Autor: Dan Cruz

  • Review | Batman: Os Bravos e Destemidos

    Review | Batman: Os Bravos e Destemidos

    batman-brave-and-the-boldOk, vamos falar sobre o Batman. Sobre o Batman que você gostava quando criança, não esse que você passou a idolatrar quando cresceu! Nada contra O Cavaleiro das Trevas, o tom sombrio de suas histórias ou os filmes do Nolan. Mas lembra quando seus amigos, irmãos e primos brincavam de Superamigos? Quando você amarrava uma toalha no pescoço e discutia sobre quem ia ser o Robin, o Coringa ou o Aquaman? Quando a sala da sua mãe se tornava uma Bat-Caverna e o quintal de casa ou o playground do condomínio se transformava em um cenário de aventuras – às vezes o chão era lava e você tinha que pular nos sofás e almofadas para não se queimar, ou subir no escorregador e salvar seu parceiro no combate ao crime? Lembra de como isso tudo era legal?

    É sobre essa época que Batman – Os Bravos e Destemidos trata!

    Se em 1992 tivemos Batman: A Série Animada, que não só revitalizou as animações do personagem como mostrou um Homem-Morcego mais sombrio e próximo das hqs, dezesseis anos depois o produtor James Tucker nos brinda com uma volta à Era de Prata dos quadrinhos com um desenho mais leve, divertido e aventuresco!

    O título da série faz referência à longeva hq The Brave and The Bold, que mostrava aventuras de heróis da DC em parcerias inusitadas. Cada edição apresentava uma dupla de super-heróis que, normalmente, não se encontravam em seus títulos regulares. Batman, durante muito tempo, foi o personagem âncora desse gibi, e suas parcerias eram bastante diversas. Na série animada, ele é o personagem título, mas nem sempre o principal. Os coadjuvantes podem ser bastante conhecidos do grande público ou total estranhos. Um exemplo disso é o Lanterna Verde, que na série é o Guy Gardner e não John Stewart ou Hal Jordan. Além disso, embora reverencie a Era de Prata, alguns personagens são mostrados em suas versões mais modernas, como o Besouro Azul, por exemplo. Já o Flash é apresentado como Jay Garrick, mas Barry Allen e Wally West/Kid Flash também dão as caras.

    Os episódios costumam contar com uma introdução que difere muito da história principal. Geralmente, vemos Batman e algum herói de segunda em meio a uma situação inusitada, com algum vilão prestes a derrota-los, até que eles viram o jogo e derrotam o malfeitor. Tudo num estilo bastante rocambolesco que poderia muito bem fazer parte de uma brincadeira com os antigos bonequinhos Super Powers na garagem do seu pai. Após essa curta introdução, entram os créditos iniciais. E que música tema! Uma batida mais acelerada, longe do tom sombrio da música de Danny Elfman, mas também diferente do tema da série live-action de 1966. A música inspira e dá o clima da série, que é de diversão e aventura. E aí vemos o título do episódio, que sempre é uma frase com um ponto de exclamação ao final! E finalmente conhecemos o convidado do dia!

    Tanto os maiores super-heróis da DC como os menos conhecidos são contemplados na série. Aquaman, Tornado Vermelho, Pantera, Arqueiro Verde, Homem-Borracha, Os Titãs, Os Renegados… Todos estão lá, e ganham traços que emulam o período em que Dick Sprang desenhava o Batman. As cores vibrantes, os traços simples e fortes ao mesmo e os roteiros absurdos faz dessa a melhor série do Batman para crianças, sem ser imbecilizante. Mesmo nos momentos mais absurdos, um adulto pode perceber uma sacada genial dos roteiristas.

    O Batman parece ser o único personagem que realmente se leva a sério. Sim, apesar do tom cartunesco, o Homem-Morcego mantém suas características, e foi definido pelos produtores da série como “um Adam West com colhões”! O uniforme cinza e azul é perfeito para a proposta da série, e todos seus gadgets aparecem e são bem utilizados. Aqui, Batman não é um ser atormentado pela morte dos seus pais, uma figura misteriosa e psicologicamente abalada. Ele é um herói! E como herói, faz o que deve ser feito, inspira e ajuda. É também dele a narração em off, característica de filmes noir, que mostra o quanto ele se preocupa com cada parceiro em cada episódio.

    A série é sim, bastante exagerada. Mas faz piada desses exageros, principalmente nos episódios do Bat-Mite (Bat-Mirim nos quadrinhos brasileiros), duende da quinta dimensão que, ao contrário de Mxyzptlk, idolatra o Batman! Nesses episódios nada é sagrado, e até os fãs de quadrinhos na Comic Con viram motivo de piada – bem sacada, por sinal! Os episódios de Bat-Mite podem ser comparados com os especiais de Halloween dos Simpsons: são histórias malucas que não fazem parte da cronologia e brincam até com os produtores da série. Em um deles, há uma homenagem ao clássico encontro de Batman com a turma do Scooby-Doo – inclusive repetindo os erros de colorização frequentes naquela época, deixando o Batman sem calças por alguns frames! Em outro episódio, há a adaptação de Batboy e Bobin, paródia publicada na revista Mad na década de 1960, e até uma versão anime dos personagens!

    Batman – Os Bravos e Destemidos é um retorno à época em que ser super-herói era algo mais simples e divertido.

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  • Crítica | Sexta-feira 13 (1980)

    Crítica | Sexta-feira 13 (1980)

    Sexta feira 13 - poster

    Quando o maníaco Ghost Face fez a pergunta “Quem é o assassino no filme Sexta-feira 13?”, em 1996, na primeira parte do filme Pânico, muitos na plateia provavelmente teriam cometido o mesmo erro que a personagem de Drew Barrymore fez ao responder. Jason Voorhees é um dos mais icônicos vilões de filme de terror, e sua máscara de hóquei é facilmente reconhecível como uma das mais assustadoras do cinema. Um assassino sanguinário, frio e calculista, que surge do nada e desaparece da mesma forma, levando consigo uma trilha de sangue e vísceras. Nada parece detê-lo: nem balas, nem facadas, e – diacho! – nem mesmo explosivos podem acabar com esse monstro silencioso. Só que ele nem mesmo aparece em Sexta-feira 13, primeiro filme da série de horror lançado em 1980!

    O filme começa no verão de 1958, em um acampamento chamado Crystal Lake, onde jovens cantam e tocam violão, enquanto um casal de monitores dá uma “escapadinha” para o andar de cima. Enquanto o casal está envolvido em seus “amassos”, uma câmera em primeira pessoa sobe as escadas, criando um clima de suspense que culmina na morte dos dois jovens apaixonados. Essa sequência inicial dá o tom do que seria o resto do filme, nunca mostrando o rosto do assassino, nem suas motivações para os assassinatos em série.

    Após os créditos iniciais, temos um salto no tempo para uma sexta-feira, 13 de junho do “presente” – provavelmente 1980, já que foi esse o ano de produção do filme, embora pudesse muito bem ser 1975 (dois anos em que 13 de junho caiu numa sexta-feira). Em uma pacata cidade do interior, uma jovem procura pelo acampamento Crystal Lake, onde será monitora no período de férias. As pessoas na cidade não se sentem confortáveis em falar sobre o local, mas ela acaba conseguindo uma carona até uma estrada próxima. Enquanto isso, os novos monitores começam a chegar ao acampamento para a semana de treinamento que antecede o início da temporada de verão. Os jovens então se divertem em seu primeiro dia, avisados de que o treinamento de verdade começaria no dia seguinte.

    Enquanto isso, a garota que procurava pelo acampamento no começo do filme consegue uma nova carona, mas dessa vez não vemos o rosto do motorista. Ela percebe que há algo errado quando a caminhonete em que está ultrapassa o limite de velocidade, e salta do veículo em movimento. A garota é então perseguida pela floresta, horrorizada, numa sequência novamente em primeira pessoa, na qual não vemos mais uma vez o rosto do assassino.

