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  • Resenha | Wytches

    Resenha | Wytches

    A família Rooks decide mudar de vida, deixar seu passado problemático para trás, e se mudam para um casa numa floresta para começarem do zero, em um cenário longe das memórias a que fogem. Original, não? Para a dupla Scott Snyder (Batman: A Corte das Corujas, O Despertar) e Jock (Os Perdedores, Arqueiro Verde: Ano Um), nenhuma história que tenha bruxas deixa de valer a pena, ainda mais se houver maldições que norteiam uma trama baseada na desconstrução de uma família adoravelmente disfuncional, cedendo a um sobrenatural irremediável que aos poucos se abate a mais cara, valiosa e frágil das instituições. Em Wytches, o destino ensina a jovem Sailor, seu pai Charlie e sua mãe Luce que fugir do passado pode ser a pior das ideias, em especial se ele dispor de garras letais, um faro apurado e uma onipresença, sob o sol ou sob a lua, pronto pra te devorar.

    Através de uma gama sem fim de livros (João e Maria), filmes (A Bruxa de Blair) e séries (Dark), aprendemos com essa ajudinha da cultura pop que as florestas americanas não são exatamente um bom lugar para ser vizinho, muito menos para se aventurar, sozinho ou com amigos. Pode ter sempre olhos à espreita… o que era para ser a história de uma menina amedrontada pela perseguição que sofre na escola, vira uma trama dupla com o pai de Sailor tendo que superar seus maiores medos para retirar suas filhas das garras da morte. Os autores demonstram seu esforço para transmitir um frescor a um velho clichês de bruxas e matas fechadas, ao passo que Wytches se revela uma grande (e aterrorizante) metáfora sobre o pior lado da paternidade: não poder mais proteger o seu bebê do mundo, lá fora.

    Sailor foi jurada e será perseguida, enquanto viver, por predadores do submundo que adoram cozinhar crianças no caldeirão, ou qualquer um que, a eles, é prometido. Ao descobrir isso, Charlie se debate contra o inevitável: a hora da filha chegou, junto de segredos devastadores que destroem sua família bem antes do perigo que existe debaixo daquelas árvores grossas, e ocas, que circulam a nova e bela residência dos Rooks, arrombar suas portas e janelas. As reviravoltas são o ponto alto, e quando chega a hora do leitor desvendar o real motivo da família ter se mudado, eis o grande momento que o livro se destaca entre outros contos banais por ai. Longe de ser uma leitura memorável, mas eletrizante até um fim surpreendente, o suspense aqui se apoia em excesso no estilo surrealista do traço e das cores do Jock, o que rende bons momentos perturbadores nos ambientes em geral, mas que às vezes subtrai o peso de diálogos importantes, ao invés de complementá-los visualmente.

    Como se sabe, o terror com inspiração em eventos reais é algo, digamos, irresistível. Atiça a nossa curiosidade com um charme quase que aromático, e assim somos levados para contos de gelar a espinha – ou que, pelo menos, nos prometem isso a partir de sua premissa. Com Wytches, a graphic novel que no Brasil é lançada pela editora Darkside num caprichado encadernado, com direito a cartas dos autores e seu processo de criação no final do livro, temos uma aventura com origem nas experiências de criança do escritor Scott Snyder dentro de uma sombria floresta, perto onde ele morava. Experiências essas que nunca abandonaram a sua fértil imaginação, e esperaram até ele crescer, até elas virarem algo mais: um bom livro ilustrado. Afinal, como bem disse o francês Victor Hugo (mesmo que a autoria da frase não seja até hoje comprovada a ele), “nenhum poder terrestre pode deter uma ideia cuja hora tenha chegado”. É isso.

    Compre: Wytches.

