales de 1987, os habitantes rechonchudos do subterrâneo de Patópolis apareceram em videogames (no antigo Nintendinho e na remasterização para PlayStation 3) e no reboot dos Caçadores de Aventuras de 2017. Na história, Patinhas descobre uma civilização responsável pela criação de terremotos, e teme pela sua caixa-forte.

    Em Qual o mais rico do mundo? vemos a primeira aparição do Pão-Duro Mac Mônei, o “duplo do mal” do Tio Patinhas. Diferente de suas aparições em Duck Tales, Mac Mônei é originalmente sul-africano, e não escocês (algo que o reboot de 2017 resolveu de forma inteligente). Essa história é bem interessante por mostrar que, apesar de tudo, Patinhas não é inescrupuloso e mantém ainda alguns princípios morais – coisa que seu rival não apresenta nem de longe.

    A edição ainda conta com pérolas como O elemento mais raro do mundo e A fantástica corrida de barcos, mas talvez a melhor ou mais importe história seja Os índios Nanicós. Nela, Patinhas demonstra que nem tudo deve ser lucro – embora seu espírito capitalista mantenha-se presente o tempo todo, o velho rico percebe que, embora possa extrair recursos naturais de uma reserva florestal, talvez ele não deva fazê-lo. Talvez hoje a história traga alguns problemas com a retratação estereotipada dos nativos-americanos, mas a mensagem final é boa, num saldo geral. Vale notar o cuidado que o tradutor Marcelo Alencar teve ao adaptar a fala dos índios, que no original é toda rimada como num poema de Henry Wadsworth Longfellow – diferente do que a tradução da Abril havia feito em sua continuação na coleção de Don Rosa.

    Ainda sobre tradução, um ponto a se destacar é a decisão da editora de manter alguns termos que talvez não façam mais sentido nos dias de hoje. Traduzir dólar por “pataca” talvez fizesse sentido décadas atrás, quando as revistas eram regionalizadas e nosso dinheiro mudava de nome como o Donald muda de emprego, mas hoje com internet e tudo mais, podemos esperar que as crianças entendam que Patópolis não fica no Brasil e sim nos Estados Unidos. Da mesma forma, manter o sobrenome de Tio Patinhas como “Mac Patinhas” ao invés de “McPato” é uma decisão um tanto polêmica, já que o segundo se assemelha mais ao original. Além disso, o personagem é chamado de Patinhas McPato nas duas séries animadas de Ducktales, nos quadrinhos da Culturama e até mesmo nas próprias novas publicações da Editora Panini. O tradutor Marcelo Alencar explicou em suas redes sociais que manteria Mac Patinhas apenas nas coleções de Barks e Rosa, por se tratarem de continuações da outra editora e que, em possíveis reedições da série completa, haverá alteração nesse detalhe. Outra mudança significativa na troca de “casa” foi o letreiramento, que passa a ser de responsabilidade do Studio Animatic. Nas edições da Abril as letras ficavam a cargo da veterana Lilian Mitsunaga, sempre extremamente competente e que faz falta nessa nova empreitada. Ainda sobre os diálogos, chega a incomodar muito os erros de revisão dos textos, que não são poucos.

    O formato do álbum se mantém o mesmo, e o padrão de qualidade gráfica não se altera, o que nos dá uma sensação tranquila de continuidade. Para o fã de quadrinhos Disney e, mais especificamente, de Barks, fica o alívio de não ter sua coleção definitivamente interrompida, mas também a esperança de vê-la, num futuro próximo, em uma nova reedição, com formato maior e mais parecido com o original da Fantagraphics.

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  • Resenha | Donald Jovem

    Resenha | Donald Jovem

    O Pato Donald é um dos mais populares personagens dos Estúdios Disney, ofuscando até mesmo o camundongo mascote do conglomerado – principalmente quando pensamos no legado deixado pelas histórias em quadrinhos. São 86 anos desde a criação do personagem até os dias de hoje, e sua trajetória passa por desenhos animados, videogames, álbuns de figurinha e toda e qualquer mídia imaginável. Porém, diferente de seu tio ricaço e avarento, não temos muito material considerado “definitivo” sobre seu passado. Não existe nada equivalente à Saga do Tio Patinhas, de Keno Don Rosa, para contar como e por quê Donald é o que ele é hoje. O personagem vive num eterno presente, sendo um homem comum, vivendo uma vida comum – ou ao menos tentando. Ainda assim, existem diversas pistas, mesmo que algumas sejam contraditórias, sobre partes de seu passado. Sabemos, por exemplo, que ele cresceu no campo, conforme mostrado em seu curta animado de estreia, A galinha sábia, de 1934. Várias hqs fazem referência à essa época, e mesmo desenhos animados das década de 1930 e 1940, bem como um especial do programa Disneylândia, que inclusive mostra a Vovó Donalda. Também podemos dizer que é canônico o fato de Donald ter crescido sem conhecer o seu Tio Patinhas, criação de Carl Barks na história em quadrinhos Natal nas montanhas, de 1947.

    Tomando essas e mais algumas pistas deixadas por roteiristas do pato durante décadas, Donald Jovem é uma minissérie em oito partes publicada no Brasil pela Culturama em um volume único de capa dura. Escrita por Francesco Artibani e Stefano Ambrosio, a série tenta preencher esse espaço de tempo em que Donald deixa o sítio da Vovó para estudar na cidade e acaba conhecendo seus amigos mais famosos. Porém, diferente do que Don Rosa fez na Saga do Tio Patinhas, aqui não vemos um período histórico acurado com todo o repertório anterior. Ao contrário, o pato adolescente vive suas aventuras nos dias de hoje, jogando videogames e salvando músicas em pendrives.

    O primeiro capítulo mostra justamente elementos de sua primeira aparição em Silly Symphonies, como o clubinho-barco no riacho e seu amigo Porcolino – que na hq é mais um espertalhão do que o preguiçoso do desenho. A dupla passa todo o tempo jogando videogame e aprontando confusões, que levam a um desastre ambiental no campo, o que faz com que Donald seja obrigado a deixar a vida na roça e ir para a cidade. Assim, Patinhas garante a caríssima mensalidade que permite ao seu sobrinho estudar em um colégio interno de Ratópolis. Duas coisas são interessantes de se notar: a primeira é a forma como Patinhas McPato monitora a vida de seu sobrinho remotamente sem que Donald saiba – afinal, eles apenas se conheceriam em Natal nas Montanhas. A segunda curiosidade é ver que, nessa edição, Ratópolis é uma cidade diferente de Patópolis, visto que nas traduções nacionais da Editora Abril ambas eram uma só cidade – mas pode ter sido apenas um deslize da tradução.

    No colégio, Donald conhece seu colega de quarto: ninguém menos que o próprio Mickey Mouse, em uma versão de franjinha emo que já nasceu datada (ainda existem emos hoje em dia?). Mickey parece ser o personagem mais descaracterizado de todos. Ao invés do jovial ratinho aventureiro, mostrado nas tiras de Floyd Gottfredson, aqui ele é tímido e inseguro. Afinal, o foco da história, pelo que os roteiristas deixam claro, deve ser unicamente o Pato Donald. Conhecemos também o Pateta, em uma versão também de franja, porém mais voltado para o estilo nerd/hipster. Causa estranhamento ver essa versão mais “inteligente” do Pateta, que curte ficção e mestra RPG para seus amigos. As meninas estão presentes também, sendo que Margarida é uma esportista que a princípio ignora Donald, que se apaixona por ela à primeira vista, e Minnie mantém um crush secreto pelo Mickey – que é recíproco, mas ambos não percebem.

    Uma personagem que aparece de forma um tanto surpreendente é a Tudinha, que nos quadrinhos italianos é a parceira romântica de João Bafo de Onça, mas na série é uma garota que sofre bullying de seus colegas de escola por gostar de coisinhas fofas, como uma mochila de coala. Bafo, por sinal, não aparece e, pra dizer a verdade, faz falta na história. Ao invés disso, temos um valentão genérico na escola chamado de Nero, que poderia muito bem ser Bafo. Foi mesmo uma oportunidade perdida.

    As histórias têm vários furos de roteiros, personagens  mal construídos e inconsistências que saltam aos olhos. Como Donald conhece Mickey, Pateta e a turma toda no colégio que deveria ser de ultra-ricaços? Seriam eles também de famílias de milionários? Por onde anda Dumbella, irmã gêmea de Donald? Eles não deveriam ter crescido juntos? Jamais saberemos…

    Para leitores mais puristas, a série pode não agradar por fugir muito de algo que se possa considerar canônico, além do design “moderno” dos personagens que reflete o que pessoas de meia idade imaginam que seja a representação do jovem de hoje. Para leitores mais jovens, por outro lado, pode ser uma excelente leitura, pois o texto flui com o dinamismo sempre presente nas hqs Disney italianas, com quadros grandes e balões de fala enxutos. A arte varia bastante do bom para o médio, mas as cores vivas (mas não saturadas) e o “movimento” das cenas a torna bastante agradável. Algumas piadas parecem um tanto forçadas e até escatológicas (Donald parece não se importar com a limpeza do banheiro ao dividir o quarto com Mickey), outras até mesmo previsíveis. Donald Jovem pode não ser a Saga definitiva do pato encrenqueiro, mas serve como uma boa diversão – principalmente para crianças na faixa dos dez anos de idade. O que acaba sendo uma vantagem, no fim das contas, pois serve para apresenta-las ao incrível mundo dos quadrinhos Disney.

    Compre: Donald Jovem.

  • Resenha | Os Anos de Ouro de Mickey: 1931-1932 – Mickey no Circo e Outras Histórias

    Resenha | Os Anos de Ouro de Mickey: 1931-1932 – Mickey no Circo e Outras Histórias

    Como é possível um rato, um ser repugnante do esgoto, servir de inspiração para um personagem que deve ser um sucesso entre todas as pessoas? Tornando-o mais que divertido, amigável, icônico em sua aparência e nas amizades e desavenças que encontra pelo caminho, Walt Disney e Ub Iwerks não apenas deram-lhe a alcunha de símbolo pop universal, como principalmente fizeram do curioso e destemido Mickey Mouse a síntese substancial de tudo e todos que viriam após a sua criação, ainda na aurora dos antigos estúdios Disney. O namorado de Minnie já passou pelas mãos dos mais diversos e talentosos desenhistas da casa de Branca de Neve e Dumbo, mas nunca lhe foi permitido perder sua essência primordial – no início, Mickey muitas vezes foi apresentado como um artista, literalmente fazendo as pessoas felizes enquanto escapava ou se metia em mil encrencas.