    A matança começa no cair da noite, dando início ao padrão da série: anoitece, chove, cai a energia, casais fazem sexo e morrem. Não há muito que falar sobre as mortes em si, exceto, talvez, que um dos garotos assassinados era Kevin Bacon antes da fama. É estranho nesse primeiro filme não sabermos absolutamente nada sobre a identidade do assassino, o que causa certa falta de empatia no espectador. Não há como se importar com nenhum personagem. E, após um a um morrer, sobrando apenas a última vítima, é que descobrimos que o assassino é, na verdade, Pamela Voorhees, uma senhora de meia-idade interpretada por Betsy Palmer. O problema é que não fazemos ideia de quem diabos é a Sra. Voorhees! Ela não aparece durante o filme, e sua história trágica só nos é contada nos minutos finais. Se tivéssemos algumas dicas durante o desenrolar da trama de que um garoto havia morrido por negligência dos monitores anos antes, e que depois disso coisas estranhas vinham acontecendo, talvez nos preocuparíamos mais com o destino dessas pessoas. Mas não sabemos nada disso até que a Sra. Vorhees revele sua motivação à última vítima, que consegue fugir e decapita a assassina com um facão. A jovem então dorme num barco, no meio do lago, e quando a polícia chega ao amanhecer, um garoto emerge abruptamente das águas e a puxa para baixo. Ao fim do filme, fica a dúvida se isso realmente aconteceu, pois os policiais que a resgataram dizem não terem visto garoto algum.

    Sexta-feira 13 foi bastante influenciado pelo filme Halloween: A Noite do Terror, de John Carpenter, lançado em 1978. A fórmula narrativa é basicamente a mesma. Além disso, é basicamente um Psicose ao contrário (sendo aqui a mãe viva e o filho morto!), mas, apesar de não ser o primeiro do subgênero slasher films (filmes de suspense ou horror baseados em assassinos em série), é um dos mais queridos. Isso justamente por causa de suas sequências, que foram ficando cada vez melhores até piorar de vez! Talvez o maior mérito do filme seja justamente ter semeado o caminho para os próximos capítulos da série e o impacto no imaginário da cultura pop.

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  • Resenha | Batman: A Máscara da Morte

    Resenha | Batman: A Máscara da Morte

    Batman - A Mascara da Morte

    Existem muitas histórias sobre o Batman e muitas formas de contá-las. Uma delas é a que nos é apresentada no mangá Batman: A Máscara da Morte, publicada no Brasil pela Panini Comics/Planet Manga. Mas por que utilizar-se dessa forma narrativa quando os quadrinhos convencionais do Homem-Morcego funcionam tão bem?

    Em primeiro lugar, devemos entender algumas diferenças básicas entre o estilo comics e o estilo mangá de se contar uma história. Nos quadrinhos norte-americanos, geralmente temos um personagem que ganha seus poderes por acaso, seja por acidente de laboratório, mutação genética ou exposição à radiação. Super-heróis são obras do destino e geralmente começam a história como uma pessoa comum que teve sua vida drasticamente modificada com a aquisição de habilidades especiais de uma hora para outra. Nos mangás, a coisa é bem diferente. As histórias são mais focadas na “jornada do herói” e têm começo, meio e fim bastante claros. Os personagens evoluem durante a saga, e seus poderes não são dons do destino, mas conquistados com muito esforço. Isso reflete bem o tipo de cultura e modo de vida oriental, que não se apegam a um “destino manifesto”, mas no esforço e superação de desafios. Com os heróis ocidentais isso raramente acontece, e eles já começam sua saga com grandes poderes e grandes responsabilidades, que não se desenvolvem e mantêm um status quo por décadas a fio.

    Exceto o Batman!

    Batman tem algumas características que podem muito bem se adaptar ao estilo mangá de se contar histórias. Ele não é alienígena, não tem superpoderes, não ganhou suas habilidades por acaso. Ao ver seus pais serem assassinados quando tinha oito anos, Bruce Wayne passou a dedicar sua vida ao treinamento de todos os tipos de artes marciais, além de desenvolver um intelecto superior ao de uma pessoa normal. Bruce uniu força física e mental o suficiente para ser um excelente lutador e, ao mesmo tempo, o maior detetive do mundo. E esse tempo de treinamento, entre o assassinato de seus pais e sua transformação em Batman, é uma lacuna que deixa margem para inúmeras boas histórias, como a do filme Batman Begins e da série televisiva Gotham.

    Em A Máscara da Morte, vemos uma parte do passado de Bruce Wayne em que ele treina no Japão, antes de se tornar o defensor de Gotham City. Ficamos sabendo um pouco mais sobre seu treinamento, seu sensei e sua formação. Como em todo mangá que se preze, temos alguns elementos místicos na história e que podem parecer estranhos aos leitores ocidentais. Mas esses elementos apenas fazem a história ficar mais interessante e se amarram perfeitamente ao fim do volume. Um assassino novo ronda Gotham, arrancando os rostos de suas vítimas, enquanto Bruce Wayne sofre alucinações com uma estranha e sombria criatura. Um inescrupuloso homem de negócios é apresentado, e sua assistente faz Bruce se recordar do tempo em que passou no Japão. A história faz conexões entre o passado do Cavaleiro das Trevas, os novos personagens apresentados e a criatura sombria, que tem uma silhueta muito parecida com a do próprio Batman. Para derrotá-la, Batman precisa enfrentar seus medos, revisitar o passado e seguir adiante.

    A tal Máscara da Morte do título é um artefato místico que se confunde, em vários aspectos, com a própria máscara do Batman, pressupondo que serviu de inspiração para o manto do morcego. Quem a usa passa a sofrer uma maldição que enlouquece seu portador. Isso traz momentos perturbadores para o herói, dando a entender que ele e a criatura são a mesma pessoa.

    O estilo mangá se encaixa perfeitamente com a atmosfera da história. Algumas cenas são verdadeiras tomadas cinematográficas, e o visual dinâmico faz o roteiro se desenvolver em um ritmo fantástico. Interessante notar que, em alguns momentos, o uso de onomatopeias sugere, inclusive, uma espécie de “trilha sonora”, coisa bastante rara em gibis ocidentais.

    O autor Yoshinore Natsume conta, em uma entrevista ao final do volume, que teve bastante liberdade criativa. Tanto que escreveu em sua língua nativa e no formato que estava acostumado – o modo de leitura oriental é da direita pra esquerda, o que pode causar certo desconforto no início para quem não está acostumado com mangás. Mas é uma excelente leitura, uma forma nova de se interpretar a mitologia do Morcego e, de forma simples e direta, de contar uma boa história.

  • Review | Gotham (Episódio Piloto)

    Review | Gotham (Episódio Piloto)

    gotham-pilotoTreze anos depois do sucesso de Smallville, agora é a vez de outra cidade fictícia ser adaptada dos quadrinhos para a televisão. Mas dessa vez a aposta não é em um drama adolescente, e sim em uma abordagem mais séria: uma série policial com personagens conhecidos da DC Comics.

    Produzida pela Fox e exibida no Brasil pela Warner, Gotham tem seu primeiro episódio exibido hoje (29/09) em terras tupiniquins. A diferença de apenas uma semana entre a exibição norte-americana e a nacional é um ponto positivo, pois quem não quer assistir a série por “outros meios” não precisa esperar tanto tempo entre um episódio e outro. Os leitores das HQs do Batman irão perceber a semelhança do episódio com a série em quadrinhos Gotham City Contra o Crime, aclamada pelo público e pela crítica.

    A análise a seguir contém revelações sobre o enredo. Portanto, se você for “spoilerfóbico”, fique avisado!

    A Gotham City dessa série difere um pouco da que nos foi apresentada na trilogia cinematográfica de Christopher Nolan em aspectos estéticos, como iluminação e arquitetura, entretanto, a cidade não deixa de ser um lugar violento e corrupto para se viver. Com ares de grande metrópole, o cenário se encaixa perfeitamente com o propósito da série. Fãs das revistas do Homem-Morcego perceberão bastante easter eggs durante o episódio, como um certo Ed Nygma, que não consegue fazer uma afirmação sem transformá-la em uma pergunta. Ou um comediante de stand up muito parecido com o que nos foi apresentado na graphic novel A Piada Mortal, de Alan Moore.