  • Resenha | Big Baby

    Resenha | Big Baby

    Big Baby é uma celebração apaixonada ao imaginário infantil, fértil ao infinito e irrepreensível perante a realidade escabrosa do mundo adulto. Um mundo este cheio de violência, doenças, polícia e até mortes misteriosas que dão o tom do que o consiste. Um mundo aqui decifrado, aos trancos e barrancos, na alegria e na dor, pelo jovem Tony, típico garotinho norte-americano de classe-média que vive rodeado de brinquedos, ideias malucas e, de vez em quando, um contato mais sério com a realidade que o assombra – em todos os sentidos.

    Publicado em preto e branco como se para nos transmitir, visualmente, a constante quebra da ingenuidade colorida pelos dilemas adultos que se infiltram, cada vez mais, na vida de Tony, Big Baby propõe um deleite a parte a seus leitores mais maduros: voltar a encarar certas situações com aquele olhar de dez anos de idade que, inevitavelmente, acabamos perdendo ao longo da vida junto de nossas horas livres para brincar, sem culpa, sem vergonha. Até mesmo o título do livro, que junta três histórias inspirados nesse encanto juvenil, remete ao fato de Tony já ser considerado um “bebezão” por quem já perdeu esse encantamento faz muito tempo, já.

    Como já mencionado, são três histórias a desdobrar com tremendo dinamismo e sedução também proporcionada pelo traço surreal, e inconfundível de Charles Burns, o choque entre a realidade implacável da violência doméstica, por exemplo, e a realidade ainda que imaginária de um menino que filtra tudo pelo viés do fantástico, pela perspectiva doce (e sem desculpas) do incrível dia a dia dos detetives de fundo de quintal. Em “A Maldição dos Toupeiras”, a primeira história do livro, os abusos de um marido alcoólatra com sua esposa indefesa perturbam Tony que assiste tudo pela janela do seu quarto, até que em “Peste Juvenil” podemos notar que os monstros da primeira história criados pela mente do garoto dependem da gravidade dos problemas reais para assustá-lo, mais ainda.

    Já “Clube de Sangue” consegue ser o conto mais inspirado e marcante dos três publicados num belo compêndio narrativo, no Brasil, pela Editora Darkside, com capa dura e tratamento gráfico impecável. Para terminar, Tony vai para um isolado acampamento de férias onde um grande mistério sobrenatural encontra-se em seu caminho, levando a desdobramentos muito além dos seus mais delirantes devaneios pueris. Burns é um grande contador de histórias, algo que já tinha nos sido provado na espetacular graphic novel Black Hole, de 1995.

    Assim, o que era para ser apenas uma história condenada a tirinhas de jornais, durante os prolíficos anos 1980 e 1990, é compilada em 2019 em três histórias a servir como um lembrete sensível, afinal de contas, de como toda essa liberdade e leveza do ser é impagável, nos conectando a quem realmente fomos no início das nossas vidas, principalmente se o leitor já passou dos vinte e cinco anos. Caminho sem volta de retorno possível, agora, com Big Baby. Só não vale ficar nostálgico demais.

    Compre: Big Baby.

  • Resenha | Prince of Thorns – Mark Lawrence

    Resenha | Prince of Thorns – Mark Lawrence

    Quando lemos um livro, logo de cara queremos nos identificar com o protagonista da história, por pior que ele seja. Buscamos em suas atitudes, sejam elas certas ou erradas, algo em que acabamos por nos espelhar ou ao menos refletir o que faríamos se estivéssemos na mesma situação. Essa empatia, esse sentimento de ter algo em comum com o personagem que nos é apresentado em uma história, é um dos fatores essenciais para que o leitor se sinta preso à narrativa e compartilhe das emoções que o autor quer passar através de sua obra. Mas como isso pode acontecer quando o protagonista é simplesmente asqueroso, ao ponto de não causar sequer um momento dessa identificação com o leitor?

