Autor: Vortex Cultural

  • Crítica | Parasita

    Crítica | Parasita

    Surpreende a ninguém que Parasita seja um dos mais interessantes filmes dos últimos anos (e que tenha levado a Palma de Ouro de lambuja), visto que seu diretor, Bong Joon-ho, é responsável por realizar vários dos filmes mais interessantes há quase duas décadas, desde seu primeiro projeto no comando, Memórias de um Assassino. Mesmo tendo se aventurado (bem) por Hollywood, inclusive em parceria com a Netflix, as obras mais impactantes de Bong são sul-coreanas, e que ele se destaque em um dos países cuja filmografia recente, a partir dos anos 2000, é uma das mais ricas do planeta, serve como amparo suficiente para seu mais novo filme. Parasita é uma mescla de tons de humor e drama com timing impecável e trama absolutamente hipnotizante.

    Apresentando uma família composta por Kim Ki-taek (o pai), Chung-sook (a mãe), Ki-woo (o filho) e Ki-jeong (a filha), Parasita demonstra cedo a precariedade financeira do grupo; morando em um minúsculo subsolo, aproveitando o wi-fi de lojas próximas e até mesmo permitindo que os gases de fumigação da rua (a janela do subsolo fica no nível do asfalto) entrem na casa, enquanto todos se fazem presentes, pra exterminar os insetos que logicamente infestam o paupérrimo ambiente. Dobrando caixas de pizza para uma pizzaria de franquia para ganhar alguns trocados (caixas igualmente fumigadas, mas esta é outra conversa, suponho), a família sobrevive como pode – e trata de aproveitar a oportunidade quando um dos amigos do filho Ki-woo, Min-hyuk, que vai até a casa de Ko-woo presenteá-los com uma pedra que simboliza sorte e fortuna, oferece a Ki-woo a chance de tutorar os estudos de inglês de Da-hye, a filha de uma família abastada, já que ele, até então o tutor (e apaixonado pela garota), não quer outros jovens interessados nela. Trocando seu nome para “Kevin”, Ki-woo se apresenta como o novo professor particular, e consegue a vaga na sofisticada casa da família Park após uma sessão de estudos onde tenta seu melhor para impressionar não a aluna, mas sim Yeon-gyo, a mãe de Da-hye, que acompanha de maneira obstinada os filhos (incluindo o pequeno e pretensamente “excêntrico” Da-song, cuja veia “artística” aparentemente é motivo de orgulho para Yeon-gyo) e adora o fato de a filha falar inglês. Ki-woo, por sua vez, identifica e agarra outra chance: ao perceber quanto dinheiro os Park parecem ter à disposição para gastar com outros funcionários, resolve dar um jeito de colocar toda a família, sob outros nomes e sem revelar suas conexões, para trabalhar na mansão dos Park. A mãe como governanta, o pai como motorista do pai da família, Park Dong-ik, e a irmã como tutora de estudos artísticos de Da-song – mesmo que para isto tenha que livrar-se de maneiras não muito honestas, ainda que criativas, das pessoas que desempenham estas funções para os Park há algum tempo.

    A dinâmica de Parasita na construção das diversas relações exibidas do começo ao fim de sua narrativa é simples, o que não torna o filme menos complexo; as ideias de Bong Joon-ho e Han Jin-won, co-roteiristas de Parasita, abordam suas personagens como poréns na engrenagem social vista na tela. As motivações da família de Ki-woo podem estar escoradas na vontade de sobreviver e ter alguma dignidade, mas não é a pobreza, e nem mesmo o oportunismo, que os define. Da mesma forma, o contraste com os Park não se dá meramente por circunstâncias dinheirísticas; ao passo em que os Park podem se dar ao luxo de enfatizar e priorizar questões mais efêmeras e (superficialmente) desimportantes em comparação a seus empregados/funcionários, seria equivocado considerar que os Park se consideram superiores a Ki-woo, Ki-taek, Ki-jeong e Chung-sook, já que a absorção em suas próprias questões, de variados níveis de frugalidade, talvez os impeça até mesmo de enxergá-los comp indivíduos. Ego é um componente firme nas aspirações de todas as personagens, e o que varia é apenas o que os compele. Para a família de Ki-woo, dinheiro é um fim; para os Park, um meio. Para outras personagens (não convém revelar; Parasita é um filme repleto de nuances e invertidas sensacionais), o dinheiro é um estorvo. Para todos, é um tecido intersticial que gruda partes desiguais a partir de uma forçada (e real) perspectiva de colaboração e conveniência, e que só começa a desgrudar conforme cada pessoa percebe a inconstância da própria situação e a impossibilidade diante dos interesses alheios – desde que exista algum incentivo à inconformidade, o que torna os Park catalisadores de intermináveis problemas e faz com que sejam encarados, ingenuamente, como intermináveis soluções. Parasita não os demoniza, mas faz algo que quiçá pareça tão cruel quanto, que é desnudá-los frente a pessoas que não parecem feitas da mesma matéria. E o filme não faz questão de construir esta ponte, o que provavelmente consistiria em moralizá-los e dizer que são.

    Bong Joon-ho sempre equilibra seus filmes em linhas tênues, feitas de observação e crítica social, mas pautadas em personagens que compõem bem mais do que a soma de suas partes nos roteiros que habitam; é fácil imaginar como seus filmes poderiam se tornar panfletários e até mesmo pueris, de fácil absorção e de ainda mais fácil contestação, e é gratificante perceber que, a exemplo dos outros componentes da sua carreira, Parasita evita resoluções fáceis e faz divertidos malabarismos (visuais e de roteirismo) pra impedir que seus elementos sejam usados pra tecer comentários casuais demais em relação ao que se vê. Sim, a situação da família protagonista é calamitosa, e sim, os Park são bem de vida e alienados (a obsessão de Yeon-gyo com americanismos e com a ideia de garantias de qualidade do que vem dos EUA, seja um currículo ou uma barraca, não é desprovida de sentido no mundo real), mas é a maneira como determinadas personagens enxergam outras (seja algo peremptório, como as interações do sr. Park com Ki-taek, ou graduais, como Ki-taek com o sr. Park – ou até mesmo de forma mais aberta, como a relação entre Da-hye e Ki-woo) que pauta o nível de toxicidade e falta de compreensão que sugere que eventualmente tudo irá desandar. E se o roteiro de Bong e Han ganha toma forma a partir da direção precisa e sutil de Bong e do ritmo leve da montagem de Jinmo Yang (um herói de Parasita; o timing de várias situações, em especial revelações, ajuda a dosar o peso de certos acontecimentos, e acrescenta humor ou horror à medida em que a narrativa necessita – um trabalho de edição bem similar em tema e tom ao que Thelma Schoonmaker leva aos filmes de Martin Scorsese, por exemplo), é justo dar créditos também ao elenco, que personifica traços da sociedade evitando caricaturas até onde é possível (certas figuras são simplesmente caricaturais por natureza, e elas logicamente existem). Vale destacar o excelente desempenho de Song Kang-ho (como Ki-taek; colaborador habitual e brilhante de Bong), como um pai de família que aos poucos percebe o quanto seu quinhão é ruim, independente de quão justo ou merecido, Cho Yeo-jeong, como a sra. Park (uma performance corajosa ao abandonar qualquer tentativa de não parecer insuportavelmente alienada), e Choi Woo-shik como Ki-woo, encarnando um conflitado ponto de partida e ligação entre mundos tão diferentes e a figura mais encurralada pelo insólito desenrolar dos fatos. Há ainda duas outras performances maravilhosas em Parasita, mas ambas dispensam elaboração – cada espectador(a) há de reconhecê-las assim que entrarem em cena, e seria um desserviço explicar como e quando.