    A cena inicial nos mostra uma adolescente interpretada por Camren Bicondova vagando pelos telhados da cidade enquanto comete pequenos furtos. A agilidade e furtividade da garota faz com que ela se locomova por entre escadas, telhados e paredes de forma graciosa, até chegar a um beco onde, usando o leite que acabou de roubar, alimenta um gato. Nesse mesmo beco, a garota – que nesse ponto, quem é leitor de quadrinhos já deve ter percebido se tratar de Selina Kyle, a Mulher-Gato – presencia uma cena terrível: um casal é assaltado e morto na frente de seu jovem filho.

    Enquanto isso, somos apresentados ao Departamento de Polícia de Gotham City (DPGC), onde o detetive novato James Gordon (Ben Mckenzie, o Ryan da série The O.C.) resolve um conflito que poderia custar algumas vidas sem a sua intervenção. Seu parceiro, o veterano Harvey Bullock (Donal Logue) não aprecia sua interferência. Os dois são, então, chamados para um caso de homicídio, e chegam até o beco onde o casal foi morto e a criança está em estado de choque. Gordon conversa com o garoto e tenta confortá-lo, enquanto Bullock descobre que os pais assassinados do menino são Thomas e Marta Wayne, uma das famílias mais ricas da cidade.

    Essa parte da trama reproduz muito fielmente o que os fãs estão acostumados a ver nos quadrinhos, inclusive explicando o que a família de ricaços estava fazendo num beco escuro após o cinema, tornando o fato mais verossímil do que em Batman Begins. A tragicidade do acontecimento e a frieza do crime impressiona até mesmo quem já conhece a história, e dá indícios do que podemos esperar durante a temporada.

    O episódio se desenvolve em torno da investigação do caso. Jim Gordon promete ao jovem Bruce Wayne que encontrará o assassino de seus pais, e o caso vai se desenrolando enquanto nos apresenta algumas figuras conhecidas. A princípio isso pode parecer um recurso usado apenas para agradar fãs, mas cada personagem apresentado tem muito potencial para ser desenvolvido. Somos apresentados ao jovem Oswald Cobblepot (brilhantemente interpretado por Robin Lord Taylor), cujo jeito de andar e o nariz pontudo lhe garantiu o apelido de Pinguim, à garota Ivy Pepper, que vive em um lar destruído por um pai extremamente violento e demonstra carinho com as plantas, à Carmine Falcone, chefão da máfia e à Fish Mooney, chefe do crime interpretada por Jada Pinkett Smith e criada especialmente para a série.

    Do lado dos “mocinhos”, temos alguns grandes conhecidos dos fãs de quadrinhos. Os policiais Crispus Allen e Renee Montoya, da Unidade de Crimes Especiais (U.C.E.) são importantes para a trama, pois são rivais de Harvey. Barbara Kean, noiva de Gordon também tem um papel importante e, aparentemente, teve um caso amoroso com Montoya no passado – nos quadrinhos, Renee Montoya foi uma das primeiras mulheres a se declarar gay nas histórias do Batman. Alfred Pennyworth, o mordomo dos Wayne, aparece aqui um pouco menos amoroso e mais rígido com seu patrão e protegido.

    O episódio termina com Jim Gordon entendendo que, para sobreviver em Gotham City, terá que reverter o jogo de corrupção no qual a cidade se encontra. Mesmo Bullock é apresentado como alguém que prefere se deixar levar pelo crime do que lutar em uma guerra perdida. Desde já fica aparente que Jim Gordon é o protagonista e não Bruce Wayne, sendo essa mais uma diferença entre essa série e Smallville. Sua caracterização está excelente, e difere do apresentado em Batman Begins não apenas por ser mais jovem, mas também mais decidido. Mesmo sabendo que Bullock não o quer como parceiro, ou que o DPGC está envolvido com a máfia, Jim se mantém firme em lutar contra a corrupção de sua cidade.

    Julgar uma série pelo episódio piloto pode ser um tiro no escuro. Mas se todo potencial apresentado nesse capítulo for explorado, Gotham tem chance de ser a melhor série já produzida sobre personagens da DC Comics.

  • Resenha | Peninha 50 Anos

    Resenha | Peninha 50 Anos

    Peninha - 50 anos

    O mais versátil personagem Disney dos quadrinhos ganha uma edição comemorativa no seu aniversário de 50 anos de criação. Peninha, o primo estabanado do Pato Donald, surgiu nas páginas da revista italiana Topolino, em 1964 – dois anos antes de estrear em terras ianques. Criado por Dick Kinney e Al Hubbard, suas histórias se tornaram populares na Europa e na América Latina, sendo pouco conhecidas nos Estados Unidos. No Brasil, ganhou popularidade nas décadas de 1970 e 1980, quando muito do que conhecemos sobre o pato cuca-fresca foi criado nos estúdios da Editora Abril. Seu sobrinho endiabrado Biquinho, seu alter-ego Morcego Vermelho e suas inúmeras encarnações nas páginas do jornal A Patada (Pena Kid, Pena Submarino, Pena das Selvas, entre outros), são todas criações tupiniquins, e algumas continuam até hoje aparecendo em histórias italianas.

    Essa edição toma emprestada a estrutura de Urtigão 50 Anos, separando as histórias em três fases: Americana, Italiana e Brasileira. A Fase Americana conta com as histórias mais antigas do volume, sendo a maioria desenhada por Tony Strobl. Vemos aqui a conturbada gênese de Peninha, pois suas primeiras duas histórias se contradizem em termos de continuidade. Pura bobagem, claro, uma vez que continuidade não é lá um grande pré-requisito nos quadrinhos Disney. Peninha é apresentado como um beatnik, um reflexo da época em que foi criado, contrastando com seu primo Donald. Desleixado, não se preocupa com o dia de amanhã e vai vivendo no improviso, fazendo Donald passar por situações bastante inusitadas.

    A Fase Italiana mostra as histórias mais recentes do personagem, visto que essas ainda são produzidas por lá. É interessante notar que, nas histórias mais antigas, procuravam manter os traços característicos de Hubbard, enquanto nas mais recentes os artistas italianos tomaram muito mais liberdade, tanto no design do personagem quanto na narrativa. Peninha, sempre tagarela, protagoniza uma série em que sequer abre o bico para proferir uma palavra! São também dessa fase as gags de uma página só, com situações do cotidiano. Como na maioria das histórias italianas da família pato, o ritmo é acelerado e o visual exagerado, proporcionando umas boas risadas ao leitor.

    Mas a melhor parte é, com certeza, a Fase Brasileira. De primeiras histórias modestas, os criadores nacionais demonstram desenvolver uma intimidade sem igual com o personagem, proporcionando o melhor material dessa coletânea. Se os primeiros artistas emulavam o traço de Tony Strobl para o pato, aos poucos foi se criando uma identidade nacional bastante perceptível e com um alto nível de qualidade nos desenhos! Carlos Edgard Herrero e Irineu Soares Rodrigues traduzem em expressões corporais e faciais todas as características do Peninha.

    Nessa fase, surgem as criações de Peninha para a sessão de quadrinhos do jornal A Patada: Pena Kid, uma paródia dos cowboys de westerns com seu Cavalo de Pau; Pena das Selvas, uma versão bastante escrachada do Tarzan; Pena Gordon, paródia da ficção-científica pulp de Buck Rogers e Flash Gordon; Pena Submarino, versão patopolense do Príncipe Namor; Indiana Pena… Enfim, Peninha se encaixa em qualquer versão de qualquer personagem que fizesse sucesso no passado. Se nas primeiras histórias desse tipo o começo e final mostravam a prancheta de desenho do Peninha, com o tempo isso foi sendo deixado de lado para dar mais fluidez à história em si.

    A fase Brasileira toma metade das páginas dessa edição, mas não é de se estranhar. O volume de material nacional é bastante vasto, uma vez que Peninha chegou a ter uma série própria de revistas em quadrinhos, que contou com 56 edições quinzenais entre 1982 e 1984.

