Autor: Dan Cruz

  • Crítica | Batman: A Piada Mortal

    Crítica | Batman: A Piada Mortal

    a piada mortal capa - vortex cultural

    A Piada Mortal é considerada uma das maiores histórias em quadrinhos já escritas com o Batman, e desde seu lançamento é envolta em polêmicas. Escrita por Alan Moore e ilustrada por Brian Bolland, a trama conta a origem mais aceita do Coringa até hoje (mesmo após tantos reboots e retcons) e marca o início de uma fase traumática para Barbara Gordon, a Batgirl. Inicialmente, teria sido apenas um especial ao estilo Elseworld (túnel do Tempo, no Brasil), mas por trazer questões tão cruciais à vida dos personagens, seus elementos mais importantes acabaram sendo inclusos no cânone das hqs do Homem-Morcego.

    Embora Alan Moore sempre tenha se mostrado avesso às adaptações de suas obras para outras mídias, a DC parece não se importar com isso nem um pouco e lançou A Piada Mortal como um filme animado. Muito barulho foi feito, principalmente porque o roteiro ficou a cargo de Brian Azzarello, que inseriu uma história da Batgirl no início do filme na qual ela tem um relacionamento com Batman. A justificativa seria levar um pouco mais de polêmica à obra. Desnecessária, por sinal.

    O filme começa mostrando ao público um pouco da vida de Barbara, e o quanto sua guerra ao crime em Gotham City se dá sempre à sombra do Batman. A justificativa de transformá-la em uma personagem mais forte perde-se no roteiro, já que em todas suas incursões no submundo do crime, Batgirl acaba dependendo muito do seu mentor para resgatá-la. A raiva que ela sente dos modos arrogantes de Batman acaba se confundindo com desejo sexual, em uma cena sem química, que serve apenas como pretensa polêmica e desconforto – tanto para a personagem, que tem que lidar com isso depois, quanto para o público. Barbara, ao final desse arco, decide aposentar sua carreira de combatente do crime.

    batgirl e batman - vortex
    Pior cena de sexo de todos os tempos!

    Após essa introdução, inicia-se o arco referente à história em quadrinhos propriamente dita. E aí vemos pura e simplesmente o texto de Alan Moore adaptado pra animação. O filme segue a mesma estrutura narrativa, inclusive a mesma paleta de cores usada por Brian Bolland na edição de luxo remasterizada. O design dos personagens lembra bastante a série animada – principalmente a Batgirl – exceto o Batman, que está idêntico ao visual de Bolland, sem a elipse amarela envolvendo o símbolo do morcego em seu peito, e com orelhas no capuz que mais parecem chifres. A tempestade anunciada por Babs no fim de seu arco dá o clima da chegada de Batman ao Asilo Arkham, tal qual na hq. Há uma explicação pra visita do Cruzado Encapuzado ao hospício, mas totalmente descartável e não se retorna mais ao assunto. Batman descobre que o Coringa mais uma vez escapou, e inicia uma investigação.

    O Coringa é mostrado negociando a compra de um parque de diversões abandonado e temos os primeiros flashbacks de sua origem mostrados, enquanto na bat-caverna vemos várias encarnações do vilão nos arquivos do bat-computador. Assim como Bolland reverenciou diferentes fases do Príncipe Palhaço do Crime nesse quadro da história original, vemos alguns easter-eggs de diferentes versões do Coringa em filmes e desenhos, com destaque para uma homenagem bastante clara a Heat Ledger. Em mais alguns flashbacks conhecemos o passado do criminoso como comediante fracassado enfrentando uma crise conjugal e entrando no mundo do crime para, talvez, remediar sua vida desgraçada. E então chegamos ao ponto crucial do filme: o ataque covarde e violento ao Comissário Gordon e sua filha Barbara.

    O filme retrata esse momento de forma bastante crua, e o impacto da cena não deve em nada à hq. Ver Barbara se contorcendo e chorando no chão, sobre os estilhaços de vidro da mesa de centro sobre a qual caiu, enquanto seu pai é espancado por capangas, é realmente uma cena bastante forte.

    gordon - vortex cultural

    Gordon é levado para o parque, onde é despido, torturado e obrigado a um passeio pelo trem-fantasma que deveria levá-lo à loucura, pois cenas de sua filha baleada, nua e sangrando, são exibidas enquanto o Coringa faz um número musical. O objetivo do Coringa é provar que qualquer um pode enlouquecer se tiver “um dia ruim”. Batman, enquanto isso, segue procurando alguma pista que o leve até o paradeiro do comissário. Ao chegar ao parque, encontra Gordon em sua deplorável condição fragilizada, mas que pede a ele para que não cruze a linha e capture o Coringa “nos termos da Lei”. Há uma luta com o elenco do circo de horrores do Coringa e sua captura ao final. Exatamente como nos quadrinhos.

    O fim do filme mantém a dúvida da hq se Batman teria ou não matado o Coringa. Exatamente como nos quadros finais, vemos o Batman rindo de uma piada, enquanto se aproxima do Coringa, que tem sua risada interrompida enquanto a câmera se abaixa e o silêncio reina (não temos, como no gibi, as sirenes da polícia).

    A impressão que se tem é que o prólogo é arrastado demais, e a animação inconsistente – principalmente na cena de perseguição, na qual os carros modelados em 3D destoam do restante. É possível assistir ao filme pulando a primeira meia hora sem que nada no entendimento da trama principal seja prejudicado. As cenas do cotidiano de Barbara na biblioteca apresentam um “amigo gay” que nada mais é do que um estereótipo, cujo único objetivo é se fazer perguntar sobre a vida sexual da ruiva. Aliás, vida sexual que se resume a uma “rapidinha” no telhado, que serviria a princípio para criar um vínculo maior entre os personagens, mas que se perde ao não ser revisitada no desenrolar da trama principal. Mais uma vez, vemos o sofrimento de uma personagem feminina servindo de catapulta para uma história focada no protagonista homem. Gail Simone, roteirista de uma das melhores fases da Bárbara Gordon em Aves de Rapina, vem falando sobre isso há muito tempo em seu website Women in Refrigerator, e Azzarello parece não se importar nem um pouco com isso.

    O filme tem alguns pontos muito positivos, como o excelente trabalho de Mark Hamill como Coringa. Cada frase é executada magistralmente e nem mesmo durante o número musical ele faz feio! Kevin Conroy nos entrega seu sempre excelente Batman, e a trilha sonora, mesmo nos momentos de silêncio, cria a atmosfera sombria necessária. Mas não chega a ser uma obra-prima, talvez por manter-se fiel demais à graphic novel, talvez por ousar em criar coisas novas em momentos errados. Não chega a ser uma bomba, mas também não tem o charme e elegância de Batman Contra o Capuz Vermelho, essa sim uma excelente adaptação de um arco de histórias do Morcegão!

    *Agradecimentos especiais à leitora Monique Carniello pela consultoria

    Compre: A Piada Mortal ( Dvd | Hq

  • Resenha | Ducktales: Os Caçadores de Aventuras (1)

    Resenha | Ducktales: Os Caçadores de Aventuras (1)

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    Entre 1987 e 1990, a Disney produziu aquela que viria a ser sua mais famosa série animada, estrelada por ninguém menos que o velho sovina Tio Patinhas e seus sobrinhos-netos Huguinho, Zezinho e Luisinho. Ducktales é ainda hoje lembrada com muito carinho por quem foi criança na época, e grande parte do seu sucesso foi devido à capacidade dos produtores em manterem-se fiéis às histórias em quadrinhos. Mesmo com algumas criações exclusivas para a série e algumas licenças poéticas que mudariam personagens já consagrados, o espírito aventureiro das obras clássicas de Carl Barks estava presente em cada episódio.

    Não demorou muito para que a transição inversa de mídia acontecesse: uma série baseada em quadrinhos acabou baseando, também, histórias em quadrinhos! Esses quadrinhos diferiam das habituais por incorporarem elementos antes exclusivos da série, como personalidades diferentes para cada um dos Irmãos Metralhas ou a origem escocesa do Pão-Duro MacMônei, que nos quadrinhos era sul-africano. Além de uma revista mensal, os patos tiveram algumas minisséries publicadas pela Editora Abril, sendo que três delas estão reunidas nesse volume de capa dura intitulado apenas Ducktales: Os Caçadores de Aventuras.

    Em busca da Número Um

    A primeira saga do volume é também a melhor das três e tem o roteiro assinado pelo consagrado escritor Marv Wolfman, conhecido pelo seu trabalho na DC Comics com os Novos Titãs e a maxissérie Crise nas Infinitas Terras. Wolfman resgata a atmosfera aventureira das histórias de Barks e demonstra um grande cuidado na caracterização de cada personagem. A história em sete partes começa com a vilã Maga Patalójika sequestrando a patinha Patrícia – neta da governanta Madame Patilda e para a qual Patinhas demonstra o mesmo carinho que tem pelos seus sobrinhos. Pelo resgate de Patrícia, Maga obriga Patinhas a entregar sua moedinha da sorte, a Número Um. Essa moeda foi a primeira que ele ganhou na vida e tem para ele um grande valor sentimental.

    O Tio Patinhas de Marv Wolfman é muito menos sovina e tem um coração muito mais mole do que as versões com as quais estamos acostumados por aqui – principalmente se comparado às hqs italianas ou mesmo brasileiras. Embora ainda tenha uma enorme sede por acumular riquezas, o velho não se importa em desfazer delas se isso significar o bem de seus entes queridos. Assim, vemos Patinhas abrindo mão de sua moedinha para resgatar a querida Patrícia, mas acaba caindo em um golpe sujo da bruxa.

    A saga então passa a ser sobre o resgate dessa moedinha e a busca pela Maga Patalójika, levando a família de patos e seus amigos a aventuras ao redor do mundo, tal qual na série animada. Destaque para o Capitão Bóing, que aqui aparece caracterizado como na primeira temporada da série animada: meio atrapalhado, porém valente e aventureiro. Paralela à história da moedinha, temos uma outra trama envolvendo o Pão-Duro MacMônei (que nessa história teve seu nome traduzido como MacMônei Coração-de-Pedra) na qual o rival se apropria das empresas Patinhas através de golpes financeiros. Patópolis é rebatizada como MacMópolis, e vemos a total ausência do poder público na cidade, sendo que todos os bens e serviços são advindos da iniciativa privada (asfalto, iluminação pública, saneamento básico…).

    Maga Patalójika está muito mais poderosa do que o habitual e sua presença é realmente assustadora. A habilidade de Wolfman de contar uma grande história, com muitos personagens, é visível e tudo se encaixa com sagacidade. Personagens como Madame Patilda, Asnésio, Professor Pardal e Leopoldo, embora não sejam importantes para a trama e alguns sequer tenham fala, marcam presença e garantem a atmosfera do desenho na saga, fazendo parte do cenário. Carl Barks também faz uma aparição na história como um aliado do vilão, e é uma bela homenagem ao Homem dos Patos.

    A odisseia do ouro

    A segunda saga do volume, com roteiro de Bob Langhans, trata de um meteoro de ouro descoberto por Patinhas e MacMônei e uma viagem pelo espaço para tomar posse dele. O clima de aventura também permeia toda a história e alguns momentos são bem divertidos. Asnésio, o patinho escoteiro rechonchudo, ganha uma importância maior, tendo um arco focado nele. Incomoda um pouco o uso de “ganchos” pelo roteirista a cada final de capítulo, que parece não ser usado de forma muito inteligente. Esses ganchos dão a impressão de que os capítulos simplesmente acabam “pela metade”, e a resolução na próxima parte soa corrida. Mais uma vez, vemos um Patinhas não muito apegado aos seus tesouros, e isso contrasta com a personalidade de MacMônei na história. Capitão Bóing continua aventureiro, porém mais falastrão do que na primeira saga.

    Alguns cuidados por parte da equipe de tradução foram negligenciados, e temos balões trocados em um quadro, assim como o nome de um dos sobrinhos em uma parte da história. Além disso, o topete do Bóing aparece sem cor em vários quadros, o que embora não atrapalhe o entendimento da história, causa certa estranheza ao leitor mais atento.

    Legítimos donos

    A terceira e última saga do volume é uma pena. Escrita por Warren Spector, designer do jogo Epic Mickey, a premissa é muito interessante, mas desperdiçada de uma forma tão inacreditável que chega a dar dó! A história parte do princípio de que muitos dos tesouros do Patinhas foram adquiridos através de apropriação cultural e, portanto, devem ser devolvidos aos seus legítimos donos. Uma excelente ideia, mas muito mal desenvolvida.

    Mesmo assim, temos alguns pontos pertinentes. A arte é bem diferente das duas séries anteriores, mais moderna e flertando com o estilo Disney italiano. Embora seja boa, não se mantém constante e as proporções dos personagens mudam muito de um capítulo para outro. As cores são definitivamente a melhor parte, e é a única coisa na história superior ao resto do volume.

    A história começa com uma exibição no museu de Patópolis dedicada às aventuras de seu mais notável cidadão. Assim, os tesouros conquistados por Patinhas em diversas ocasiões são expostos orgulhosamente, o que causa um certo constrangimento em Patrícia, que acaba convencendo o tio a devolvê-los. Junto a isso, o também ricaço esbanjador Patacôncio faz uma aposta com o velho Patinhas “nos termos de sempre”, o que significa que o perdedor deverá comer seu chapéu. Assim inicia-se uma jornada à tribos remotas para a devolução dos pertences.

    Mas o roteiro não funciona direito. A começar com a escolha do rival Patacôncio, que nunca sequer apareceu na série animada e não é tão popular nos Estados Unidos quanto no Brasil ou Itália. Peninha faz uma ponta que poderia passar despercebida, e Donald, apesar de citado e de aparecer em dois quadros, não teve nenhuma notoriedade na história – diferente do que a condução do roteiro parecia sugerir. Margarida – outra que nunca apareceu no desenho – surge como repórter, talvez uma referência à série Quack Pack, e o Capitão Bóing está muito diferente das histórias anteriores. Menos aventureiro e muito mais abobalhado, Bóing lembra mais sua versão no spin-off Darkwing Duck, inclusive citando sua temporada em St. Canard. Muitas e muitas referências às aventuras passadas são simplesmente jogadas na história, sem causar empatia a leitores que não as conhecem, e nem nostalgia aos fãs antigos. O desenvolvimento da primeira parte não se mantém no mesmo ritmo, forçando a história a correr na última parte, atropelando a narrativa. E ainda se encerra com um gancho forçado, que em nada contribui para o entendimento da trama. O resultado é uma história confusa, fraca, com personagens rasos e que mais parece uma fanfic do que um produto oficial.

