Tag: Bill Willingham

  • Resenha | Fábulas – Livro Três

    Resenha | Fábulas – Livro Três

    Em conversas com amigos, dos mais diversos gostos e pontos de vista, unânime mesmo é uma coisa só: toda história tem seu ponto baixo. Seja numa cena chata de um filme, seja numa passagem interminável de uma bela obra literária ou teatral; toda narrativa tem seu ponto fraco, vide que nada é perfeito. Ao iniciar a saga Fábulas, seus autores certamente reconheceram o ouro que tinham nas mãos, e deram o melhor debute possível a história de Branca de Neve, Lobo Mal, Chapeuzinho, e centenas de outras criaturas lendárias que, para fugirem da destruição no seu mundo encantando, tiveram de se refugiar no nosso mundo.

    Ao que parece, a própria condição de reclusão das fábulas nessa dimensão parece ter sortido efeito ao próprio encantamento da história, sendo aqui banalizada nestes fracos arcos, de uma saga que começou tão bem, e que parece ter tido seu grande fôlego inicial diminuído neste compilado, em questão. Em uma premiada saga com mais de 40 volumes já publicados no Brasil pela Editora Panini, no selo adulto Vertigo, da DC Comics, ao que parece o ponto mais descartável da longa história faz-se em Os Ventos da Mudança, e consequentemente, com Terras Natais, sob a impressão cada vez mais clara que a narrativa sofre, aqui, uma bela de uma ressaca junto aos inúmeros acontecimentos dos arcos anteriores, e ótimos volumes de Fábulas.

    Após uma enorme batalha entre seres mitológicos ter custado a paz de todos os refugiados, na mítica cidade das fábulas, tudo mudou. Tramas políticas tomam forma e armadilhas são feitas, como se a história agora fosse um episódio perdido de House of Cards com animais falantes, e rainhas de gelo. Cada vez mais, os ícones da mitologia mundial se adaptam a lógica do mundo humano, uma lógica fria, capitalista e cínica, repleta de traições e artimanhas para sobreviverem nas chamadas “selvas de pedra”. Assim, velhos amigos retornam, novos inimigos retiram suas máscaras para infernizar (mais ainda) a vida do xerife da Cidade, enquanto um jovem guerreiro aterroriza as terras natais galgando sua fama de invencível. E o que parecia ser uma saga, agora, ganha contornos de uma coleção de contos pobremente conectados.

    Se em Os Ventos da Mudança perde-se um tempo valioso com longos flashbacks que nada somam a mitologia geral, apenas para a saga ter um ar de aventura descompromissada – uma exigência da editora, provavelmente –, o desinteresse pelo enredo e suas digressões começa a tomar forma muito antes do final. Um volume preguiçoso, em que os poucos acontecimentos que realmente importam carregam certo impacto, tal o nascimento dos seis filhos de Branca de Neve, para logo tornarem-se esquecíveis no começo de Terras Natais, em que a história parece relembrar um pouco do seu rumo, e seu fôlego, e aposta novamente no prazer da construção e na exploração de um mundo próprio, e adorável, repleto de possibilidades espetaculares.

    Ao final, descobrimos que as fábulas originais já estão divididas, todas com interesses mesquinhos e nada altruístas, e o príncipe que era encantado já virou sapo, faz tempo. Fábulas conta também com seus traços inconfundíveis, tão vibrantes que não perderiam sua força nem mesmo em uma versão preto e branco, mas que não apresentam mais aquele minimalismo gráfico que tanto colaboraram para a boa experiência de se mergulhar nas cores, e no movimento dos volumes anteriores. Uma publicação, enfim, que não deixa de ser sobre a desilusão com o mundo adulto e moderno, distópico por natureza, ou ainda, acerca de uma falta de empatia generalizada com o próximo. Algo que ninguém parece ter a cura. Nem no reino mágico, muito menos num mundo cuja única magia, o amor, sempre foi tão subestimada.

    Compre: Fábulas – Volume 3.