    A jovialidade aqui presente é latente, e todas essas características muito bem asseguradas desde o começo por sua dupla criadora fazem deste personagem inconfundível um clássico que sempre uniu gregos e troianos para participar de suas façanhas, e irresistível estripulias. Porém, algo precisava ser feito para ajudar um artista solitário. Estamos falando de Floyd Gottfredson, cartunista de grande aptidão que substituiu no começo de 1930 Ub Iwerks, este indo embora com seus próprios projetos. Gottfredson se viu sozinho para comandar um ícone cada vez mais amado pelo público, e uma vez que “ostra feliz não produz pérolas”, a óbvia pressão impulsionou a criatividade de um dos principais colaboradores de Mickey a expandir as possibilidades. A responsabilidade era enorme, mas se distanciar do que já tinha sido estabelecido estava fora de questão. A missão, portanto, era abraçar um passado recente, e abrir novas portas para novas ideias.

    Assim, Gottfredson não apenas continuou com as qualidades originais do ratinho espoleta, como deu-lhe um ar mais detetivesco nas histórias de perseguição e crime (lembre-se que estamos aqui nos tempos da Grande crise econômica americana, dos anos 1920/30), e concedeu-lhe também seus populares companheiros de aventura para ressaltar os pontos mais forte de Mickey, com muito humor e irreverência típicos de uma época mais simples, doce e ingênua do entretenimento. Ao imprimir elementos reais em histórias fantásticas, Gottfredson se mostrou absolutamente habilidoso nas divertidas metáforas que produziu, sugerindo o charlatanismo, a malandragem e o altruísmo de um povo largado a própria sorte – ou azar. Percebemos isso claramente em duas brilhantes e longas histórias reunidas, entre outras, neste segundo volume dos Anos de Ouro de Mickey, publicado no Brasil pela editora Abril, em um trabalho gráfico de esplendorosa excelência.

    Em “Mickey e os Ciganos”, na qual Minnie viajando com seu namorado e amigos é sequestrada por ladrões atrapalhados, podemos sentir o forte sentimento de impunidade que nasce dessa situação, refletindo (in)diretamente o espírito da época. Também retratando as dificuldades socioeconômicas do seu tempo, “Mickey e O Grande Roubo do Orfanato” talvez seja uma das melhores histórias já criadas para o personagem. Nela, ao saber da miséria de uma instituição que acolhe jovens desamparados, o ratinho e seu amigo Horácio armam uma peça de teatro para angariar fundos ao orfanato, mas quando todo o dinheiro é roubado, a polícia acha que os dois são os principais culpados. Agindo então como detetive em um contexto tanto urbano, quanto rural, Mickey começou nos anos de 1931/32 a ser agraciado com histórias levemente mais complexas e até mesmo mais ousadas que as aventuras de seus primeiros anos de publicação, em tiras semanais ou em desenhos animados.

    Com vários arquétipos ainda presentes em certos momentos desses Anos de Ouro, como a representação estereotipada de negros e mulheres, por exemplos, os estúdios Disney já se mostravam hábeis o bastante para evoluir suas ideias sem perder qualquer traço de familiaridade. Universais e tão icônicos como podem ser, nenhuma outra criação oriunda do estúdio foi tão perfeita sendo seu porta-voz essencial quanto Mickey, e isso podemos atestar em cada tirinha reunida nesta impagável coletânea, perfeita para qualquer estante.

    Compre: Os Anos de Ouro de Mickey: 1931-1932 – Mickey no Circo e Outras Histórias.

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  • Resenha | Os Anos de Ouro de Mickey: 1930-1931 – Mickey na Ilha Misteriosa e Outras Histórias

    Resenha | Os Anos de Ouro de Mickey: 1930-1931 – Mickey na Ilha Misteriosa e Outras Histórias

    É dito que abrir um livro reitera não só a magia da experiência puramente imersiva de se voltar no tempo, e acompanhar aqui as primeiras aventuras de Mickey Mouse ainda sem a sua turma, logo quando foi criado, como também reforça a importância da literatura, no caso a mídia dos quadrinhos, em emoldurar e artisticamente simbolizar a época em que se está presente, e faz retratar. Seja por meio da arte das gags, em que se provoca o riso e a descontração por meio da irreverência de piadas visuais, ou por evidenciar um zeitgeist, em certos momentos, que nos parece totalmente ultrapassado, com suas normalidades e seus preconceitos, é indiscutível o prazer de viajarmos a idos mais simples, em que o humor ainda tinha na sua simplicidade histriônica, suas cores, sua diversão e nas suas onomatopeias os seus principais triunfos de grande e duradoura paixão.

    Os Anos de Ouro de Mickey – Volume 1 chegou tal um monumento da nostalgia para conservar o encanto (e a importância para a cultura pop) de um dos personagens norte-americanos mais populares e amados do século XX, sendo este a criação máxima tanto do famoso Walt Disney, quanto de seu co-criador, o igualmente genial Ub Iwerks. Diz-se também que a genialidade apenas surge através do trabalho duro, e desde 1929, ambos trabalharam juntos na sementinha de um império que, em 2019, se consolida como uma das dez maiores marcas do mundo. Ainda nos primórdios de um entretenimento já muito remodelado, Disney e Iwerks foram parceiros por poucos anos nos estúdios Disney, antes do segundo seguir seu rumo. Contudo, a breve combinação de talentos deixou sua marca histórica em tiras de quadrinhos que serviram de base do que chamamos de cultura popular. Mickey já passou pelas mãos de diversos artistas, cada um com seu traço e sua visão de mundo, mas nunca com o mesmo senso de forte liberdade criativa que o começo dos anos de 1930 tão bem permitiam.

    Isso porque a Disney não se orgulha, hoje, de certos desenhos ou tiras ancestrais cujos temas são percebidos como polêmicos e até mesmo ofensivos, sendo parte então de sua extensa cronologia, e mesmo que representativos a mentalidade de uma época que ficou para trás. As primeiras histórias de Mickey, por outro lado, usam e abusam de outras características relativas ao tempo que foram criadas, tais como a crise na economia dos EUA após o grande desastre na bolsa de valores de Nova York, em 1929, e a hostilidade entre as pessoas que deixam de se respeitar, muitas vezes, para conseguirem sobreviver no cenário da Grande Depressão, em que muitos cidadãos americanos estavam literalmente passando fome. Sem achar graça deste contexto, mas aproveitando-se do drama da situação, vemos neste primeiro volume dos seus Anos de Ouro o valente e astuto Mickey enfrentando problemas e caindo em artimanhas que muitos dos seus leitores também passavam, mas achando no poder do riso o melhor remédio para se enfrentar uma dura realidade, impossível de se ignorar.

    Afinal, como representar melhor a sensação de desespero das pessoas diante da miséria financeira, na primeira grande crise do capitalismo, do que colocar Mickey sendo cozinhado num caldeirão de canibais, como vemos na ótima história Mickey na Ilha Misteriosa, ou ainda, sendo enganado de várias formas, junto de sua namorada Minnie, pelo cafajeste Chico Charlatão, no delicioso conto homônimo de 1930? Isso porque a arte não precisa ser óbvia ou apolítica, e seus leitores tampouco ingênuos. Assim, acompanhamos os primeiros passos de um rato desde sempre visto como um jovem adulto ultra curioso, e que se mete em mil confusões para tentar se livrar delas logo em seguida com seu grande coração, e a esperteza que os destemidos sempre carregam mundo afora. Em uma coletânea primorosa neste primeiro volume da editora Abril, lançado no Brasil em 2017, notamos o quanto o personagem, seus amigos e vilões, todos icônicos o suficiente para serem amados por todos os públicos, e gerações, leva consigo também a essência da empresa Disney, e de tudo o que viria em quase cem anos de história a ser produzido, e aprimorado, por uma marca brilhante o bastante para habitar os corações do passado, presente e futuro.

    Compre: Os Anos de Ouro de Mickey: 1930-1931 – Mickey na Ilha Misteriosa e Outras Histórias.

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  • Resenha | O Manual do Mickey

    Resenha | O Manual do Mickey

    O fato é que Walt Disney, o menino sonhador do estado do Kansas, nos Estados Unidos, pode ser considerado um dos grandes autores do Séc. XX. E até mesmo o mais querido, vide suas criações que até hoje conquistam as novas gerações com uma naturalidade e aclamação universal imbatível. Surpreendente mesmo é que seu personagem mais popular não seja uma bela princesa, ou um grande herói de estilo europeu, e sim um rato, uma criatura asquerosa que nas mãos de Disney, desde 1928, virou sinônimo de magia, encantamento, e grandes aventuras.

    Com O Manual do Mickey (nome este dado a emblemática figura pela esposa de Walt, diante de outros nomes bem menos interessantes que ele bolou, na época), é junto de Mickey, sua namorada Minnie e o cachorro Pluto que passeamos pelos mais diversos cenários, idos e lendas, enfrentando com muita diversão e alegria as mais malucas situações. Sejam no mar ou em terra firme, sejam no espaço ou ainda em alguma dimensão criada sob medida para nos divertir, é claro, mas também, para tirarmos algum proveito intelectual desta experiência enriquecedora.

    Aliás, Disney pode também ser considerado um dos grandes e poucos criadores de conteúdo em Hollywood a se preocupar mais com a qualidade autêntica desse conteúdo, do que com o lucro que deveria obter através de sua imaginação. Muito mais que Donald ou Pateta, percebemos como Mickey Mouse foi moldado para ser o porta-voz oficial da criatividade inesgotável do corajoso empreendedor que foi Walt, representando então a personalidade para sempre jovial de seu prolífico e incansável criador norte-americano.

    Sempre visando o público infantil, tal um “professor pardal” da garotada de verdade, o inventor pretendia transmitir conhecimento para a turminha através das aventuras irresistíveis que ele, e seu departamento criativo, bolavam para uma mídia em especial: o cinema. E muitos anos depois, em O Manual do Mickey, conhecemos mais a fundo a dinâmica do velho oeste americano, os fundamentos da lei e da ordem sociais pós-revolução industrial, e os grandes aventureiros de antigamente, como se o nosso avô estivesse contando essas histórias para nós, numa tarde ensolarada de domingo.