    Acabamento de luxo

    Embora tenha seus problemas, o volume é muito bom. A capa dura com reserva de verniz tem a aparência de uma peça de pedra de algum templo antigo e é realmente muito bonita. Impossível não comprar com a arte dos filmes de Indiana Jones, clara inspiração para a série. O material extra traz um excelente texto contando a trajetória dos Caçadores de Aventuras em diversas mídias, e é realmente muito bom. As páginas em couché dão um brilho às histórias e a encadernação é perfeita, como vem sendo nas outras edições de capa dura da editora. É uma peça para se guardar na coleção e, mesmo com seus problemas, no coração de quem já cantou a música tema de Ducktales com empolgação um dia!

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  • Resenha | John Constantine, Hellblazer – Infernal Vol. 8: O Filho do Homem

    Resenha | John Constantine, Hellblazer – Infernal Vol. 8: O Filho do Homem

    Hellblazer_Infernal_8Último volume apresentando a passagem de Garth Ennis pelo título de John Constantine, Hellblazer: Infernal – Vol 8 traz o irreverente e assustador arco de histórias O Filho do Homem. Ennis assumiu o roteiro de Hellblazer no número 41, com o excelente arco Hábitos Perigosos, escrevendo até o número 83 e voltando, em 1998, para esse último arco entre as edições 129 e 133. Existe uma diferença bastante clara entre o estilo narrativo de O Filho do Homem e seus outros textos, que é a quebra da quarta parede. Constantine frequentemente interrompe o que está fazendo para olhar diretamente para o leitor e narrar a história, não com recordatórios, mas com balões de fala. Isso pode soar estranho para alguns leitores – afinal, ele não é o Deadpool! – mas não atrapalha a história, e dá um tom bastante sarcástico em alguns momentos.

    A história começa com Chas, o amigo taxista de John, se envolvendo por acaso com um assassinato. Devido a um equívoco, Chas foi confundido com o motorista de fuga de um crime e acabou cúmplice de um gângster por acidente, e ao fugir da polícia, o bandido é baleado e morto dentro de seu carro. Ele procura abrigo no apartamento de Constantine, que o ajuda a se livrar do carro e do corpo, mas descobre que o criminoso envolvido faz parte de seu passado.

    Em uma sequência de flashbacks, descobrimos a relação de John com o chefão do crime Harry Cooper. O criminoso foi responsável pela saída de Constantine do hospício de Ravenscar, pedindo a ele um “favor”: trazer seu filho de oito anos de volta à vida! Chantageado para poupar as vidas de sua irmã e sobrinha, John reúne seu grupo de amigos (mortos em edições passadas, mas importantes nos flashbacks e muito bem representados!) para resolver a situação do único jeito que ele sabe: com trapaça! A equipe sacana trabalha num esquema (também enganados por John, obviamente) que traria um demônio diretamente do inferno para habitar o corpo inanimado do garoto. O demônio deveria, supostamente, servir a Constantine, porém essa servidão tinha um prazo de validade que John não contou aos seus companheiros.

    Doze anos depois desses acontecimentos, o demônio (não mais sob o poder de Constantine) continua no corpo do garoto, que não envelheceu um ano sequer e domina o submundo do crime. Além disso, tem um plano diabólico de trazer o anticristo ao mundo. Como uma paródia da virginal concepção de Jesus, o anticristo milagrosamente nasceria do ventre de um homem: o chefão Harry Cooper. Com um desfecho bizarro e assustador, a história toma um rumo bastante inesperado, com John tendo que tomar uma atitude drástica e até mesmo cruel, embora acertada dentro deste cenário.

    Ennis trabalha de forma ao mesmo tempo grotesca e divertida esses temas, e parece muito à vontade ao satirizar elementos da fé cristã. As tramas paralelas também são muito interessantes, como o caso que Constantine acaba tendo com uma garota lésbica – que garante umas boas risadas ao leitor – ou a forma como o demônio manipula um prostíbulo para manter sua juventude. A arte de John Higgins é acertada, longe dos exageros e experimentações das edições anteriores, e garante a atmosfera necessária para a trama. A narrativa de horror nunca esteve tão afiada, e o volume encerra a série Infernal brilhantemente.

  • Resenha | Bizarro

    Resenha | Bizarro

    Bizarro - Dc & VocêApós alguns anos da linha editorial da DC Comics conhecida como Novos 52, a Editora das Lendas resolveu mexer novamente com suas publicações e lançar a iniciativa DC You (no Brasil, DC & Você). Essa não era propriamente uma nova linha editorial, mas sim uma proposta que viria para deixar de lado a homogeneização de suas revistas, dando mais liberdade criativa aos autores e oferecendo material para diferentes perfis de leitores. Assim, tivemos participações de artistas de fora das publicações mainstream, com uma diversidade maior de estilos e ritmos narrativos.

    Dentre as novidades dessa proposta que aportaram em terras tupiniquins, Bizarro merece um lugar de destaque.

    A série em seis edições foi compilada em um encadernado pela Panini e ganhou grande destaque, principalmente devido  ao talento do artista brasileiro Gustavo Duarte (que recentemente ilustrou Pavor Espaciar, graphic novel do Chico Bento para a MSP). Seu traço leve e cartunesco traz o tom de humor necessário para a história, e transforma a cópia imperfeita do Superman em um Frankenstein bonachão. Heath Corson assume o roteiro, e não faz feio. Advindo das animações, sua estreia nos quadrinhos mostra uma grande vontade de inovar e divertir. Às favas com a continuidade dos Novos 52 – em que Bizarro é um clone do Homem de Aço, atormentado e sombrio – essa versão do personagem lembra em muito os desenhos animados dos Superamigos. Bizarro faz tudo ao contrário, mas não é exatamente um vilão. Ele tem um coração enorme (representado na ilustração de Fábio Moon e Gabriel Bá lá pela página 69), porém enxerga o mundo de uma forma totalmente distorcida, e muitas das trapalhadas (ou desastres) que faz é com uma genuína vontade de ajudar.

    bizarro canada vortex

    A história segue os moldes dos filmes de comédia dos anos 80, e é clara a influência do diretor John Hughes e seu clássico Antes Só do que Mal-Acompanhado. Para evitar mais desastres em Metrópolis, Jimmy Olsen leva Bizarro por uma road trip rumo ao Canadá, passando por várias cidades e encontrando velhos conhecidos do Universo DC. As participações especiais nessa viagem acontecem tanto na história como nos bastidores. Além de personagens famosos do UDC (Jonah Hex, Desafiador, Zatanna, Rei Tut até mesmo Batman e Superman), artistas convidados ilustram algumas páginas (Kelley Jones, Darwyn Cooke, Bill Sienkiewicz, Rafael Albuquerque e os já citados Bá e Moon). No caminho, encontram um chupacabra chamado Colin, que se torna amigo de Bizarro e lidam com vendedores de carros, uma cidade-fantasma, agentes do governo e alienígenas. E muitas, mas muitas referências à cultura pop, que vão desde as mais óbvias (como Arquivo X) até algumas mais escondidas (o pôster de uma banda de rock nacional no metrô), passando por referências às obras autorais de Duarte (galinhas, alguém?). Algumas piadas visuais podem agradar aos fãs mais hardcore do Superman (como a inscrição em kryptonês na nave do Kal-El), mas a maioria é de fácil entendimento. Não é necessário nenhum conhecimento prévio dos personagens para apreciar a história

    Para quem quer se divertir e rir um pouco, essa é uma ótima história! É bom rever um pouco de comédia nas páginas da DC, principalmente após a onda sombria dos últimos tempos. Os diálogos lembram bastante a fase de Keith Giffen e J.M. DeMatteis na fase cômica da Liga da Justiça Internacional, e a obra é um respiro em meio a tantas Crises e sagas mirabolantes e arrastadas da editora. Infelizmente, a série é limitada e não há previsão de continuação. Mas já dá pra sonhar com outras obras de Gustavo Duarte nos mesmos moldes. Quem sabe uma série do Lobo ou do Sr. Mxyzptlk?

    bizarro antes só

    Post script: Resenha “Bizarra”

    Essa não ser uma revista boa! Pior história da Marvel dos primeiros tempos! Bizarro é extremamente competente no que faz, e seu pior inimigo Jimmy Olsen não tem nenhum objetivo escondido na viagem. Gustavo Duarte desenha mal pra caramba, e a história ser muito triste! Não lembrar em nada nenhuma fase boa da editora, e todos devem odiar a história! Não ter nenhum easter egg nas páginas e no fim a revista é uma porcaria! Olá!

  • Crítica | Alice Através do Espelho

    Crítica | Alice Através do Espelho

    alice atraves do espelho“Se você não sabe onde quer chegar, então qualquer caminho serve”, disse o Gato Que Ri à Alice, que conta suas aventuras pelo País das Maravilhas no livro de Lewis Caroll. E é exatamente esse conselho que a direção de Alice Através do Espelho, de James Bobin, parece seguir no longa. A obra original, Através do Espelho e o que Alice Encontrou por Lá, é uma espécie de sequência que simplesmente ignora a fonte, e embora possa ser “mais do mesmo” acaba por ser uma leitura agradável no fim das contas. Já o filme está bem longe disso. Do material original, apenas o título e a passagem pelo espelho se mantiveram. De resto, nada tem a ver com o livro, ignorando passagens memoráveis como o conto da Morsa e o Carpinteiro, ou a conversa com as flores no jardim.

    A maioria das adaptações da obra não seguem-na ao pé da letra, é verdade, e muitos filmes misturam o primeiro livro com o segundo – como os próprios estúdios da Disney fizeram nas duas versões anteriores a essa – mas sempre guardam alguma semelhança. Dessa vez, apenas o título mesmo foi usado. Fica claro desde o começo que não passa de uma forma de ganhar dinheiro com um produto já conhecido do público, com um esforço mínimo de trazer personagens memoráveis ou sequer significantes para a trama. Revemos velhos conhecidos, como o Coelho Branco ou a Lebre de Março, que apenas desfilam pela tela sem qualquer relevância.

    Logo no início, como de costume, vemos Alice (Mia Wasikowska) no “mundo real”, como capitã de um navio enfrentando perigos, e em seguida, resolvendo negócios de família e sendo ridicularizada por ser mulher. Se tivéssemos mais tempo com a Alice do mundo real, talvez poderíamos até mesmo ver uma história interessante. Infelizmente, esses problemas são tratados de forma superficiais e sequer arranham a superfície das questões que poderiam ser levantadas, mesmo que de forma anacrônica, por uma personagem feminina forte. Isso não ocorre, talvez pela falta de carisma da protagonista ou do raso desenvolvimento de sua personalidade. Temos que ser informados por sua mãe de que ela é “teimosa”, quebrando uma das regras fundamentais das artes cênicas de mostrar, não contar.

    Alice ouve a voz da Lagarta, agora transformada em Borboleta, que a guia até um espelho. Ao atravessá-lo, Alice volta para o Mundo Subterrâneo (Underland no original, fazendo um trocadilho com Wonderland). Se algo se salva nessa cena é a voz da Borboleta, interpretada pelo finado Alan Rickman, o eterno Professor Snape de Harry Potter, em seu último papel. Essa cena, que deveria ser de extrema importância por estar no título do filme, é totalmente banalizada. Alice simplesmente atravessa o espelho e pronto! Não existe encantamento, deslumbre, motivação… nada! Talvez por puro fan service, vemos um tabuleiro de xadrez senciente e Humpty Dumpty (o homem-ovo da rima infantil inglesa), em uma breve aparição, fazendo a única coisa que ele sabe fazer.

    Alice se encontra então com a “turma antiga” (seus amigos de Alice no País das Maravilhas), que estão todos tomando chá e se mostram felizes por vê-la. Assim, ela fica sabendo que o Chapeleiro Louco caiu em desgraça e precisa muito de sua ajuda. Ao conversar com o conturbado Chapeleiro (Johnny Depp, que parece querer reprisar mais uma vez o papel de Jack Sparrow) descobre que ele está abatido devido a um drama familiar. Alice, para ajudá-lo, vai até o Senhor do Tempo (Sacha Baron Cohen, ainda mais caricato que seu famoso personagem Borat) atrás de um artefato que a permita voltar no tempo. E é aí que a trama se torna genérica de uma vez!

    A Rainha de Copas interpretada por Helena Bonhan Carter é a vilã novamente – e novamente é mesclada com a Rainha Vermelha do livro – e também quer o mesmo artefato, chamado cronosfera, e para isso isso envolve-se em um relacionamento com o Senhor do Tempo. O desenrolar da história é tão mal-feito que descobrimos que tudo que acontece é por causa de uma… torta! Sim, a torta que faz parte do julgamento no primeiro livro e é apenas um recurso narrativo para parodiar os absurdos e arbitrariedades do sistema de Justiça, aqui é um elemento principal da história. E mais uma vez vemos o recurso narrativo da “escolhida” sendo usado, pois Alice é a única que pode salvar o mundo e por aí vai…

    O filme carece de uma lógica interna, o que torna seu desenvolvimento ainda mais sem sentido. Durante as viagens no tempo, ficou estabelecido que não se pode mudar o passado, mas mesmo assim, o passado é mudado! Os personagens são simplesmente desperdiçados e as piadas até tentam fazer rir, mas não funcionam. A melhor parte do filme é quando Alice volta ao mundo real pela primeira vez e quase temos um plot twist – bastante sombrio e que levantaria muitas questões a serem discutidas sobre a veracidade das viagens da personagem – mas que sequer é comentado no fim, quando ela volta de vez e resolve os problemas que havia deixado pra trás.

    No fim das contas, o filme não parece ir para lugar nenhum. Além da parte estética e fotografia, que emulam muito bem o estilo que Tim Burton imprimiu no também sofrível primeiro filme, não há nada que justifique o tempo perdido com essa película. Se a ideia era realmente não ir a lugar nenhum, então todos os envolvidos na produção estão de parabéns por atingir o objetivo.