    O termo parasita, como adjetivo ou substantivo, confere título e identidade ao filme, mas a constatação de quem parasita quem dirá muito a respeito de quem dedicar algum tempo a pensar no que assistiu. É provável que vários(as) tentem reduzir Parasita a uma fábula de crítica social, ou mesmo condená-lo como um retrato sórdido de alpinismo societal – ambas visões estreitas e erradas. Há ideias em profusão no vencedor do prêmio máximo de Cannes deste ano, e nenhuma necessariamente nega ou corrobora a outra. Servem ao intuito de acrescentar níveis de informação e discussão. Isto tudo envelopado em uma estética apurada (e elegantemente variada, de um microverso para outro) para as diferenças entre as suficientes infestações de parasitismo monetário, comunitário e emocional que justificam seu nome. Contrariando o título, no entanto, Parasita é um filme do qual não faz bem algum se livrar.

    Texto de Henrique Rodrigues.

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  • Crítica | Eli

    Crítica | Eli

    Eli é uma nova produção da Netflix. Assim como outros demais filmes recém lançados pelo gigante canal de streaming, é um filme de suspense/terror, cuja história já bastante batida e desgastada guarda uma ótima surpresa em seu final.

    Eli (Charlie Shotwell) é um menino que sofre de uma doença bastante rara, onde o ar em que respiramos é extremamente tóxico para ele, causando queimaduras por todo seu corpo, o que faz com que ele viva literalmente dentro de uma bolha em sua casa, sem ao menos poder tocar seus pais Rose (Kelly Reilly) e Paul (Max Martini) e tão logo somos apresentados à família, sabemos que eles embarcarão para uma viagem que será a última tentativa para um tratamento que leve o menino à cura. Última tentativa, pois seus pais, desesperados, praticamente gastaram todo o dinheiro que possuíam para este tratamento com a Dra. Horn (um nome sensacional), vivida pela atriz Lily Taylor, que é pioneira no tratamento de crianças que possuem a mesma doença de Eli.

    Embora Eli precise viver dentro de uma bolha, isso não significa que ele não possa sair de casa. Contudo, é preciso usar uma roupa especial, que o deixa parecido com um astronauta. É uma vida difícil, pois ele é sempre alvo de algum tipo de brincadeira de mal gosto.

    A clínica da Dra. Horn fica numa enorme mansão no meio do nada, muito semelhante à do primeiro capítulo do jogo Resident Evil. A Dra. Horn possui outras duas enfermeiras que as auxiliam nos procedimentos. Embora o local seja arcaico, ele serve de moradia para todos durante as semanas de tratamento, além de ser altamente tecnológica na parte voltada à medicina.

    O filme começa a deixar de ser interessante quando Eli, já em tratamento, passa a vivenciar experiências sobrenaturais e a enxergar coisas que ninguém mais consegue ver, algo que já vimos milhares de vezes na tela do cinema. O tratamento é doloroso e quanto mais afundo ele fica, maiores acabam sendo as experiências, o que deixa o menino extremamente receoso com a postura da Dra. Horn, suas enfermeiras e o tratamento, principalmente quando conhece secretamente a menina Haley (Sadie Sink), uma vizinha local, que começa a contar histórias horríveis sobre a médica.

    O filme é dirigido por Ciaràn Foy, que possui certa experiência em filmes do gênero, mas sem nenhum crédito significativo, ao contrário do time de roteiristas, composto por David Chirchirillo, Ian Goldberg e Richard Naing, que possuem vasta experiência escrevendo roteiros para diversos seriados, sendo os dois últimos responsáveis pelo bom A Autópsia.

    Visualmente falando, o filme não traz nenhum atrativo, exceto pela atuação do quarteto principal. Kelly Reilly, Lily Taylor e Max Martini, embora não sejam estrelas, são veteranos e possuem bastante experiência com filmes e seriados sendo que certamente o expectador já viu algo com eles em cena, mas o destaque mesmo fica para o menino Charlie Shotwell, o protagonista do longa, principalmente por conta da sensacional  reviravolta na trama, já que absolutamente ninguém está esperando o que acontece e a maneira como o filme termina, fazendo com que os roteiristas ganhem pontos fundamentais.

    A parte final de Eli é seu grande trunfo, é o que tira o filme da galeria de desastres do cinema, sem contar que contém uma das mais sensacionais mortes da história do cinema e não acho que isso seja exagero, o que torna o filme obrigatório para os amantes do gênero.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

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  • Crítica | Fratura

    Crítica | Fratura

    Fratura é uma das recentíssimas produções da Netflix exclusivamente voltadas aos thillers de suspense e terror. Obviamente, as histórias não tem nada a ver umas com as outras, mas, contudo, buscam um denominador comum, trazer algo inovador e com uma grande reviravolta ao final.

    Ray Monroe (Sam Worthington) está voltando da casa de seus sogros, dirigindo pela estrada junto de sua esposa, Joanne (Lily Rabe) e sua simpática filha de seus anos, Peri (Lucy Capri). Logo de início, pela conversa do casal dentro do carro, percebe-se que os pais de Joanne não gostam muito de Ray, que é um alcoólatra em recuperação. As pilhas do player de música da pequena Peri acabam e Ray decide parar num posto na estrada para comprar pilhas para sua filha e um refrigerante para sua esposa, enquanto as duas vão ao banheiro. Ray, ao olhar para a geladeira da loja de conveniência, fica tentado a comprar duas doses de bebida, abrindo mão das pilhas para sua filha. Enquanto Joanne volta ao banheiro para buscar algo que esqueceu, Peri deixa o veículo para ir atrás de um balão que está preso numa construção ao lado da loja de conveniência, quando é encurralada por um cão. Ray tenta afugentar o animal com uma pedra, mas ele junto de Peri cai de uma altura considerável. Quando Joanne chega ao local, Ray, demonstrando nervosismo e preocupação para com sua filha, acaba por empurrar a esposa que cai no chão. Ele se recupera, coloca as duas dentro do carro e parte desesperadamente para o hospital mais próximo. É a partir desta premissa, que Fratura, de fato, começa.

    O hospital é bastante estranho. Seus funcionários parecem não se importar com os pacientes e quando Peri finalmente é atendida, o médico demonstra ser uma ótima pessoa. Porém, quando a menina é levada para fazer exames e é acompanhada por sua mãe, Ray, após passar o dia inteiro esperando-as, descobre por meio de uma atendente que as pessoas com aqueles nomes nunca deram entrada naquele hospital. Começa então uma busca frenética pela verdade para provar que o hospital, de fato comete crimes dentro de suas dependências.

    O filme é dirigido por Brad Anderson, um especialista no assunto, responsável por bons filmes como O Operário e Expresso Transiberiano e que vem se dedicando consideravelmente a dirigir alguns episódios de diversos seriados. Anderson demonstra que sabe fazer com que seu elenco passe ao expectador o sofrimento e a dor vivida ali por eles, merecendo elogios à competente atuação de um sumido Sam Worthington, que não está e sua melhor forma, mas ainda consegue carregar filmes como estes em suas costas. Contudo, o roteiro de Alan McElroy deixa um pouco a desejar, andando de mãos dadas com uma produção ruim, que pode ter sido prejudicada por um orçamento baixo e uma fotografia opaca (talvez intencional).

    Os momentos em que Ray está em busca de sua família são muito bons, mas, como dito no início deste texto, o filme traz uma reviravolta em seu final que dividirá quem assiste. Uns vão adorar o que acontece e outros torcerão seus narizes e ficarão com aquela sensação de “putz”. Mas o final e os “poréns” não chegam a ofuscar o filme, que cumpre o que propõe desde seu início.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

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  • Star Wars: A Ascensão Skywalker | Comentários Sobre o Trailer Final

    Star Wars: A Ascensão Skywalker | Comentários Sobre o Trailer Final

    E o trailer final de Star Wars: A Ascensão Skywalker, o nono capítulo da maior franquia da história do cinema, finalmente foi ao ar.

    O trailer vinha sendo aguardado com ansiedade pelos fãs após o bombástico teaser especial lançado durante a D-23 deste ano, que trazia uma imagem de Rey usando roupas pretas e portando um sabre de luz duplo de cores vermelhas.

    A expectativa era que esse trailer final mostrasse mais dessa Rey do Lado Negro, ou que de fato, Palpatine desse finalmente as caras.