    É justamente essa a sensação pretendida, aqui, e plenamente alcançada. Assim, O Manual do Mickey reúne literalmente essa nobre ambição de Walt Disney em usar um dos mais famosos personagens da cultura pop que tanto ajudou a construir, desde seus primórdios, para nos deixar por dentro das grandes odisseias da humanidade e suas consequências para a evolução do homem, enquanto indivíduo, e das sociedades em si, desde o tempo das cavernas até os grandes roubos de bancos nas grandes cidades do mundo civilizado.

    A publicação da editora Abril é um relançamento da obra de 1973, e chegou caprichada em 2016 no Brasil, repleta de desenhos originais, uma bela capa dura e com um acabamento gráfico impecável, garantindo por sua estética uma leitura mais que agradável a todos os públicos que se propõe a investigar a história dos gregos e troianos, da conquista dos polos, das Américas e até mesmo do nosso brilhante satélite lunar, e muito, muito mais. Tudo pela ótica mais amável possível: brincando, sorrindo, e se sentindo parte cativa dessa atemporal turminha do Mickey Mouse.

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  • Resenha | Manual do Prof. Pardal

    Resenha | Manual do Prof. Pardal

    Para o adorável professor Pardal, há magia na tecnologia, sendo que ambas não tem muita diferença para o inventor que faz acontecer, e traz a sua imaginação mirabolante para uma realidade utilitária. Pardal é a versão infantil de Da Vinci, Santos Dumont e Benjamin Franklin, que aliás são lembrados neste Manual do Prof. Pardal junto de muitos outros gênios da humanidade que, um dia, já viveram sob a alcunha de “malucos”. Se já acharam que era impossível o homem ganhar os céus, se comunicar a grandes distâncias, e ter uma chama eterna em cada casa, chamada de eletricidade (é só pagar a conta, todo mês), alguém precisava ser ‘doido’ o suficiente para tornar tudo isso tangível, e patentear as utopias que já foram impossíveis. Algo que, para nosso personagem, um dos melhores já criados por Walt Disney, sempre faz parte da rotina.

    É por isso que, em Monotonópolis, o povo não se acostumou com as grandes invenções revolucionárias da família Pardal – uma vertente criadora herdada desde o vovô Pardal, quando este já deixava a cidade inteira maluca de tanto dançar com seu “dançofone”, um instrumento que emitia sons irresistíveis! Anos depois, em Patópolis (a família foi expulsa de Monotonópolis, porque será?), Pardal cresceu sabendo que atrapalhar os outros com suas invenções não era nem um pouco legal. Portanto, para ajudá-lo a trazer seus projetos para o dia a dia das pessoas, ele logo tratou de montar um ajudante com suas próprias mãos: o Lampadinha, um mini robô tão inteligente que, quando sua lâmpada queima um fuzil, ele mesmo troca sua “cabeça”. Papo de louco? Não, apenas mais um dia no laboratório do bom e velho Pardal.

    Disney também sonhava com um mundo melhor, e mais fácil, e nos convida ao mesmo com uma graça ímpar. Um pó que faz chover, um carro que pula para escapar do trânsito local de Patópolis, um destorcedor de ciclones (um objeto que inverte a direção dos ventos de um furacão, acabando assim com o fenômeno)… Tudo isso e muito mais podemos desfrutar neste Manual do Prof. Pardal, um verdadeiro tesouro criativo que permite, a todos os públicos e idades, viajar pela história dos grandes inventos, indo do telefone ao foguete, da luneta ao submarino. O livro, dotado de um texto delicioso e irreverente, e desenhos coloridos mais que divertidos, nos instiga a pensar e achar soluções graciosas para os problemas do nosso dia a dia, da mesma forma como os grandes inventores do passado um dia também se questionaram. Isso explica porque o primeiro mandamento do inventor, segundo Walt Disney, é: “Preocupar-se com seus semelhantes, a fim de descobrir quais são suas necessidades”.

    Mas Pardal e Lampadinha não estão cercados apenas de máquinas malucas, e tubos de ensaio, não. Eles dividem suas aventuras com o pato Donald e seus três jovens sobrinhos, afinal de contas, em Patópolis moram todos eles – para o stress de Donald, sempre ranzinza. Ou melhor, quase sempre: um dia, para ajudar um navio que naufragou na cidade, os sobrinhos de Donald deram ao tio um grande motivo de orgulho, usando bolinhas de tênis para puxar o navio de volta à superfície. A ideia não só deu certo nas histórias em quadrinhos de 1952, como em 1964, quando o Al Kuwait realmente afundou, usaram essa ideia para trazê-lo à tona com bolinhas de plástico, ainda mais leves… e não é que deu certo?! Donald deve estar até hoje contando essa história para todo mundo em Patópolis, a cidade oficial dos grandes criadores. Quem não estaria? A editora Abril acertou em cheio em republicar o Manual do Prof. Pardal em 2016, apresentando-o para uma nova geração de leitores a ser os nossos Pardais, de amanhã.

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  • Resenha | Tesouros Disney

    Resenha | Tesouros Disney

    Seguindo a onda de encadernados luxuosos de capa dura para um público de nicho, a Editora Abril lançou em 2017 o volume intitulado Tesouros Disney, que se propunha a publicar histórias raras e inéditas no Brasil. A publicação acabou sendo um tanto confusa. Afinal, o que faz de uma história em quadrinhos um “tesouro”: sua raridade ou a qualidade do conteúdo?

    Entre as escolhas editoriais do volume que podem gerar certa confusão temos, logo de cara, a pintura à óleo sobre tela de Carl Barks representada na capa. Embora a arte seja belíssima e tenha ficado ótima com a reserva de verniz, nada tem a ver com o conteúdo do miolo, que não apresenta nenhuma história do Homem dos Patos. Ao invés disso, temos várias histórias comerciais, criadas para promover o turismo nos parques temáticos de Walt Disney, crossovers pouco ortodoxos e uma história que causou um incidente diplomático no mundo real. Tudo isso em quase 400 páginas de quadrinhos em um excelente papel couché – que infelizmente é subaproveitado devido a decisão de manter as cores originais de época, claramente inferiores ao potencial da obra.

    A história que abre a edição, O fantasma da Montanha Canibal, apresenta Mickey e Pateta numa clássica aventura de mistério. Publicada originalmente em 1951, não escapa aos clichés da época sobre o funcionamento de materiais radioativos, mas tem uma ou outra solução criativa tanto para o roteiro quanto para os desenhos (representar as silhuetas dos personagens no escuro quase como em um anúncio de neon foi uma sacada genial!). Em seguida, temos a primeira história de Pluto como protagonista, que acaba sendo longa demais para o que se propõe. Pluto funciona melhor com histórias mais curtas, mas isso acabou sendo desenvolvido com o tempo a partir dessa primeira empreitada, que já apresentava os elementos clássicos das hqs do cachorro do Mickey (narração em off, Pluto como personagem mudo, agindo como um cão agiria em diferentes situações). A edição tem mais algumas histórias do Mickey com o Pateta que seguem mais ou menos o mesmo padrão, sempre com João Bafo-de-Onça como antagonista.

    Os crossovers da edição são bastante estranhos. Branca de Neve e Pinóquio se encontram numa história na qual não fica claro em que tempo/espaço ocorreu. Ela ainda mora com os anões e Pinóquio ainda é um boneco de madeira e isso foge do que foi estabelecido para os personagens em seus próprios filmes. Também é estranho ver na mesma história o Capitão Gancho, Tio Patinhas e Irmãos Metralha, ou o grande encontro de vilões que une esses a João Bafo-de-Onça e Lobão, de forma totalmente aleatória. Provavelmente um fan-service da época, já que essas são histórias que servem pra apresentar elementos da Disneyland. Além disso, como foram extraídas de uma revista específica, essas histórias contam com a apresentação da fada Sininho (nessa edição, traduzida como Tinker Bell para se adequar ao mercado atual) ou de uma página com Donald e seus sobrinhos de férias comentando a história antes dela começar. É estranho notar que, após essa miscelânea, temos duas ótimas histórias do Peninha escritas por Dick Kinney, seguida por uma das primeiras histórias do Donald desenhadas pelo mestre Giorgio Cavazzano.

    A última e mais longa história da edição é uma adaptação para o formato revista da série de tirinhas do Mickey Mouse de 1937, o Monarca de Medioka. Nessa aventura, após ganhar uma fortuna em dinheiro, Mickey acaba substituindo o rei de um país europeu falido. Como carapuças sempre servem em alguém, o governo da antiga Iugoslávia se sentiu profundamente ofendido e a história levou à proibição do camundongo no país! A história é bem divertida e realmente brinca com vários estereótipos da época, mas a polarização política da Europa de então viu a obra como subversiva e perigosa num mundo às portas da Segunda Guerra. Vale notar que essa mesma história foi republicada cerca de sete meses depois no nono volume da coleção Os Anos de Ouro de Mickey, no formato original. Por mais que a história seja boa, é impossível não pensar que as mais de cem páginas foram desperdiçadas com um material que já estava nos planos de ser publicado em outra coleção.

    Tesouros Disney é uma edição com altos e baixos, que pode decepcionar quem espera encontrar as melhores histórias da casa do Mickey em um volume, mas apresenta material raro e curioso que muito provavelmente não será republicado nas décadas vindouras.

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  • Culturama e os Novos Quadrinhos Disney

    Culturama e os Novos Quadrinhos Disney

    Após o hiato em que ficaram os quadrinhos Disney no Brasil devido ao cancelamento do contrato com a Editora Abril, finalmente os fãs de Mickey, Donald e toda a turma tiveram contato com o material da nova casa das aventuras de Patópolis. A editora gaúcha Culturama lançou em março suas cinco revistas mensais, todas com histórias inéditas e com a numeração reiniciando do zero. Além da distribuição avulsa normal em bancas, a editora aposta em outros pontos de vendas para popularizar a leitura de quadrinhos Disney, principalmente entre crianças – por isso, a princípio, não teremos os encadernados de luxo que foram descontinuados pela editora anterior, que era mais caro e voltado ao público adulto. Também está disponível um sistema de assinatura que, ao invés de oferecer um desconto ao assinante, oferece brindes exclusivos como canecas, chaveiros e miniaturas exclusivas. A Culturama oferece ainda uma terceira modalidade de venda: o box contendo as cinco edições e uma cartela de adesivos. Foi com essa caixa que o Vortex Cultural teve contato, e iremos analisar cada uma das edições a seguir. Todas elas têm 68 páginas e apresentam o mesmo texto introdutório, contando um histórico da própria Culturama, das publicações Disney no Brasil e os planos futuros da nova editora.