  • Resenha | Constantine: Hellblazer – Fantasmas do Passado

    Resenha | Constantine: Hellblazer – Fantasmas do Passado

    hellblazer-fantasmas-do-passadoParece que finalmente a DC Comics quer dar um rumo para o icônico personagem John Constantine fora da linha Vertigo. Quando a editora o reinseriu em seu universo de super-heróis – tirando-o do selo adulto que foi sua casa por 300 edições – pouco ou quase nada lembrava o mago trambiqueiro criado por Alan Moore. No reboot da casa conhecido como Novos 52, John era basicamente um super-herói usando magia genérica como se fosse um haduken ou kamehameha, em forma de energia bruta. A sutileza das artes místicas, rituais, pactos com entidades demoníacas haviam ficado para trás, e o título Constantine teve pouco mais que vinte edições. Com a nova linha da editora, DC You (traduzida no Brasil com o quase sertanejo universitário título de “DC & Você”), John volta às suas origens de “lobo solitário”, e já nas primeiras páginas deixa claro que abandonou de vez a convivência com super-heróis.

    Essa nova iniciativa da DC tenta retomar o clima das histórias clássicas do Mago, porém com uma roupagem mais moderna e atualizada para o século 21. Saem de cena todos os elementos datados e entram novas referências. Esse John Constantine, embora mais jovem e totalmente reformulado, finalmente volta a se parecer com o que ele era nos anos 90. Seu passado em Newcastle ou a temporada em Ravenscar não são sequer mencionados e provavelmente não aconteceram, mas temos novos elementos em sua vida, novos personagens, uma nova história a descobrir. Mas a personalidade sacana está de volta. Esse John não é nem de longe o mesmo que, há pouco tempo, liderava a Liga da Justiça Dark.

    O visual baseado no cantor Sting foi descartado. Constantine agora se parece mais com Neil Patrick Harris, astro de How I Met Your Mother. Volta, inclusive, sua bissexualidade – parte integrante de sua personalidade que havia sido descartada nos últimos anos. Seus hábitos autodestrutivos, como fumar e beber até cair, estão novamente muito bem representados, e parte da trama ocorre justamente durante um porre do personagem.

    Constantine é assombrado por vários fantasmas de pessoas que, de uma forma ou de outra, morreram relacionadas a seus erros. Quando esses fantasmas começam a sumir, algo pior do que a morte está acontecendo e John precisa investigar. Durante a investigação, acabamos conhecendo um pouco do passado desse novo Constantine. Por meio de alguns flashbacks, vemos um pouco de sua juventude e relação com as artes místicas, além de conhecermos seus amigos e a única mulher que ele realmente amou: Veronica Delacroix. A relação com Veronica não acaba bem, devido à forma inconsequente que John utilizava a magia em favor de sua banda, Membrana Mucosa. Essa relação entre amor, música e magia (ou sexo, drogas e rock n’ roll) é parte fundamental da trama e da busca por Delacroix – ou o que restou dela. Ao mesmo tempo que remonta às origens da versão anterior do personagem, traz um novo respiro, uma forma nova de se contar sua história, mais condizente com os dias de hoje.

    A arte de Riley Rossmo é capaz de nos transmitir a sensação de horror que uma história desse tipo precisa, fugindo bastante do padrão que a DC tem apresentado ultimamente. O roteiro de Ming Doyle e James Tynion IV está bastante apurado e transmite muito bem essa nova proposta. Infelizmente, não é um título para maiores de 18 anos e, portanto, existe uma certa censura nos palavrões (e Constantine fala muitos palavrões na edição!). Isso não impede que a sexualidade de John seja explorada, não só ao retratar sua ex-namorada como durante uma transa com uma demônio ou nos flertes com Oliver, dono do café que nos é apresentado neste volume e parece ser o novo interesse romântico do personagem em histórias vindouras.

    Esse é um novo John Constantine para uma nova geração de fãs. Saudosos de Hellblazer podem até estranhar, pois ele não carrega toda a carga emocional e cicatrizes de batalha de sua versão mais famosa, mas ainda temos um personagem interessante e com muita coisa a desenvolver pela frente.

    constantine-Riley-Rossmo

  • Resenha | LJA: Terra 2

    Resenha | LJA: Terra 2

    JLA - Terra 2 - capa - Grant Morrison - Frank Quitely
    Terras paralelas sempre foram um elemento chave da DC Comics, embora a editora tenha tentado acabar com o conceito nos anos 1980 com a maxi-série Crise nas Infinitas Terras. Para tornar seu universo de personagens mais coeso e aberto a novos leitores, a Crise serviu como uma forma de simplificar as muitas Terras tornando-as uma só. Isso facilitou a vida tanto de roteiristas quanto de novos leitores, embora elementos cruciais da cronologia da editora tivessem sido varridos pra baixo do tapete. Na saga em questão, universos inteiros morreram, e o primeiro a ser extinguido da existência foi o que comportava a Terra-3. Esse planeta era uma cópia às avessas da Terra principal, onde havia uma versão maligna da Liga da Justiça e o único herói era Alexander Luthor. O conceito de “cópia maligna”, apesar de parecer uma solução preguiçosa pra arranjar bons vilões, sempre foi usado na editora e se perdeu com a reformulação.

    No entanto, muitos personagens e várias linhas narrativas acabaram ficando prejudicados com a Crise. Se não existiam mais Terras paralelas, os roteiristas pós-Crise passaram a ter que justificar a existência de heróis que tinham sua origem fortemente ligadas a esses mundos. Assim, malabarismos precisaram ser feitos para explicar as origens de personagens como a Supergirl, a Legião dos Super-Heróis e a Poderosa. A maioria dos roteiristas apenas aceitou as mudanças e fizeram o melhor que puderam com um universo único.

    Mas Grant Morrison não era como a maioria dos roteiristas.

    Na metade da década de 90, Morrison reformulou a Liga da Justiça trazendo de volta vários elementos clássicos da Era de Prata, principalmente a formação da equipe com os sete maiores heróis do universo. Sua fase na revista LJA foi aclamada por público e crítica – cometendo alguns deslizes típicos do autor, de certa forma perdoáveis – e revitalizou o título, que havia se tornado uma comédia pastelão com heróis secundários desde o final da década de 80 até então. A Liga de Grant Morrison era grandiosa e empolgante.

    Morrison pretendia trazer de volta o conceito de Terras paralelas – algo que recentemente se mostrou fixação do autor, com a série Multiverso DC – mas parecia que não havia um jeito, devido à Crise. Mas o universo de antimatéria ainda era um conceito válido na época, e foi disso que ele se aproveitou para escrever LJA: Terra 2.

    Lançada nos Estados Unidos como uma graphic novel, Terra 2 passou quase que despercebida pelas terras brasileiras. Na época, a Editora Abril lançou uma ousada e questionável iniciativa na sua linha de hqs de super-heróis, abandonando o consagrado formatinho e adotando a linha Premium. Essa nova linha, embora maior e melhor, tinha um preço pouco acessível aos leitores da época, e muitos acabaram abandonando o hábito de ler quadrinhos. LJA: Terra 2 foi publicada na primeira edição de Superman Premium e nunca mais relançada em português, até agora com a Coleção de Graphic Novels da DC Comics, da editora Eaglemoss.

    Na trama, Morrison revela que o universo de antimatéria abriga uma versão espelhada da nossa Terra, tal qual a extinta Terra-3 pré-Crise. Mas esse universo parece muito mais sombrio do que sua extinta versão, adaptada para a realidade do fim do milênio (mais sombria e realista). Alexsander Luthor, único herói dessa Terra (tal qual a versão pré-Crise) descobre um universo livre da tirania do Sindicato do Crime e pede ajuda aos heróis da Liga da Justiça. Após um momento de deliberação, Superman, Batman, Mulher-Maravilha, Lanterna Verde (Kyle Rayner) e Flash (Wally West) resolvem ajudar, ficando apenas Aquaman e Caçador de Marte na nossa Terra. Os heróis descobrem que nesse universo, as coisas funcionam de forma bastante diferente do que estão acostumados: lá, o Mal sempre ganha!

    Temos alguns momentos interessantes, como o encontro de Batman com a versão de seu pai – o Comissário Thomas Wayne – e descobrimos que Ultraman e seu Sindicato do Crime dominam a Terra. Supermulher (versão da Mulher-Maravilha) tem um relacionamento com Ultraman, mas mantém um caso com o Coruja (o Batman de lá). Há uma “troca de lugares”, e o Sindicato do Crime vem parar na Terra da Liga e, invertendo a ordem das coisas, passa a chama-la de Terra 2! A Liga da Justiça vê-se então forçada a retornar para reestabelecer a ordem. Com uma trama bastante simplória, vence o Sindicato. Isso porque, em nosso mundo, o bem sempre vence o mal.

    É sempre interessante perceber como Grant Morrison utiliza conceitos simplistas de forma magistral. O autor costuma pegar elementos que a maioria dos fãs prefere ignorar e fazer deles algo bem construído e agradável de se ler. Além disso, a arte de Frank Quitely casa perfeitamente com o estilo de narrativa do autor. Quitely colabora com Morrison eu outras ocasiões, como em Novos X-Men ou Grandes Astros: Superman, e sempre adiciona a dose certa de modernidade e saudosismo à trama.

    Morrison prova, mais uma vez, que até o mais simples dos conceitos pode ser bem trabalhado e render uma boa história. A Eaglemoss acertadamente nos traz essa pérola há muito esquecida pelas editoras nacionais, ainda com uma história secundária de 1961 que mostra, pela primeira vez, o conceito de Terras paralelas. A história O Flash de Dois Mundos é simples e direta, mas alicerça a longa tradição de infinitas Terras da DC Comics.

    LJA: Terra 2 foi o pontapé inicial para que as Infinitas Terras voltassem com força total nos anos posteriores e retomassem lugar de destaque nas histórias da DC.

    Compre: LJA – Terra 2

    LJA - Terra 2 - 01

  • Resenha | Superman: O Homem de Aço

    Resenha | Superman: O Homem de Aço

    Superman - O Homem de Aço - capa

    Em 1986, a DC Comics deu carta branca a um dos maiores desenhistas da Marvel para recriar a seu modo o maior herói da casa. A editora havia acabado de publicar a maxi-série Crise nas Infinitas Terras e a intenção era reorganizar os 50 anos de cronologia e deixar as histórias mais agradáveis para um público novo. Assim, John Byrne ficou encarregado de reformular o Superman. A mini-série em seis partes O Homem de Aço foi escrita e desenhada por ele, com arte-final de Dick Giordano, e até hoje é motivo de discussões entre os fãs do personagem, por ter, segundo alguns, “marvelizado” o Superman.

    Byrne quis deixar a história do personagem a mais simples possível. Para isso, varreu pra baixo do tapete muito da mitologia que o cercava, como os super-mascotes (Krypto, Raiado, Beepo, Cometa), e qualquer outro sobrevivente de seu planeta natal (como sua prima Kara Zor-El ou os criminosos da Zona Fantasma). Kal-El era, em sua visão, o Último Filho de Krypton.

    A primeira edição abre com um prólogo narrando os momentos finais do moribundo planeta Krypton. Usando uma estética que combinava com a ficção científica da época, Byrne descreveu um planeta com uma sociedade bastante desenvolvida nos mais diversos campos da ciência, porém estéril em seus relacionamentos. Jor-El e Lara não eram mais os pais amorosos de encarnações anteriores. Na verdade, o casal mal se tocava e o bebê Kal-El fora gerado em uma matriz, através de um processo parecido com o de clonagem, e ainda não havia nascido. Também diferente da versão clássica, onde o bebê é colocado em um foguete para ter sua vida preservada da catástrofe, Kal era apenas um embrião quando foi enviado para a Terra. Krypton, que estava sofrendo com a instabilidade de seu núcleo, explode, matando todos os seus habitantes com exceção do embrião na matriz gestacional.

    Isso já foi o suficiente para irritar muitos fãs do Superman na época. Parte importante de sua origem, de sua personalidade, sempre tinha sido sua ligação com o passado. O Superman pré-Crise era duas vezes órfão, o que lhe concedia uma bagagem emocional muito forte. Tudo isso se perdeu. Jonathan e Martha Kent estavam vivos e muito bem nessa nova versão, e qualquer coisa envolvendo Krypton não fazia sentido nenhum para o jovem Clark Kent. Mesmo a perda de seus pais biológicos não significaria nada, uma vez que nem mesmo os havia visto quando bebê.

    A história dá um salto para a época em que o jovem Clark Kent jogava futebol americano no colégio, em Smallville. Também diferente da origem anterior, aqui Clark se vale de seus poderes para ser um atleta, querido por todos na escola. Morre a identidade introspectiva de outrora, quando o disfarce do Superman era o pacato repórter, meio abobalhado, que não lembrava em nada a figura do campeão de Metrópolis. Clark, na visão de Byrne, era popular o suficiente para almejar uma carreira no futebol. Ao final do jogo, Jonathan Kent o chama para lhe contar o segredo há muito guardado, e revela que é seu pai adotivo. Mostrando-lhe o foguete que o trouxe ao Kansas, o velho pai conta que o encontrou e criou como filho biológico desde então. Jonathan imaginou que fosse um foguete russo (a Guerra Fria ainda não tinha acabado quando a história foi publicada), e aproveitando-se de uma nevasca que durou meses e impediu que saíssem de casa, o casal apresentou o bebê aos amigos como se fosse seu.

    Esse capítulo até hoje é bastante controverso, e muitos consideram John Byne xenofóbico por tê-lo escrito. Clark “nasceu” em terras norte-americanas, o que significa que o maior símbolo dos Estados Unidos não é mais um “imigrante ilegal”. Essa essência do “sonho americano”, da “terra das oportunidades”, onde qualquer um poderia alcançar o sucesso, cai por terra. O Superman de Byrne não era um imigrante, e sim totalmente americano como qualquer pessoa destacável deveria ser… Reflexo de sua época, quem sabe?