  • Resenha | Fábulas – Livro Dois

    Resenha | Fábulas – Livro Dois

    Escondidos na nossa dimensão, eles tentam passar despercebidos – enquanto a coisa só complica entre eles. Só o amor, na causa. Causa, no caso, dessas pobres fábulas perdidas e em constantes conflitos, uma com a outra, em que apenas um laço forte e sincero entre elas pode lhes salvar a pele, nas mais perigosas situações que se metem – e todo o resto é fadado a morte, e ao fracasso. No mundo dos homens, em que não há moral nem final para as histórias, já que a vida real é uma sucessão de coisas inacabadas ou mal terminadas, as figuras icônicas de Fábulas sabem que tudo é complexo e imprevisível demais, as vezes perverso também, e para sobreviver a uma realidade dessas, só se convertendo a seus princípios – sejam eles quais for.

    E onde fica o amor do xerife Lobo Mal, pela durona Branca de neve? Do mafioso e milionário Barba Azul, pela revolucionária fugitiva Cachinhos de Ouro? Tudo à base de interesses e intrigas, é claro, já que até o Príncipe Encantado esconde segundas e oitavas intenções da sua ‘amada’ Aurora – de quem só quer o dinheiro. A pureza não resiste a lógica mundana. Aparentemente, os autores aqui não apenas americanizaram e capitalizaram essas figuras de acordo com a moral financeira de uma sociedade, cujo poder financeiro é o que manda, mas neste terceiro volume da série, O Livro do Amor, deixam claro que a felicidade e o êxito, em qualquer coisa na vida, não podem ser atingidos sozinhos, e muito menos sob a égide do mal.

    Soa um tanto moralista, mas ironia dessas histórias reside justamente nisso. Assistimos a desconstrução dos inocentes enquanto acompanhamos um jogo de interesses tomar corpo e armar suas terríveis consequências, já que todos querem a cabeça da rebelde Cachinhos de Ouro, por ter colocado fábula contra fábula em busca de poder, no segundo volume, A Revolução dos Bichos. Escondida junto do seu amante Barba Azul, ela é descoberta e parte para a vingança contra os envolvidos na sua caça. Nem mesmo a mais angelical donzela evita em pegar num rifle e enfiar machados na cabeça de ninguém, em momentos tão chocantes que poderiam fazer parte de um filme de Quentin Tarantino – como no conto de abertura da revista, em que João das Montanhas, do folclore americano, consegue enganar e prender a própria morte para dar mais tempo de vida a sua amada.

    Este terceiro volume perde muito tempo, recompensado pelo belo trabalho gráficos de alguns quadros coloridos, com histórias paralelas que pouco contribuem com a trama principal de Branca de Neve, Cachinhos de Ouro e seus companheiros de fé. Com quase duzentas páginas, há inúmeros personagens cujas tramas se cruzam com certa naturalidade e um bom ritmo de leitura, atrasado por vezes com pequenos contos sem importância, e que são válidos apenas para explorar o potencial desta situação bidimensional, em que princesas e entidades do folclore mundial vestem terno, salto alto, usam celulares e se defendem, como podem. Em meio a boa dramaturgia e a ação de uma condição dessas, o final feliz do Lobo Mal e companhia (nem tão mal assim, já que na vida real o maniqueísmo absoluto não dura) parece ser uma utopia difícil de acreditar, tal como também o é para todos nós. Como diria Woody Allen: “a realidade é chata, mas ainda é o único lugar onde se pode comer um bom bife.”

    A Marcha dos Soldados de Madeira deveria se chamar ‘A guerra dos exilados’, uma vez que, agora, a subversão dos valores das figuras do mundo da magia, no mundo humano, em contato com os princípios complexos das relações humanas, é o que impera. Tudo é virado de ponta a cabeça, ninguém é quem parece ser, e a trama toma caminhos totalmente inesperados. Com a iminência do nascimento do filho de Branca com o Lobo, os protagonistas da série, há cada vez mais forças da dimensão em que todos vieram influenciando a paz das fábulas sobreviventes, escondidas parte em Nova York, e metade numa fazenda no interior americano. Tentando viver uma vida normal, enquanto uns tocam blues e outros tentam vender os feijões mágicos que lhe sobraram depois de tantos anos, uma personagem surge sem ninguém esperar por ela: Chapeuzinho Vermelho. Mais misteriosa que nunca, cheia de amor para dar, e histórias bem estranhas para contar.