    Mas, não foi isso o que aconteceu. De qualquer forma, o último trailer da saga que conta a história da família Skywalker foi lindo.

    Logo no início das imagens vemos Rey (Daisy Ridley), deixando no chão um capacete enquanto corre por uma floresta e um droid tenta alvejar suas costas, sem sucesso. O capacete e o droid são muito semelhantes aos usados por Luke no início de seu treinamento. Pelas imagens, podemos perceber que a jovem aprendiz já domina a Força consideravelmente. Chama a atenção uma faixa vermelha que ela usa numa das mãos. Essa faixa já havia sido mostrada no trailer anterior.

    Enquanto ouvimos a voz de Finn, dizendo que “é um instinto, uma sensação” e que a Força os reuniu, vemos Rey dentro de uns escombros, muito semelhantes ao destroyer imperial de Jakku em O Despertar da Força. Muito provável que este seja o interior da segunda Estrela da Morte. Vemos também o próprio Finn (John Boyega) num planeta desértico.

    A imagem corta para uma reunião que provavelmente acontece numa base dos rebeldes que deve ser durante uma pré-batalha, talvez a batalha mais importante do filme. Nesta cena, vemos Lando Calrissian (vivido novamente por Billy Dee Williams), Poe Dameron (Oscar Isaac) e C-3PO (Anthony Daniels) e muitos outros personagens, distribuídos entre pilotos e aparentemente civis. As imagens são rápidas e enquanto ouvimos a voz de Poe, dizendo que eles não estão sozinhos e que as pessoas lutarão se eles as liderarem, podemos ver a primeira aparição de Rose (Kelly Marie Tran), que aparece junto do personagem vivido por Dominic Monaghan, e vemos também, no planeta floresta a nave Tantive IV, além de Chewie (Joonas Suotamo), Poe e Finn, junto de uma X-Wing.

    Vemos novamente um novo trecho de Rey do lado de fora dos escombros da Estrela da Morte, com seu sabre de luz em punho aguardando ansiosamente para batalha, quando vemos pela primeira vez Kylo Ren (Adam Driver) saindo de dentro de uma onda que acabou de quebrar. As belas imagens são embaladas pela voz de Rey dizendo que as pessoas dizem que a conhecem, mas que na verdade, ninguém a conhece, para em seguida a voz de Ren proferir que ele a conhece. Essas falas mexeram com o público, não porque existe a possibilidade dos dois ficarem juntos, mas porque talvez seja do momento de uma possível redenção de Ben Solo em tentar salvar Rey, algo que será abordado em outro texto.

    Aí começam a surgir as novidades, como vários caças Tie se dirigindo a uma monstruosa base que parece que fica em um enorme iceberg. A imagem do gelo refletindo na água é maravilhosa, um grande trono de pedra com vários tentáculos, muito semelhante à tiara usada pelo Máscara da Morte, Cavaleiro de Câncer, de Os Cavaleiros do Zodíaco, e um antigo destroyer imperial saindo de dentro da água. A julgar pelo excesso de raios em tela, tanto pelas claridades na sala do trono, quanto pelas imagens do destroyer, é muito possível que seja o mesmo local onde a base iceberg se encontra. Ouvimos também pela primeira vez a maléfica voz de Palpatine (Ian McDiarmid), que diz que esperou muito tempo e que agora essa união será a destruição. Enquanto ouvimos Palpatine, vemos outras imagens como a Millennium Falcon se juntando e liderando uma gigantesca armada, onde podemos ver naves dos mais diferentes modelos, como naves da antiga Aliança Rebelde, naves separatistas, dentre muitas outras, inclusive a Fantasma, de Star Wars: Rebels, que aparece claramente ao lado da Falcon, pronta para a batalha. A nave que anteriormente havia aparecido como um easter egg de Rogue One, finalmente deu as caras e aumentou consideravelmente a possibilidade de vermos na tela grande, mesmo que por alguns segundos, seus integrantes.

    Depois um momento de partir o coração e que levou a maior dos fãs às lágrimas. C-3PO está sofrendo uma manutenção na região de sua cabeça. Ao ser perguntando por Poe o que ele está fazendo, o robô diz que está olhando para seus amigos pela última vez. Rey, e Finn também estão em cena e todos com cara de tristeza. É muito provável que, por algum motivo “Threepio” precisa alterar seu protocolo diplomático, o que justificaria seus olhos vermelhos mostrados no teaser anterior. Na cena, também vemos pela primeira vez a personagem de Keri Russel, a mascarada Zorri Bliss.

    A trilha sonora maravilhosa explode em tela e vemos mais e mais cenas épicas, como Chewie, Finn e Poe dizimando Stormtroopers, um caloroso abraço de Leia (Carrie Fisher) em Rey, enquanto ouvimos Luke Skywalker dizendo que enfrentar o medo é o destino de um Jedi. Vemos Lando comandando a Falcon ao lado de Chewie, além de trechos da enorme batalha que deve ser tão épica quanto à batalha de Coruscant, em A Vingança dos Sith. Sobre a batalha, como dito anteriormente, poderemos matar a saudade de diversas naves da trilogia clássica, já que veremos Y-Wings, B-Wings, entre outras em tela.

    A imagem corta para Rey e Kylo Ren na sala do trono do Imperador mostrada em O Retorno de Jedi, onde Luke enfrenta Darth Vader, vemos também, numa espécie de contraste os mesmos personagens destruindo um artefato, que provavelmente é o totem onde Kylo Ren mantém o capacete de Vader. Na verdade, não se sabe se eles destruíram o artefato juntos ou se foi Rey, enquanto Ren tentava proteger o totem. Curiosamente, é possível ver Rey empunhando uma adaga em sua outra mão. E vemos também um relance de Palpatine que parece se movimentar em alguma cadeira flutuante em direção à Rey, enquanto novamente ouvimos Luke dizer “a Força estará com você”, enquanto Leia completa com um “sempre”.

    O trailer cumpriu o seu papel: é lindo. O curioso é que mostra tudo, mas, em contrapartida, não mostra nada. As imagens que vemos ali, acabam por colocar uma pá de cal em algumas teorias, mas atiçam a curiosidade dos fãs sobre como será esse desfecho, algo que discutiremos em breve aqui no Vortex Cultural.

    Só sabemos que será grandioso. A impressão que o trailer deixou é que Star Wars: A Ascensão Skywalker será visualmente muito bonito e épico, no sentido de escala. Tudo parece ser enorme, com bastante informação em tela.

    O filme estreia no Brasil em 19/12/2019 e os ingressos já estão à venda.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

  • Review | Demon Slayer: Kimetsu no Yaiba

    Review | Demon Slayer: Kimetsu no Yaiba

    Tanjiro Kamado, um jovem camponês que ajuda a família vendendo carvão, cresce no período Taisho do Japão, até que uma tragédia acontece. Sua família é atacada e morta por um demônio, exceto sua irmã Nezuko, que acaba sendo transformada em uma dessas criaturas. Além de ter que lidar com a horrenda surpresa, aparece Giyu Tomioka, um espadachim exterminador de demônios, que ao cumprir seu papel, tenta dar fim em Nezuko. O espadachim vê potencial em Tanjiro, que o ataca por impulso e impede sua irmã de morrer.  Giyu acaba deixando os irmãos em paz e envia o jovem carvoeiro para treinar com seu mestre, para que Tanjiro torne-se um exterminador de demônios, conseguindo poder para proteger sua irmã e tente achar uma maneira de fazê-la voltar a ser humana. Assim Demon Slayer: Kimetsu no Yaiba começa, com a mudança de realidade do protagonista, de sua vida pacata para o treinamento (literalmente) mortal, entrando no mundo sobrenatural e fantástico da animação.