    Clark inicia uma jornada de auto-conhecimento pelo mundo que o leva a salvar vidas anonimamente, até ser forçado a se revelar publicamente em um desastre envolvendo um ônibus espacial. Inicialmente, esse ônibus seria a Challenger, mas devido ao desastre que ocorreu no mundo real (a nave explodiu em um voo que levava, além da tripulação, a primeira civil a ir ao espaço – a professora Christa McAuliffe), os editores alteraram isso de última hora. Clark salva a nave e seus tripulantes e não pode mais esconder sua identidade. Assim, volta ao Kansas e com a ajuda de Jonathan e Martha Kent, cria um uniforme para usar nos momentos heroicos, surgindo assim como Superman. Dessa forma, seu traje não é mais indestrutível e nem veio com ele na nave de Krypton, bem como o símbolo no peito foi criado por ele mesmo e nada tem a ver com a Casa de El. Nenhuma referência ao planeta natal – até aqui, ele ainda não sabe de onde vem.

    A segunda edição apresenta Lois Lane e a equipe do Planeta Diário na busca pela matéria mais importante do ano. Lois está bem caracterizada, assim como a equipe do jornal, e passa todo o capítulo buscando a primeira entrevista com o novo herói. Ousada, provoca um acidente de carro para ser salva e assim entrevistar o Superman, mas de nada adiantou: um novo repórter já havia escrito a matéria e seu nome era Clark Kent. Isso fez com que a relação entre os dois colegas fosse de rivalidade, pois Lois jamais o perdoaria por ter roubado seu furo de reportagem.

    As edições seguintes apresentam, cada uma, um aspecto da vida do herói focando em seus coadjuvantes. Temos então o primeiro encontro com Lex Luthor (não mais um gênio do mal e sim um mega-empresário inescrupuloso), com o Batman (e a relação entre os dois não seria mais de “superamigos”, e sim de leve rivalidade), com Bizarro (uma tentativa de Luthor clonar o Homem de Aço que deu muito errado)… Até a última edição, na qual ele retorna a Smallville e descobre sua verdadeira origem.

    Infelizmente, muitos “ganchos” espalhados pela história não são explicados. Claro que, nas edições posteriores de John Byrne, tudo fica esclarecido (quem é a figura misteriosa que o observa? por que ele passa mal ao chegar perto da nave?), mas falta um pouco de ação no último capítulo. Entretanto, a representação do Superman como um ideal a ser seguido é excelente, e Byrne consegue fazê-lo ser um bom-moço sem parecer chato. Em uma época em que os quadrinhos estavam começando a se tornar mais sombrios, é importante ver o Superman sorrindo com tanta frequência, voando com suas cores vivas e brilhantes pelos céus da Cidade do Amanhã.

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  • Resenha | O Reino do Amanhã

    Resenha | O Reino do Amanhã

    O Reino do Amanhã - capa

    A Era de Ferro dos Quadrinhos

    A década de 1990 foi um período conturbado para as hqs de heróis. Uma verdadeira explosão de comic shops nos Estados Unidos levou um grande público a consumir cada vez mais revistas novas, com heróis que fugiam dos padrões morais das décadas anteriores. Resultado direto de uma nova visão de mercado adotada dez anos antes, as editoras perceberam que séries fechadas poderiam render boas cifras. Além disso, o público havia tomado conhecimento da raridade de exemplares “número um” e seus valores astronômicos atingidos (uma cópia de Action Comics nº 1, com a primeira aparição do Superman, pode chegar hoje a 1 milhão e meio de dólares). Assim, uma grande especulação fez com que qualquer exemplar com o número 1 estampado na capa vendesse horrores, na esperança de que um dia aquilo valeria alguma coisa. Na ânsia de capitalizar em cima dessa tendência, as editoras despejaram nas comic shops cada vez mais “primeiras edições” de revistas com qualidade duvidosa. Essa tendência, junto com a necessidade dos autores e artistas de terem maior poder criativo sobre seus personagens, levou ao surgimento de editoras independentes, sendo a Image Comics a principal delas.

    As histórias de super-heróis de então tiveram seus maiores artistas criando cada vez mais novos personagens, que não estavam diretamente ligados a nenhuma cronologia pré-existente. O impacto visual das páginas passa a ser mais importante do que as histórias, e assim vários desenhistas começaram a roteirizar seus próprios quadrinhos. Extremamente violentos, com musculatura exagerada e armados até os dentes, os heróis do fim do milênio não eram tão diferentes dos vilões que enfrentavam. O bom-mocismo estava, definitivamente fora de moda. As duas maiores editoras, Marvel e DC Comics, incorporaram essa tendência em suas páginas também. Vimos então histórias mais violentas, roteiros menos elaborados e arte exagerada – com direito a mulheres sendo representadas pura e simplesmente como objetos sexuais. Um herói que não matasse seu inimigo – de preferência, da pior forma possível – não merecia ser chamado de herói. Da mesma forma, um desenhista que entendesse minimamente de anatomia não teria seu lugar ao sol no mercado de hqs.

    Até que chegou Alex Ross.

    Retorno à Era de Prata

    Em 1993, Ross tinha ilustrado a belíssima minissérie Marvels. Com um estilo bastante realista e um retorno às origens da Casa das Ideias, Marvels lançou o jovem pintor no mercado de forma magistral. Pouco tempo depois, Alex Ross teria ido à Distinta Concorrência apresentar um novo projeto. Ele que cresceu com os personagens da editora, lendo seus gibis e assistindo seus desenhos animados, queria ilustrar uma história que retratasse sua paixão pela Era de Prata dos quadrinhos, um tempo no qual heróis eram heróis “de verdade”. Para não cair no risco de deixar uma obra de tamanha magnitude ser roteirizada pelo próprio desenhista (algo bastante em voga na época), o editor Dan Raspler convidou Mark Waid para a empreitada. Waid era famoso por seu conhecimento enciclopédico do Universo DC, e era talentoso o bastante para encarar tamanho desafio. Assim, com os esboços e anotações originais de Ross em mãos, e após várias reuniões de criação, Mark Waid criou uma história fantástica que ao mesmo tempo que criticava o cenário da época, reverenciava os maiores personagens de todos os tempos. Alex Ross teve bastante liberdade na criação, e sua ideia original (a história deveria se chamar A Era Heroica) teve bastante coisa aproveitada.

    Assim, em 1996, Reino do Amanhã é publicado, na forma de uma minissérie em quatro partes. O sucesso foi estrondoso. Uma grande campanha de marketing antecipou o lançamento, com pôsteres e cards colecionáveis. Desde então, a história tem sido republicada frequentemente, com edições de luxo, materiais extra, esboços… E a trama, embora um registro histórico da época em que foi escrita, continua relevante nos dias de hoje.

    Verdade, Justiça e Quadrinhos Americanos

    O primeiro capítulo apresenta como está o mundo após a aposentadoria dos maiores heróis do UDC. Através do ponto de vista de um ser humano comum, o Reverendo Norman McCay, Waid e Ross nos apresentam esse futuro pessimista e muito parecido com o que estava acontecendo nas outras editoras. Os meta-humanos se consideravam superiores ao resto do planeta, e suas brigas mesquinhas e egocêntricas ofereciam mais riscos do que segurança à população. Os vilões não são mais um grande problema, e sim os próprios autoproclamados heróis. Wesley Dodds, o Sandman original, está num leito de hospital, em seus últimos momentos da vida. Norman McCay presencia sua morte e acaba herdando as visões do Armagedom que Sandman tinha em vida. Ao fim de um culto, Norman recebe a inesperada visita do Espectro, o Fantasma da Vingança, que anuncia ao pastor sua missão no fim do mundo. McCay e Espectro iniciam uma jornada no plano etéreo na qual presenciam os grandes fatos que levará ao Apocalipse de suas visões.

    Assim, vemos um Superman isolado em sua Fortaleza da Solidão em um holograma que simula fielmente a Fazenda Kent. Clark está mais velho, de barba e cabelos grisalhos, e seu semblante demonstra o peso do mundo que carrega em seus ombros. Ele demonstra não saber do incidente que ocorreu há pouco tempo no Kansas, uma explosão nuclear causada pela morte do Capitão Átomo pelas mãos de Magog. Diana, a Mulher-Maravilha chega para avisá-lo de que o mundo precisa dele novamente, aparentemente sem sucesso. Espectro então leva Norman para conhecer o que restou da antiga Liga da Justiça. Descobrimos que o Flash se fundiu à Força de Aceleração, e agora praticamente pode estar em todos os lugares ao mesmo tempo, inclusive em outras dimensões da realidade. Gavião Negro se tornou uma entidade da natureza, Lanterna Verde orbita solitariamente a Terra em uma base espacial que ele mesmo construiu com seu anel. E Gotham City é governada por uma legião de drones controlada pelo Batman, que adota uma estratégia de tolerância zero ao crime. O fim do primeiro capítulo mostra o Superman finalmente retornando à ativa e trazendo consigo novamente a esperança de tempos melhores.

    No segundo capítulo, vemos o ressurgimento da Liga da Justiça da América. O retorno do Superman inspirou outro heróis de sua época a juntarem-se às suas fileiras. Flash, Lanterna Verde, Poderosa, Ray, Mulher-Maravilha, Gavião Negro e Robin Vermelho são os primeiros. Com o tempo, a inspiração faz com que mais heróis saiam da sombra. Menos, claro, o Batman, que continua recluso em sua caverna, controlando os drones e monitorando, como um Grande Irmão, sua cidade. Seu estado físico encontra-se debilitado, mas suas habilidades mentais estão melhores do que nunca. Bruce Wayne se recusa a voltar para a Liga da Justiça, por não concordar com os métodos que o Superman adota. Após o diálogo entre os dois gigantes, descobrimos que o Homem-Morcego tem sua própria rede de vigilantes, em sua maioria jovens e filhos dos heróis do passado. Isso reforça a tradição do Cavaleiro das Trevas de influenciar e arrebanhar jovens pro seu exército particular. Dick Grayson, o primeiro Robin, não está ao seu lado. Como Robin Vermelho e conhecendo seu antigo mentor, ele prefere juntar-se ao kryptoniano, mas sua filha não pensa da mesma forma e engrossa as fileiras do Batman (uma subtrama que, infelizmente, se perdeu e só ficamos sabendo devido ao material extra). Ao lado do Batman, temos também grandes figurões como o Arqueiro Verde, Besouro Azul, Canário Negro entre outros.

    Superman continua seu recrutamento e vai atrás dos novos heróis, impondo sua vontade através da força. Os que recusam são presos em um Gulag projetado pelo Senhor Milagre, impossível de escapar (uma clara referência ao sistema de encarceramento e trabalhos forçados da extinta União Soviética). Alex Ross concebeu a arquitetura da prisão com o design clássico do QG da Legião do Mal, do desenho Superamigos. A ideia do Superman é que o Gulag seja uma espécie de colônia de reabilitação, e hologramas são projetados para educar os internos a usarem seus poderes com responsabilidade. Infelizmente, as coisas não são tão simples como ele gostaria.

    Nesse capítulo ficamos também sabendo o motivo pelo qual Superman se aposentou. Com a chegada de novos heróis, a opinião pública passou a não confiar mais nos métodos considerados antiquados do protetor de Metrópolis. Após um ataque do Coringa que resultou na morte de Lois Lane, Magog – um dos novos heróis – assassina o Palhaço do Crime e é preso pelo Superman, que o leva a julgamento. Seguindo a ideia de que “bandido bom é bandido morto”, o júri absolve Magog que desafia Superman para uma luta. Ao ver que isso não levaria a nada, o Azulão abandona sua cidade, seus protegidos e sua “batalha sem fim”, entregando esse novo mundo aos heróis do novo tempo. Seu isolamento então mostra-se uma forma de abandonar tudo, menos seus ideais, pois ele ainda está convencido de que está certo. Ao voltar, enfrenta Magog e o prende para a reabilitação.

    Além dos dois grupos de heróis, vemos ainda nesse capítulo os humanos mais ricos do mundo, liderados por Lex Luthor, formando uma Frente de Libertação da Humanidade. Os maiores vilões do passado se mostram preocupados com o destino dos humanos comuns frente a tanto poder concentrado nas mãos de tão poucos. Esta cena reflete em muito a noção de que magnatas e grandes corporações são quem realmente governam o mundo. Luthor e seus aliados podem até usar a desculpa de que estão protegendo a humanidade, mas na verdade estão apenas protegendo seus próprios interesses e garantindo os privilégios da elite capitalista. Qualquer semelhança com qualquer magnata da vida real (principalmente alguém que porventura almeja o cargo de presidente dos Estados Unidos) não me parece mera coincidência. Novamente, os quadrinhos americanos refletem a sociedade na qual são produzidos.

    Ponto de ebulição

    No terceiro capítulo, tudo dá errado. O Gulag não funciona como reabilitação, e cada vez mais os prisioneiros se rebelam. A população, que havia voltado a acreditar no Superman, passa a olhá-lo novamente com desconfiança. A Mulher-Maravilha então começa a pressionar Superman para que ele tome atitudes mais severas. Como uma guerreira, ela acredita que força letal deve ser usada contra os mais resistentes. Superman não concorda por achar isso uma atitude fascista, e a Princesa Amazona insiste que ele deva assumir de uma vez seu papel como líder mundial. Vemos um Superman dividido entre a vontade de tomar as rédeas do poder e a ideia de justiça e democracia que ele sempre defendeu e acreditou. Enquanto isso, Bruce Wayne une-se a Lex Luthor para garantir o protagonismo à humanidade. Luthor tem em suas mãos uma arma secreta: o jovem adulto Billy Batson, que sofreu lavagem cerebral desde criança e pode tornar-se o Capitão Marvel e agir à favor do magnata.

    O capítulo fica cada vez mais tenso quando vemos o rompimento da Mulher-Maravilha com o Superman. Decidida a derrubar a prisão sobre as cabeças dos presos rebeldes caso necessário, Diana segue para o Gulag com os heróis que a apoiam. Enquanto isso, Bruce Wayne revela que nunca esteve realmente do lado de Luthor, que manda o capitão Marvel derrubar a prisão. É a batalha do Homem de Aço contra o Mortal Mais Poderoso da Terra.