    Mas nada mais é tão simples quanto, um dia, já foi para os envolvidos em sua tenra e fabulesca história: a realidade roubou a magia dos olhos dela, e agora, surge no mundo real como emissária direta do mal que assola a dimensão de onde todos conseguiram escapar. Um exército inspirado em Pinóquio, com soldados literalmente rústicos numa clara alusão ao mito dos homens de preto (agentes do governo dos EUA e que, supostamente, atuam entre civis a serviço das forças ocultas de inteligência do país), marcha em direção ao prédio nova yorkino onde estão a maioria das fábulas exiladas. Um estado de emergência se forma, mulheres e crianças também vão precisar lutar, e com o desaparecimento repentino do xerife Lobo Mau, o desespero só aumenta para aqueles que não tinham grandes problemas nas clássicas alegorias literárias do passado, mas agora, carecem um do outro para não serem assassinados em um grau de realismo assustador.

    A história é longa, e desta vez, sem tempo a perder em contos paralelos igualmente longos, mas entediantes. Logo no começo, somos apresentados a uma épica guerra na terra natal das fábulas, o que rende belíssimos quadros repletos de detalhes das paisagens, e suas criaturas fantásticas – dragões, homens-corvo, ogros e guerreiros de todo tipo. Padecida na batalha, e tida como morta, Chapeuzinho Vermelho nunca esqueceu do amor que cultivava pelo Menino Azul, o jovem amigo de Branca de Neve e o único conhecedor vivo dos horrores no campo de batalha que acometeram Chapeuzinho – e o que mais sofre, com seu retorno. É preciso afirmar, novamente, como este quarto volume de Fábulas, diferente de O Livro do Amor, flerta metaforicamente com o tema da perversão, no qual muitas garotas (e garotos) são expostos, geralmente por questões culturais, com suas vidas e sua índole alteradas para sempre em um processo, muitas vezes, sem volta.

    As fábulas, mesmo lutando contra o temível e homônimo soldados de madeira, se veem no dilema (i)moral de Chapeuzinho, já que neste mundo, é muito fácil sair dos trilhos que uma vez foram sugeridos como uma boa escolha, a alguém, mas é preciso lutar contra uma deles, o que os torna, é lógico, enfraquecidos como comunidade. As duas publicações aqui citadas da editora Panini, do selo Vertigo da DC são orgulhosamente cruéis com seus personagens, dando-lhes o destino que alguns não merecem, afinal, eles estão na complexa e inexplicável realidade humana. Tendo que se manter vivos, e da forma mais decente possível, o amanhã é incerto para todos, e a série, vencedora de 25 prêmios Eisner, o Oscar dos quadrinhos, ainda parece ter muito fôlego no desenrolar de suas tramas paralelas. E como diz o Príncipe Encantado, a certa altura da história: “O governo dos mundanos cuida deles!”. Gostaria que ele viesse para o Brasil ver a situação do cidadão brasileiro, em 2019. Seria uma dose de realidade forte demais, para ele.

    Compre: Fábulas – Volume 2.

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  • Resenha | Fábulas – Livro Um

    Resenha | Fábulas – Livro Um

    A ideia de juntar o fabulesco com o real, as criações dos irmãos Grimm, de Walt Disney e outros antigos autores, e fazê-las se cruzar em mil e uma situações pelas calçadas e prédios de Nova York, é irresistível demais para habitar apenas o terreno das idealizações. E qual outra mídia seria mais adequada para o surreal explodir com suas cores, seus célebres exageros, seu ideal satírico do que as histórias em quadrinhos?