    Além dos heróis “inventados” por Peninha, vemos também duas histórias com seu alter-ego, o Morcego Vermelho, a primeira aparição de Biquinho e uma história de 1984 que comemorava os 20 anos do pato amalucado.

    Mais uma vez, fica nítido que os roteiristas e desenhistas da época não se importavam com continuidade. As duas primeiras histórias da fase Americana contam, de forma diferente, a primeira aparição do Peninha, sendo que Donald afirma em uma delas não ver seu primo desde que eram crianças. Já na última história, os dois cresceram juntos. Soma-se a isto a história de origem do Biquinho, que, segundo Peninha, é filho de sua irmã – o que contradiz a Árvore Genealógica da Família Pato, criada por Keno Don Rosa, que não faz nenhuma menção a essa suposta irmã. Mas esses detalhes não tiram a graça e o carisma do personagem, que se mantém firme nas publicações inéditas italianas e, no Brasil, sustenta-se em reedições de sua fase áurea.

    Peninha 50 Anos ainda apresenta três textos informativos no início de cada fase, escritos por Marcelo Alencar, que nos mostra algumas curiosidades dos bastidores da produção, além de depoimentos de dois artistas que trabalharam com o personagem, e uma ilustração inédita de Herrero feita especialmente para esse volume. Para fãs de HQs Disney, suas 300 páginas são um deleite de histórias divertidas e descompromissadas. Tal qual o personagem-título!

  • O Morcego Quebrado: Batman e a Queda

    O Morcego Quebrado: Batman e a Queda

    Os anos “nojenta”

    A Queda do Morcego foi, indiscutivelmente, a saga do Batman que marcou os anos 90. Não que ela fosse um primor de arte e roteiro, mas foi tanto a porta de entrada de muitos leitores quanto a de saída para outros mais velhos.

    A última década do século XX viu o surgimento de quadrinhos cada vez mais violentos. A figura do “anti-herói” passa a ser extremamente valorizada, e parece não haver lugar para escoteiros nos gibis. A arte começa a ser cada vez mais exagerada, com personagens musculosos ao extremo e anatomicamente desproporcionais, e os heróis bonzinhos dão lugar cada vez mais a machões parrudos, sujos e com músculos até a orelha. A linha entre o bem e o mal se torna cada vez mais tênue, a ponto de sumir por algumas vezes. A editora Image é fundada e dá uma banana para os roteiros (quem precisa disso?) em troca de uma arte avassaladora que chame a atenção de adolescentes.

    Com isso, a DC Comics viu-se quase que obrigada a dar uma “chacoalhada” no seu universo fictício. Só na primeira metade dos anos 90, tivemos a morte do Super-Homem, a loucura do Lanterna Verde, a Mulher-Maravilha perdendo seu posto, o Flash correndo a uma velocidade terminal… E o Batman. Ah, o Batman…

    O Cavaleiro das Trevas

    O Batman já tinha passado por uma grande reformulação há pouco tempo, nas mãos de Frank Miller. O Cavaleiro das Trevas e Ano Um foram duas minisséries que deixaram pra trás o clima leve de décadas de história do personagem para deixá-lo mais sombrio. O Homem-Morcego já não se parecia nem um pouco com os super-heróis da Era de Prata, e passou a adotar uma postura mais, digamos, obsessiva. Reflexos dessa fase se encontram até hoje nos meios pelos quais ele passa, tendo seu ápice na trilogia cinematográfica de Christopher Nolan. Mas ainda era pouco. Batman ainda era um personagem da DC, e precisava (na cabeça dos editores) de algo mais próximo do que estava acontecendo na Image. E foi aí que tiveram a ideia da reformulação total do nosso herói.

    Os quadrinhos da Abril

    Nessa época, tanto a Marvel quanto a DC, e mais tarde a Image, eram publicadas em formatinho (o mesmo formato dos gibis da Turma da Mônica) no Brasil pela Editora Abril. Essa primeira fase da Queda saiu na revista Liga da Justiça e Batman, que, após oito edições, ganhou a revista-irmã Batman, e suas histórias eram interconectadas e intercaladas. À época surgiram várias críticas quanto a esse formato. A primeira, e talvez mais pertinente, foi sobre a publicação abranger personagens tão distintos. Não parecia ser uma boa ideia colocar as histórias sombrias de um Batman exaurido pelo fardo de combater o crime na mesma revista em que uma Liga da Justiça galhofeira era publicada. Embora Dan Jurgens quisesse dar um tom mais sério à Liga do que seus antecessores (que tinham transformado o título em uma espécie de sitcom com super-heróis), a Liga ainda tinha Besouro Azul e Gladiador Dourado em suas fileiras. Podemos somar a isso o fato da cronologia estar totalmente defasada. Nos primeiros números, vemos o Batman usando uma braçadeira de luto pela morte do Super-Homem, mas nas histórias da Liga isso ainda não tinha acontecido, e a tal braçadeira só foi entregue dez edições depois!

    Fora isso, para aproveitar ao máximo as 84 páginas disponíveis, eram feitos cortes terríveis nas histórias. Para fazer duas histórias se tornarem uma só, cortavam a última página da primeira história e a primeira da segunda, para parecer uma história contínua. O resultado era desastroso, pois isso podia ser notado principalmente na mudança de artista e de estilo. Além disso, trechos chaves da trama iam, por vezes, para o ralo. Um exemplo, como forma de curiosidade, é o modo como Bane invade a Mansão Wayne, que foi cortada e só apresentada anos mais tarde.

    Não só as páginas eram cortadas como os diálogos também. Ainda sem recursos tecnológicos como os de hoje, as letras eram escritas à mão nos balões. O formato reduzido em comparação ao original obrigava os textos a serem mais curtos, e os tradutores reduziam bastante as falas. Comparar uma página original com sua versão nacional é até covardia.

    Isso sem contar que as capas das edições nacionais muitas vezes não refletiam a história da revista. E quando acertavam na capa, tínhamos outro problema: Kelley Jones. O artista que desenhava as capas seguia à risca o estilo Image, inventando músculos onde não existem e descaracterizando os personagens. Sua arte dividia opiniões. Uns gostavam e outros odiavam, principalmente porque seu estilo gótico contrastava com a arte mais leve de Jim Aparo no miolo da revista. Jones continuou desenhando as capas até o fim da saga e, mais tarde, passou a desenhar as histórias do Batman. E o formato reduzido da revista acabava deformando a arte.

    A queda

    A Queda do Morcego começou com uma premissa básica: Bruce Wayne, após anos lutando contra o crime em Gotham, estava num estado de cansaço físico e mental avançado. Isso levaria um novo vilão a se aproveitar de sua situação precária de saúde para tirá-lo de circulação. Assim, fomos apresentados a Bane, um vilão nascido e criado na prisão, que treinou seu corpo e sua mente para se tornar o senhor do crime de Gotham City. Bane, com seu alto intelecto, percebeu o que se passava com Batman e se aproveitou disso. Liderou uma fuga em massa do Asilo Arkham, para que o já combalido Cavaleiro das Trevas enfrentasse todos os seus piores inimigos, um a um, até não se aguentar em pé. E foi o que aconteceu. Batman, após uma série de confrontos envolvendo o Charada, Espantalho, Vaga-Lume, Hera Venenosa, Sr. Zsasz, Chapeleiro Louco e o Coringa, finalmente encontra-se com Bane. O mentor do plano havia descoberto a identidade de Batman e já o esperava na Mansão Wayne, para o pegar quando não tivesse mais força. E foi o que fez: após dar uma surra homérica no Morcego, Bane quebra sua coluna em uma das cenas mais icônicas dos quadrinhos no período. Batman foi, finalmente, derrotado.