    Prince of Thorns é o primeiro livro da Trilogia dos Espinhos, lançada pela Darkside Books, editora especializada em livros com temática mais sombria e violenta. Escrito por Mark Lawrence, esse primeiro volume nos apresenta o jovem príncipe Honório Jorg Ancrath e sua escalada obsessiva ao poder. Jorg foge de casa muito novo após uma tragédia familiar que o traumatizou. Sua mãe e irmão mais novo foram brutalmente assassinados e ele foi deixado à beira da morte em meio aos espinhos de uma roseira. A ira em sua mente cresce ainda mais ao perceber que seu pai nada fez para evitar o massacre (encabeçado por um rei rival) devido a questões políticas. Isso é parte do que faz dele um ser tão amargurado e sedento por sangue. Ainda criança, Jorg liberta os piores prisoneiros do castelo e junta-se a esse grupo de homens que guerreiam através de vários vilarejos em busca de poder. O que vemos a partir de então é uma pessoa sem qualquer moralidade cometendo os mais cruéis atos de barbárie e liderando um bando de homens bem mais velhos que ele.

    Jorg tem 14 anos no desenrolar da história, mas é inescrupuloso e sua ambição é se tornar rei aos 15 anos, mesmo que se utilize dos mais cruéis meios para atingir seu objetivo. Quando a idade limite auto imposta começa a chegar, o Prince dos Espinhos decide que é hora de enfrentar seu pai e tomar o trono para si. É interessante notar como no gênero dark fantasy, o foco é na violência crua e intrigas políticas, embora também exista magia no mundo, mas não tão colorida como em outros universos literários young adult. Aqui, tudo é sombrio e violento ao extremo, fazendo com que Game of Thrones pareça uma peça infantil em comparação. Jorg é psicopata, violento, estuprador, e não há remissão alguma para o protagonista na história. Essa é o principal motivo de não nos identificarmos com ele. Diferente de outros vilões da cultura pop, não existe nenhum momento em que podemos dar razão a ele, mesmo a história sendo contada em primeira pessoa e todas as motivações de Jorg nos sendo apresentadas tão explicitamente.

    O livro tem uma excelente qualidade técnica, com uma excelente encadernação em capa dura e papel de miolo com ótima gramatura. A leitura acaba sendo facilitada pelo formato do capítulos, geralmente bastante curtos e separados por páginas pretas com citações que nos dão uma pista do que irá acontecer em seguida. Obviamente, não é uma leitura que agrade a qualquer pessoa, e para aproveitar ao máximo a história o leitor deve deixar de lado a estranheza que um protagonista amoral e nada ambíguo pode causar. E esse é apenas o primeiro volume…

    Compre: Prince of Thorns – Mark Lawrence.

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  • Resenha | O Demonologista – Andrew Pyper

    Resenha | O Demonologista – Andrew Pyper

    O demonologista – Andrew Pyper

    O primeiro destaque que chama a atenção em O Demonologista foi o design do livro. A editora Darkside Books teve um cuidado absurdo em sua apresentação: a capa que simula uma encadernação artesanal que sofreu a exposição ao tempo, as folhas de rosto e páginas de ilustração, tudo aquilo me encheu os olhos no primeiro contato e foi se tornando melhor a partir do momento em que percebi que havia um diálogo estreito com a história a ser contada. Na trama de Andrew Pyper, O protagonista David Ullman denomina a si mesmo como o homem dos livros velhos. Especialista em mitologia cristã, ele leciona literatura na Universidade de Colúmbia e passa horas debruçado sobre O Paraíso Perdido de John Milton.

    Logo de início fica evidente que o momento em que se passa a história não é um recorte qualquer de sua vida, mas simplesmente a pior crise que já enfrentou. Dono de uma natureza inegavelmente prática, David tem que enfrentar a ruína de seu casamento, as dificuldades em relação à filha adolescente e a morte iminente de sua melhor amiga. A personagem não se sente confortável na própria pele. Um cético que se entrega a encontrar a lógica em narrativas de fé, um homem prático defendendo ideários românticos, alguém amargurado e deprimido que não quer aceitar a derrota em seus relacionamentos mais significativos.