    A nona-arte consegue abordar com naturalidade e fascínios impressionantes a crueza do mundo real, cheio de leis, sexo e contradições, e ao mesmo tempo o fabuloso e o onírico, sendo um palco narrativo mais do que perfeito para uma premissa que visa juntar todas as figuras (ou boa parte delas) dos contos de fadas, e de outras mundialmente famosas reinações infanto-juvenis, em torno de um crime sem solução.

    Sempre no limiar entre a verdade, e a ficção, a trama desse primeiro volume se inicia com o arco Lendas no Exílio, e envolve os mitológicos Branca de Neve, o Lobo Mal, Príncipe Encantado, Barba Azul e muitos outros ícones em forma humana, infiltrados na sociedade americana após fugirem dos reinos encantados onde moravam, escapando de uma força demoníaca avassaladora. Conformados, e cientes de precisarem superar suas desavenças clássicas para sobreviverem do lado de cá, tudo vai bem até que o exílio dessas figuras é conturbado pela morte de Rosa Vermelha, a irmã de Branca de Neve.

    Ao desencadear uma investigação que nos faz conhecer a fundo vários segredos, descobrimos junto do Lobo Mal, o experiente detetive que parece uma versão caricatural de William Somerset, de Os Sete Crimes Capitais, que ninguém consegue se manter inocente neste mundo real. Com um mistério pedindo resolução, todas as personagens acabam se entrelaçando (a relação de um dos três porquinhos com o Lobo é ótima, mesmo que rapidamente mostrada), mas bem distante do contexto e dos valores fabulescos que aprendemos a vê-los, desde a nossa infância.

    Todos(as) estão jogados aqui numa espécie de rascunho de um conto mal elaborado de Agatha Christie. Isso porque a história é totalmente dependente da sua premissa inicial, e fraca no desenrolar da trama oriunda da ideia central. Em certos pontos, a trama (frágil, e previsível) recicla alguns diálogos expositivos e certas explicações também, pois parece não se sustentar com seu pleno desenvolvimento. Aqui, o roteirista Bill Willingham prefere sempre olhar o passado para desdobrar as situações presentes, e nunca alçar o futuro, como nem mesmo o final um tanto inseguro, deste primeiro volume, consegue transparecer.

    Mantendo um certo interesse (em especial nas primeiras cenas, nas quais as interações entre personagens provam o potencial pobremente aproveitado da história), e com belíssimos painéis beneficiados pelo traço instigante e detalhista de Lan Medina, o começo desta saga publicada no Brasil em 2012 pela editora Panini, sob o selo Vertigo, da DC Comics, conta com inúmeras lendas dos contos de fadas refugiadas em um cenário urbano, onde é proibido revelarem suas reais aparências. Porém, em termos de juntarem essas figuras em torno de um desaparecimento de uma delas, em uma ambientação atual, cínica, e cheia de conflitos mesquinhos, digamos que o antigo O Mistério de Feiurinha fez muito menos, ser muito mais.

    Afinal de contas, a resistência, o não-conformismo e a luta instigam muito mais que a possível vitimização, o silêncio e a fuga conformista dos exilados. Com Fábulas – A Revolução dos Bichos, a evolução natural da história acontece, com seus elementos básicos sendo muito mais bem aproveitados que no início desta saga sobre os mitos refugiados, e em convívio, neste nosso mundo real não tão doce, e colorido, assim. Se no fraco Lendas no Exílio, os ícones dessa dimensão surreal precisavam se acostumar com um novo cenário, e com a saudades da terra natural (de onde foram enxotados, por uma força diabólica irrefreável), agora chegou a vez da revolta dos exilados – e no maior estilo George Orwell, versão luta armada de guerrilha.