    A jornada dos irmãos Kamado segue uma narrativa básica de animes de batalha, com o herói seguindo em busca do seu objetivo. Contudo, de modo bastante honesto, pelo carisma enorme que Tanjiro demonstra e como ele reage a cada pessoa que encontra em suas missões, a cada acontecimento em sua jornada, seja a violência constante que passa a presenciar pelas suas ações no novo posto de exterminador, nas lutas, no contato com o ambiente urbano que ele como camponês se espanta ao ver um Japão pós-modernização: cidades lotadas, vestimentas diferentes, transportes etc. tudo se torna recente para ele.

    O aspecto emocional de Tanjiro e suas relações entre os personagens é um dos pontos altos da obra, envolvendo bastante o espectador com o desenvolvimento das relações em volta do protagonista, seja pelo vínculo entre os dois irmãos e o sacrifício que ele faz pela Nezuko, ganhando o apreço de quem o encontra durante o caminhar do anime, motivando os personagens para que até se arrisquem pela sua causa. Mesmo os vilões se afeiçoam pelo herói, já que os demônios são humanos transformados e ressentem sobre os sentimentos das suas vidas passadas.

    Isso se sustenta quando Tanjiro encontra seus companheiros de jornada, Zenitsu Agatsuma e Inosuke Hashibira, dois outros exterminadores de demônios. O primeiro sendo um medroso e inseguro que não entende a capacidade que tem e o seu papel, e o segundo, um selvagem hiperativo que desconhece e luta contra as relações interpessoais, principalmente por ter detalhes faciais bem delicados, usando uma cabeça de javali como máscara. Eles veem Tanjiro como uma figura cativante e juntam-se à jornada instintivamente. Juntos os três compõem uma harmonia incrível e um alívio cômico bem dosado, complementando o elemento humano e emocional da obra.

    O outro ponto alto de Kimetsu no Yaiba, e talvez o maior, é a parte técnica. Tanto  na ambientação e estética propostas pelo mangá homônimo de Koyoharu Gotoge, com a reimaginação do contexto histórico, roupas, espaços e os elementos de terror do mundo sobrenatural criado, os designs dos demônios e suas habilidades bem inusitadas, encaixam perfeitamente para as cenas de ação, sendo uma experiência bastante imersiva. A animação é bem fluida e as técnicas de espada fazem das batalhas um espetáculo, certos momentos lembrando bastante um jogo de hack and slash, pela movimentação de tela usada. Somando a trilha sonora que é usada de forma bem sucinta, o estúdio Ufotable, responsável pela produção de Kimetsu no Yaiba, resume exatamente como fazer um anime de batalha ideal, divertido e muito empolgante, demonstrando o motivo do sucesso.

    Os 26 episódios lançados introduzem bem a história e os personagens, com Tanjiro e os Pilares, que são os excêntricos exterminadores de demônios da mais alta patente, tendo que lidar com os planos do grande vilão da obra, Muzan Kibutsuji, o demônio que assassinou sua família e transformou Nezuko. Encerrando com Tanjiro, Nezuko, Inosuke e Zenitsu partindo para uma nova missão. A continuação foi anunciada nos pós-créditos do episódio final, que adaptará o arco do Trem Infinito em formato de filme.

    Texto de autoria de Wedson Correia.

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  • Crítica | Rambo III

    Crítica | Rambo III

    John Rambo é um dos principais personagens da cultura pop mundial. Vivido pelo astro Sylvester Stallone, o personagem caiu nas graças do público logo no primeiro filme, Rambo: Programado Para Matar, que conta a história de um boina verde que voltou à América após o fiasco da Guerra do Vietnã. Rambo é praticamente um andarilho e, confundido com um vagabundo, acaba por sofrer nas mãos da polícia de uma pequena cidade. O soldado, usando de suas habilidades de guerra, acaba caçando os policiais com maneiras muito primitivas, chamando a atenção de seu antigo companheiro, o Coronel Trautman, vivido por Richard Crenna. O filme é até considerado um drama (dos bons), o que difere do segundo e terceiro filme, onde o soldado volta ao campo, primeiro para libertar prisioneiros de guerra e segundo para salvar o próprio Coronel Trautman.

    À época de seu lançamento, Rambo III foi considerado pelo Guiness Book, o livro dos recordes, o filme mais violento já feito, dada a contagem de mortes, explosões e atos e violência. Contudo, a produção passou por diversos problemas, dentre eles a demissão do diretor Russel Mulcahy e de boa parte da equipe. Mulcahy estava em alta por ser o responsável pelo clássico Highlander: O Guerreiro Imortal. Apesar dos problemas na produção, o diretor de segunda unidade Peter MacDonald assumiu a bronca, fazendo com que Rambo III fosse sua primeira empreitada na cadeira de direção.

    Como mencionado, o Coronel Trautman vai até John Rambo para pedir ajuda numa missão para intervir a favor do povo do Afeganistão que está sofrendo nas mãos dos russos. Vale destacar que o episódio de fato ocorreu, quando os Estados Unidos, secretamente ajudaram o povo afegão com o fornecimento de armamento. Rambo nega o pedido de seu amigo que parte sozinho para a missão, sendo capturado por um tirano coronel soviético, não restando outra alternativa ao soldado, senão salvar seu mentor e amigo. Fica registrada aqui a “ivandragonização” dos personagens soviéticos, que assim como em Rocky IV, são extremamente caricatos.

    MacDonald claramente tenta mostrar um lado mais humano de Rambo, fazendo-o interagir com o povo que está assolado pela guerra. Os momentos de humanidade presente no personagem procuram ser mais extensos do que aquele momento em que o vemos sentindo um certo carinho uma informante e que morre pouco tempo depois no segundo filme. Só que, talvez por força do personagem, o Rambo que melhor funciona em tela é o soldado implacável.

    Assim como nos dois primeiros filmes, vemos o personagem passando por muitos apuros e ganhando novas cicatrizes e por que não, fazendo seus próprios curativos? Aliás, esse é o ponto alto do filme, quando um detrito de uma explosão atinge Rambo, que fica com o artefato atravessado em sua barriga. Numa cena que faz com que os mais durões roam as unhas, o combatente retira o artefato, despeja pólvora no buraco do ferimento e ateia fogo em si mesmo para estancar o sangramento. Sem mais.

    Mas com uma história interessante e que pega emprestado um fato que realmente aconteceu, o filme não empolga. As sequências de ação que eram para ser a especialidade do diretor não emplacam e o que se vê é um amontoado de cenas e cenários que parecem não se encaixar, principalmente no segundo e terceiro ato. O filme foi recebido pela crítica como uma bomba e para se ter noção do nível, Sylvester Stallone ganhou o Framboesa de Ouro como pior ator. O filme teria sido uma triste despedida para o personagem se Rambo IV não tivesse sido feito anos depois.

    Um fato curioso é que, em seu final, o filme é dedicado ao povo do Afeganistão, sendo que, anos depois a película passou a ser ainda mais odiada após os horríveis ataques terroristas ocorridos em 11 de setembro de 2001, liderados por Osama Bin Laden.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

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  • Crítica | Rambo IV

    Crítica | Rambo IV

    Poucas franquias contrariam tanto sua obra original, comumente a que guia capítulos subsequentes, quanto a saga de John Rambo. Não que o original Rambo: Programado Para Matar fosse exatamente contrário às ideias contidas nos três filmes realizados entre 1985 e 2008, mas a trajetória de Rambo após sua trágica incursão por seu próprio país pós-Guerra do Vietnã, culminando em sua transformação numa máquina de guerra cínica e quase mitológica, dificilmente seria imaginada por quem assistisse ao primeiro filme, cujo desfecho apresentava uma improvável sensibilidade diante das experiências de alguém treinado pra se tornar um guerreiro perfeito. Mas assim como o pragmatismo militar tão apreciado por Hollywood (mesmo quando os filmes trazem questionamentos à tona), Rambo IV faz valer a força de uma existência voltada para uma cultura bélica e empreende todo o possível pra transformar a guerra não apenas em espetáculo, mas também em uma necessidade, ou ao menos em algo inevitável.