    *Os textos a seguir são as opiniões pessoais do redator, e não refletem necessariamente a posição dos editores do site.

    Tio Patinhas nº zero

    Comecei a ler pelo título do meu personagem favorito, o que seria o mais lógico a se fazer. O gibi do Tio Patinhas apresenta um formato de publicações de histórias que me pareceu o ideal, e se continuar assim tem grandes chances de ser minha revista favorita. A primeira história é uma publicação italiana, que costumam ser mais longas e com menos quadros por páginas. Pessoalmente, não sou um grande fã da Disney italiana. Embora eu reconheça a liberdade criativa dos autores e desenhistas, o traço mais estilizado típico dos artistas do país da pizza me incomodam às vezes. Mas o que me incomoda sempre é a falta de comprometimento com uma cronologia razoável. Isso fica muito claro na primeira história intitulada O grande amor do Tio Patinhas. Escrita por Bruno Concita e desenhada pelo mestre Giorgio Cavazzano, a história me induziu a um erro logo no título. Eu esperava que fosse sobre Dora Cintilante, a vigarista que roubou o ouro e o coração do velho sovina nos tempos de garimpo no Klondike. Bem, nada disso apareceu, e vemos uma personagem totalmente nova chama Miriam MacGold. Como assim, ela é o grande amor do Tio Patinhas? O que houve com Cintilante? Como eu disse, os italianos tomam certas liberdades criativas e acabam simplesmente ignorando qualquer coisa já feita antes por autores de outras nacionalidades. Mas devo confessar que a história é bem interessante e me peguei rindo em algumas situações. As histórias a seguir são mais curtas (e com mais quadros por página), com um traço mais clássico e consistente, e aparentam estar mais alinhadas com Barks e Don Rosa. Produzidas na Dinamarca, essas hqs apresentam tudo que se espera de um conto dos Patos: Invasão à Caixa-Forte, os Irmãos Metralha, Maga Patalójika, uma viagem ao antigo garimpo do Tio Patinhas… Mas apesar de manter o visual clássico, temos tecnologia atualizada, como smatphones por exemplo. Diferente das histórias de Don Rosa, que se passam em uma eterna década de 1950, os dinamarqueses atualizam o que julgam necessário para dialogar com a nova geração de leitores.

    Pato Donald nº zero

    Eu tinha uma grande expectativa pra ler o novo gibi do Pato Donald. Afinal, foi com ele que começou a publicação mensal de hqs Disney no Brasil, na Editora Abril. Não me decepcionei. Suas 68 páginas foram bem recheadas de histórias que se alternavam entre mistério, aventura e humor, todas elas na média de dez páginas. Me surpreendi ao ler a primeira história com o teor mais sério e atual. Um golpe na Escandinávia mostra Donald e seus sobrinhos de férias em Oslo e retrata de forma bem realista algumas das paisagens nórdicas mais famosas. Mais histórias dinamarquesas seguem a essa, com tom mais leve, e duas histórias italianas (além das gags de uma página estreladas pelo Peninha). Temos Professor Pardal, Metralhas, Gastão, uma história de exploração espacial com Tio Patinhas e claro, o Peninha aprontando das suas! Pra quem gosta de humor leve e descompromissado, ou procura por algo mais infantil, esse gibi é certamente a melhor opção.

    Mickey nº zero

    Após ler as duas revistas que eu mais estava esperando, resolvi tirar logo o elefante da sala. Nunca gostei muito das histórias do Mickey, então resolvi ler de uma vez pra terminar logo. Ah, como eu estava errado! O gibi do Mickey realmente aqueceu meu coração e superou qualquer coisa que meu preconceito com o ratinho pudesse me permitir esperar. Loo na primeira história, aquela surra de nostalgia: Francesco Artibani escreve um conto da juventude de Mickey, Donald e Pateta que remete às primeiras animações do trio, lá do início do século passado. A arte de Lorenzo Pastrovicchio emula perfeitamente o espírito da época, e vemos aquele Mickey aventureiro e cheio de energia dos clássicos animados em uma empreitada com seus amigos como limpadores de chaminés, e enfrentam o Bafo de Onça e cientistas malucos em uma história de 30 páginas que me levou diretamente aos VHS da Video Collection Walt Disney de quando eu era criança. A segunda história não deixou por menos. Contando a história do romance entre Mickey e Minnie desde quando se conheceram (mais uma vez adaptando o estilo ao dos anos 1920 em um flashback), Giorgio Fontana e Massimo De Vita nos mostra como é a vida a dois do casal mais famoso da Disney. Apenas duas histórias italianas nesse gibi e PRONTO! Já não sou mais um hater! Quem diria que um gibi do Mickey iria abrir minha mente para experimentar essas liberdades criativas? (Ou talvez tenha sido justamente o fato de manterem uma cronologia? Veremos nos próximos lançamentos…)

    Pateta nº zero

    Ah, o Pateta! Hahaha, não tem como errar numa revista dessas! É o Pateta, ele é o mais engraçado dos três personagens principais, haha… ha? Oi, como assim, ele não é o personagem principal de sua própria revista? É isso mesmo que estou vendo? Infelizmente, é isso sim. Assim como no título do Mickey, a revista do Pateta apresenta duas histórias longas produzidas na Itália. Mas o Pateta sequer é o protagonista! Nem mesmo secundário ele é na primeira história, que dá mais importância a uma personagem que eu só conhecia de longe (a arqueóloga Eurásia). Já na segunda história, Pateta faz dupla com Horácio (o cavalo, não o tiranossauro herbívoro) para desbaratinar os planos de uma empresária inescrupulosa que descobriu a “água fóssil” e… Ah, cara! Que história genérica, qualquer outra dupla de personagens poderia estar ali que daria na mesma! Podia ser com Donald e Peninha, Mario e Luigi, Cebolinha e Xaveco… A história não mudaria em nada. Espero que as próximas revistas tragam histórias mais curtas ou ao menos mais engraçadas.

    Aventuras Disney nº zero

    Ah, a cereja do bolo! Deixei por último pois sabia que ia gostar, já que lembra o mix de histórias do antigo Almanaque Disney. A revista abre com uma história longa do Superpato, que eu gostei mas confesso não ter conseguido identificar se é a versão clássica ou a nova, futurística, pois pra mim parecia mesclar elementos de ambas. (“Ain, Dan, você tem que pesquisar mais antes de escrever!” – É, eu sei, mals aí! Tô tentando.) A seguir uma história curta do único Lobão que vale a pena prestar atenção, uma história muda do Pardal com o Peninha e um conto de mistério da Vovó Donalda – eu senti um certo orgulho em ter desvendado o roubo antes do desfecho, mas depois me lembrei que é um gibi pra crianças! Pra terminar, uma história do Superpateta bem divertida e leve (meio bobinha até), mas que pode tirar um riso ou outro.

    Conclusão: os italianos são legais, Dan!

    Após terminar os cinco gibis, cheguei à conclusão de que não devo torcer o nariz pras histórias italianas. Elas são divertidas! E as novas revistas estão com uma material muito melhor na Culturama do que na antiga casa. Papel de maior gramatura, capa em couché, excelente impressão. Teve um ou dois errinhos de diagramação nos balões, mas nada que prejudique o resultado final. Resta agora esperar que essa qualidade se mantenha, e que venham também as prometidas publicações diferenciadas, além da retomada da produção nacional. Ah, e tem cartela de adesivos! Todo mundo gosta de adesivos!

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  • Resenha | A Nova História e Glória da Dinastia Pato

    Resenha | A Nova História e Glória da Dinastia Pato

    Pouco antes de perder os direitos de publicação dos quadrinhos Disney no Brasil, a Editora Abril lançou o primeiro e único volume de uma série que seria trimestral mas acabou morrendo na praia: tratava-se de Disney Saga, apresentando as seis partes da inédita minissérie intitulada A Nova História e Glória da Dinastia Pato. Continuação da saga italiana semi-homônima dos anos 1970 que mostrava os antepassados do Tio Patinhas, a nova história apresenta seus futuros descendentes.

    Na saga original, Patinhas e seus sobrinhos descobrem um baú com moedas mágicas pertencentes aos seus antepassados e cunhadas em diferentes eras, que ofereciam aos patos um vislumbre do passado ao serem esfregadas com os dedos. Essa premissa se mantém na nova história, porém com o misterioso surgimento de novas e estranhas moedas vindas do futuro. Assim, cada capítulo da série mostra um salto de cem anos pra frente, e acompanhamos o surgimento de novas tecnologias, bem como o avanço da sociedade rumo à colonização do espaço sideral. A cada novo século o valor do dinheiro vai mudando de importância, bem como a forma de se ocupar os espaços – seja na terra, no mar ou por todo o sistema solar.

    A qualidade dos desenhos de Claudio Sciarrone nos salta aos olhos logo de cara. Não temos aqui um traço clássico para os personagens, como os de Don Rosa ou do próprio Carl Barks, mas também não é caricato ao extremo como muitas das produções italianas. Embora em alguns momentos pareça estilizado, não chega a ser desproporcional e a leveza da arte-final combinada com as cores e o enquadramento das cenas dá uma dinâmica ao roteiro invejável a outras produções contemporâneas. Infelizmente, não podemos dizer o mesmo do roteiro em si. Os personagens que deveriam ser descendentes do Tio Patinhas, Pato Donald e dos trigêmeos Huguinho, Zezinho e Luisinho acabam sendo nada mais do que os próprios personagens com roupas diferentes. Não existe nenhum desenvolvimento das personalidades deles, de forma que lá pela metade da edição o leitor percebe ser inútil tentar aprender seus nomes – basta chamá-los pelos nomes clássicos mesmo e está resolvido!