    Quem manda na noite

    Em seguida, Bane leva o desacordado Batman para o alto de um edifício em Gotham e o joga de lá de cima, fazendo com que seu corpo moribundo caia na calçada. Batman só não morre porque tem a queda amortecida pelos toldos do prédio (e porque é o personagem principal). Convenientemente, Alfred Pennyworth já o estava esperando com uma ambulância de resgate e o leva pra caverna. O mordomo, que também é treinado em medicina (e corte e costura!) já havia preparado uma UTI em seu covil, e faz o que pode para salvar a vida de seu patrão/amigo/filho adotivo. Enquanto isso, Bane se estabelece como o novo chefão do crime de Gotham.

    Essa fase da saga traz algumas bizarrices de roteiro que, vendo em retrospecto, não fazem sentido algum. Em primeiro lugar, está a desculpa esfarrapada que a bat-família arranja para o sumiço de Bruce Wayne: ele se acidentou com o Porshe. Por que diabos não foi levado para um hospital, então? Enquanto está incapacitado, Bruce escolhe alguém pra substituí-lo. Jean-Paul Valley, o Azrael, assume então o manto do morcego. Outra escorregada de roteiro, pois não havia nenhum motivo plausível para não ser Dick Grayson o novo Batman. Afinal, não foi pra isso que ele foi treinado desde criança? Quem é Azrael, afinal de contas?

    Jean-Paul Valley foi introduzido ao público na minissérie A Espada de Azrael, e além de ser um personagem menor, estava há pouco tempo na bat-família. Foi uma decisão bastante estúpida entregar o manto a ele, afinal de contas. Somando o fato de que ele era uma espécie de fanático religioso, com supostas visões de um suposto santo implantadas em sua mente, não tinha como dar certo. E o novo Batman começou uma jornada rumo à loucura, tratando os criminosos de forma ultraviolenta, fazendo upgrades no bat-traje que começou com uma manopla com garras e culminou em uma armadura de batalha. Perseguindo implacavelmente os bandidos, Paul chega até Bane e lhe dá uma surra que o deixa catatônico. É o início de uma nova era para um novo Homem-Morcego.

    A cruzada

    As visões de São Dumas implantadas em sua mente pelo “Sistema” faz com que Paul fique completamente obcecado e inicie uma espécie de cruzada contra o crime. Nessa fase da saga, o novo Batman não só expulsa Robin da Bat-Caverna como sela todas as suas entradas e saídas conhecidas pelo Menino-Prodígio. Sua armadura começa a ganhar mais acessórios, como um capacete no lugar da máscara, um lançador automático de batarangues – que agora eram menores e mais letais – e garras mais afiadas. Nessas histórias, o Batman se tornaria uma paródia do que o público de outras editoras esperavam de um herói, um ser psicótico e com sede de vingança ao invés de justiça. A loucura foi crescendo de forma assustadora, a ponto de Paul deixar um vilão morrer, sem remorso algum. Esse novo Batman era, para todos os efeitos, um assassino a sangue frio.

    A Busca

    Enquanto isso, Bruce Wayne estava totalmente sem saber o que ocorria. Numa cadeira de rodas, o antigo Batman procurava alguma maneira de voltar a andar, e encontrou em sua terapeuta Shondra Kinsolving um tratamento alternativo e uma nova paixão. Em uma trama rocambolesca de novela mexicana, Shondra é sequestrada pelo seu irmão malvado (!), que descobre que ela tem poderes curativos (!!), e Bruce faz um juramento, com os punhos cerrados para o céu (!!!), de que não descansaria até encontrá-la. Shondra, que estava sendo drogada pelo seu irmão para ser manipulada, é enfim encontrada pela força-tarefa de Bruce e, no meio de um duelo telecinético com o vilão, dispara uma onda de energia que cura a coluna quebrada de Wayne, fazendo-o voltar a andar (!!!! Ah, eu desisto de colocar exclamações aqui!). Infelizmente, o trauma foi muito grande, e a mente da Doutora Shondra Kinsolving se torna a de uma criança de oito anos. Bruce, com o coração partido, financia o seu tratamento em uma instituição mental na Inglaterra, e não a vemos novamente.

    O Retorno do Morcego

    Ao voltar pra Gotham City, Bruce Wayne finalmente é atualizado sobre a situação do seu sucessor, e decide que é hora de tomar seu lugar. Como esteve muito tempo paralítico, precisa antes passar por um treinamento intensivo com Lady Shiva, que o obrigou a matar um homem como teste final. Bruce engana sua mestra fingindo matar e conclui seu treinamento. Vestindo novamente o manto do morcego original, o Batman verdadeiro enfrenta o novo Batman, numa luta que se estende por algumas edições. Bruce é mais experiente e melhor preparado, mas, a essa altura, Jean-Paul usava uma armadura extrema que incluía, entre outras coisas, um lança chamas! Após uma épica batalha na caverna (que Bruce consegue invadir pelo mesmo buraco que caiu quando era criança), o Batman original derrota o seu substituto não pela força, mas pela inteligência. Atraindo-o por túneis cada vez mais estreitos, Azrael se vê forçado a largar a armadura aos poucos para poder se locomover, até que sai para a luz, que momentaneamente o cega e o traz à razão. Paul percebe que não é o Batman, e entrega o posto a seu verdadeiro dono.

    Esse é o fim?

    A história final, embora intitulada Clímax, é paradoxalmente decepcionante. Claro que a ideia foi demonstrar a superioridade moral de Bruce Wayne sobre Jean-Paul Valley, mas mesmo assim não funcionou. A arte de Barry Kitson não ajudou muito, deixando a impressão de que o desenhista é um “escravo de close-ups”, pois usa quadros e mais quadros apenas com o rosto dos personagens. Uma saga como essa, que levou dois anos para ser concluída, merecia um final melhor. As histórias que vieram depois foram bastante insossas, com Dick Grayson assumindo o lugar de Bruce por um tempo para que esse pudesse se recuperar melhor – o que, diga-se de passagem, deveria ter acontecido desde o começo.

    Entre o começo e o fim da saga, tivemos momentos bons, ótimos e meias-bocas. Uma das melhores coisas que aconteceram a partir dessa saga foi a revista solo do Robin, que acabou tendo 183 edições e só foi cancelada em 2009. Além disso, excelentes artistas como Graham Nolam, Jim Aparo e Tom Grummet – além de outros menos ortodoxos, como Norm Breyfogle – estiveram sempre presentes durante esses dois anos. Os roteiros nem sempre eram bons, mas davam pra entreter e na maioria das vezes cumpriam seu papel.

    A Queda do Morcego é bastante datada, e se lida novamente nos dias de hoje pode se tornar até um pouco (se não bastante) intragável. Mas foi algo que se destacou durante um período de escassez de ideias e criatividade editorial. Certamente, quem a leu em sua própria época (principalmente quem começou no mundo dos quadrinhos com ela) guarda memórias afetivas que podem trair os mais incautos.

    O que fica para a posteridade é uma espécie de “lição de moral”, mais ou menos como a ideia principal da graphic novel O Reino do Amanhã: o mundo precisa de heróis de verdade, não de lunáticos fascistas ultraviolentos que fazem justiça com as próprias mãos. Só não dá pra dizer ao certo se os fãs de Jean-Paul Valley entenderam essa metáfora ou procuraram o próximo herói sanguinário depois dessa saga.

  • Resenha | He-Man e os Mestres do Universo

    Resenha | He-Man e os Mestres do Universo

    He Man e os Mestres do Universo - Panini

    “No mundo de Etérnia, bem distante daqui / Na luta pela paz um guardião vai surgir…” Quem foi criança nos anos 80 cantava essa música do grupo infantil Trem da Alegria quase que como hino nacional ou religioso. Afinal, todos os dias, no saudoso Xou da Xuxa, víamos o Príncipe Adam levantar sua espada e invocar os “poderes de Grayskull“, para se transformar no poderoso campeão da justiça conhecido como He-Man e chutar a bunda de uns caras malvados!

    A série da Filmation tinha uma premissa muito simples: um grupo de heróis que defendia o Castelo de Grayskull das investidas de um grupo de vilões liderado pelo temível Esqueleto, um feiticeiro cruel com cara de caveira que queria derrotar He-Man e sua turminha por motivos de… Bem, na verdade a gente nunca se importava muito com os motivos. O que sempre importava era que Adam vencia no final e nos passava valorosas lições sobre a vida.