    Trazendo um cansado e desencantado John Rambo (Sylvester Stallone, que também dirigiu e co-escreveu o filme) vivendo às margens de um rio (e da sociedade) na Tailândia, sustentando-se de bicos e quietude duas décadas após a apoteose combativa que protagonizou no Afeganistão, Rambo IV rapidamente nos introduz a um grupo humanitário cristão que visa chegar a Burma para levar medicamentos e provisões à população local, vitimada por conflitos civis longe de qualquer resolução, e que pretende contratar os serviços do ex-combatente para transportá-los até a região. Inicialmente relutante, especialmente ao ponderar sobre o caráter pacifista do grupo, Rambo aceita levá-los após a intervenção de Sarah (Julie Benz), esposa do líder do grupo missionário, Michael (Paul Schulze), que o convence através de uma insuspeita demonstração verbal de altruísmo. Uma vez a bordo do barco de Rambo e rumo ao destino pretendido, não demora para que os viajantes sejam atacados por bandidos (viajavam, afinal, por uma região inóspita e hostil), pronta e brutalmente repelidos pelo protagonista, para horror dos missionários – e assim Rambo é dispensado dos seus serviços, voltando à sua vida pacata na Tailândia apenas para, pouco tempo depois, ser procurado por outras pessoas pra liderar um time de militares privados e resgatar os missionários da (previsível) situação em que se encontram após serem capturados pelos algozes (dotados de vileza ímpar, diga-se) da população que visavam amparar.

    A lógica narrativa de Rambo não é absurda, e nem mesmo torpe, ao apresentar o mundo (visto pelos olhos do inativo boina verde) como um lugar onde dificilmente as coisas não são resolvidas através de violência e onde o altruísmo costuma custar bem caro, já que geralmente vem acompanhado de ingenuidade e boa vontade incompatíveis com a realidade. Poderíamos dizer que Rambo é o retrocesso em pessoa após os eventos do primeiro filme, no qual gradualmente o mundo fora da zona de guerra não oferecia lugar a alguém condicionado a se tornar alguém que só teria lugar num front, mas a verdade é que o Johm Rambo visto em Rambo é uma figura consequente e natural dos desenvolvimentos em seus segundo e terceiro filmes – de alguém desesperado para compreender como voltar à sociedade após uma guerra que não foi capaz de vencer, Rambo passou a alguém que foi ativamente em busca de guerras que seria capaz de vencer (sozinho, se fosse o caso) -, e conseguimos encarar o recrudescimento da personagem como algo aceitável, mesmo que nada agradável e até melancólico. O problema, que no filme não é apresentado exatamente como um problema em si, é que Rambo é tão capaz de justificar suas ações quanto é capaz de executá-las, e Rambo até tenta qualificá-lo como alguém disposto a encontrar outro caminho para trilhar (o que, em retrospecto, foi *deixado para a próxima* assim que o quinto filme da franquia foi anunciado), mas o fato é que o homem forjado pelo Coronel Trautman (bom personagem de Richard Crenna nos três primeiros filmes) é bom demais no que faz para que ideias de paz sejam mais viáveis do que a lógica inapelável da guerra.

    Stallone, como figura do meio cinematográfico, seja como ator, roteirista ou diretor, sempre permaneceu firme na proposta de usar colarinho azul, e Rambo é um ótimo exemplo desta abordagem; estetica e narrativamente, Rambo é um filme simples e objetivo, que não se ocupa de floreios e não esconde o jogo tramando viradas e buscando surpreender o espectador com algo impensado. Assim como seu protagonista, Stallone compõe em Rambo, tanto como ator como quanto realizador, uma experiência singela, que mesmo quando propõe a aceitação de vários baluartes do cinema de ação mais reacionário (a necessidade da intervenção, a eficácia da violência, a disposição para reconhecer que o mundo inevitavelmente será pautado pela ação de quem abandona a inércia em prol da guerra justificada – seja qual for a justificativa), não se exime de apresentar o horror gráfico de um conflito. Ainda assim, mesmo que as cenas de ação sejam bem enquadradas, elaboradas e executadas pra que pareçam enxutas e sanguinolentas, é impossível deixar de notar a catarse oferecida por Rambo através da violência; quando nos lembramos que a brutalidade de John Rambo em Rambo 1 era ao mesmo tempo um recurso e um desafogo, e que gradualmente o traumatizado soldado deu lugar a alguém que acatou tudo o que não conseguia compreender e aceitar, temos a sensação conflitante de que algo genuíno se perdeu, mesmo que um novo filme tente provar que esta é a única maneira sensata de Rambo fazer parte, qualquer parte, de algo maior do que a própria lenda. Vale a reflexão acerca da facilidade com a qual Rambo mata em nome de uma causa: se não aceitarmos que ele está certo, muito além de ter ou não alguma outra escolha diante do cenário apresentado, nem toda a honestidade do mundo conseguiria tornar a violência vista em Rambo em algo digno de purificação e expiação (talvez Mel Gibson fosse o diretor ideal pra filmes contemporâneos sobre John Rambo). É revelador como as duas personagens icônicas vividas por Stallone (com o peso do mundo nas costas, embora Rocky seja bem mais humano) só se sentem confortáveis, ou ao menos bem acomodados, em meio ao nada que costuma sobrar de suas vidas outrora bem movimentadas.

    Navegando rio asiático adentro entre abordagens que variam sem sair do raso entre o marketing e o horror de um conflito, Rambo é um filme competente, mesmo que seja desprovido de ferramentas que permitam uma oferta mais generosa de estofo (e algo além do espetáculo de vísceras e sangue que o filme apresenta como algo cotidiano quando se quer fazer uma diferença). E o tempo torna cada vez mais óbvio que o desespero do combatente agarrado a Trautman (seu mentor E seu superior) ao final da sua primeira aparição nas telonas se devia muito menos à constatação de quem Rambo havia se tornado, e muito mais ao vislumbre de quem ele teria de se tornar, sabendo o que sabe e fazendo o que faz, se um dia almejasse uma vida honesta (principalmente consigo mesmo). Se Programado Para Matar era um ponto de partida, Rambo IV é, ao menos provisoriamente, a lastimável e coerente chegada.

    Texto de Henrique Rodrigues.

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  • Star Wars: A Ascensão Skywalker | Comentários do Novo Teaser Trailer

    Star Wars: A Ascensão Skywalker | Comentários do Novo Teaser Trailer

    A semana dos dias 20 a 25 de agosto foi cheio de surpresas para os fãs da cultura pop. Mais precisamente para os fãs da Disney, a realização da D23 deste ano de 2019, em Anaheim, deixará um marco na história da convenção. Englobando todas as empresas da gigante casa das ideias, a convenção praticamente marcou a estreia do ambicioso serviço de streaming da Disney, o Disney+, trazendo muitas novidades (muitas mesmo) do que estará por vir, principalmente quando se trata de produções da própria Disney, além da Marvel a, obviamente, da Lucasfilm.

    Sem dúvida, o momento mais aguardado era o painel de Star Wars: A Ascensão Skywalker, o nono e último capítulo da franquia. Se durante a Star Wars Celebration, realizada em maio, nos foi mostrado o primeiro teaser do filme, a esperança aqui era que o primeiro trailer completo fosse apresentado. Após a produtora e atual presidente da Lucasfilm, Kathleen Kennedy, e o diretor J. J. Abrams darem às boas vindas ao elenco do filme, o que os fãs viram foi um trailer que não tinha nome de trailer propriamente dito, mas sim um “material especial” para os fãs ali presentes. O material foi lançado oficialmente dois dias depois e deixou a internet atônita, como vem sendo feito em todos os trailers lançados desde O Despertar da Força.

    Embora tenhamos aproximadamente dois minutos e treze segundos de imagens, praticamente metade delas são de material inédito. No começo da fita vemos imagens marcantes de toda a história da saga da família Skywalker, desde A Ameaça Fantasma até Os Últimos Jedi. Importante destacar que o trailer respeita a ordem de lançamento dos filmes e não a ordem cronológica da história e novamente ouvimos a fala de Luke Skywalker (Mark Hamill) que diz “passamos adiante tudo que sabemos. Mil gerações vivem em você agora. Mas esta é a sua luta.”