    Saem os conformados civilizados, entram os rebeldes inconformados: não mais na Nova York do volume anterior, mas numa fazenda isolada aonde as lendas que se recusam a ficar numa forma humana precisam morar – bem longe dos olhos dos “mundanos”, como por eles somos chamados, assim como éramos os “trouxas” para os bruxos de Harry Potter. Cientes de que não estão vivendo um “felizes para sempre” nesta fazenda, já que o gosto de injustiça ainda é muito presente para eles, os porquinhos apenas desejam reconquistar o reino encantado de onde todos precisaram escapar da noite, para o dia.

    A tanto, um ideal separatista toma conta dos ânimos das criaturas da Fazenda, e os porcos se mostram militantes obstinados a agregar mais pessoas a aventura de retomada do seu lugar de origem. Caso contrário, a opinião é de que nunca terão de volta a liberdade e a segurança que tinham, mas nem todos querem se arriscar. Numa crítica ao totalitarismo, e a selvageria que habita em toda ideologia imposta a uma população, a história se entrega ao gênero de aventura de suspense, recheada de pequenos bons momentos satíricos quando a tensão é capaz de sufocar quaisquer dos leitores, numa trama deliciosamente imprevisível.

    Neste segundo volume, muito mais bem resolvido e ousado, vários clássicos da literatura do pós-guerra são homenageados, como o próprio A Revolução dos Bichos, de Orwell, e o extraordinário O Senhor das Moscas, de William Golding. Quando uma facção começa a se formar na fazenda das fábulas, uma luta pelo poder toma corpo entre os conterrâneos que deveriam se unir contra um mal maior. Assim, lidando com esse trabalho de filosofia moral que a história sobre separações e autoritarismo oferece, o roteirista Bill Willingham explora com grande dinamismo as relações mundanas entre os ícones mitológicos, e acima de tudo, a ética dessas criaturas que passam a lidar com seus choques ideológicos num mundo antes simples, e hoje, complexo.

    Mortes, prisões, e reviravoltas inesperadas começam a dar o tom, e o plano que era o melhor para todos os exilados, vira exatamente o contrário. Ninguém está seguro, mais, e todos parecem ser cúmplices de verdades absolutas que não beneficiam ninguém. Difícil acreditar que Branca de Neve, o coelho da Alice, e até mesmo uma Cachinhos Dourados armada não merecem nossa confiança, mas nota-se ser impossível reconquistar o reino encantado, e manter a paz entre todos, ao mesmo tempo. A Revolução dos Bichos é uma ótima e reflexiva diversão com uma arte gráfica belíssima, e belos painéis ilustrando novamente este mundo remodelado, e tão simbólico quanto real, do ‘era uma vez’.

    Compre: Fábulas – Volume 1.

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  • Resenha | Lanterna Verde: Crepúsculo Esmeralda

    Resenha | Lanterna Verde: Crepúsculo Esmeralda

    Era a década de 1990 e a DC Comics resolveu esculhambar de vez com seus maiores heróis. O Superman tinha morrido, Batman estava numa cadeira de rodas enquanto Azrael insanamente ocupava o seu lugar e, mais tarde, Diana perderia seu lugar como Mulher-Maravilha e Flash atravessaria todos os limites da Força de Aceleração. Mas havia ainda um herói para ser mais estragado ainda do que os demais: Hal Jordan, o Lanterna Verde. Assim, dentro de um tie-in da saga O retorno do Superman, o Lanterna Verde do setor espacial 2814 enfrenta o vilão Mongul, que havia ajudado o Superciborgue a transformar Coast City em uma cidade-motor, matando seus seis milhões de habitantes no processo.