    O terror intensamente presente no livro é representado enfocando um homem que perde tudo o que lhe é caro, inclusive sua mente, do que na figuras de demônios capazes das maiores proezas. Nem por um segundo acreditei que o protagonista estivesse mesmo em contato com estas forças ocultas, e me perguntei várias vezes se essa leitura da obra se devesse apenas por eu ser extremamente cética. De qualquer forma, a sutileza de Pyper parece privilegiar essa interpretação mais realista da história de Ulmman, o demonologista do título.

    Mas não se engane: dizer que o autor é sutil não significa que você não vá temer e ter calafrios. Embora não tenha desenvolvido medo repentino dos caminhos escuros, os recônditos de minha mente nunca me pareceram tão assustadores. Com a elegância de um musicista, o autor faz de cada capítulo mais sombrio e perturbador, explorando os medos mais elementares: ser traído, ficar sozinho, não conseguir se conectar com quem lhe é caro, perder as mais duras convicções. Os terrores diante da inevitabilidade da morte, da ameaça constante da loucura, da força inesperada de uma decepção, são dignos demônios que fazem dessa narrativa tão impactante. Outro diferencial da narrativa são os momentos de grande emoção. Foi uma surpresa me conectar tanto com os personagens de uma narrativa de terror a ponto de chorar com eles constantemente.

    Apesar de O Demonologista ser o primeiro livro publicado no Brasil, Pyper já lançou seis livros, entre eles o aclamado Lost Girls (1999), vencedor do Arthur Ellis Award e The Killing Circle (2008), eleito o melhor romance policial do ano pelo New York Times. Três romances de Pyper tiveram seus direitos vendidos para adaptação no cinema, inclusive esta obra, que deve chegar ao cinema com a direção de Robert Zemeckis, responsável pela trilogia De Volta Para o Futuro, o que me faz ter esperança que logo veremos mais publicações do autor no Brasil.

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    Mariana Guarilha é devota de George R. R. Martin, assiste a séries e filmes de maneira ininterrupta e vive entre o subconsciente e o real.

  • Resenha | Evil Dead:  A Morte do Demônio – Bill Warren

    Resenha | Evil Dead: A Morte do Demônio – Bill Warren

    Em 1981, chegava aos cinemas o cultuado A Morte do Demônio (The Evil Dead), dirigido pelo novato Sam Raimi, com a colaboração de Rob Tapert, produtor, e, claro, de Bruce Campbell, astro da série e co-produtor. Todos os amigos do trio se revezavam entre tarefas nos bastidores, elenco e pós-produção e contribuíram para a realização do longa-metragem, que, após todas as limitações, tornou-se um cult do gênero, conquistando seguidores ao redor do mundo.

    Décadas depois, mal sabiam os criadores da série que Evil Dead renderia duas sequências, um musical na Broadway, games, um remake, diversos sites dedicados a destrinchar todos os seus detalhes, e como não poderia deixar de ser, este livro. Escrito pelo crítico de cinema Bill Warren, conta com uma riqueza de documentos, detalhes de bastidores, entrevistas, fotografias e muito mais.

    O livro reúne em suas páginas detalhes de toda a trilogia original, contando ainda com dois capítulos extras dedicados especificamente ao musical da Broadway e ao remake de 2013, dirigido por Fede Alvarez (leia nossa crítica aqui). Contudo, o foco do livro é dedicado principalmente ao primeiro filme e a cada detalhe, da concepção do roteiro até a recepção do público e da crítica.

    Os capítulos iniciais são dedicados a figuras centrais na criação da série, Sam Raimi, Robert Tapert e Bruce Campbell, estabelecendo assim o elo de amizade, que existe até hoje, entre eles. Ademais, conhecemos um pouco do passado dos realizadores, suas experiências com cinema, como filmagens de aniversários, trabalhos de escola, pequenos curtas, e, por fim, o amadurecimento profissional de cada um.