    O desenho  era, na verdade, uma grande propaganda da linha de brinquedos surgida antes e tinha até mesmo uma premissa diferente. Aos poucos, a linha de brinquedos foi se inteirando com a animação e outras mídias foram se adaptando a ela. Além de alguns esquecíveis jogos de videogame e do sofrível filme live-action de 1987, com Dolph Lundgren no papel principal, He-Man estrelou sua própria série de quadrinhos na Marvel, publicada no país em formatinho pela Editora Abril. Essa série, para atender à grande demanda, acabou recheada de produção nacional.

    A série animada ganhou uma nova versão em 2002, que embora contasse basicamente a mesma história, atualizou para o novo século não só os traços e a animação, mas também a temática. Ali conhecemos um pouco a origem do Esqueleto, do Castelo de Grayskull e de outros elementos do cenário que, quase 20 anos antes, fizeram a cabeça da garotada. Mas a série não teve o retorno financeiro esperado e foi cancelada logo na primeira temporada.

    Junto com a nova versão, surgiu também uma história em quadrinhos baseada nela. A nova casa dos campeões de Etérnia, após passar pela Marvel e pela DC, agora seria a Image Comics. A HQ se manteve fiel ao design de personagens do novo desenho animado, mas não teve longa duração e parou por aí mesmo. Agora, uma década depois, He-Man e os Mestres do Universo voltam para a DC Comics. E a nova (velha) casa não faz feio!

    Nessa nova série em quadrinhos, temos uma história que se passa alguns anos depois da que estamos acostumados. Não fica muito claro se é uma continuação da série clássica ou de sua contraparte do começo deste século, mas isso não importa muito. O que importa é que todos os personagens oitentistas, que os mais saudosos conheciam e cresceram amando, estão lá, em versões que, embora bastante modernas, conseguem ser fiéis à essência de cada um deles.

    A história começa bastante confusa e deixa o leitor meio que sem entender o que está se passando, mas isso tudo é proposital. Adam não tem nenhuma lembrança de seu tempo como príncipe de Etérnia e vive como um simples lenhador, numa cabana no meio da floresta. A princípio, o leitor pode até achar que se trata de uma “história de origem”, o que contraria totalmente tudo o que sabemos sobre o personagem, mas aos poucos o roteiro vai dando pistas do que realmente está acontecendo. Adam teve, na verdade, a mente apagada, e junto com o leitor vai desvendando o que aconteceu em seu passado recente.

    Essa apreensão envolve o leitor de tal maneira que é praticamente impossível parar de ler. Isso porque, embora o personagem principal nada saiba sobre seu passado, os vilões que vão aparecendo gradualmente sabem! Eles parecem saber quem é Adam, e aos poucos vemos as novas versões de Aquático, Mandíbula, Homem-FeraMaligna, além de seus aliados Teela e Mentor. Adam e Teela partem juntos em uma jornada que os leva a descobrir a verdade e relembrar seu passado progressivamente. E aí fica a parte perturbadora: de alguma forma, Esqueleto dominou Etérnia e manipulou a mente dos heróis. Após vários perigos, Adam finalmente encontra sua espada e diz as palavras mágicas “Pelos poderes de Grayskull: EU TENHO A FORÇA!” e se transforma em He-Man para finalmente lutar contra o Esqueleto – aqui cabe ressaltar: é simplesmente impossível ler as palavras entre aspas da frase anterior sem ouvir, em sua mente, a voz inesquecível de Garcia Júnior, dublador do He-Man da série dos anos 80! Aliás, não só a voz do personagem como a do Esqueleto também nos vem à mente a cada balão de diálogo do vilão.

    Se há algo que poderia frustar o leitor é a transformação tardia de Adam em He-Man. Em uma história de sete partes, a espada só é levantada no final da penúltima, o que nos deixa com vontade de ver um pouco mais. Principalmente quando a espada aparece cheia de sangue, o que significa que algumas gargantas foram cortadas e que essa série não é tão ingênua quanto o desenho. Embora pouco nos tenha sido revelado, dá pra imaginar algumas coisas e esperar pelo desenvolvimento da história, principalmente devido a algumas dicas que os personagens nos revelam ao longo da trama (o destino do Gorpo, por exemplo, parece ser um ponto-chave, embora tenha sido citado apenas em um ou dois quadrinhos).

    A arte reveza entre momentos espetaculares e outros apenas O.K., mas não chega a ser ruim. Talvez a pouca roupa de Teela tenha sido um exagero, até porque não acredito que fan service seja algo necessário numa série como essa. E a tradução da Panini respeitou os fãs antigos da série ao manter os nomes dos personagens do jeito que nos acostumamos a ela – na série de 2002, a dublagem manteve todos os nomes no original, o que causou estranheza, pois falar Skeletor ou Man-At-Arms não nos soava muito natural. Apenas um pontinho negativo: por mais de uma vez, a palavra “mais” foi utilizada no lugar de “mas”. Parece bobagem para quem está acostumado a ler tantas atrocidades na internet, mas tais erros em uma publicação como essa causam certo incômodo e necessitam de atenção.

    He-Man e os Mestres do Universo tem potencial para ser uma ótima série se a Panini continuar sua publicação no Brasil. Se continuar dessa forma, talvez o crossover com a Liga da Justiça não pareça algo tão absurdo assim, e podemos ter a certeza de diversão garantida por um bom tempo! E talvez, como na continuação da música do primeiro parágrafo, “unidos venceremos a semente do Mal” (La-la-la-la-la-la-la-la-la-la: HE-MAN!).

  • Resenha | John Constantine, Hellblazer – Infernal Vol. 1: Hábitos Perigosos

    Resenha | John Constantine, Hellblazer – Infernal Vol. 1: Hábitos Perigosos

    Hellblazer - Infernal - Vol. 1 - Habitos Perigosos

    Se a Warner fizer direito a lição de casa, é provável que John Constantine se torne um de seus personagens mais populares nos próximos anos. Isso porque está em produção uma série televisiva estrelando o mago, que a julgar pelos vídeos publicados até agora na internet, irá abocanhar uma grande fatia de fãs da já saturada série Supernatural. Soma-se a isso sua recém renovada popularidade nos quadrinhos mainstream da DC Comics, graças ao reboot do personagem e sua nova série mensal nos Novos 52 e – Bingo! – temos um novo personagem favorito dos fãs e dos cofres da Warner.

    John Constantine foi criado por ninguém menos que o aclamado autor de quadrinhos Alan Moore, em 1985, nas histórias do Monstro do Pântano. De lá pra cá, ganhou uma série duradoura em quadrinhos, Hellblazer, um longa metragem estrelado por Keanu Reeves em 2005 que divide opiniões entre os fãs e diversas aparições em revistas em quadrinhos, como na Liga da Justiça Dark, além da já citada série de TV. Mas suas melhores histórias estão, com certeza, no selo Vertigo – linha de quadrinhos da DC Comics com temática adulta.

    A Panini trouxe ao público brasileiro o arco de histórias escritas por Garth Ennis no encadernado John Constantine, Hellblazer: Infernal Vol. 1 – Hábitos perigosos. Aqui, vemos histórias de 1991 que serviram de inspiração para o filme, e que molda muito do que sabemos sobre o personagem. Logo na primeira parte da história, John recebe a notícia que está morrendo, graças a um câncer terminal no pulmão (resultado de um maço e meio de cigarro por dia desde os dezessete anos). Constantine sabe que sua morte resultará no castigo do inferno pela eternidade, e passa a pensar em um jeito de contornar a situação.

    A forma como Ennis desenvolve o roteiro nos faz acompanhar com empatia o sofrimento de John Constantine, que não pode simplesmente curar-se com magia. Constantine aproveita para despedir-se de seus entes queridos, de forma a causar nó na garganta do leitor mais durão. Da mesma forma, seu jeito trambiqueiro tira boas risadas, e o roteiro sabe equilibrar momentos tensos, divertidos e tristes, de forma a despertar as mais diversas emoções. A forma como John lida com demônios é fantástica, e demonstra uma esperteza sem tamanho.