    É evidente que os autores italianos tenham maior liberdade criativa com os personagens Disney, mas chega a incomodar a falta de uma árvore genealógica coerente (como a de Don Rosa). Isso já era sentido na saga original, mas na nova história fica muito estranho. É impossível não se questionar sobre a linhagem de cada um. Como exemplo, podemos observar a primeira história, que se passa no ano 2118. MacPat é o “bisneto” do Tio Patinhas (embora mantenha todas as características do próprio), mas não sabemos mais nada dele. O Tio Patinhas teve filhos então? Com quem? Foi na velhice? O mesmo questionamento vale pros sobrinhos, mas fica ainda mais estranho quando pensamos em Huguinho, Zezinho e Luisinho: os três patinhos nas eras futuras são trigêmeos também ou cada um descende de um dos irmãos? Não sabemos. Não faz diferença, já que todos são, basicamente, os mesmos personagens.

    Lá pelo meio da história temos uma participação especial inusitada do Ultracomissário Mick-Maus que, bem, é basicamente o Mickey mesmo. É interessante vê-lo na história, pois geralmente os universo dos patos não se mistura com o dos ratos, mas aqui o crossover ocorre de forma bastante natural.

    Quanto aos vilões da história, temos a participação dos Metralhas e do Bafo de Onça (como chefe do Mickey), mas o principal é mesmo o Patacôncio, em suas diferentes encarnações. O desfecho da saga retoma algo do começo que, sinceramente, pode passar batido ao leitor casual menos atento (vale até a pena retomar as primeiras páginas para compreender melhor), pois se desenvolveu de forma corrida e pouco original. Ao terminar a leitura, fica aquela sensação de que poderia ter sido melhor, mas os desenhos, cores e enquadramentos são tão agradáveis aos olhos que uma crítica mais pesada pode até parecer injusta. Deve ser a tal da “Magia Disney”, que carrega uma grande carga de nostalgia e permite que relevemos alguns erros em troca da experiência de uma leitura leve e descompromissada.

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  • Resenha | Tio Patinhas e Pato Donald: “Volta a Quadradópolis” – Biblioteca Don Rosa

    Resenha | Tio Patinhas e Pato Donald: “Volta a Quadradópolis” – Biblioteca Don Rosa

    O segundo volume da série Biblioteca Don Rosa, Tio Patinhas e Pato Donald: “Volta a Quadradópolis” é um dos livros mais interessantes publicados pela recém-extinta divisão de quadrinhos Disney da Editora Abril. Nele, vemos uma época da carreira de Keno Don Rosa em que embora ele estivesse mais confortável com os personagens, histórias e arte, também precisou passar por questões editoriais alheias à sua vontade. As histórias desse volume datam de outubro de 1988 até junho de 1990, e foram publicadas por editoras diferentes e em países diferentes, o que fez com que o autor tivesse que se submeter a alguns contratempos que, mais tarde com a carreira já consolidada, ele provavelmente não aceitaria. Assim, temos histórias que contam com o talento de outros artistas e escritores, em uma co-produção inclusive com o próprio Carl Barks!

    A primeira história, “O caçador de crocodilos”, segue a fórmula favorita de Don Rosa, que é a de aventuras de exploração e caça ao tesouro. A trama contém várias referências às histórias antigas de Barks, incluindo o incrível zoológico do Tio Patinhas mostrado na edição Em Busca do Unicórnio,  da coleção O Pato Donald por Carl Barks, publicada pela mesma editora. Na trama, baseada em uma ilustração de capa feita por Barks, Donald e os sobrinhos partem em uma aventura no Egito para encontrar um raríssimo crocodilo. Em seguida, temos Fortuna nas rochas, uma história curta em que Don Rosa usa seu conhecimento sobre geologia adquirido na faculdade para fazer piadas e trocadilhos com pedras (que se perdem na tradução). Mas a terceira história é a que, de longe, chama mais a atenção!

    Volta à Quadradópolis é a primeira continuação direta de uma obra de Barks, dando sequência à história Perdido nos Andes (também publicada na outra coleção). Vale notar o cuidado da tradução em manter os mesmos termos usados na coleção Carl Barks, incluindo a música que Donald havia ensinado aos nativos de Quadradópolis (corrigindo um equívoco ocorrido na última republicação das duas histórias, em Disney Big nº 05). A família Pato retorna aos Andes – dessa vez acompanhados de seu rico tio – para devolver as galinhas quadradas ao seu habitat natural, mas são perseguidos pelo Pão-Duro Mac Mônei, mais uma vez brilhantemente usado como vilão da história. É interessante a forma como Don Rosa representa o impacto cultural que pode ser gerado quando uma inóspita tribo é visitada por membros do chamado “mundo civilizado”, e o quanto de aculturação pode resultar do processo.

    Entre as outras histórias do volume (algumas curtas, centradas em uma piada), vale destacar mais quatro: Um pato vendo estrelas, Sua majestade Patinhas, Viagem no tempo e Ratos, sigam-me!, cada uma por um motivo diferente e igualmente interessante.

    Um pato vendo estrelas nunca foi finalizada, e é apresentada em sua forma de roteiro, com os esboços do próprio Don Rosa. Trata-se de uma peça publicitária, onde Donald e os Sobrinhos visitam o parque Disney-MGM. É a única história de Don Rosa em que Mickey aparece, aqui como uma celebridade dos cinemas (o universo do camundongo não existe nas histórias de Rosa). A história foi engavetada na época e é apresentada de forma crua, possibilitando ao leitor entender como o autor trabalha seus roteiros.

    Sua majestade, Patinhas mostra um pouco do passado de Patópolis quando o Tio Patinhas resolve transformar o Morro Matamotor, onde reside sua Caixa-Forte, em um país independente. A história lida com questões de imigração e impostos, e embora sua premissa seja ingênua à princípio, vemos várias camadas de assuntos sérios e relevantes sobre economia, geopolítica e sociedade, disfarçados de piadas infantis. Alguns elementos dessa história seriam reapresentados mais tarde na épica Saga do Tio Patinhas.

    Viagem no tempo é  uma história bobinha de quatro páginas que merece atenção por algumas curiosidades. Primeiro: não foi desenhada por Barks, o que nos salta logo de cara. Segundo: carrega a marca DuckTales, e apresenta os personagens de uma forma muito diferente do que Don Rosa estabeleceu em suas publicações. Em várias entrevistas e em matérias autobiográficas, Rosa afirma que apenas escreve histórias que possam ser uma continuidade do que Barks fez, recusando a desenhar personagens como o Peninha, por exemplo, que não foi criado pelo Homem dos Patos. Pois bem: nesta história ele escreve para nada menos do que TRÊS personagens criados para a série de TV! O mordomo Leopoldo, o garoto pré-histórico Bubba e o atrapalhado Capitão Bóing, além da Mansão Patinhas abrigar os sobrinhos como estabelecido na série. Aparentemente, Don Rosa é um homem de plenas convicções artísticas apenas quando não precisa de dinheiro…

    Em Ratos, sigam-me!, vemos algo singular: o autor se apropria de um antigo roteiro não finalizado de Carl Barks e desenvolve sua trama, baseada no clássico O flautista de Hamelin. Assim, essa é a única história feita, de certa forma, em conjunto pelos dois grandes artistas!

    Tio Patinhas e Pato Donald: “Volta a Quadradópolis” é um daqueles volumes cheios de gratas surpresas e curiosidades, que remonta a uma fase um tanto conturbada na carreira do autor e mesmo assim prende nossa atenção, tanto pelas ótimas histórias quanto pelas curiosidades de bastidores.

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  • Resenha | O Mistério dos Signos

    Resenha | O Mistério dos Signos

    Fazia um boa tempo que não lia uma história em quadrinhos da Disney. Para ser bem sincero, não tenho memória de quando sentei e li uma HQ do Mickey ou Pato Donald antes de ler O Mistério dos Signos, lançado pela Abril Jovem em Janeiro de 2014. Talvez por esse fato, minha leitura tenha sido um tanto quanto imparcial, o que não significa que não tenha gostado da trama. Aliás, adorei a história.

    Concebida por Bruno Sarda, O Mistério dos Signos foi durante um bom tempo a maior saga em quadrinhos da Disney, posto depois tomado por Era Uma Vez na América. Publicada ao longo de 12 edições do gibi Topolino, a história narra a busca pela Pedra Zodiacal, artefato mágico dividido em 12 pedaços que revela seu poder quando é unificado.

    A trama começa quando Pateta e Mickey descobrem a existência do artefato durante uma viagem ao passado. A dupla acaba dando de cara com um grupo, liderado pelo Professor Zodiacus, que acredita que a pedra possui poderes extraordinários e dá ao seu possuidor a capacidade de enxergar o futuro. Ao voltarem para o presente, a dupla começa uma busca pelas doze peças que compõe a Pedra. Ela foi dividida pelo professor para que seus herdeiros transmitissem a cultura e o respeito pela Astrologia. A trama vai ficando mais interessante à medida que Tio Patinhas, Donald e seus sobrinhos se unem à dupla e ao professor na procura das peças. Patinhas quer usar a pedra para seu lucro próprio, enquanto Mickey, Pateta e Zapotec querem a peça por seu valor histórico. Mas, espere! Tem mais! Bafo de Onça, o arqui-inimigo de Mickey também está ciente da Pedra Zodiacal e parte em sua busca própria para ter em suas mãos a relíquia.

    Parece confusa? Só parece. O roteiro de é muito bem escrito e faz com que a trama se desenrole de forma muito natural, dividindo-se entre os eventos presentes e flashbacks que contam como funciona história das 12 peças que compõe a Pedra Zodiacal. Outro ponto positivo é a interação entre os personagens. Mickey, Donald, Tio Patinhas, Bafo, Mancha Negra, Vovó Donalda, Gansolino, Huguinho, Zezinho, Luisinho, Maga Patalójika e até o Super Pato desfilam pela história, sempre interagindo em cena e com funções importantes na trama. Geralmente, excesso de personagens ocasiona problemas narrativos, mas aqui é uma das melhores soluções. Os desenhos de Massimo de Vita e Franco Valussi também ajudam na fluidez da história, pois criam um visual agradável aos olhos.

    Essa edição da Abril também é digna de elogios porque conta com um especial sobre todo o processo de criação da saga e ainda com um breve guia de astrologia, extras que fazem a leitura ser mais prazerosa. Em resumo, O Mistério dos Signos é uma dessas deliciosas histórias que divertem tanto aos leitores novos quanto aos mais velhos.