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    No quarto e último capítulo, o Armagedom chega à Terra. Durante a luta entre Superman e Capitão Marvel, a ONU resolve mandar uma bomba nuclear sobre o local, eliminando a ameça sobre-humana de uma vez por todas. Batman e seus aliados juntam-se finalmente aos seus antigos amigos para combater os prisioneiros. Enquanto isso, os jatos dos Falcões Negros chegam com a bomba, que é lançada no coração dos Estados Unidos. Superman e Capitão Marvel parecem finalmente ter chegado a uma trégua no embate, e enquanto a bomba cai, o Espectro finalmente dá a Norman McCay a ordem para cumprir seu papel no fim do mundo: julgar. Cabe ao velho pastor decidir quem deve pagar pelos pecados do mundo, os super-humanos ou a humanidade.

    A explosão da bomba – e a morte e sacrifício de vários heróis –  faz com que Superman perca o juízo e decida acabar de uma vez por todas com os responsáveis. Com fúria nos olhos, voa para o prédio das Nações Unidas decidido a derrubá-lo. Nesse momento, Norman McCay pede ao Espectro para que ele possa interferir. Como um bom pastor, o reverendo MacCay aconselha o ensandecido kryptoniano e firmemente o trás à razão. Superman então percebe que a paz não pode ser imposta pela força, e que um novo mundo mais justo só é possível com a união entre humanos e super-homens.

    A história então termina com a redenção dos meta-humanos e sua reinserção na sociedade, de uma forma bastante inspiradora e positiva após tantas tragédias. Superman volta a acreditar na humanidade e isso fica representado em seu retorno à identidade de Clark Kent, ao colocar os óculos na última página.

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    O Reino Hoje

    Anos após a publicação original, duas novas cenas foram acrescentadas à trama, em edições encadernadas de luxo. A primeira é o encontro do Super com Órion, em Apokolips, que tomou o lugar de seu pai Darkseid como ditador do planeta, e a conversa com Senhor Milagre, que projetaria a prisão. A segunda é o epílogo, onde vemos que Clark e Diana não só estão juntos como anunciam para Bruce Wayne que ele será o padrinho do bebê que está no ventre da Mulher-Maravilha. Uma cena bastante emocionante, diga-se de passagem.

    O tempo também nos mostrou o quão acertada foi a decisão de Dan Raspler em convocar Mark Waid para o roteiro. Embora a ideia de Alex Ross fosse excelente, é muito provável que o resultado não seria o mesmo caso o próprio ilustrador assumisse o roteiro. Prova disso é a maxi-série Justiça, escrita por Jim Krueger e ilustrada  por Ross, que foi muito maior (12 capítulos!) e não teve o mesmo êxito que o Reino. Vinte anos depois de sua publicação original, Reino do Amanhã ainda tem muito o que dizer. A Edição Definitiva apresenta, além dos esboços de Alex Ross para cada personagem, um guia para cada easter egg presente na hq, além de toneladas de textos explicativos, pôsteres e a sensação de que cada material extra é realmente relevante. Reino do Amanhã não é apenas uma história da Liga da Justiça. É uma epopeia atual, que mostra os super-heróis como deuses vivos da mitologia moderna andando entre nós. Se o Superman é o protagonista da história, Norman McCay é o “pé-no-chão” que nos conecta a ela. Norman representa cada leitor ou leitora que já se admirou com essas lendas e, por um motivo ou outro, virou as costas pra ela. A narrativa bíblica, presente em versículos do Apocalipse de São João nas visões do reverendo, dá o tom grandioso da história. O conflito ideológico entre Batman e Superman, além das inserções da Mulher-Maravilha, nunca estiveram tão presentes no mundo moderno quanto hoje em dia. Ao mesmo tempo, a escalação dos personagens remonta claramente à época em que foi escrita. O Lanterna Verde por exemplo, é Alan Scott porque Hal Jordan tinha morrido nas publicações da época e a Tropa dos Lanternas Verdes não existia mais.

    A história serviu ainda de base para muitas publicações futuras da DC, mas nenhuma delas se equipara à grandiosidade e maestria dessa saga sobre deuses e mortais, sobre o Bem e o Mal, sobre homens e super-homens.

    Compre: Reino do Amanhã (Edição Definitiva)

  • Resenha | Lendas do Cavaleiro das Trevas: Jim Aparo

    Resenha | Lendas do Cavaleiro das Trevas: Jim Aparo

    Lendas do Cavaleiros das Trevas - Jim Aparo

    Seguindo os moldes da coleção anterior dedicada a Alan Davis, Lendas do Cavaleiro das Trevas: Jim Aparo volta um pouco mais no tempo e reapresenta histórias da década de 70 publicadas na revista norte-americana The Brave and The Bold. Aparo assume os desenhos da revista em 1971, substituindo Neal Adams, e ali permanece por cerca de dez anos, tornando-se um dos responsáveis pelo visual do Batman que ficou estabelecido nas décadas a seguir. O material apresentado na coleção brasileira em quatro volumes é apenas metade do que foi lançado nos Estados Unidos, embora haja rumores de que o restante seja publicado num futuro próximo.

    Mas do que se trata, afinal, essa coleção? Dizer que é um compilado de histórias desenhadas por Jim Aparo seria por demais simplista. Os quatro volumes apresentam grande parte do Universo DC dessa época, bem como a forma como Batman interage com personagens tão diversos. Além disso, vemos uma grande evolução nos desenhos do artista. Se nas primeiras histórias ele praticamente emula o traço de seu antecessor, vemos no último volume uma melhora significativa em sua arte, imprimindo seu traço característico aos personagens. Além disso, é interessante notar como Jim Aparo retrata a sua época com detalhes marcantes nos cenários, roupas e objetos cênicos (como gravadores de fitas cassete, telefones de disco e gravatas com estampas espalhafatosas). Os roteiros – todos de Bob Haney, que já estava no título antes da chegada de Aparo – também refletem os problemas, preocupações e aspirações de sua época. Saem de cena as ameaças alienígenas da década anterior para dar espaço às gangues de rua, traficantes de drogas, terrorismo internacional, feminismo e Guerra Fria. Claro que o elemento fantástico ainda permeia várias histórias, mas o foco principal é uma espécie de realismo, mesmo que muito menor que os quadrinhos de hoje em dia aos quais nos acostumamos. As tramas são mais urbanas e policialescas, e até mesmo o design dos personagens adota proporções mais humanas. Batman tem um corpo atlético, mas não é uma montanha de músculos. É um detetive sagaz, mas não um computador ambulante. É um exímio lutador, mas não uma máquina de golpes violentos. É obstinado, mas não psicótico.

    A personalidade do Homem-Morcego também difere muito do que já conhecemos. Aqui ele se apresenta de forma bastante heroica, mas não é de maneira alguma um ser infalível. Suas convicções, em alguns momentos, beiram a hipocrisia. Por exemplo, Batman mantém seu juramento de nunca matar, mas isso não o impede de pedir para que um policial do DPGC o faça! Nada mais controverso e fora do personagem atual, que não mata e impede os outros ao seu redor de matarem também. Outra característica que pode causar estranheza no leitor é a aceitação geral da polícia de sua autoridade super-heroica, bem como a dos cidadãos de Gotham. Batman dá ordens a policiais, caminha pelas ruas durante o dia com uniforme completo e, por várias vezes, é hospitalizado sem que alguém da equipe médica sequer pense na possibilidade de tirar sua máscara. Na história em que ele se encontra com os Titãs, há uma explicação: Batman é oficialmente o xerife de Gotham! Uma autoridade constituída legalmente. Sim, é uma explicação bastante ingênua, mas revolucionária para a época. Talvez apenas “ser um super-herói” bastasse nos anos 60 para lhe conferir alguma autoridade, mas nessas histórias setentistas isso não era mais convincente, aparentemente.

    As histórias seguem um padrão: cerca de vinte páginas divididas em três capítulos, e todas autossuficientes. Não é necessário nenhum conhecimento prévio para apreciá-las, e não existe conexão entre elas. Talvez esse seja um aspecto que falte nas hqs de hoje em dia; elas se desdobram em tantas sagas, crossovers, tie-ins e spin-offs que fica difícil para um novato simplesmente escolher uma edição em banca para ler e compreender do começo ao fim. Não são histórias que alteram o status quo dos personagens envolvidos, porém são intrigantes e divertidas o suficiente para prender a atenção do leitor. Cada história apresenta o Cavaleiro das Trevas se unindo a um ou mais heróis – e às vezes, vilões! – para resolver algum mistério. No estilo que foi trazido às animações do século XXI com a série Batman – Os Bravos e Destemidos, vemos as mais variadas parcerias. Arqueiro Verde, Titãs, Metamorfo, Desafiador, Canário Negro, Mulher-Maravilha (numa fase sem poderes e com visual “kung-fu”), Homens-Metálicos, Sargento Rock, Flash, Pantera, Aquaman, Homem-Borracha, Etrigan e Coringa, entre outros, fazem parte da galeria de aliados do Batman durante os quatro volumes. Até mesmo a equipe criativa de The Brave and The Bold surge no último volume como parceiros no crime, em um exercício de meta-linguagem digno dos gibis do Bidu, de Mauricio de Sousa! As histórias ficam, em sua maior parte, em uma tênue linha entre o realismo e a ingenuidade. Batman é um excelente detetive, mas também é capaz de errar e principalmente, de aprender com esses erros.

    Uma curiosidade: o personagem Eléktron, no volume 3, foi sabiamente rebatizado como Átomo! Isso é importante e – porque não dizer – corajoso, pois um erro de tradução do passado não justifica manter assim no presente. Foi o que a Panini fez com o Caçador de Marte (antes erroneamente chamado de Ajax) logo que assumiu os quadrinhos DC.

  • Resenha | Bafo-de-Onça: 90 Anos

    Resenha | Bafo-de-Onça: 90 Anos

    Bafo - Vortex Cultural

    O mais antigo personagem Disney ainda em atividade acaba de completar 90 anos. Sim, João Bafo-de-Onça já estava por aí antes mesmo de um certo camundongo dar as caras nas telas do cinema. Inicialmente um animal parecido com um urso, Bafo foi transformado em um gato para melhor antagonizar o ratinho Mickey. De lá pra cá, mudou de personalidade várias vezes, sendo ora um criminoso incorrigível, ora um vizinho mal-humorado, ou até mesmo um amigo meio incompreendido, como no desenho A Casa do Mickey Mouse.

    Seguindo a linha das outras edições comemorativas – como Superpateta: 50 Anos – a Editora Abril lançou um especial de 300 páginas para celebrar o aniversário do vilão. O volume segue a mesma estrutura dos outros, dividido em três fases (Americana, Italiana e Brasileira), sem seguir uma rigorosa ordem cronológica. A importância histórica dessas hqs para o personagem parece ter sido o principal quesito na seleção, muito mais do que a qualidade das histórias ou a participação do Bafo nelas.

    A primeira história, de 1930, mostra a estreia do gatuno em uma história em quadrinhos. Publicada originalmente em formato de tiras, o leitor deve virar a edição no sentido horizontal para acompanhá-la. Essa história do Mickey foi escrita pelo próprio Walt Disney – embora o roteiro tenha sido finalizado pelo talentoso Floyd Gottfredson, que também ficou responsável pelos desenhos. É uma história ainda seminal, em que Bafo não passa de um capanga do vilão principal, e muito do que viria a ser as personalidades de Mickey e Minnie ainda estava sendo desenvolvida. Os personagens moram numa área pouco urbanizada, e vemos o cenário rural bastante presente, com seus elementos típicos ao fundo. A história gira em torno de uma herança que Minnie ganhou de um velho tio, embora a namoradinha do Mickey quase não tenha falas ou ações relevantes. O tom é de aventura, e o camundongo ainda mantém algumas características que sumiram com o tempo, sendo divididas aos poucos com outros personagens (ele se irrita fácil como o Pato Donald e se atrapalha como o Pateta). A história que vem depois mostra mais a personalidade do Bafo-de-Onça, que nessa época ainda tinha uma perna de pau. Nela, Bafo é o “homem da carrocinha” que persegue Pluto. Em seguida temos a primeira história de Carl Barks na qual o Bafo faz uma aparição, já com a perna “restaurada”. É basicamente uma história do Donald, e Bafo aparece muito pouco, embora seja essencial mais pro fim. A fase americana encerra com três histórias do Mickey, nas quais, além de ter maior relevância, Bafo apresenta a personalidade que iria consagrá-lo no quadrinhos: um verdadeiro e perigoso bandido.

    Na fase italiana, João Bafo-de-Onça ganha uma importância maior nas histórias. Não apenas o bandidão unidimensional, mas um personagem mais complexo e de personalidade maleável. Em terras italianas ele ganha uma “famiglia”, com direito a uma noiva (Tudinha) e sobrinhos terríveis (Bafito e Bafildo). O Bafo italiano ainda é um mau-caráter, mas se permite fazer uma macarronada na casa do Mickey e almoçar em sua mesa enquanto conta a história de seu tio-avô. Ou ainda, confia no camundongo para cuidar de seus sobrinhos enquanto cumpre pena na prisão. Claro que, no fim, sua verdadeira face vem à tona. Mas é interessante a forma como ela é construída ao longo das histórias. Vale lembrar que os autores italianos são mais propensos a criar novos personagens. Nas histórias dessa fase selecionadas para essa edição, não aparece o Pateta como “fiel escudeiro” e sim dois personagens menores. Atomino Bip Bip (um ser de outra dimensão) ajuda o Mickey na história de 1960 “O colar Quirikawa”, na qual a noiva Tudinha faz sua estreia. Já na história mais recente “A Ilha Nefausta” (de 2004, escrita pelo renomado Casty e desenhada por Giorgio Cavazzano), o companheiro de aventuras é Brutus, um corvo filho adotivo do Amadeu. Brutus é um personagem pouco conhecido do grande público, principalmente por ter sido traduzido em várias histórias nacionais erroneamente com o nome de seu pai. Essa é, de longe, a melhor história da edição.