    O arco de histórias que dá título ao volume se encerra, na verdade, na quinta história dentre as oito publicadas no volume, mais um epílogo na parte seis. Isso não significa que as outras duas histórias que encerram a edição sejam ruins. Infelizmente, a arte não segue o primor do roteiro, sendo que na última história ela chega a ser bastante inconsistente, de modo que não conseguimos sequer distinguir um mesmo personagem de um quadrinho pro outro na mesma página. Se nos anos 90 os quadrinhos foram marcados por artes arrebatadoras e roteiros fracos, aqui vemos exatamente o contrário. O esquema de colorização também é bastante datado, tendo páginas e páginas utilizando apenas uma ou duas cores. Talvez sirva para o propósito da narrativa, mas não deixa de ser estranho se comparado com a versão dos Novos 52 e com o atual modelo de colorização por computador. A arte de capa de cada edição é reproduzida entre os capítulos da história, e é algo que vale a pena gastar um tempo observando.

    O modo como a magia é retratada nessas histórias é bastante sutil. Nada de bolas de fogo lançadas pelas mãos ou feitiços de voo para facilitar o deslocamento dos personagens. Aqui, a magia é algo misterioso e deve ser evitada sempre que possível. Coisas mais corriqueiras, como alterar a percepção que o porteiro tem dos trajes de Constantine ou estourar o pneu do caminhão de um desconhecido babaca funcionam de forma coincidente, quase como se fosse algo natural. Já invocar demônios ou transformar água benta em cerveja requer rituais elaborados, que demandam tempo, velas acesas, pentagramas desenhados com giz e outros elementos do ocultismo. Não é a magia em si que faz Constantine ser um excelente personagem, mas a forma que ele a usa.

    Não é a primeira vez que Infernal é publicado no Brasil. Mas para quem está conhecendo o personagem agora, é uma excelente oportunidade de ter em mãos uma das melhores fases do mago, com um material de qualidade e preço bastante acessível. Embora a publicação comece pelo número 41 da série Hellblazer, não é necessário ler as outras edições para entender e apreciar a obra. Isso sem contar que é muito provável que mais volumes da saga sejam publicados. Assim, o leitor pode garantir alguns momentos de leitura bastante agradáveis num futuro próximo, com o que há de melhor nos quadrinhos adultos da DC, além da possibilidade de se preparar para assistir a série da Warner. Para o bem ou pra o Mal.

  • Resenha | Coleção Histórica Marvel: O Homem-Aranha (1 a 4)

    Resenha | Coleção Histórica Marvel: O Homem-Aranha (1 a 4)

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    Que o Homem-Aranha é o herói de maior apelo ao público da Marvel, é indiscutível! Ele é como o Batman: podem tentar zoar o personagem, cantar musiquinha (“nunca bate, só apanha”) ou questionar sua sexualidade; nada disso abala sua popularidade! Mas para entender a origem desse status de ídolo pop, adorado tanto por crianças quanto por adultos, conhecer suas origens é essencial. E é isso que nos é apresentado na Coleção Histórica Marvel: O Homem-Aranha.

    Em primeiro lugar, é importante ressaltar a diferença entre esse material e outro bastante conhecido, a Biblioteca Histórica Marvel. Enquanto a Biblioteca publica as primeiras edições da revista norte-americana do personagem em ordem rigorosamente cronológica, a Coleção não se apega muito a isso. Existe, sim, uma ordem cronológica, mas apenas em cada volume. Isso significa que você pode ler uma história de The Amazing Spider-Man #122, de julho de 1973 ao final do primeiro volume e começar o segundo com The Amazing Spider-Man #03, de dez anos antes. Isso se explica porque os volumes são temáticos.

    O primeiro volume apresenta as histórias clássicas do Aranha com o Duende Verde, e cobrem um período que vai desde o surgimento do vilão até a sua morte, após o assassinato de Gwen Stacy (isso foi um spoiler? A história tem mais de 40 anos, portanto eu acho que não!). O segundo volume é sobre o Doutor Octopus, o terceiro sobre o Lagarto e o quarto nos apresenta o Sexteto Sinistro. Os quatro volumes, em capa cartonada, formam uma pequena imagem do Aranha na lombada, quando colocados lado a lado, e se acomodam perfeitamente na caixa que acompanha a primeira edição.

    Os volumes são independentes entre si, o que significa que qualquer pessoa que nunca tenha lido um gibi do aracnídeo pode entender com facilidade qualquer um deles, em qualquer ordem. É difícil de se imaginar isso hoje, numa época em que é praticamente preciso fazer um curso de graduação, mestrado e doutorado para acompanhar as múltiplas sagas, crises infinitas e reformulações pelas quais passam os gibis de heróis em geral. Stan Lee acreditava que “todo gibi é o primeiro gibi de alguém”, portanto não partia do pressuposto de que o leitor já tinha um alto grau de conhecimento sobre a história de seus personagens, e deixava tudo explicadinho. Mas o verdadeiro segredo do sucesso dessas histórias era a forma como os autores dialogavam com seu público. Se hoje em dia muitos fãs de hqs se zangam quando ouvem que “quadrinhos é coisa de criança”, esse era o público alvo das histórias dessa época! Diferente do Batman, que era adulto, e do Robin, que era um sidekick, Peter Parker era um garoto E o protagonista. Não era um simples ajudante de um herói mais velho, o que fez com que seu público alvo se identificasse com ele.

    Parker tinha problemas que garotos comuns também tinham, mas ganha poderes e responsabilidades maiores do que poderia suportar. Então, sua vida pessoal passa a ser mais importante do que sua vida heroica: prender o bandido é essencial, mas chegar em casa antes que a Tia May fique preocupada é mais importante do que tudo! Lendo essas histórias até dá pra entender porque o Ben 10 faz tanto sucesso hoje com a criançada! Peter é um garoto, assim como seus leitores, mas toma as rédeas da sua vida e não fica na sombra de um herói mais velho.

    Todo o clima pesado das histórias, com temas como a doença da Tia May ou a responsabilidade que Peter assume após a morte de seu tio, é suavizado com o bom humor da narrativa. Em alguns momentos de puro drama, o narrador faz uma pausa para a história não virar “novela das seis”! Cortesia do tio Stan Lee, que parece se divertir muito ao escrever seus roteiros. O clima descontraído pode ser sentido nas apresentações dos artistas, sempre com algum apelido como “Sorridente Stan Lee” ou “Jovial Johnny Romita”.

    Se existe um ponto fraco digno de nota nessa coleção é o volume 4. Não que seja ruim, pelo contrário, foi uma excelente forma de apresentar o Sexto Sinistro, sendo que as primeiras histórias contam a origem dos vilões que ainda não haviam sido apresentados na coleção, e a última história apresenta um especial de 76 páginas, nas quais o Sexteto se une pela primeira vez. Até aí, tudo bem, se não fosse o fato da coleção não ter parado por aí, e uma segunda caixa nos ser apresentada alguns meses depois com o volume 5 dedicado ao vilão Abutre (cuja história de origem é a primeira do volume 4). Resta saber se a qualidade dessa nova leva se manterá como a da primeira, mas a impressão que fica é que foi feita às pressas para aproveitar o sucesso de sua antecessora.

    Enfim, a Coleção Histórica Marvel: Homem-Aranha é um excelente item para se ter na estante, tanto para quem é fã de longa data do Cabeça de Teia quanto para quem está começando agora a conhecer o Escalador de Paredes. Mas, principalmente, é a melhor pedida para aqueles mais jovens que estão na vibe do novo filme e querem conhecer um pouco mais o material original, sem precisar se preocupar com os anos de cronologia e más fases pelas quais o herói passou nos últimos quarenta anos.