    As imagens inéditas começam com Rey (Daisy Ridley), Finn (John Boyega), Poe Dameron (Oscar Isaac), Chewbacca (Joonas Suotamo) e C-3PO (Anthony Daniels), num planeta desértico observando uma cidade que parece estar comemorando algum tipo de carnaval. Os figurinos de Rey pouco mudaram desde o usado em O Despertar da Força, mas de Finn e Poe Dameron parecem muito bem trajados para uma aventura estilo Indiana Jones, principalmente Poe que parece que saiu direto do jogo Uncharted. Rapidamente temos a General Leia (Carrie Fischer), lembrando que esta é a última vez que a veremos a atriz em tela, sendo que sua participação foi feita por imagens descartadas dos outros filmes, já que infelizmente, Carrie Fisher nos deixou após terminar sua participação nas filmagens de Os Últimos Jedi.

    O trailer continua com uma bela imagem de diversas naves rebeldes pairando no ar pós velocidade da luz e vemos, também uma infinidade de cruzadores imperiais preparados para batalha. A quantidade é tão grande que chega a lembrar a armada de Agamenom, em Tróia. Observando os cruzadores, está Finn juntamente com Jannah, a nova personagem vivida por Naomi Ackie. Após vemos C-3PO com olhos vermelhos e um tipo de raio destruindo o que pode ser parte do planeta desértico do começo do trailer, para então vermos Rey praticando com o sabre de luz de Luke restaurado e Kylo Ren (Adam Driver) saindo furioso de sua nave, empunhando também sua arma. Vale destacar que as imagens não possuem nenhuma relação, porém vemos uma linda imagem dos dois duelando violentamente em cima de uma peça que provavelmente faz parte dos destroços da Estrela da Morte mostrada no primeiro teaser. Enquanto essas últimas cenas enchem os olhos dos espectadores, ouvimos a voz do Imperador Palpatine (Ian McDiamird) que diz “a sua jornada está próxima do fim”. A tela fica totalmente preta para logo então revelar uma maligna Rey, toda trajada de preto, empunhando um sabre de luz de lâmina dupla na cor vermelha, semelhante ao usado por Darth Maul.

    Obviamente, o destaque do trailer ficou por conta de Rey possivelmente flertando com o Lado Negro da Força e isso sugere o que pode ser parte da trama do novo filme, que poderá retratar a queda de Rey e a ascensão de Ben Skywalker, algo que será discutido no texto sobre as expectativas sobre o filme, dias antes do lançamento. Mas também, outras coisas chamaram bastante a atenção. A festa mencionada no início deste texto sugere que possa estar sendo realizada por Maz Kanata, já que o retorno de Lupita Nyong’o está confirmado. A quantidade de naves da Aliança Rebelde é significativa se levarmos em conta que a rebelião foi praticamente extinta no filme anterior. A imagem dos milhares de cruzadores imperiais no meio a uma tempestade de raios é incrível e pode se tratar somente de um desfile militar sob a liderança do General Hux (Domhnall Gleeson), que até agora não apareceu em uma imagem sequer. Os olhos vermelhos de C-3PO pode não ter siginificado algum, uma vez que o robô vem sofrendo trocas de peças constantemente e ele pode estar acordando justamente do procedimento em que seus olhos foram trocados após ser ferido em batalha.

    Aliás, vários personagens confirmados ainda não deram as suas caras. Luke Skywalker e Palpatine, provavelmente são aqueles que causam as maiores expectativas, além deles e de Maz Kanata, não vimos ainda Rose (Kelly Marie Tran) e a nova personagem vivida por Kerri Russel.

    Star Wars: A Ascensão Skywalker chega ao Brasil em 19 de dezembro de 2019.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

  • Crítica | Fora de Série

    Crítica | Fora de Série

    Um dos subgêneros mais relacionáveis do cinema, o coming of age, já eternizou clássicos com fãs apaixonados. John Hughes, por exemplo, deu à década de 1980 um dos sentimentos mais gostosos de se revisitar da época, aquela eterna juventude, a sensação de liberdade que aprender com os próprios erros pode dar, e que foi inspirador para as dezenas de anos seguintes. Mas de Curtindo a Vida Adoidado até Superbad e A Mentira, era difícil encontrar bons coming of age de comédia escritos, dirigidos e protagonizados por mulheres, e o recém lançado no Brasil, Fora de Série, defende bem a temática e se mostra uma grande surpresa para alimentar uma safra que pode ter sido iniciada por Lady Bird.

    O filme é o primeiro longa metragem com Olivia Wilde na direção e escrito por Emily Halpern, Sarah Haskins, Susanna Goel e Katie Silberman, que já carregam um bom histórico na comédia e no drama. Acompanhamos as duas protagonistas do longa no último dia de aula do ensino médio, Molly (Beanie Feldstein) é uma estudante extremamente focada e mandona e Amy (Kaitlyn Dever) tenta superar sua timidez para conquistar uma menina da escola, amigas de infância elas decidem aproveitar ao máximo a última noite dessa etapa de suas vidas.

    O texto, sem dúvidas, é o grande destaque desde o início, é forte a sensação de que o que passa em tela já foi visto antes, mas vem refrescante, o saldo é como de um material quase novo. As personagens alcançam tridimensionalidades através da subversão de clichês reciclados excessivamente pelo subgênero e até pelo próprio cinema estadunidense, são saídas sagazes que impedem Fora de Série de cair em lugares comuns e possibilita espaço para todas as personagens coadjuvantes além da dupla principal.

    As piadas funcionam boa parte do tempo e rende momentos preciosos, mas algumas sobram e soam convenientes e previsíveis, com momentos até de exposição desnecessária. Problema que talvez seria mais perceptível com um elenco fraco, o que não é o caso, as intérpretes de Molly e Amy fluem bem entre o humor e o drama e nos faz acreditar que aquela amizade é verdadeira, visível na intimidade que compartilham em cena.

    Já a estreia de Wilde na direção não poderia ser mais bem-sucedida, sua câmera traduz com precisão ansiedades de momentos chave, como quando opta por prolongar planos, usar câmera na mão ou quebrar expectativas com a própria linguagem. É um olhar muito sensível e, como já dito, refrescante sobre essa história, expondo caminhos excitantes para esse tipo de abordagem. Prova que a presença feminina atrás das câmeras seja o maior passo a ser tomado, pois o resultado não é nada tímido.

    Texto de autoria de Felipe Freitas.

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  • Crítica | O Gênio e o Louco

    Crítica | O Gênio e o Louco

    O Gênio e o Louco é um longa adaptado para o cinema a partir do livro O Professor e o Louco, de Simon Winchester (além de autor do livro, ele co-assina o roteiro). Estória real que relata o cruzamento das vidas de dois homens no final do século XIX, o prof. James Murray (Mel Gibson) e o Dr. William Chester Minor (Sean Penn).

    Os dois entram em contato no processo de elaboração do New English Dictionary on Historical Principles, conhecido atualmente como The Oxford English Dictionary (dicionário Oxford da língua inglesa). O escocês autodidata sem formação superior, James Murray, é um self-made man dedicado ao estudo das línguas. Ele propõe ao corpo diretor da Sociedade Filológica da Língua Inglesa ligada à universidade de Oxford que lhe conceda a liderança do projeto audacioso de elaboração do dicionário. A esse objetivo ele dedicaria sua vida a partir dali. No seu tortuoso, desafiador e sofrido caminho, conheceria o doutor Minor.

    O filme, embora nos entregue uma estória real muito interessante e cativante, tem pontos negativos que comprometem sua qualidade. O enredo que o longa retrata cobre o período que vai de 1871 até 1910, praticamente 40 anos, e o roteiro deveria, assim, apresentar de maneira adequada essa passagem de tempo. A impressão que se tem ao assisti-lo é que toda sequência de acontecimentos ocorre em não muito mais que dois anos. Ponto negativo para os roteiristas John Boorman (O General), Todd Komarnicki (Sully: O Herói do Rio Hudson), Farhad Safinia (Apocalypto) e Simon Winchester (relevante jornalista e escritor – dentre muitos outros, O Homem que Amava a China é seu livro de destaque publicado no Brasil).