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  • Resenha | Tio Patinhas e Pato Donald: “O Filho do Sol” – Biblioteca Don Rosa

    Resenha | Tio Patinhas e Pato Donald: “O Filho do Sol” – Biblioteca Don Rosa

    Quadrinhos Disney costumam ser vistos pelo grande público como uma forma de escapismo simples e divertida, sem grandes nuances e, por vezes, até meio ingênua. Vez ou outra surge algum grande artista que resolve colocar um pouco mais de esforço em suas histórias e se dedica a trazer algo além do mero escapismo. Foi o caso de Carl Barks, nos anos de 1940 em diante, que criou grande parte do que conhecemos hoje nas histórias do Pato Donald e marcou gerações de leitores. Seguindo sua linha de narrativa e explorando os personagens desenvolvidos por Barks, nos anos de 1980 desponta aquele que seria aclamado pelo público como seu “sucessor espiritual” nas revistas dos patos. Keno Don Rosa era fã de quadrinhos desde criança, e afirmava ter se preparado a vida inteira para escrever uma única história do Tio Patinhas. Em julho de 1987 essa história foi publicada, e claramente não foi a única: muitas vieram depois e Rosa consagrou-se como um dos grandes artistas Disney!

    Em outubro de 2017 a Editora Abril publicou pela primeira vez no Brasil o primeiro volume da série que se propõe a compilar cronologicamente todas as histórias Disney em que Don Rosa trabalhou. Tio Patinhas e Pato Donald: “O Filho do Sol” – Biblioteca Don Rosa é um álbum luxuoso não só para os padrões de quadrinhos Disney publicados mensalmente no país, mas para o mercado de graphic novels como um todo. O livro apresenta histórias de julho de 1987 a agosto de 1988, com notas do autor e a primeira parte de sua autobiografia. A primeira história é a que dá nome ao volume (O Filho do Sol), e é uma releitura de uma hq que Rosa tinha produzido para um fanzine em sua juventude. A história traz tudo que uma aventura dos patos deve ter: ação, aventura, comédia, uma civilização perdida, tesouros… E um vilão que, nas mãos de Don Rosa, ficou realmente assustador: Pão-Duro MacMônei, que não só usa suas artimanhas e trapaças para ludibriar a equipe do Tio Patinhas como claramente ameça assassiná-los em determinado momento. A cena em que o vilão aponta uma arma para seus rivais em um avião em pleno voo passa uma emoção ímpar aos leitores, e realmente tememos pelas vidas dos protagonistas emplumados.

    Rosa segue à risca a cartilha de Barks, tratando os personagens não como patos verdadeiros, mas como uma representação da condição humana. Sua arte, muito detalhista e um tanto fora dos padrões Disney, dá o tom mais sério das histórias quando necessário. Em suas 200 e poucas páginas, vemos o autor explorar várias nuances de histórias clássicas do Tio Patinhas e Pato Donald, tanto nas histórias longas, nas curtas e nas piadas de duas páginas. Elementos clássicos como o carro 313, os Escoteiros Mirins, o vizinho rabugento Silva e o primo sortudo e presunçoso Gastão ganham o mais próximo de uma versão “definitiva” nas mãos talentosas do quadrinista. Embora esse primeiro volume ainda não apresente uma continuação direta de alguma história de Carl Barks, existem vários elementos do Homem dos Patos apresentados como homenagem, assim como a dedicatória que Don Rosa procurava esconder na maioria das suas histórias (D.U.C.K., sigla em inglês para “Dedicado ao Tio Carl, por Keno”). A preocupação com a continuidade das histórias, como num universo coeso cronologicamente, faz com que todas elas sejam ambientadas aproximadamente na década de 1950, o que se reflete nos hábitos e costumes dos personagens e na tecnologia que é por eles utilizadas – não há computadores ou celulares por perto!

    O último trenó para Dawson é a mais tocante das histórias. Nela, vemos um pouco do passado do pato quaquilionário e sua juventude vibrante, que contrasta muito com a sua personalidade sovina adquirida na velhice. Essa história faz uma ponte com A Saga do Tio Patinhas, épico de Don Rosa que será republicada na coleção.

    O álbum foi editado de forma muito parecida com a versão original, o que deve ter sido um árduo trabalho de negociação com o próprio Keno Don Rosa – que nunca estivera antes satisfeito com a forma que suas histórias eram publicadas. Todas as notas sobre todas as histórias, o prefácio e a biografia do autor foram escritas pelo próprio artista. O trabalho de tradução e letreiramento estão realmente muito bons, embora, por ser uma edição que se propõe definitiva, talvez algumas decisões editoriais como traduzir a moeda americana para “pataca” ou o sobrenome do velho tio para “MacPatinhas” ao invés de McPato (popularizado pela série de TV DuckTales) pudessem ter sido evitadas, como a Panini tem feito com personagens DC que tiveram nomes adaptados no passado. Mas esses são pequenos detalhes que, de forma alguma, alteram a grandiosidade da obra e a importância de sua publicação em terras brasileiras.

    Compre: Tio Patinhas e Pato Donald: “O Filho do Sol”.

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  • Resenha | Pato Donald por Carl Barks: A Cidade Fantasma

    Resenha | Pato Donald por Carl Barks: A Cidade Fantasma

    O quarto volume da série que pretende republicar toda a obra do Homem dos Patos é ao mesmo tempo o maior e o mais fraco que a Editora Abril publicou até agora. Com 252 páginas, Pato Donald por Carl Barks: A Cidade Fantasma corresponde cronologicamente ao volume 15 da coleção, e passa longe da fase de ouro do autor. Embora Barks se mostre muito mais à vontade tanto ao escrever quanto ao desenhar os personagens, algumas soluções de roteiro se mostram muito simplistas e em alguns momentos até mesmo preguiçosas. O traço dos patos está mais simples que nas edições anteriores, e Donald parece mais jovem e menos pesado, com seu bico menos alongado, pescoço mais curto e cabeça mais arredondada.

    As histórias dessa edição são de dezembro de 1953 a junho de 1955, e são mais curtas, sem os grandes épicos das edições anteriores. O foco está mais voltado para o dia a dia do Pato Donald, seus relacionamentos com a família e os vários ofícios que exerce para sobreviver. Embora não apresente histórias épicas, podemos destacar vários clássicos nesse volume, como Puxa-Puxa, que caramelo!, O faz-tudo, e Quem tutu quer, tutu perde. Essa última tem algumas curiosidades, como a aparição de um gato muito parecido com Lúcifer, de Cinderela, ou uma versão meio abobalhada do Professor Pardal bem diferente do que estamos acostumados hoje em dia. Em O preço da glória, Donald cisma que tem o dom cantar e quer participar de um programa de televisão, deixando os sobrinhos enlouquecidos com seus ensaios. Na tradução, todas as músicas cantadas por Donald são da banda Pato Fu, o que soa um tanto quanto anacrônico se lembrarmos da data e país de origem dessa história – talvez o tradutor Marcelo Alencar tenha as inserido para brincar com o nome da banda.

    A história que dá nome ao volume é a primeira a ser apresentada, e é uma ótima peça de comédia que homenageia os filmes de bangue-bangue muito populares à época. Porém, diferente de O Xerife do Vale Balaço, publicada anteriormente na coleção, a história é mais comedida no que se pesa à aventura. Mesmo assim, mostra um Pato Donald decidido a até mesmo pegar em armas para defender sua família de um suposto fantasma! Além de várias outras histórias de dez páginas, vemos duas que foi republicada há pouco tempo, com colorização diferente, no especial Contos de Natal por Carl Barks,  mas que valem a pena serem relidas (Um camelo de graça… é caro e Presentes para todos). Jogo de tênis, gag de uma página só, é um caso curioso: é uma das duas únicas histórias roteirizadas por Barks e desenhada por outro artista (no caso, Tony Strobl). Outro caso curioso é a história Pato Donald fala sobre pipas, que não tem roteiro de Barks e foi distribuída gratuitamente por companhias elétricas para alertar as crianças sobre os perigos de soltar pipas perto de fios e torres de energia.

    Embora não tenha grandes épicos e apresente uma qualidade inferior de roteiro e arte, esse volume ainda assim é bastante divertido e, por conter histórias menores, mais variado que os demais. Vemos um Pato Donald mais humano, um verdadeiro homem comum, que se esforça para atingir seus objetivos mesmo que, muitas vezes, não consiga. Temos, rivalidades, humor  e uma boa dose de inconsequência, além de textos explicativos e excelente qualidade gráfica, que podem agradar tanto o leitor casual quanto o mais exigente colecionador.

    Compre: Pato Donald por Carl Barks – A Cidade Fantasma.

  • Resenha | Pato Donald por Carl Barks: Em Busca do Unicórnio

    Resenha | Pato Donald por Carl Barks: Em Busca do Unicórnio

    Terceiro volume publicado da série (e oitavo editorialmente), O Pato Donald por Carl Barks: Em busca do unicórnio segue a qualidade gráfica de seus antecessores, e apresenta histórias sensacionais. Barks parece estar mais à vontade com os personagens, principalmente os recém-criados por ele, como Gastão e Tio Patinhas. Esses dois apresentam algumas características que foram aos poucos se perdendo nas histórias mais recentes. A história-título, Em busca do unicórnio, apresenta algo impensável para o Tio Patinhas dos dias de hoje: o velho sovina oferece uma gorda recompensa em dinheiro ao seu sobrinho caso ele cumpra a tarefa de capturar o último unicórnio vivo na Índia. Roteiristas mais novos costumam fazer com que Donald receba apenas 30 centavos por hora de seu tio, ou acabe até devendo algo a ele pelo uso de equipamentos. O Patinhas ainda embrionário de Barks não toma a dianteira da expedição, como faria em futuras obras do autor, terceirizando a ação. O Gastão, também embrionário, não é apenas um ganso sortudo. Ele “faz” a própria sorte, através de meios muitas vezes escusos, enganando e trapaceando seu primo para conseguir encontrar o unicórnio antes dele, e de forma menos trabalhosa. Assim, ao final das histórias com a dupla Donald/Gastão, nem sempre o primo ganso leva a melhor e a justiça poética parece funcionar. Donald pode, vez por outra, usufruir de uma parcela da riqueza de seu abastado tio, afinal!

    Em outra história apresentando a relação entre o pato e seu tio rico, Carta para Papai Noel, vemos um Patinhas menos avarento esbanjando seu rico dinheirinho para presentear seus sobrinhos-netos no natal. Essa história formidável (com direito a uma luta de retro-escavadeiras) já tinha sido republicada recentemente no especial de capa dura Contos de Natal, mas aqui apresenta a paleta de cores original, como todo o volume.