    Já a fase brasileira deixa muito a desejar. Embora mostre a primeira vez que Bafo é desenhado por um artista brasileiro (Jorge Kato, pioneiro dos quadrinhos Disney brazucas), as histórias são rasas e superficiais. Mickey e Pateta contracenam com Zé Carioca em duas histórias bastante insossas, com roteiros ingênuos mesmo para a época (1961). As duas outras histórias dessa fase são melhores e realmente engraçadas, embora mais curtas. São da década de 1980, quando os quadrinhos Disney no Brasil tinham uma produção de excelente qualidade. Morcego Vermelho e Superpateta contracenam com o Bafo, com aquele humor brasileiro que Gérson L.B. Teixeira e Verci de Mello combinavam muito bem! Mas é pouco, comparado às mais de 260 páginas dedicadas aos autores americanos e italianos.

    Se levarmos em consideração que essa é uma edição dedicada a um personagem específico, podemos dizer que na maioria das histórias ele não foi lá muito relevante. Embora contenha boas histórias, o homenageado aparece muito pouco na primeira metade do volume, ganhando status de co-protagonista em apenas uma (A Ilha Nefausta). Na história de Barks, por exemplo, Bafo aparece em apenas nove dos cento e sessenta e cinco quadros! O material extra, com textos e fotos raras, é bem interessante. Mas não chega a ser uma edição tão boa quanto suas antecessoras.

    pietro gambadilegno

  • Resenha | Contos de Natal

    Resenha | Contos de Natal

    natal disney

    Histórias de natal nos quadrinhos Disney são quase que uma tradição anual. No Brasil, todo fim de ano vemos nas bancas um almanaque contendo coletâneas de histórias natalinas, o Natal de Ouro Disney. Edição esperada o ano todo pelos leitores nos anos 80 e 90, Natal de Ouro voltou a ser publicada há alguns anos, apostando em histórias mais recentes e algumas inéditas, produzidas na Itália. Além desta costumeira edição, os leitores de quadrinhos Disney no Brasil tiveram uma ótima surpresa nesse fim de ano: a Editora Abril publicou um volume em capa dura intitulado Contos de Natal por Carl Barks.

    Barks foi o criador de praticamente tudo que é legal nas histórias do Pato Donald, desde personagens secundários até a própria cidade de Patópolis. Esta edição apresenta, em ordem cronológica (em partes – mais sobre isso daqui a pouco) todas as histórias com tema natalino escrita pelo Homem dos Patos. São 35 histórias que vão desde épicos de mais de vinte páginas até gags de uma página só.

    As histórias de natal apresentadas nesse volume, além de serem clássicos indiscutíveis, carregam também grande valor histórico. A primeira delas, O Melhor Natal, apresenta a primeira aparição da Vovó Donalda. Além disso, mais duas histórias nos brindam com primeiras aparições: Natal nas Montanhas é a estreia de ninguém menos que Tio Patinhas Mac Patinhas (ou MacPato, para os saudosistas de Duck Tales). Aqui, Patinhas é um velho sovina e rabugento que odeia o natal e é praticamente o vilão da história. Sua personalidade ainda não estava definida – dizem que Barks não tinha planos de usá-lo em outras histórias.

    O avarento Tio Patinhas, em sua primeira aparição.

    O velho avarento co-estrela várias histórias, e rouba a cena em quase todas elas. O Patinhas de Barks não é tão avarento quanto era a princípio, e para ganhar a atenção de seus sobrinhos-netos não pensa duas vezes antes de esbanjar! Se em uma história ele aprende a valorizar o natal e a família, parece que na outra ele simplesmente esqueceu-se de tudo, e em outra se mostra muito mais mão aberta do que estamos acostumados. Nas últimas histórias, porém, podemos ver um Tio Patinhas muito mais próximo da figura que conhecemos: ainda um pão-duro, mas com bom coração!

    Em A Visita do Primo Gastão vemos o surgimento do ganso sortudo que não gosta de trabalhar. Gastão vive à revelia da própria sorte, e aparece mais algumas vezes no volume, sempre rivalizando com Donald e se dando bem no fim das contas. Sua personalidade não muda tanto quanto a do Tio Patinhas.

    A maioria das histórias parece girar em torno de um modelo: Donald enfrenta alguma dificuldade para comemorar o natal, inventa um plano, o plano dá errado mas no final tudo fica bem. Claro que nem tudo segue essa fórmula, e essa é a graça. Podemos ver os patos em um farol distante da cidade, em um submarino no meio do oceano, em uma ilha deserta ou simplesmente nos arredores de Patópolis. Barks pode contar uma excelente história, seja qual for o contexto ou cenário escolhido para tal.

    A figura do Papai Noel é algo bastante curiosa. Aparentemente, ele existe e todos concordam com isso – inclusive o próprio Bom Velhinho aparece em duas histórias. Porém, ainda assim, é preciso comprar os presentes para os meninos ou colocar a cartinha deles no correio a tempo. Aparentemente, existe uma diferença entre os presentes dados pelo Noel e os recebidos das mãos de seu próprios familiares. O que importa, mais do que tudo, é uma boa ceia em família, com peru assado!

    Barks não era lá um grande entusiasta da tradição natalina em sua vida pessoal, mas conseguia com maestria capturar as angústias, as ambições, os desejos e os mais diversos sentimentos que o feriado cristão gera nas pessoas, extrapolando para as páginas em uma excelente caricatura do Natal.

    Das histórias publicadas, apenas as duas últimas não estão em ordem cronológica. Noite Feliz, penúltima história, havia sido escrita e desenhada nos anos 60, mas foi vetada devido a um alto teor de violência para os quadrinhos Disney americanos na época (Donald é torturado com choques elétricos por seu vizinho Silva). Essa história foi publicada pela primeira vez duas décadas depois, na Holanda. Isso explica a diferença do traço dos personagens, com pescoços e bicos mais longos, como nas primeiras histórias. Essa é a única trama em que fica evidente o caráter cristão do feriado, com Donald cantando a música título, mais devido à tradução da versão brasileira do que uma vontade do próprio autor, que preferia deixar questões religiosas de lado.

    A última história não foi escrita por Barks, apenas desenhada a lápis. É a reprodução das páginas de um livro que já foi publicado no brasil três vezes, em diferentes formatos (diferente do que aparece creditado no índice, onde diz que foi publicada apenas uma vez). O velho conto Um Conto de Natal, de Charles Dickens, é mais uma vez reencenado pelo “Tio Scrooge” da Disney.

    Contos de Natal por Carl Barks é uma excelente edição, não trata o feriado de forma maçante e é garantia de boa diversão. O formato de capa dura, 400 páginas e miolo em couché é excelente, embora um pouco menor do que o apresentado em A Saga do Tio Patinhas e Os 80 Anos do Pato Donald. Ao leitor e fã das aventuras barksianas, resta torcer para que a Abril republique sua obra completa em um modelo parecido.

  • Resenha | Peanuts Completo: 1957 a 1958

    Resenha | Peanuts Completo: 1957 a 1958

    Peanuts-completo-1957-1958

    Vamos direto ao ponto: vale a pena ler apenas um volume dessa obra monumental que é Peanuts Completo? A resposta é: com certeza! Difícil é não querer ler os outros volumes…

    Peanuts Completo é uma coleção que se propõe a publicar da primeira à última tira de Charles M. Schulz, cada volume correspondendo a dois anos de publicações diárias e dominicais (exceto o primeiro volume, que abraça três anos). As tiras diárias diferenciam-se por serem, via de regra, de apenas quatro quadros, enquanto as dominicais possuem três linhas com oito ou mais quadros. No Brasil, a L&PM Editores já lançou sete dos vinte e cinco volumes previstos, com uma qualidade e acabamento bastante superior a outros produtos da casa (que é especializadas em livros de bolso).

    O volume quatro da obra registra todas as tiras publicadas entre os anos 1957 e 1958. Os personagens mais conhecidos de Schulz começam a ganhar os traços e contornos com os quais ficaram conhecidos até hoje. Lá pela metade do livro vemos Snoopy ganhando algumas de suas principais características (no primeiro volume ele aparenta ser um cãozinho beagle normal), principalmente andar sobre duas patas.

    O estilo aparentemente inocente das histórias de Schulz contrasta em muito com o de outros autores que utilizam a infância como temática de suas tiras. Enquanto a Mafalda do argentino Quino é altamente politizada e preocupada com questões globais de sua época e Calvin, de Bill Watterson, é extremamente criativo e agitado, Charlie Brown está muito longe disso. Questões políticas são tratadas de muito leve (quando tratadas!), e a imaginação exacerbada de Calvin contrasta com a dura realidade do bom e velho Charlie Brown. O garoto lida diariamente com frustrações, decepções e o peso de suas próprias limitações. Cobrado constantemente pelos seus amigos por coisas que ele supostamente deveria dominar, Charlie Brown está menos preocupado com a fome no mundo (como Mafalda) do que com que cara vai aparecer na escola amanhã após ter perdido o jogo de beisebol.

    As piadas recorrentes ganham bastante espaço durante a construção das personalidades de cada criança. Lucy se afirma como a maior implicante do mundo, ganhando inclusive troféus para provar. Linus não consegue se separar de seu cobertor – objeto de transição entre sua primeira e segunda infância. Schroeder, que era um bebê no primeiro volume, passa a ser religiosamente devotado à vida e obra de Beethoven, ignorando todas as investidas românticas de Lucy. “Chiqueirinho” (sempre grafado entre aspas) tem um espaço considerável também, estreando nas tiras alguns anos antes do brasileiro Cascão, de Mauricio de Sousa. Snoopy rouba a cena cada vez que aparece, e vai se tornando mais humanizado pouco a pouco.

    Mas são os fracassos de Charlie Brown (ainda sem seu apelido “Minduim”) que nos fazem ao mesmo tempo rir e se identificar com esse universo. O leitor sabe que Charlie Brown vai se dar mal, mas espera e torce por ele mesmo assim! Esse sentimento de empatia nos faz lembrar de nossas próprias frustrações, e de como rir disso nos ajuda a deixá-las para trás. Tanto que o próprio Schulz já disse que suas épocas mais produtivas eram as que ele estava passando pelos piores problemas pessoais! Charlie Brown não é um garoto perfeito, não é audacioso, não é sequer inteligente. Mas é por ser um garoto comum que temos essa empatia quase que imediata com ele.

    Das personagens retratadas na edição, Violet é a única que tem tão pouco destaque que quase não aparece. Além disso, figuras mais conhecidas como Patty Pimentinha, Marcie, Sally e Woodstock ainda não tinham sido criados e portanto não são vistas no volume.

    Não é necessário ter lido os três livros anteriores para apreciar Peanuts Completo Volume 4, que funciona independentemente das outras edições. Mas a vontade de ler os outros certamente será maior ao terminar a última tira!

    Compre Aqui: Peanuts Completo – 1957 a 1958

  • Resenha | Ayrton Senna: A Trajetória de um Mito

    Resenha | Ayrton Senna: A Trajetória de um Mito

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    Onde você estava no dia em que Ayrton Senna morreu?

    A pergunta varia de tempos em tempos, de lugar pra lugar. Pode ser sobre o assassinato de John F. Kennedy ou o atentado de 11 de setembro. Mas para os brasileiros que viveram a época mais gloriosa de nossa Fórmula 1 (ao menos em nossa idílica memória), o dia em que Senna se acidentou fatalmente diante de nossos olhos ficou marcado para sempre. Ao conversar um pouco sobre a vida de Ayrton Senna com pessoas ao meu redor, notei o quanto todos pareciam demonstrar uma grande emoção ao relembrar daquele dia. A história acaba sendo suprimida, e o mito toma seu lugar. Se Senna foi um grande corredor em sua época, nos dias de hoje ele alcança quase um status divino no panteão de heróis nacionais.

    E é esse espírito emotivo que a HQ Ayrton Senna – A Trajetória de um Mito evoca. Escrita por Lionel Froissart – jornalista francês apaixonado por corridas de automóveis e amigo pessoal de Senna – e desenhada por Christian Papazoglakis e Robert Paquet, a graphic novel apresenta quatro histórias curtas que mostram o início e o fim da carreira do piloto. O estilo de narrativa e os recursos gráficos utilizados nas belíssimas ilustrações fogem do que estamos acostumados a ler na mídia mainstream, deixando a marca de quadrinho europeu bastante evidente. É interessante notar a forma como o roteiro e o desenho se completam. Se o leitor desatento apenas folhear suas páginas, poderá erroneamente pensar que a qualidade dos desenhos se assemelha às antigas propagandas do Instituto Universal Brasileiro que circulavam nos gibis dos anos oitenta. Ledo engano: o traço leve e detalhado dá movimento às cenas de corrida, e a narrativa dá o tom de emoção que uma obra como essa depende para funcionar. Em alguns momentos, o leitor pode ver-se realmente tenso entre uma volta e outra das pistas de corrida. A riqueza de detalhes dos desenhos se mostra também nas marcas dos patrocinadores nos carros e uniformes dos corredores: nenhuma é suprimida, como seria de se esperar em uma obra como essa.

    O número de quadros por página é bastante alto. Temos uma média de dez, mas algumas páginas chegam a doze ou até mesmo catorze quadros. É algo bastante diferente do que estamos acostumados nos quadrinhos nacionais, até mesmo pelo número relativamente baixo de páginas: apenas cinquenta, contando a capa. Além disso, a fonte usada nos textos e os balões de fala retangulares podem causar certa estranheza ao leitor. Mas as histórias são muito bem contadas.

    A primeira mostra Senna ainda criança, em corridas de kart, e introduz uma parte importante de sua mitologia: seu melhor desempenho em dias chuvosos. A segunda história mostra seu relacionamento com pilotos e empresários brasileiros, dando um grande destaque a Emerson Fittipaldi. A rivalidade com Nelson Piquet é sugerida, porém não muito explorada, e acaba ficando subentendida. Na terceira história, Senna já alcança um patamar de ídolo, e vemos os problemas que enfrenta com empresas e patrocinadores. Na quarta e última história, temos seu capítulo final: a troca da McLaren pela Williams, o acidente e o início do Instituto Ayrton Senna.

    Ao sustentar-se principalmente nas emoções, o livro é bastante competente no que se propõe. Fica impossível, para quem tem mais do que trinta anos, não se lembrar daquele dia fatídico. Não importa se você era ou não fã de Fórmula 1, sempre irá se lembrar onde estava no dia em que Ayrton Senna morreu.