  • Crítica | Rio 2

    Crítica | Rio 2

    Rio-2

    Um deslumbre visual em 3D! Isso é o que se pode resumir da nova empreitada do diretor Carlos Saldanha e sua produtora Blue Sky, a continuação das aventuras de Blu, a ararinha azul criada em Minnesota. Com muita música e visual fantástico, Rio 2 prende a atenção do espectador por ser divertido e nada mais. O roteiro, assinado por Saldanha e Don Rhymer, não é uma obra-prima e peca pelo excesso de clichês, mas isso não é um impedimento para a plateia mais jovem da sala  decididamente, o público-alvo que vai comprar os bonequinhos e outras peças de merchandising.

    O filme começa no ano-novo do Rio de Janeiro com uma linda sequência musical, mostrando pessoas vestidas de branco na praia, fazendo oferendas a Iemanjá, tendo o Cristo Redentor ao fundo, além de muitos fogos de artifício. A música, parte em inglês, parte em português, é bastante chamativa, e as coreografias dos pássaros são belíssimas. Essa cena de abertura dá o tom do resto do filme. Para quem não gosta do gênero musical, isso incomoda bastante. Cada momento de drama, ação ou desenvolvimento de roteiro são intercalados por sequências musicais.

    Blu vive em um santuário para pássaros criado por Túlio e Linda no final do primeiro filme e localizado na Floresta da Tijuca. Leva uma vida confortável com sua esposa Jade e seus filhos Tiago, Bia e Carla, adaptando o american way of life ao “jeitinho brasileiro”. Blu não quer nada além da boa vida nos trópicos e das comodidades que a tecnologia moderna pode oferecer. Mas tudo muda quando Jade descobre através do noticiário que existem evidências de que uma família de ararinhas azuis vive na Amazônia. Como acreditavam ser os últimos representantes de sua espécie, essa informação vem como um golpe na vida das aves. Jade fica extremamente animada para conhecer outros membros de sua espécie, esperando talvez encontrar algum familiar perdido. Blu, por sua vez, não quer deixar a comodidade de seu lar para se arriscar numa viagem tão longa e perigosa.

    E então esse conflito se resolve de forma tão rápida que acabamos esquecendo dele. Blu concorda em viajar, mas tem que convencer seus filhos e… Opa, já conseguiu também! A viagem até a Amazônia se resolve com mais um número musical e, de repente, opa de novo! Nossos heróis encontram a família de Jade! Tudo muito rápido, muitas coincidências e, claro, com muita música! Falando em coincidência, adivinha quem avista o grupo de pássaros assim que eles chegam a Manaus? Nigel, vilão do filme anterior, que quer se vingar de Blu por não poder mais voar.

    A partir desse ponto, temos mais e mais clichês saltando da tela: madeireiros explorando a floresta ilegalmente, ecologistas que querem salvar a floresta, a capanga que se apaixona pelo vilão, e Blu entrando numa fria maior ainda com a família (trocadilho intencional). O pai da garota que é um ótimo avô mas não vai com a cara do genro. O amigo de infância bem-sucedido que desperta ciúme no marido. A gangue rival. O concurso de talentos. O conflito resolvido com um tipo de esporte. Rivais percebendo que têm algo em comum. A batalha campal para derrotar os vilões. Piadinhas infames. Está tudo lá, numa salada de clichês envolvida em muito samba e maracatu. Tem até um desfecho shakespeariano para o casal de vilões!

    Ao fim, parece que nos são apresentados personagens demais, tramas demais e resoluções fáceis demais para os conflitos. Mas o deslumbre visual  e por que não dizer, também, musical?  consegue prender nossa atenção sem tornar o filme enfadonho. Pode ser uma propaganda do Brasil para o ano da Copa, uma máquina caça-níquel de produtos relacionados ou uma opção para pais que querem algo leve para seus filhos pequenos assistirem. Mas Rio 2 parece conseguir se firmar como uma franquia de sucesso, e não nos surpreenderia se mais uma sequência for lançada nos próximos anos.

  • Resenha | Urtigão: 50 Anos

    Resenha | Urtigão: 50 Anos

    Urtigão - 50 Anos - capa

    Um dos personagens dos quadrinhos Disney mais queridos no Brasil, Urtigão Urtiga ganha uma edição especial de 300 páginas para comemorar seus 50 anos de criação. Criado como coadjuvante em uma história de Donald e Peninha de 1964, o velho Urtiga logo foi ganhando mais espaço até conquistar um gibi próprio por aqui, em meados de 1987. Essa edição traz uma amostra de três fases do montanhês esquentado, em histórias representativas de cada período.

    A primeira parte, chamada de Fase Americana, retrata a criação do personagem. Urtigão é um velho “hillbilly” que vive isolado na sua cabana nas montanhas, tendo por companhia apenas seu cão chamado Cão e sua espingarda pra afastar visitas indesejáveis. De temperamento explosivo e pavio curto, Urtigão (ou Hard Haid Moe, seu nome original) não pensava duas vezes antes de atirar em Donald e Peninha cada vez que a dupla cismava de atrapalhar seus afazeres – que consistiam, basicamente, em tirar uma soneca. A seleção de histórias para essa fase vai desde sua criação até 1970. Nessas sete histórias, Urtigão é ora um coadjuvante, ora o antagonista, e a maioria envolve os patos como repórteres do jornal “A Patada”.

    A segunda parte apresenta vinte histórias da Fase Brasileira, que vai de 1972 até meados de 1994. Nesse período, a editora Abril tinha perdido os gibis de Mauricio de Sousa para a editora Globo, e Urtigão ocupou o espaço deixado pelo gibi do Chico Bento com uma publicação quinzenal. Com histórias produzidas por brasileiros e para brasileiros (embora elas tenham sido publicadas no exterior também, principalmente na Itália), essa fase mostra o personagem como um matuto, um típico caipira do interior de São Paulo, Minas Gerais ou Goiás. Sua moradia, antes retratada como simplesmente nas “montanhas”, passa a ser no Brejo das Urtigas. Coadjuvantes são criados, e de um ermitão convicto, Urtigão passou a ser mais sociável, tendo inclusive uma companheira morando em sua cabana – a Firmina. Nessas histórias, o lado explosivo do personagem vai ficando de lado, dando espaço a uma espécie de Pedro Malasartes disneyano, um caboclo que apesar de ingênuo sempre se dá bem e passa a perna no povo da cidade. Aos poucos, o leitor até esquece sua origem estadunidense e o confunde com uma criação quase exclusivamente brasileira – ainda mais devido à sua interação com o papagaio Zé Carioca nas séries Urtigão in Rio e Zé no Brejo. A seleção de histórias deixou um pouco a desejar. Apesar de numerosas (nada menos que vinte histórias!) e, de certa forma até significativas, algumas são pouco inspiradas e outras são simplesmente sem graça.

    Por fim, temos a chamada Fase Italiana. Urtigão Urtiga se torna “Dinamite Bla” e volta à sua origem: um ermitão esquentado! Saem de cena Firmina, o Brejo das Urtigas e os coadjuvantes como Juca Piau, e volta o Morro do Cabeção (uma tradução livre para Cucuzzolo del Misantropo, em italiano), além da famigerada espingarda de cano duplo. Para representar essa fase foram selecionadas três histórias, sendo a primeira de 1977 e as outras de 2006 (retomada da produção de histórias do personagem após 12 anos) e 2011. Curiosamente, o personagem passa a usar sandálias ao invés de andar descalço, e as histórias são mais divertidas do que as da fase brasileira. Infelizmente, muito pouco dessa fase nos foi apresentado, deixando uma sensação de que poderiam ter diminuído um pouco a fase anterior (afinal, foram duas histórias inéditas e vinte e oito republicações!).

    Cada uma das três fases apresenta um texto de Marcelo Alencar que nos conta um pouco sobre a criação e desenvolvimento do personagem, além de curiosidades de bastidores.

    Enfim, é uma edição que não decepciona quem é fã de quadrinhos Disney, além de uma boa porta de entrada para quem ainda não conhece o personagem. E deixa no ar aquela vontade de procurar por mais histórias italianas do Urtigão, que vem sendo publicadas nas revistas Disney regulares no país.