    Talvez o maior destaque da edição seja a história O felizardo do Pólo Norte, na qual Donald arma um esquema para se livrar do seu primo esnobe Gastão, mandando-o a uma infrutífera expedição no gelo polar. As cenas em que o pato sente o peso na consciência de sentenciar o ganso a uma morte glacial são de uma genialidade característica de Barks, e um dos momentos mais humanos do volume.

    A terra dos ídolos é mais uma daquelas histórias que se utilizam dos estereótipos raciais da época ao retratar os nativos americanos. Guardadas as devidas precauções para que não haja um julgamento anacrônico de valor, a história é sensacional! Donald arruma um emprego como vendedor de bugigangas e procura os povos mais isolados da América para empurrar suas quinquilharias. A transformação dos ídolos do título (totens, na verdade) em um enorme órgão à vapor é uma das cenas mais divertidas da edição!

    O volume apresenta Carl Barks bastante à vontade e em sua melhor fase. A qualidade das histórias é muito superior à edição que veio logo a seguir – que seria, cronologicamente, o volume 15 – , e merece um lugar de destaque na coleção de qualquer fã de quadrinhos Disney.

    Compre: Pato Donald por Carl Barks: Em Busca do Unicórnio

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  • Resenha | Pato Donald por Carl Barks: O Segredo do Castelo

    Resenha | Pato Donald por Carl Barks: O Segredo do Castelo

    Segundo volume publicado da coleção dedicada a trazer para o leitor toda a obra do Homem dos Patos (e cronologicamente, anterior ao primeiro volume), Pato Donald por Carl Barks: O segredo do castelo nos brinda com o que que há de melhor nos quadrinhos Disney de todos os tempos. Para o leitor e fã brasileiro, essa edição tem uma importância histórica, já que O segredo do castelo foi a primeira hq Disney publicada pela Editora Abril, em O Pato Donald nº 01, em julho de 1950 (dois anos após sua publicação original). A edição segue o padrão da anterior, com papel fosco e de gramatura maior que o normal e mantendo a paleta de cores próxima do original – com um restauro de verdade, não o que vem ocorrendo com as revistas Disney mensais que mais parecem xerox mal feito. A qualidade gráfica é bastante superior a qualquer obra publicada recentemente, o que prova que é realmente uma coleção à parte dos outros encadernados em capa dura da editora.

    Além da história que dá título ao volume, temos mais algumas aventuras longas, outras histórias de dez páginas e várias gags de uma página só. Em qualquer uma delas, vemos a arte de Barks de forma quase que cinematográfica, e painéis estáticos nos passam a noção de movimento necessária para que, em determinados momentos, tenhamos a sensação de estar assistindo um desenho animado. A maestria do roteiro de Barks pode ser percebida pelo tour que ele faz ao redor de vários gêneros literários, seja a aventura de exploração em “Os caçadores da borboleta perdida”, a ficção científica em “Corrida fórmula lua”, o faroeste de “O xerife do Vale Balaço” ou as sitcoms das gags de página única.

    Interessante notar como os personagens coadjuvantes ainda não apresentam as características que conhecemos hoje. O Ganso Gastão, por exemplo, embora rivalize com seu primo e se mostre um folgado convicto, ainda não tem a sorte como elemento chave de sua personalidade (sua história de estreia consta nesse volume, mesmo tendo sido republicada há pouco tempo em Contos de Natal, mas dessa vez com as cores originais). Os sobrinhos Huguinho, Zezinho e Luisinho ainda não são os Escoteiros Mirins que seriam mais tarde, e embora já não sejam mais os pestinhas das tiras dominicais de Al Taliaferro, tomam atitudes bastante questionáveis. Tio Patinhas é uma figura distante, longe do protagonista que se tornaria mais tarde pelas mãos do próprio Carl Barks, digno de estrelar sua própria série animada nos anos 80.

    Se há algo no volume que não agrada o leitor é o preço: 60 patacas é bastante salgado, mesmo pra um volume de qualidade como esse. Talvez compense esperar por promoções em sites especializados.

    Cada história – inclusive as gags – é analisada ao fim da edição por vários estudiosos de literatura e quadrinhos, que dão um gosto ainda melhor pra cada uma delas ao situarem o contexto histórico em que estão inseridas, bem como o momento da vida do autor que refletem. O trabalho de restauro é muito bem feito, principalmente em “Os caçadores da borboleta perdida”, cuja arte original havia se perdido há muito tempo e foi redesenhada em 1982 pelo artista holandês Daan Jipes. Nesse volume, ela teve seu restauro com base em uma edição italiana de 1950 e finalmente a vemos com a arte de Carl Barks novamente. Aos fãs, resta torcer para que a coleção seja publicada até o fim, mantendo a qualidade que vem se mostrando até agora.

  • Resenha | Bafo-de-Onça: 90 Anos

    Resenha | Bafo-de-Onça: 90 Anos

    Bafo - Vortex Cultural

    O mais antigo personagem Disney ainda em atividade acaba de completar 90 anos. Sim, João Bafo-de-Onça já estava por aí antes mesmo de um certo camundongo dar as caras nas telas do cinema. Inicialmente um animal parecido com um urso, Bafo foi transformado em um gato para melhor antagonizar o ratinho Mickey. De lá pra cá, mudou de personalidade várias vezes, sendo ora um criminoso incorrigível, ora um vizinho mal-humorado, ou até mesmo um amigo meio incompreendido, como no desenho A Casa do Mickey Mouse.

    Seguindo a linha das outras edições comemorativas – como Superpateta: 50 Anos – a Editora Abril lançou um especial de 300 páginas para celebrar o aniversário do vilão. O volume segue a mesma estrutura dos outros, dividido em três fases (Americana, Italiana e Brasileira), sem seguir uma rigorosa ordem cronológica. A importância histórica dessas hqs para o personagem parece ter sido o principal quesito na seleção, muito mais do que a qualidade das histórias ou a participação do Bafo nelas.

    A primeira história, de 1930, mostra a estreia do gatuno em uma história em quadrinhos. Publicada originalmente em formato de tiras, o leitor deve virar a edição no sentido horizontal para acompanhá-la. Essa história do Mickey foi escrita pelo próprio Walt Disney – embora o roteiro tenha sido finalizado pelo talentoso Floyd Gottfredson, que também ficou responsável pelos desenhos. É uma história ainda seminal, em que Bafo não passa de um capanga do vilão principal, e muito do que viria a ser as personalidades de Mickey e Minnie ainda estava sendo desenvolvida. Os personagens moram numa área pouco urbanizada, e vemos o cenário rural bastante presente, com seus elementos típicos ao fundo. A história gira em torno de uma herança que Minnie ganhou de um velho tio, embora a namoradinha do Mickey quase não tenha falas ou ações relevantes. O tom é de aventura, e o camundongo ainda mantém algumas características que sumiram com o tempo, sendo divididas aos poucos com outros personagens (ele se irrita fácil como o Pato Donald e se atrapalha como o Pateta). A história que vem depois mostra mais a personalidade do Bafo-de-Onça, que nessa época ainda tinha uma perna de pau. Nela, Bafo é o “homem da carrocinha” que persegue Pluto. Em seguida temos a primeira história de Carl Barks na qual o Bafo faz uma aparição, já com a perna “restaurada”. É basicamente uma história do Donald, e Bafo aparece muito pouco, embora seja essencial mais pro fim. A fase americana encerra com três histórias do Mickey, nas quais, além de ter maior relevância, Bafo apresenta a personalidade que iria consagrá-lo no quadrinhos: um verdadeiro e perigoso bandido.

    Na fase italiana, João Bafo-de-Onça ganha uma importância maior nas histórias. Não apenas o bandidão unidimensional, mas um personagem mais complexo e de personalidade maleável. Em terras italianas ele ganha uma “famiglia”, com direito a uma noiva (Tudinha) e sobrinhos terríveis (Bafito e Bafildo). O Bafo italiano ainda é um mau-caráter, mas se permite fazer uma macarronada na casa do Mickey e almoçar em sua mesa enquanto conta a história de seu tio-avô. Ou ainda, confia no camundongo para cuidar de seus sobrinhos enquanto cumpre pena na prisão. Claro que, no fim, sua verdadeira face vem à tona. Mas é interessante a forma como ela é construída ao longo das histórias. Vale lembrar que os autores italianos são mais propensos a criar novos personagens. Nas histórias dessa fase selecionadas para essa edição, não aparece o Pateta como “fiel escudeiro” e sim dois personagens menores. Atomino Bip Bip (um ser de outra dimensão) ajuda o Mickey na história de 1960 “O colar Quirikawa”, na qual a noiva Tudinha faz sua estreia. Já na história mais recente “A Ilha Nefausta” (de 2004, escrita pelo renomado Casty e desenhada por Giorgio Cavazzano), o companheiro de aventuras é Brutus, um corvo filho adotivo do Amadeu. Brutus é um personagem pouco conhecido do grande público, principalmente por ter sido traduzido em várias histórias nacionais erroneamente com o nome de seu pai. Essa é, de longe, a melhor história da edição.

    Já a fase brasileira deixa muito a desejar. Embora mostre a primeira vez que Bafo é desenhado por um artista brasileiro (Jorge Kato, pioneiro dos quadrinhos Disney brazucas), as histórias são rasas e superficiais. Mickey e Pateta contracenam com Zé Carioca em duas histórias bastante insossas, com roteiros ingênuos mesmo para a época (1961). As duas outras histórias dessa fase são melhores e realmente engraçadas, embora mais curtas. São da década de 1980, quando os quadrinhos Disney no Brasil tinham uma produção de excelente qualidade. Morcego Vermelho e Superpateta contracenam com o Bafo, com aquele humor brasileiro que Gérson L.B. Teixeira e Verci de Mello combinavam muito bem! Mas é pouco, comparado às mais de 260 páginas dedicadas aos autores americanos e italianos.