    Ayrton Senna - A trajetória de um Mito - foto

  • Resenha | Lendas do Cavaleiro das Trevas: Alan Davis

    Resenha | Lendas do Cavaleiro das Trevas: Alan Davis

    Se existe uma lacuna nas publicações DC Comics no Brasil, podemos dizer que é a de fases clássicas de seus personagens. A Panini vem publicando com sucesso suas Coleções Históricas da Marvel Comics há algum tempo, enquanto os fãs da DC quase não têm acesso às histórias da mesma época. A coleção Lendas do Cavaleiro das Trevas vem preencher esse vácuo, e podemos comparar sua qualidade com a da Coleção Histórica Marvel: Homem-Aranha. A primeira publicação dessa linha apresenta o Batman desenhado pelo veterano Alan Davis.

    Esqueça o personagem fascista e psicótico eternizado por Frank Miller em O Cavaleiro das Trevas: esse Batman é um verdadeiro herói em todos os sentidos da palavra! O lado detetivesco é bastante explorado, mas o melhor é a relação com o Robin! Qualquer aspirante a humorista que insiste em fazer piadas homofóbicas com a Dupla Dinâmica provavelmente nunca leu uma história dos personagens. Robin aqui é Jason Todd, e a julgar por essas histórias, não há motivo para odiar o personagem. Sua relação com Batman é mais do que entre pupilo e tutor: é de pai e filho. Batman demonstra uma preocupação e um carinho muito grande com seu filho adotivo, e quer para ele um destino melhor que o seu próprio. A possibilidade da perda do parceiro-mirim é um fantasma que assombra o Homem-Morcego – o que nos faz entender todo o desenvolvimento do personagem após a morte de Jason.

    Os vilões clássicos estão presentes nos dois volumes: Mulher-Gato, Coringa, Espantalho e Chapeleiro Louco são apresentados da forma como os conhecemos nas animações oitentistas. Assim, temos uma Selina Kyle miando e ronronando todo o tempo, um Coringa espalhafatoso e pouco ameaçador, e um Jarvis Tetch abobalhado.

    O primeiro volume é bastante divertido. Já o segundo, embora tenha histórias melhores, é um pouco frustrante, pois a capa induz o leitor a pensar em histórias que, no final, não estão na edição. A capa do volume dois apresenta o Batman carregando Robin no colo, com chamas no cenário atrás, o que dá a entender que será apresentada a clássica história Morte em Família, quando na verdade é uma história de origem do Homem-Morcego. Já na quarta capa vemos o Morcegão segurando uma arma, imagem do clássico Ano Dois. Infelizmente, apenas a primeira história de Ano Dois consta na edição, por ter sido a única desenhada por Alan Davis. Esse seria um bom argumento, se no primeiro volume não houvesse histórias desenhadas por outros artistas (o encontro de Batman com Sherlock Holmes) para completar um arco iniciado por Davis. Mesmo assim, essa edição é melhor que a primeira, e se encerra com uma história de Batman – Preto e Branco. É bom ver o Batman oitentista novamente, sendo aquilo que ele realmente deveria ser: um detetive e, acima de tudo, um herói!

    Compre: Lendas do Cavaleiro das Trevas: Alan Davis

  • Resenha | Assassin’s Creed: Bandeira Negra – Oliver Bowden

    Resenha | Assassin’s Creed: Bandeira Negra – Oliver Bowden

    Assassin's Creed - Bandeira Negra - Oliver Bowden

    A série Assassin’s Creed teve sua estreia nos videogames em 2007 e desde então não parou mais de crescer. Ao todo, foram lançados 15 jogos com a marca, entre os principais e os spin-offs. Não bastando saturar o mercado de games, outros produtos foram licenciados pela desenvolvedora Ubisoft, como histórias em quadrinhos, curta-metragens e livros. Lançado pela Editora Record no selo Galera RecordBandeira Negra é a novelização do quarto game da série (ou décimo, contando todos os outros paralelos). Felizmente, não é preciso para o leitor ter conhecimento prévio algum sobre o jogo, pois o livro funciona por si só. Escrito por Oliver Bowden – pseudônimo de Anton Gill, também autor dos outros livros da série – o livro nos conta a história de Edward Kenway e como ele se tornou um pirata.

    A história começa em 1711, em Bristol, Inglaterra. Kenway, um criador de ovelhas, vê-se apaixonado por Caroline Scott, a jovem e linda filha de um rico mercador. Para poder sustentar sua amada, acaba obrigado a servir como corsário. Assim, começa sua vida de aventura que em breve o tornaria um verdadeiro pirata. A narrativa em primeira pessoa, em certos momentos, torna a leitura um tanto quanto cansativa. Kenway está, certamente, contando sua história a alguém que não é o próprio leitor, uma vez que a certa altura revela o ano de nascimento de seu ouvinte. Isso acaba sendo um problema, pois, não gera identificação nem com o personagem-narrador, nem com o ouvinte. A ação, por vezes bastante complexa, acaba por se tornar enfadonha em determinados momentos, principalmente por se referir a termos náuticos – comuns em histórias de piratas – sem revelar alguma descrição do que se trata.

    Esse parece ser um problema recorrente nos livros da série. Para ser considerado um romance histórico, faltam descrições dos termos, objetos, ambientações, expressões, etc. Talvez para contar a história de forma mais fluida, o autor não se preocupe tanto com essas descrições, mas dificulta a vida do leitor, que precisa de alguma ferramenta de pesquisa caso queira entender melhor o que está sendo contado. Uma pequena lista traduzindo esses termos ao fim do livro seria uma excelente ideia que infelizmente não foi utilizada.

    A primeira parte é um tanto quanto arrastada e demora para empolgar. Edward só vem a se tornar um pirata de verdade lá pela página 100 (na verdade, a primeira parte parte do jogo de videogame acontece por aí). Mas a partir da parte dois, a narrativa tem um ritmo mais empolgante. É quando o protagonista assume uma nova identidade, utilizando o manto do Credo dos Assassinos sem nem sequer saber do que se trata. A partir desse momento, Kenway se vê envolto a uma série de tramoias conspiratórias envolvendo os Templários e algumas das pessoas mais influentes do mundo. Aos poucos, vai se transformando em um verdadeiro Assassino. Então, temos todos os clichês de histórias de piratas, incluindo o temível pirata Barba Negra, amigo do protagonista. Batalhas navais, lutas com espadas, traições e reviravoltas na trama (para evitar spoilers, não leia a lista de personagens no final do livro!).

    Não é necessário ter jogado Assassin’s Creed IV para apreciar a leitura de Bandeira Negra. No entanto, é provável que ao terminar o livro, o leitor acabe tendo interesse pelo jogo – e sua experiência será ainda mais enriquecedora!

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  • Resenha | Superpateta: 50 Anos

    Resenha | Superpateta: 50 Anos

    Super Pateta - Capa

    A Editora Abril continua sua série de especiais “50 Anos”, que já apresentou excelentes edições como Urtigão e Peninha. Dessa vez, a criação do Superpateta é comemorada em 300 páginas, nos mesmos moldes dos outros especiais. Não existe no formato nada de novo, pois é o que já vem sendo apresentado em edições como Disney Big: capa cartonada, papel jornal, formatinho. Entretanto, o conteúdo e a seleção de histórias mostram-se mais importantes do que comumente vemos nas hqs da linha Disney no país.

    Assim como os dois últimos especiais de 50 anos, essa edição é dividida por “fases”, sendo elas Americana, Brasileira e Italiana, novamente. Na Fase Americana, temos três histórias de origem, publicadas em ordem cronológica. A primeira trata-se de uma aventura comum do Mickey contra o vilão Mancha Negra no Velho Oeste, e Pateta acredita ter adquirido super-poderes ao beber um combustível do Professor Pardal por engano. Essa história é bem divertida, e pode ser considerada “normal” dentro do universo do camundongo detetive. A segunda história mostra o Pateta com uma capa inventada pelo Pardal que lhe concedia seus poderes, e pode até ser considerada uma continuação da anterior – embora não seja oficialmente. Já a terceira origem é a considerada “canônica”, pois mostra o Pateta comendo seus famosos “superamendoins“. Aqui surgem elementos que viriam a ser marca registrada do herói nos anos posteriores, como uma identidade secreta – Pateta vive em sua casa simplória e tem a certeza de que ninguém acreditaria se ele assumisse seu alter-ego. Seus incríveis poderes – os mesmos do Superman, diga-se de passagem – podem desaparecer a qualquer momento, ao passar o efeito do superamendoim. Essa fraqueza do herói permite que o roteiro seja bem desenvolvido, gerando situações cômicas e alguns problemas que Pateta deve resolver sozinho. Todos esses elementos seriam explorados nas histórias posteriores, portanto essa é a “verdadeira” origem do personagem.

    A partir de então, podemos considerar que Superpateta e o Pateta comum são dois personagens distintos. Isso porque, nas histórias do Mickey da época, os elementos super-heróicos são ignorados, talvez para que Pateta continuasse a ser um side-kick do rato mais famoso do mundo, ao invés de personagem principal. Da mesma forma que Donald não é o Superpato em todas as histórias, Superpateta faz parte desse universo onde quase todos os personagens principais da Disney tem uma contraparte heroica. Vemos então, na Fase Brasileira, o herói se juntar ao Clube dos Heróis. Superpato, Superpata, Morcego Vermelho, Borboleta Púrpura, Vespa Vermelha e Super Gilberto (o sobrinho gênio do Pateta) formam uma Liga da Justiça disneyana, além do encontro histórico com o Morcego Verde no Rio de Janeiro. As histórias brasileiras tem um tipo de humor mais centralizado e costumam ignorar a localidade onde se passam. O primeiro encontro do personagem com Zé Carioca, por exemplo, não deixa claro onde a história se passa. Isso pode ser entendido como algo comum nas histórias brasileiras da época, que assumiam Mouseton e Duck Burg como uma só cidade: Patópolis. Era comum, portanto, que o mesmo Coronel Cintra das histórias do Mickey pedisse ajuda ao Morcego Vermelho, Superpato ou Superpateta, bem como encontros com o Zé Carioca eram frequentes.

    A Fase Italiana conta com três histórias, sendo a primeira aventura do Superpateta produzida na Itália, uma história com a Bruxa Vanda e uma inédita no Brasil, a última produzida até agora. Os desenhos são mais exagerados e o humor mais escrachado, mas os artistas italianos expandem o universo do personagem, ampliando uma característica esquecida por outros autores: o ceticismo. Nessas histórias, o comedor de superamendoins não acredita em magia e superstições, contrariando o Pateta supersticioso de antigas revistas Disney.

    Para um personagem que surgiu como paródia às histórias de super-heróis, Superpateta cresceu e envelheceu razoavelmente bem. As histórias mais atuais são menos ingênuas, com um toque de ficção científica, e os roteiristas parecem mais preocupados em criar piadas originais e um background melhor desenvolvido do que parodiar quadrinhos consagrados. Para além das histórias em quadrinhos, Superpateta já teve uma memorável aparição no desenho animado O Point do Mickey, onde surpreendentemente é bastante fiel ao original, e bem engraçado também! Recentemente, também apareceu na série A Casa do Mickey Mouse, mas em uma versão mais infantil e de acordo com o propósito da animação.

    Superpateta  50 Anos é um prato cheio para os fãs do personagem e um bom tira-gosto para quem não o conhece ainda. Um tira-gosto quase tão bom quanto superamendoins!

     super pateta

  • Sai de cena Roger Slifer, cocriador do Maioral!

    Sai de cena Roger Slifer, cocriador do Maioral!

    Faleceu nessa segunda-feira 30 Roger Slifer, co-criador do personagem Lobo, a paródia da DC Comics aos personagens ultra-violentos dos anos 80/90.

    Lobo surgiu como personagem secundário, mas logo ganhou o respeito dos fãs por ser uma versão escrachada do Wolverine. Nos anos 90, teve sua revista mensal comandada por Alan Grant,  e teve seu traço definitivo desenhado por Simon Bisley.

    Slifer criou o Último Czarniano em parceria com Keith Giffen, que continuou escrevendo suas histórias por muito tempo.

    O autor sofreu um acidente de carro em 2012, e desde então mantinha-se vivo apenas com a ajuda de aparelhos. Sua vida foi marcada não só pela autoria de quadrinhos, mas também de animações como Transformers, Comandos em Ação (G.I. Joe) e Jem e as Hologramas.

  • Resenha | Batman: Silêncio

    Resenha | Batman: Silêncio

    silêncio - capa

    Quando Jim Lee foi anunciado como novo desenhista do Batman, na DC Comics, muita gente ficou com a pulga atrás da orelha. Afinal, o artista coreano era conhecido por desenhar os coloridos X-Men na Marvel, e não se imaginava como seria sua investida no mundo sombrio do Homem-Morcego. Felizmente, ele não fez feio! A arte de Lee caiu como uma luva e funcionou perfeitamente para aquilo a que se propôs. Tudo o que ele precisava era de um bom roteirista que soubesse aproveitar seus atributos em favor de uma boa narrativa. Infelizmente, não foi o que aconteceu com o roteiro de Jeph Loeb.

    Silêncio se mostrou uma trama arrastada, sem foco, rocambolesca e massavéi, o que desperdiçou todo o potencial de Lee. Loeb, que já nos brindou com a excelente maxi-série O Longo Dia das Bruxas, tentou imitar a si mesmo. Não colou. Em O Longo…, o autor desenvolve uma trama na qual ficamos as treze edições tentando adivinhar a identidade do assassino. O mesmo ele tenta fazer nesta história, mas com um problema: o assassino fica muito claro já na primeira edição!

    Loeb utiliza-se de um recurso narrativo que tem se tornado o pesadelo dos fãs de quadrinhos nas últimas décadas: o retcon. Esse recurso é usado quando o roteirista resolve mudar o passado de algum personagem, inserir algum detalhe na trama ou explicar algo que ele considere importante mas que nunca foi mostrado. Diferente de um flashback, o retcon abala as estruturas da história de um personagem. E é exatamente o que ocorre nessa história. Um personagem extremamente importante é “retro apresentado” aos leitores: um amigo de infância de Bruce Wayne do qual ninguém jamais tinha ouvido falar, mas que de uma hora para outra passa a ser a pessoa mais importante na vida do playboy milionário. Causa estranheza no leitor, e, em um momento, Robin chega até a mencionar o fato de Bruce não ter falado a ninguém sobre esse amigo. Nesse momento, lá pela metade da trama, parece que Tim Drake está expressando o pensamento de seus leitores.