    O longa-metragem Evil Dead é marcado por ser um grande filme cult do gênero e que revelou um grande diretor para o mundo. Mais que isso: conta a história de um grupo de jovens cheios de imaginação e talento, além, é claro, de insistência para o projeto ser concretizado. Essa perseverança já é marcada nos primeiros curtas, principalmente em Within the Woods, um filme de pouco mais de 30 minutos, com Bruce Campbell como protagonista se tornando um zumbi que passa a perseguir sua namorada. O curta de poucos recursos rendeu ótimas críticas a Raimi e sua trupe e preparou terreno para o que viria a se tornar Evil Dead.

    Outro ponto interessante da leitura são as influências que permearam a carreira de Raimi: muito longe de ser um aficionado pelo terror, o diretor sempre foi muito mais influenciado pela comédia (principalmente Os Três Patetas, que ele e Campbell adoravam) do que necessariamente por outros gêneros. Essa influência fica bem clara em Evil Dead. Contudo, após muitas conversas com Rob Tapert e o fracasso do curta It’s Murder, entendeu que o terror seria a melhor maneira de lhe abrir uma porta inicialmente, haja vista o baixo custo de produções como O Massacre da Serra Elétrica, de Tope HopperA Noite dos Mortos Vivos, de George Romero; O Aniversário Macabro, de Wes Craven; Halloween – A Noite do Terror, de John Carpenter, todos bem recebidos pelo público e de diretores em início de carreira.

    Dessa forma, Raimi passou a estudar o gênero e esses estudos encontram-se na sua série e em toda a sua filmografia. Um trabalho competentíssimo de resgate não só de filmes clássicos, como também de filmes b, trash’s e cult’s, denotando o compromisso e a paixão de Raimi pelo cinema. Outro ponto importante em toda a obra é a forma como ele encara sua técnica como cineasta, sempre buscando novas formas de filmar por meio de diferentes ângulos, equipamentos e outras tecnologias.

    O processo de criação de toda a série é minuciosamente detalhado pelo autor, desde a dificuldade em levantar o dinheiro da produção; as filmagens; a problemática montagem do filme, já que Raimi e seu perfeccionismo deixou Evil Dead com dezenas de horas de filmagem (Joel Coen e Edna Paul foram os responsáveis pela montagem do primeiro filme); todos os problemas de censura que o filme passou; como também a sua distribuição.

    O livro conta ainda com dezenas de imagens de bastidores, entrevistas, além de três capítulos finais com os comentários de Bruce Campbell sobre cada obra da série, uma espécie de versão comentada. Por isso, aconselho o leitor a rever os filmes acompanhado do livro, já que Campbell revela vários detalhes e segredos de como as cenas foram concebidas.

    Evil Dead – A Morte do Demônio, da editora Darkside Books, é um livro surpreendente não apenas para fãs da série e de filmes de terror trash, mas também para os fãs do cinema, e fundamental para entender um pouco a cabeça de um grande diretor. Admirável.

    Compre aqui: Edição Simples | Limited Edition.

  • Resenha | O Massacre da Serra Elétrica – Stefan Jaworzyn

    Resenha | O Massacre da Serra Elétrica – Stefan Jaworzyn

    Depois de estrearem com a novelização do clássico Os Gonnies, a Editora Darkside lançou no mercado a Coleção Dissecando para apresentar bastidores de clássicos filmes de terror. Até o momento, O Massacre da Serra Elétrica e Evil Dead foram publicados tanto no formato tradicional quanto em capa dura, evidenciando uma editora que também faz do seu acabamento um diferencial.

    O primeiro título da coleção Dissecando é dedicado a O Massacre da Serra Elétrica, um filme de baixo orçamento que modificou as estruturas das produções cinematográficas. A obra é assinada por Stefan Jaworzyn, editor de fanzines e de festivais de filmes de horror. Porém, é difícil legitimá-lo com um autor no sentido literal da palavra. Ao contrário da biografia da banda Black Sabbath, de Martin Popoff, também publicada pela editora, não há uma condução narrativa que ligue as histórias de cada filme com os depoimentos apresentados. Jaworzyn optou por realizar pequenas introduções em diversos capítulos e colocar em sequência justaposta os depoimentos dos envolvidos.