    Se levarmos em consideração que essa é uma edição dedicada a um personagem específico, podemos dizer que na maioria das histórias ele não foi lá muito relevante. Embora contenha boas histórias, o homenageado aparece muito pouco na primeira metade do volume, ganhando status de co-protagonista em apenas uma (A Ilha Nefausta). Na história de Barks, por exemplo, Bafo aparece em apenas nove dos cento e sessenta e cinco quadros! O material extra, com textos e fotos raras, é bem interessante. Mas não chega a ser uma edição tão boa quanto suas antecessoras.

    pietro gambadilegno

  • Resenha | Contos de Natal

    Resenha | Contos de Natal

    natal disney

    Histórias de natal nos quadrinhos Disney são quase que uma tradição anual. No Brasil, todo fim de ano vemos nas bancas um almanaque contendo coletâneas de histórias natalinas, o Natal de Ouro Disney. Edição esperada o ano todo pelos leitores nos anos 80 e 90, Natal de Ouro voltou a ser publicada há alguns anos, apostando em histórias mais recentes e algumas inéditas, produzidas na Itália. Além desta costumeira edição, os leitores de quadrinhos Disney no Brasil tiveram uma ótima surpresa nesse fim de ano: a Editora Abril publicou um volume em capa dura intitulado Contos de Natal por Carl Barks.

    Barks foi o criador de praticamente tudo que é legal nas histórias do Pato Donald, desde personagens secundários até a própria cidade de Patópolis. Esta edição apresenta, em ordem cronológica (em partes – mais sobre isso daqui a pouco) todas as histórias com tema natalino escrita pelo Homem dos Patos. São 35 histórias que vão desde épicos de mais de vinte páginas até gags de uma página só.

    As histórias de natal apresentadas nesse volume, além de serem clássicos indiscutíveis, carregam também grande valor histórico. A primeira delas, O Melhor Natal, apresenta a primeira aparição da Vovó Donalda. Além disso, mais duas histórias nos brindam com primeiras aparições: Natal nas Montanhas é a estreia de ninguém menos que Tio Patinhas Mac Patinhas (ou MacPato, para os saudosistas de Duck Tales). Aqui, Patinhas é um velho sovina e rabugento que odeia o natal e é praticamente o vilão da história. Sua personalidade ainda não estava definida – dizem que Barks não tinha planos de usá-lo em outras histórias.

    O avarento Tio Patinhas, em sua primeira aparição.

    O velho avarento co-estrela várias histórias, e rouba a cena em quase todas elas. O Patinhas de Barks não é tão avarento quanto era a princípio, e para ganhar a atenção de seus sobrinhos-netos não pensa duas vezes antes de esbanjar! Se em uma história ele aprende a valorizar o natal e a família, parece que na outra ele simplesmente esqueceu-se de tudo, e em outra se mostra muito mais mão aberta do que estamos acostumados. Nas últimas histórias, porém, podemos ver um Tio Patinhas muito mais próximo da figura que conhecemos: ainda um pão-duro, mas com bom coração!

    Em A Visita do Primo Gastão vemos o surgimento do ganso sortudo que não gosta de trabalhar. Gastão vive à revelia da própria sorte, e aparece mais algumas vezes no volume, sempre rivalizando com Donald e se dando bem no fim das contas. Sua personalidade não muda tanto quanto a do Tio Patinhas.

    A maioria das histórias parece girar em torno de um modelo: Donald enfrenta alguma dificuldade para comemorar o natal, inventa um plano, o plano dá errado mas no final tudo fica bem. Claro que nem tudo segue essa fórmula, e essa é a graça. Podemos ver os patos em um farol distante da cidade, em um submarino no meio do oceano, em uma ilha deserta ou simplesmente nos arredores de Patópolis. Barks pode contar uma excelente história, seja qual for o contexto ou cenário escolhido para tal.

    A figura do Papai Noel é algo bastante curiosa. Aparentemente, ele existe e todos concordam com isso – inclusive o próprio Bom Velhinho aparece em duas histórias. Porém, ainda assim, é preciso comprar os presentes para os meninos ou colocar a cartinha deles no correio a tempo. Aparentemente, existe uma diferença entre os presentes dados pelo Noel e os recebidos das mãos de seu próprios familiares. O que importa, mais do que tudo, é uma boa ceia em família, com peru assado!

    Barks não era lá um grande entusiasta da tradição natalina em sua vida pessoal, mas conseguia com maestria capturar as angústias, as ambições, os desejos e os mais diversos sentimentos que o feriado cristão gera nas pessoas, extrapolando para as páginas em uma excelente caricatura do Natal.

    Das histórias publicadas, apenas as duas últimas não estão em ordem cronológica. Noite Feliz, penúltima história, havia sido escrita e desenhada nos anos 60, mas foi vetada devido a um alto teor de violência para os quadrinhos Disney americanos na época (Donald é torturado com choques elétricos por seu vizinho Silva). Essa história foi publicada pela primeira vez duas décadas depois, na Holanda. Isso explica a diferença do traço dos personagens, com pescoços e bicos mais longos, como nas primeiras histórias. Essa é a única trama em que fica evidente o caráter cristão do feriado, com Donald cantando a música título, mais devido à tradução da versão brasileira do que uma vontade do próprio autor, que preferia deixar questões religiosas de lado.

    A última história não foi escrita por Barks, apenas desenhada a lápis. É a reprodução das páginas de um livro que já foi publicado no brasil três vezes, em diferentes formatos (diferente do que aparece creditado no índice, onde diz que foi publicada apenas uma vez). O velho conto Um Conto de Natal, de Charles Dickens, é mais uma vez reencenado pelo “Tio Scrooge” da Disney.

    Contos de Natal por Carl Barks é uma excelente edição, não trata o feriado de forma maçante e é garantia de boa diversão. O formato de capa dura, 400 páginas e miolo em couché é excelente, embora um pouco menor do que o apresentado em A Saga do Tio Patinhas e Os 80 Anos do Pato Donald. Ao leitor e fã das aventuras barksianas, resta torcer para que a Abril republique sua obra completa em um modelo parecido.

  • Resenha | Superpateta: 50 Anos

    Resenha | Superpateta: 50 Anos

    Super Pateta - Capa

    A Editora Abril continua sua série de especiais “50 Anos”, que já apresentou excelentes edições como Urtigão e Peninha. Dessa vez, a criação do Superpateta é comemorada em 300 páginas, nos mesmos moldes dos outros especiais. Não existe no formato nada de novo, pois é o que já vem sendo apresentado em edições como Disney Big: capa cartonada, papel jornal, formatinho. Entretanto, o conteúdo e a seleção de histórias mostram-se mais importantes do que comumente vemos nas hqs da linha Disney no país.

    Assim como os dois últimos especiais de 50 anos, essa edição é dividida por “fases”, sendo elas Americana, Brasileira e Italiana, novamente. Na Fase Americana, temos três histórias de origem, publicadas em ordem cronológica. A primeira trata-se de uma aventura comum do Mickey contra o vilão Mancha Negra no Velho Oeste, e Pateta acredita ter adquirido super-poderes ao beber um combustível do Professor Pardal por engano. Essa história é bem divertida, e pode ser considerada “normal” dentro do universo do camundongo detetive. A segunda história mostra o Pateta com uma capa inventada pelo Pardal que lhe concedia seus poderes, e pode até ser considerada uma continuação da anterior – embora não seja oficialmente. Já a terceira origem é a considerada “canônica”, pois mostra o Pateta comendo seus famosos “superamendoins“. Aqui surgem elementos que viriam a ser marca registrada do herói nos anos posteriores, como uma identidade secreta – Pateta vive em sua casa simplória e tem a certeza de que ninguém acreditaria se ele assumisse seu alter-ego. Seus incríveis poderes – os mesmos do Superman, diga-se de passagem – podem desaparecer a qualquer momento, ao passar o efeito do superamendoim. Essa fraqueza do herói permite que o roteiro seja bem desenvolvido, gerando situações cômicas e alguns problemas que Pateta deve resolver sozinho. Todos esses elementos seriam explorados nas histórias posteriores, portanto essa é a “verdadeira” origem do personagem.

    A partir de então, podemos considerar que Superpateta e o Pateta comum são dois personagens distintos. Isso porque, nas histórias do Mickey da época, os elementos super-heróicos são ignorados, talvez para que Pateta continuasse a ser um side-kick do rato mais famoso do mundo, ao invés de personagem principal. Da mesma forma que Donald não é o Superpato em todas as histórias, Superpateta faz parte desse universo onde quase todos os personagens principais da Disney tem uma contraparte heroica. Vemos então, na Fase Brasileira, o herói se juntar ao Clube dos Heróis. Superpato, Superpata, Morcego Vermelho, Borboleta Púrpura, Vespa Vermelha e Super Gilberto (o sobrinho gênio do Pateta) formam uma Liga da Justiça disneyana, além do encontro histórico com o Morcego Verde no Rio de Janeiro. As histórias brasileiras tem um tipo de humor mais centralizado e costumam ignorar a localidade onde se passam. O primeiro encontro do personagem com Zé Carioca, por exemplo, não deixa claro onde a história se passa. Isso pode ser entendido como algo comum nas histórias brasileiras da época, que assumiam Mouseton e Duck Burg como uma só cidade: Patópolis. Era comum, portanto, que o mesmo Coronel Cintra das histórias do Mickey pedisse ajuda ao Morcego Vermelho, Superpato ou Superpateta, bem como encontros com o Zé Carioca eram frequentes.

    A Fase Italiana conta com três histórias, sendo a primeira aventura do Superpateta produzida na Itália, uma história com a Bruxa Vanda e uma inédita no Brasil, a última produzida até agora. Os desenhos são mais exagerados e o humor mais escrachado, mas os artistas italianos expandem o universo do personagem, ampliando uma característica esquecida por outros autores: o ceticismo. Nessas histórias, o comedor de superamendoins não acredita em magia e superstições, contrariando o Pateta supersticioso de antigas revistas Disney.

    Para um personagem que surgiu como paródia às histórias de super-heróis, Superpateta cresceu e envelheceu razoavelmente bem. As histórias mais atuais são menos ingênuas, com um toque de ficção científica, e os roteiristas parecem mais preocupados em criar piadas originais e um background melhor desenvolvido do que parodiar quadrinhos consagrados. Para além das histórias em quadrinhos, Superpateta já teve uma memorável aparição no desenho animado O Point do Mickey, onde surpreendentemente é bastante fiel ao original, e bem engraçado também! Recentemente, também apareceu na série A Casa do Mickey Mouse, mas em uma versão mais infantil e de acordo com o propósito da animação.

    Superpateta  50 Anos é um prato cheio para os fãs do personagem e um bom tira-gosto para quem não o conhece ainda. Um tira-gosto quase tão bom quanto superamendoins!

     super pateta