    Esse foi o pontapé inicial para a saga que redefiniria o Universo DC de então. Crepúsculo Esmeralda foi publicada pela primeira vez no Brasil em formatinho pela editora Abril, mas também já foi republicada em encadernados pela Panini e Eaglemoss (em ambas com a continuação intitulada Novo Amanhecer). Escrita por Ron Marz e desenhado por Bill Willingham, Fred Haynes e Darryl Banks, a história começa logo após os eventos que levaram à destruição de Coast City, na cratera onde outrora ficava a cidade. Os heróis da Liga da Justiça resolveram afundar o que sobrou da Cidade-motor no oceano (tirando antes todas as impurezas que pudessem poluir o lar do Aquaman, claro) e ergueram um monumento para homenagear os mortos. Após a cerimônia, Jordan vê-se sozinho onde antes era o seu lar. Ainda com o braço quebrado pela batalha com Mongul e com o psicológico bastante alterado pelo momento de luto, o herói resolve trazer de volta todos os seus amigos e familiares que pereceram na cidade. Usando toda a sua força de vontade, o Lanterna Verde da Terra reconstrói a cidade com suas memórias e seu anel de poder, criando construtos altamente detalhados feitos de luz sólida. O protagonista então passeia pela cidade e encontra-se com suas criações representando as pessoas que ele mais amava. Quando Jordan e seu pai estavam finalmente conversando, o poder do anel se esvai e a ilusão se desfaz. Um guardião está em sua frente para adverti-lo e retomar seu anel, por tê-lo usado para benefício próprio.

    O herói não se intimida e ataca seu superior, sugando toda sua energia para si. Nesse momento, o Lanterna Verde percebe que não tem poder suficiente para salvar Coast City e sai em uma jornada pelo universo com um objetivo: mergulhar na bateria central de Oa e tomar todo seu poder para si. Assim, o Gladiador Esmeralda enfrenta toda a Tropa dos Lanternas Verdes, matando um a um seus antigos amigos e apossando-se de seus anéis. Uma das cenas mais emblemáticas foi sua luta com Killowog, seu antigo treinador, parceiro e amigo, a quem ele mata sem titubear. Porém, antes que ele alcance a bateria central, os Guardiões têm uma última arma: Sinestro é libertado para deter seu antigo pupilo. A luta entre os dois deveria ser justa e portanto, o responsável pelo setor 2814 se livra de todos os outros anéis, ficando apenas um contra um. Nem mesmo o maior vilão da Tropa foi páreo para o enlouquecido Hal Jordan e finalmente ele chega na bateria e absorve todo o seu poder. Surge então o maior vilão da DC dos anos 90.

    A saga toda tem um tom bastante massavéio, típico das HQs da época. Violência extrema, páginas duplas, personagem principal malvadão, tudo que estava na moda se encaixava ali. A trama em si é bastante simples, e suas páginas são ocupadas por briga após briga até Hal chegar na bateria e concretizar seu objetivo. Mas essa história aparentemente simplória serviu para pavimentar todos os rumos do Universo DC da época ao transformar em vilão um de seus maiores heróis, extinguir a Tropa dos Lanternas Verdes e os Guardiões do Universo. Seu desenrolar na revista mensal do Gladiador Esmeralda, Novo Amanhecer, apresenta o substituto de Hal e da Tropa inteira, Kyle Rayner, que seria o único Lanterna Verde durante muito tempo. Em suas primeiras histórias (reapresentadas nos encadernados da Panini e Eaglemoss), Rayner tem que aprender a usar os poderes do anel e enfrentar o Major Força, que o confunde com seu antecessor e mata sua namorada, esquartejando-a e guardando-a na geladeira. Esse começo de carreira bastante pesado fez com que Kyle amadurecesse mais rápido e, no mundo real, levou a vários questionamentos sobre o papel das mulheres nas revistas de heróis, sempre como vítimas que sofrem para que o arco heroico do protagonista homem se desenvolva. Gail Simone se destacou com o blog Women in refrigerator, que faz referência direta à essa cena tão impactante e violenta e hoje é uma das maiores roteiristas da indústria. Após esse trágico início, as histórias de Kyle Rayner passam a ter uma pegada mais leve e muito parecida com as do Homem-Aranha, da Marvel.

    Crepúsculo esmeralda tem muitas falhas, mas não deixa de ter sua importância histórica e editorial por ser o marco de uma época que só se encerraria dez anos depois, com a volta de Hal Jordan ao panteão de super-heróis da DC.

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