    Este estilo inusual  – que alguns poderiam considerar preguiçoso por parte do autor – faz a leitura ficar, a princípio, truncada até que o leitor se acostume com as diferentes vozes. No começo da edição, uma lista identifica a equipe que prestou depoimentos para cada filme.

    Antes do prefácio do livro, a edição brasileira explica que o filme foi traduzido erroneamente para o país, modificando a motosserra do original por uma serra elétrica, aparelho que precisaria de energia elétrica para funcionamento. Por questão de tradição, os editores optaram por utilizar a mesma expressão no decorrer do texto.

    O prefácio é assinado por Gunnar Hansen, primeiro ator a vestir a máscara de pele humana e segurar a serra elétrica, sendo, ainda hoje, reconhecido pelos fãs. Em seguida, um breve prelúdio explica o que o diretor Tobe Hopper produziu até a composição de O Massacre da Serra Elétrica.

    O ponto alto do livro centra-se nas histórias desta pequena grande produção. Mesmo sem uma linha narrativa, os depoimentos são coesos e postos em uma sequência que dialoga entre si. A história por trás de O Massacre é rica em informações e detalhes. Sua filmagem foi feita de maneira mambembe e a realização em grande parte deve-se aos investidores que, mesmo sem um roteiro nas mãos, viram uma ideia com muito potencial. O resultado conhecido do público é um filme de terror precursor. Além de recursos escassos, abriu espaço para que narrativas do estilo saíssem do nicho do gênero e fossem considerados grandes filmes assustadores. Mais de 50 páginas abordam este fenômeno, que, até a década de 2000, ainda era proibido integralmente em alguns países.

    Antes de apresentarem a segunda produção da saga Leatherface, um capítulo se dedica a biografar Toby Hopper e mencionar suas outras produções de sucesso, como Poltergeist – O Fenômeno, Pague Para Entrar, Reze Para Sair e outras obras que, por modificações dos estúdios, tiveram resultado aquém do esperado, caso de Força Sinistra, Invasores de Marte e outras produções recentes.

    Em cada parte dedicada a mais uma produção de Leatherface, encontramos um material rico em informações de bastidores, comentários e recepção do filme na época e em críticas contemporâneas.

    O livro originalmente termina em 2003, época em que a produção de um remake de O Massacre estava em pré-produção. Para deixar a leitura completa, os tradutores Antônio Timbau e Dalton Caudas produziram os capítulos posteriores sobre a refilmagem, uma prequel lançada em seguida, e a nova versão em terceira dimensão, que é continuação direta do filme original.

    Complementando o material, há um capítulo sobre Ed Gein, personagem que inspirou partes dessa obra e de outros clássicos do cinema, como Psicose; uma lista de documentários e outras produções associadas e as fichas de elenco, créditos, bibliografia selecionadas e links consultados.

    Se tais informações não fossem tão profundas, produzindo um material histórico, a não-narrativa do livro seria um dos problemas mais gritantes, já que o autor não sentiu a necessidade de enriquecer um material incrível conduzindo-o com propriedade.

    Mesmo que as sequências de depoimentos fujam do conceito tradicional de uma biografia, o livro é afiado e obrigatoriamente te incita a revisitar todos os capítulos da saga. Permite acompanhar, com uma visão mais aprofundada, as cenas consideradas difíceis e episódios que causaram vergonha em muitos por sua baixa qualidade técnica ou de roteiro.

    O bom conteúdo se destaca ainda mais por uma edição repleta de imagens e com um design e material gráfico excelente produzido pela competente equipe da Retina 78. Fazendo desta obra um produto-fetiche de prateleira admirado também por sua beleza.