    A trama é bastante rasa. Alguém está stalkeando o Batman e usando seus maiores inimigos contra ele. O herói tem que enfrentar os vilões mais perigosos de sua galeria, como o Crocodilo, Hera Venenosa, Arlequina, Coringa, Charada, Espantalho… E até o Superman! Aqui cabem dois comentários: primeiro, a ideia de enfrentar todos os vilões já foi explorada, e de forma muito melhor, na megassaga A Queda do Morcego; segundo, o Superman não acrescenta nada à trama a não ser o fan service para quem idolatra o Batman e odeia o Azulão. Lá pelas tantas, o tal amigo de infância é assassinado, aparentemente pelo Coringa, e Batman precisa descobrir quem está arquitetando o plano (que plano mesmo?). O roteirista parece querer brincar com o leitor (que não sacou na primeira edição), inserindo diversas possíveis identidades para o assassino. E talvez essa seja a parte mais frustrante da história. Em determinado momento, um importante aliado de Batman é revelado como sendo o vilão da história. E faria sentido, principalmente devido a algo que aconteceu na primeira edição (o rompimento da “batcorda” com um “batarangue”). Mas era mais uma “pegadinha”. Entre os personagens que poderiam ser o stalker está, inclusive, Harold – o corcunda de estimação do Batman –, que estava sumido desde a A Queda. O problema é que Harold aparece completamente solto na trama, e leitores mais novos podem ficar totalmente sem entender o que ele significa no universo do Morcego.

    (Nota do redator: Harold é um personagem que, para o bem de Bruce Wayne, deve ser desconsiderado editorialmente. Afinal, é praticamente um escravo que cuida da parte mecânica da Batcaverna, e que, além de corcunda e mudo, tem claros sinais de deficiência cognitiva. Já ouviu falar de ética, Patrão Bruce?).

    Batman Villains in The HUSH Storyline

    No fim da trama, a identidade do vilão é revelada (Nossa! Que surpresa!), e ficamos sabendo que um dos mais antigos vilões de Gotham conhece a identidade secreta do Cavaleiro das Trevas, mas não pode fazer nada com essa informação. Temos um Batman mais abalado e trágico do que já estamos habituados, e percebemos claramente que seus aliados são parte crucial de sua persona. A imagem do Batman solitário nos é colocada à prova, pois vemos o quanto ele depende de seus aliados – não, “amigos” seria a melhor palavra! – para se manter como defensor de Gotham.

    Para um leitor iniciante, talvez Silêncio não seja tão ruim. A saga apresenta bem os personagens, e o “fator fan service” talvez até agrade bastante aos leitores. É como se fosse um álbum do tipo Batman – Greatest Hits, por apresentar encontros com seus maiores inimigos no decorrer da saga. Como um narrador inexperiente de RPG, Loeb parece rolar dados e consultar uma tabela de “encontros aleatórios” para inflar sua trama. Talvez Silêncio tenha funcionado como série mensal, mas como Graphic Novel é sofrível. Vale lembrar que a edição lançada pela Eaglemoss Collections em dois volumes apresenta vários erros de digitação que, se não atrapalham o entendimento da saga, ao menos se tornam um incômodo desnecessário. Pelo menos, temos a arte de Jim Lee, que sofre do mesmo mal de seus amiguinhos da Image Comics – não desenhar pés, ou apresentar problemas com perspectiva , mas em diversos momentos é agradável e nos proporciona diversos “pin ups”. E é sempre bom ver um de nossos heróis favoritos bem desenhados!

  • Crítica | Sexta-feira 13 – Parte 3

    Crítica | Sexta-feira 13 – Parte 3

    Jason Voorhees é, indiscutivelmente, um dos personagens mais queridos dos filmes de terror. Entretanto, o motivo para isso pode ser um tanto difícil de entender. Se for comparado a outros ícones do horror moderno, como o diabólico Freddy Krueger ou o assustadoramente divertido Chucky, Jason é, na verdade, meio bobo. Não é sutil, não é inteligente, não é sarcástico, nem mesmo diabólico. Então, por que será que ele é tão assustador? Talvez as pistas para entendermos o medo e admiração que sentimos pelo personagem está na segunda sequência de sua franquia, Sexta-feira 13 – Parte 3.

    O filme, lançado em 1982, foi marcado por ser o primeiro em 3D da Paramount Pictures em quase trinta anos. De certa forma, o 3D alavancou a bilheteria do filme na época, inclusive derrubando o lugar de E.T. – O Extra-terrestre no fim de semana de estreia. Assistindo a ele, hoje, em home video, percebemos como esse 3D era gritante e às vezes sem sentido. Muitas coisas apontadas para a câmera – que vão desde um taco de beisebol até um globo ocular, passando por um baseado e um ioiô – com o simples intuito de impressionar o espectador, não acrescentam em nada à trama ou ao modo de contar a história. Ainda assim, parece mais honesto do que a maioria dos filmes picaretas convertidos ao 3D que vemos hoje em dia.

    A história começa no dia seguinte ao último filme, o que faz com que, tecnicamente, seja um “sábado 14”. Jason sobrevive e ataca uma loja local, ganhando novas roupas. Depois, somos apresentados a um novo grupo de jovens que estão à procura de diversão e vão passar uns dias no campo. Tal qual o filme anterior, todos são perseguidos e mortos por Jason, restando apenas uma garota ao final do filme (Chris Higgins, interpretada por Dana Kimmell). O que difere dos dois filmes anteriores é a forma mais elaborada com que as mortes são retratadas. Um dos rapazes é cortado ao meio enquanto andava “plantando bananeira”, em uma das cenas mais bizarras da película. Em outra cena, um rapaz tem a cabeça esmagada até os olhos saltarem das órbitas – embora hoje seja possível notar a cabeça falsa e o cabo que puxa os olhos, na época deve ter rendido um bom susto pra quem a assistiu em 3D.

    Entre as diferenças em relação ao filme anterior está a música de abertura, agora com uma pegada eletrônica para parecer mais moderna. Além disso, há a presença de uma gangue de motoqueiros punks, o que deixa o filme ainda mais datado. Mas o grande diferencial mesmo é a adoção da máscara de hóquei pelo assassino Jason – até então, ele usava um saco de pano na cabeça. Um dos rapazes é um loser estereotipado, infeliz com sua aparência e rejeitado pelos seus colegas, que extravasa seus sentimentos pregando peças nas pessoas ao seu redor. Em uma dessas “pegadinhas”, ele aparece usando a famosa máscara de hóquei, que Jason passa a utilizar depois de matá-lo. Não existe nenhuma explicação para isso, Jason apenas passa a usar a máscara e pronto!

    O duelo final acontece no celeiro, onde Jason é enforcado, mas sobrevive para ser morto, logo depois, com um golpe de machado na cabeça desferido por Chris. Realmente, essa é uma das cenas mais tensas e o clímax do filme. Ao final, tal qual a sobrevivente do primeiro filme, Chris foge de barco pelo lago e dorme até o amanhecer. Ao acordar, ela vê o assassino sem a máscara correndo em direção ao lago para atacá-la, quando do nada surge das águas… a mãe de Jason! Esta parte do filme é bastante confusa, pois logo em seguida vemos Chris com os policiais, o corpo de Jason no celeiro, ainda com a máscara e o machado na cabeça, deixando claro que foi uma alucinação. Mas então por que usar a mãe de Jason nessa cena se ela não apareceu durante o filme? E sua cabeça não estava separada do corpo no filme anterior? Seria essa cena apenas uma homenagem ao filme original? Não ficou claro o propósito, e o filme termina assim mesmo.

    Sexta-feira 13 – parte 3 é melhor que seus dois antecessores. O filme consegue criar bons momentos de tensão, nos dá personagens com quem podemos facilmente nos importar e é a gênese da máscara de hóquei mais famosa do mundo. Mas seu maior mérito talvez seja responder à pergunta do começo deste texto. Jason é assustador não por alguma qualidade marcante, mas por ser a encarnação da morte. Cada aparição do personagem, cada close-up na máscara, cada take de câmera em que ele aparece nos dá a certeza de que alguém vai morrer. Jason, neste filme, ainda não é um zumbi extremamente poderoso tal qual se tornou nos últimos filmes da franquia. Sua aparência é mais humana e não menos perturbadora. Um psicopata, uma criança fragilizada em um corpo de adulto, um assassino frio e sanguinário. Não há propósito algum em seus atos, e é isso que dá medo.

  • Crítica | Sexta-feira 13 – Parte 2

    Crítica | Sexta-feira 13 – Parte 2

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    Em 1981, o cinema ganha a continuação do slasher que havia feito certo sucesso no ano anterior. Sexta-feira 13 – Parte 2 começa como sequência direta dos eventos do filme original. Alguns meses após os eventos ocorridos no acampamento Crystal Lake, a única sobrevivente do massacre luta para ter uma vida normal e superar o trauma pelo qual passou. Essa sequência de abertura traz uma série de flashbacks recontando toda a história para quem não assistiu ao primeiro filme, e é a mais longa introdução de toda a franquia, com quinze minutos. Pela primeira vez, Jason Vorhees (interpretado por Warrington Gillette) é o assassino da saga, mas ainda não usa a icônica máscara de hóquei. Jason não parece, a princípio, um morto-vivo como nos filmes mais recentes da série. Embora sua cabeça esteja coberta com um saco de pano, vemos frequentemente suas mãos, que não estão em decomposição e nem nos dão nenhuma dica de que ele seja um ser sobrenatural. Pela aparência de sua roupa (camisa xadrez, macacão jeans, botas), Jason surge com um visual de “caipira”. De alguma forma, ele encontra e mata a sobrevivente do filme anterior, que tinha cortado a cabeça de sua mãe, Pamela Vorhees. Após essa longa introdução, o filme começa de verdade.

    O filme se passa cinco anos depois do massacre de Crystal Lake, que ficou conhecido como “Acampamento de Sangue” (ou Camp Blood, no original). Apesar do título, nada indica que a história se passe em uma sexta-feira 13. Mais uma vez, um grupo de jovens se reúne para começar seu treinamento como monitores num acampamento de verão. A fórmula é a mesma do filme anterior, mas dessa vez temos um background se desenvolvendo desde o início. As pessoas falam sobre o massacre, conhecem a trágica história do garoto Jason e sua morte no lago, bem como a vingança de sua mãe. Os personagens desenvolvem até algumas teorias sobre Jason e contam histórias assustadoras sobre ele. Em uma dessas suposições, uma das personagens chega a sugerir que o garoto não morreu no lago e que cresceu sozinho na floresta se alimentando de ódio por tudo e por todos. Essa fala é bastante elucidativa de como, a princípio, o assassino não seria um monstro sobrenatural, mas sim um psicopata deformado.

    A história se desenvolve numa colônia de férias vizinha a Crystal Lake, onde Paul Holt (John Furey) treina os novos monitores. A princípio, não sabemos quem será o protagonista do filme, o que é uma sacada inteligente que se espalhou pela série e tem sua origem no filme Psicose, de Alfred Hitchcock, quando a personagem principal é assassinada logo no começo da película. Gina Field (Amy Steel) aparenta ser uma garota fútil, mas, surpreendentemente, é ela quem termina o filme ainda respirando. Os primeiros personagens a quem somos apresentados são os primeiros a morrer quando o banho de sangue começa. Isso é, de certa forma, uma boa característica do filme, pois ao fazer com nos frustremos com essas mortes, o diretor já deixa claro o ritmo do filme. Ninguém está a salvo.

    Com cenas de morte mais elaboradas, a trama se desenvolve em torno dos assassinatos, conforme vamos descobrindo mais sobre Jason. Em uma cena, descobrimos que ele mora em um barraco improvisado com restos de madeira e materiais de construção, onde mantém um altar adornado com velas acesas ao redor da cabeça de sua mãe. Jason ganha um pouco de profundidade aqui, pois o motivo de sua matança se torna mais claro. O homem com a mentalidade de uma criança traumatizada, que se recusa a aceitar a morte da mãe e faz aquilo que acha que a agradaria. Seus assassinatos são uma espécie de sacrifício em honra à sua sagrada mãe, única pessoa que se importava com ele. Tanto que até mesmo a trilha sonora reproduz essa devoção: o refrão “ki-ki-ki-ki, ma-ma-ma-ma”, assustadoramente sussurrado durante os momentos mais tensos, origina-se na frase “kill her, mommy” (mate-a, mamãe).

    Sua confusão mental é percebida por Gina, que, ao ser encurralada, ao fim do filme, no barraco onde está a cabeça da Sra. Vorhees, percebe a devoção de Jason à sua mãe. Percebendo que ele guarda ainda o suéter de lã da falecida, veste-se com ele, prende o cabelo e se passa por ela, deixando o assassino ainda mais confuso. Jason acata  as ordens de quem ele pensa ser sua mãe, demonstra-se dócil e subserviente, até avistar a verdadeira cabeça sobre a mesa. A fúria assassina volta e Jason ataca, levando aos momentos finais do filme.

    A morte é o motivo do medo nesse subgênero de filmes de terror. Não é a crença em seres do além, não é um terror psicológico e intimista, não é o diabo ou outro ser religioso/mitológico. É a morte, pura, simples e sem sentido, que pode chegar de qualquer lugar e acontecer com qualquer um. Mas a morte nesse filme tem suas vítimas favoritas: jovens que fazem sexo, que bebem, que usam drogas. A morte vem associada a um senso de moral conservadora, que julga e executa aqueles que fazem algo considerado “errado”. E temos em Jason o arauto da morte, uma espécie de Ceifador Sinistro do século XX, punindo aqueles que considera pecadores.

    Sexta-feira 13 – Parte 2 é, para todos os efeitos, o verdadeiro primeiro capítulo da franquia e aproveita-se do sucesso inesperado do primeiro filme para criar um dos mais assustadores e memoráveis filmes de terror de todos os tempos.