    Safinia, além de co-assinar o roteiro, dirigiu filme. Isso poderia tê-lo levado a uma percepção diferente sobre a apresentação da estória e ter propiciado correções, que elevariam a qualidade do filme. Sobre a atuação dele como diretor há uma questão engraçada, Gibson (detentor original dos direitos para cinema do livro de Winchester) dividiria a direção com ele. Desistiu de fazê-lo e teve dificuldades financeiras que o levaram a vender os direitos a outra produtora. Os novos donos se desentenderam sobre detalhes da obra com Safinia, o que redundou na impossibilidade de que esse assinasse diretamente a direção do longa. Oficialmente o diretor é P.B. Sherman, pseudônimo que Farhad teve de criar para os créditos.

    Apesar dessa questão negativa do tratamento do tempo na obra (central para a qualidade dela), assistir ao filme não é nenhum esforço. A atuação de Penn (Sobre Meninos e Lobos) é sensacional. Ele nos apresenta um Dr. Minor mais que convincente como combatente, nos poucos flashs de memória que tem da Guerra Civil Americana; um homem de meia idade verdadeiramente insano e profundamente intelectualmente compenetrado e produtivo ao ponto de contribuir com mais de 10.000 citações para o dicionário.

    O prof. Murray que Gibson (Coração Valente) nos faz conhecer é a perfeita imagem de um homem auto-forjado a partir das dificuldades. Sua interpretação de convicção, entusiasmo e autoconfiança na cena inicial com a diretoria da sociedade filológica não poderia ter retoques. Ao mesmo tempo, os diversos momentos de vacilação de Murray apenas talvez tenham alcançado expressão mais fidedigna no rosto do James real.

    Natalie Dormer (Game of Thrones) está simplesmente de fazer chorar no papel de Eliza Merrett, viúva de George Merrett, assassinado pelo Dr. Minor. Em toda sua desgraça e limitações, em toda sua dor, desespero e confusão, em sua insana paixão por William, a Eliza de Dormer nos faz experimentar um pouco do que essa infeliz deve ter passado em sua vida.

    Se o filme não é uma obra prima, faz valer as pouco mais de duas horas investidas em frente à tela. Adicionalmente ao já apresentado, é uma delícia visualizar a vida na Oxford de finais do século XIX e início do XX. Permita-se ser levado pela confluência de sentimentos. Ouça a música-tema original do filme The professor and the madman de Bear McCreary (Godzilla II: Rei dos Monstros) de olhos fechados e inicie o filme assim que o som encerrar. Esteja pronto para se perguntar o que é loucura e o que é genialidade.

    Texto de autoria de Marcos Pena Júnior (marcospenajr.com).

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  • Crítica | Brightburn: Filho das Trevas

    Crítica | Brightburn: Filho das Trevas

    Se há dois gêneros cinematográficos que ninguém pode negar que estão tendo bons momentos é o horror e os tão populares filmes de super-heróis. Então, não parece tão utópica a tentativa de unir os dois em um só, já tivemos Blade nos cinemas e o tão adiado Os Novos Mutantes que deve sair ano que vem, porém o representante este ano é Brightburn: Filho das Trevas, filme dirigido por David Yarovesky e com produção de James Gunn, o responsável por Guardiões da Galáxia. Mas mesmo tão promissora, essa reimaginação da história de Superman é tão rasa e sem graça que no fim é difícil se lembrar se queríamos mesmo essa mistura.

    Um jovem casal, interpretado por Elizabeth Banks e David Denman, escuta um pequeno meteorito cair próximo a sua fazenda no meio da noite e descobrem que na verdade o pedaço de pedra especial carrega uma nave alienígena com um bebê. Anos depois, após suspeitar de sua origem, o rapaz desperta fortes poderes alienígenas e, vestido com uma capa vermelha e uma máscara, passa a espalhar um rastro de morte.

    Os primeiros minutos do longa logo denunciam que de fato a produção não é muito inspirada, as cenas não funcionam entre si dando a impressão que a versão final está faltando partes pontuais, problema que reverbera na montagem de todo o longa. Personagens somem da narrativa, cenas com efeitos visuais sofrem de cortes bruscos e nem os momentos de suspense têm sucesso em criar tensão.

    E mesmo que o elenco não esteja exatamente afiado, Jackson A. Dunn no papel desse “super-herói do mal” funciona na maioria das vezes, principalmente por conta da violência gráfica de seus ataques que dão o único senso de gravidade do filme, pois se afasta da ideia de filmes de super-heróis que o público está acostumado. Porém, no fim, o longa acaba sendo só o resquício de uma boa ideia que não conseguiu ir além disso, nem as pistas descaradas no final para novas sequências ou universo compartilhado conseguem animar por conta do gosto amargo da boca. Não diverte e não instiga, Brightburn: Filho das Trevas acaba saindo como imemorável.

    Texto de autoria de Felipe Freitas.

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  • Crítica | Crimes e Pecados

    Crítica | Crimes e Pecados

    A maneira como pequenos fatos podem tomar grandes proporções, afetarem terceiras pessoas ou simplesmente se perderem entre as casualidades da vida são o ponto de partida de uma ideia que viria a acompanhar toda a obra de Woody Allen.

    Talvez Crimes e Pecados não seja o filme mais cultuado da extensa filmografia de Woody Allen, mas sem dúvidas é um dos mais importantes. Sua trama central viria a servir como pilar para algumas outras tramas do diretor: Os Trapaceiros, Match Point e Homem Irracional, por exemplo.

    Nele, Martin Landau apresenta Judah Rosenthal, um oftalmologista bem sucedido, casado com uma filha já educada. Judah se enxerga como um homem de moral irreparável,mas há um porém…  Ele tem uma amante, Dolores. Para ela, essa relação já não se sustenta e não se conforma mais com a situação. Ou Judah deixa sua família para ficar com ela, ou Dolores conta tudo sobre sua relação para a esposa do doutor. É quando então seu Jack, irmão de Judah que mantém vínculos criminosos, oferece uma solução alternativa (e final) para seu imbróglio familiar.

    Como grande maioria dos roteiros escritos por Woody Allen, Crimes e Pecados dispõe de uma extensa árvore genealógica da arte, sendo Crime e Castigo, o livro quase homônimo de Fiodor Dostoiévski, sua principal referência. A partir do momento em que o crime é consumado, a culpa pesa sobre o protagonista que passa a refletir sobre sua vida, criação e a situação confortável e ao mesmo tempo hipócrita que vivia.

    Embora o filme aconteça em duas vias distintas, a história principal do filme é a de Martin Landau: o crime, a culpa e a moralidade entorno do protagonista; enquanto a história de Cliff, o documentarista vivido pelo próprio Woody existe para empregar mais valor aos temas propostos. Isso é feito de maneira bastante assertiva,pois assim também trata dos desdobramentos do amor e da vida de aparências da alta sociedade, que entram em discussão em sua narrativa primária. A culpa de Judah é evocada em abstrações que vão desde conversas imaginárias com um de seus pacientes, que é um rabino, até flashbacks lúcidos que trazem o passado para sua frente. Judah e Cliff traçam histórias diferentes que constroem a ideia que será discorrida no último diálogo do filme, numa espécie de touché que parte do autor.

    Antes de ser um filme sobre um crime, este ainda é um filme de Woody Allen. Então mesmo com um assassinato na trama, o foco do diretor está em pontos subjetivos, em explorar da melhor maneira possível os personagens dentro daquele universo e como eles lidam com as questões morais propostas. Sendo assim, o crime não é mostrado. É revelado pela história com apenas um telefonema.

    Crimes e Pecados é uma das obras mais sombrias dentre todas as de Woody Allen – junto de Interiores, Setembro e A Outra, onde o diretor também se encontra em grande forma filosófica.O monólogo do final do filme, proferido por Cliff é curto e grosso:a ordem natural universo é o caos.Mesmo aqueles que praticam o mal podem acabar recompensados perante a desordem total da vida – onde alguns privilegiados detém maior controle de sua rotina que outros. Sendo assim então, a culpa é uma escolha e é possível sim conviver com ela de alma leve e sono saudável.

    Texto de Gabriel Caetano.

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  • Resenha | Steins;Gate

    Resenha | Steins;Gate

    Rintaro Okabe, também conhecido como Okarim, é um Jovem excêntrico que se autoproclama como Cientista Maluco, conhecido como Hououin Kyouma, perseguido pela misteriosa Organização por sua grande “influência”. Seu sonho é criar invenções inovadoras para mudar a humanidade e assim se tornar um cientista rico e famoso. Junto a seus colegas de laboratório, Okabe e seus amigos formam a equipe que compõe o Laboratório de Experimentos do Futuro (Mirai Gajetto Kenkyūjo), onde passam grande parte do tempo tentando desenvolver seus inventos. Sua equipe é composta pela carismática Mayuri Shiina, amiga de infância de Okabe e também por Itaru “Daru” Hashida, seu colega da época do colégio. Quando não está no Laboratório, Mayuri trabalha em uma cafeteria local chamada Mayqueen Nyannyan e adora fabricar Cosplay como hobby. Já Daru é um ótimo programador, Otaku e um experiente Hacker. Em resumo, Mayuri é a musa do laboratório enquanto Daru é a mão de obra. A mais recente e promissora invenção do laboratório é o maravilhoso TeleForno, um forno de micro-ondas que pode ser controlado por celular. Mas infelizmente, a única coisa que consegue fazer é congelar comidas frias e transformar bananas em meleca. O TeleForno precisa de mais testes…

    Passado em 2010 na cidade de Akihabara no Japão, Steins;Gate conta o decorrer das conseqüências dos experimentos de Okabe, após conhecer Kurisu Mikase, jovem prodígio de uma universidade norte-americana, durante um simpósio científico, onde acaba encontrando a jovem morta de maneira misteriosa. Ao tentar contatar Daru, Okabe sente uma presença misteriosa, e descobre que sua realidade não é mais a mesma de segundos atrás. As pistas começam a aparecer quando um satélite aparece misteriosamente no prédio onde o simpósio aconteceria, e também quando a jovem Kurisu aparece viva bem na sua frente. Juntando as informações, Okabe e sua equipe (agora composta por Kurisu, apelidada de Cristina por Okabe) descobrem que qualquer aparelho telefônico ligado ao TeleForno acaba se tornando chave para o que vem a se tornar uma espécie de Máquina do Tempo, capaz de enviar uma mensagem para o passado, sendo possível modificar acontecimentos específicos e assim mudar o futuro, o atual presente dos personagens. Okabe também descobre que apenas ele possui a habilidade de se lembrar dos acontecimentos anteriores às mudanças feitas pelas mensagens, podendo identificar as diferentes linhas de tempo, o que o faz chamar sua habilidade de Reading Steiner.

    Tentando adquirir mais informações sobre o funcionamento da mensagem enviada para o passado, algumas experiências são realizadas, mas apenas Okabe parece capaz de observar as mudanças, sendo assim cada vez mais complicado de os resultados serem analisados, até mesmo quando as pesquisas de Daru descobre o envolvimento de um possível projeto da SERN, uma entidade governamental, sobre o mesmo assunto. Moeka Kiryū, uma moça que não desgruda de seu celular, tropeça com Okabe durante o incidente do simpósio enquanto procura pelo mesmo computador, se juntando ao grupo na esperança de conseguir a máquina para poder estudá-la. Nesse tempo, Mayuri descobre que a família de sua colega de trabalho, Feiris Nyannyan, uma menina que adora a cultura otaku de Akihabara, havia doado esse computador anos atrás para o templo local, templo este onde mora um amigo dos parceiros do Laboratório, o jovem Ruka Urushibara, um garoto freqüentemente confundido com uma garota por sua aparência andrógena e personalidade dócil e sensível. Ao conseguir o computador, os documentos são decifrados, e logo é descoberto que o TeleForno poderia ser a chave que todos procuram.

    Lançado em 2009 para o Xbox, o jogo em forma de visual novel Steins;Gate foi adaptado por Yomi Sarachi para Mangá no mesmo ano com 3 volumes, com uma arte limpa e simples que parece bem fiel a arte do jogo ao qual se baseia, também ganhando duas continuações por outros autores, uma adaptação em Anime em 2011 com 24 episódios, e um longa animado em 2013. Mesmo sendo personagens carismáticos no jogo, e aparentemente, mais explorados no anime, o mangá deixar claro quem são os personagens principais, pois sua trama é centrada na relação entre Okabe e Kurisu, e, mesmo assim, parece apressado demais em seu desenvolvimento. Com enredo denso e complicado, e mudanças bruscas em certos pontos da estória, o mangá tem problemas sérios em alguns núcleos, deixando os personagens secundários em um segundo plano tão forte que quase parecem desaparecer, aparecendo apenas em momentos chave para a estória avançar. A velha técnica do “ele estava aqui o tempo todo, você apenas não tinha percebido”.

    A trama ainda contém traços semelhantes ao do filme Efeito Borboleta, de 2004, porém evoca uma premissa mais voltada à ciência do que para o sobrenatural. Talvez seja também adequado comparar com o enredo do conto “O som do trovão” (1953), de Ray Bradbury, que também possui a premissa de que uma mudança feita no passado modifica a linha temporal presente, por menor que elas sejam, envolvendo os personagens em diversas ocasiões em que seria necessária uma visita ao passado para tentar modificar algo que teria dado errado causando uma mudança drástica em seus futuros, assim sendo necessária uma nova viagem para concertar os acontecimentos divergentes. E, assim como no conto e no filme de 2004, pesar de também presente o fenômeno conhecida como Paradoxo Temporal, (fenômeno que teoriza a viagem do tempo se tornando nula uma vez que ela é feita apenas para mudar um evento, pois, assim que o evento é desfeito, a viagem se torna desnecessária), este não parece afetar o personagem principal, dando assim maior conexão deste com a estória e as viagens que são feitas ao longo do enredo. Apesar das semelhanças, as motivações dos personagens são claramente diferentes, porém, uma obra não anula a outra, talvez uma pessoa se identifique mais com a história japonesa de enredo científico, talvez o romance fantástico sobrenatural de 2004 seja mais atraente, ou quem sabe o inventivo conto de Bradbury seja ainda mais interessante.O Mangá de Steins;Gate foi publicado no Brasil em 2015 pela Editora JBC também em 3 volumes.

    Texto de Bruno Gaspar.

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  • Crítica | A Mansão do Inferno (1980)

    Crítica | A Mansão do Inferno (1980)

    Dario Argento e seu Suspiria, de 1977, marcaram a história do cinema de horror e o filme sobrevive como um grande clássico até hoje, mas o que muita gente não sabe é que o cineasta continuou essa história no desejo de criar uma trilogia. O segundo longa foi o A Mansão do Inferno, de 1980, esse que prometia expandir a mitologia criada por Argento a partir do livro Suspiria de Profundis (Thomas de Quincey, 1845) mostrando a segunda mãe das Três Mães, responsáveis por afundar o mundo em suspiros, lágrimas e trevas, residente em uma Nova York sinistra e barroca.

    Mesmo que o filme pareça ser dividido em três momentos e em três personagens, pode-se dizer que  sua trama principal se inicia quando a jovem Rose Elliot (Irene Miracle), que mora em um misterioso prédio na cidade de Nova York, compra o livro de um arquiteto que diz ter construído um lar para cada uma das bruxas intituladas Três Mães, desconfiada que está morando em uma dessas construções ela pede a ajuda de seu irmão Mark (Leigh McCloskey).

    É interessante perceber que o longa acaba repetindo os erros e acertos do teu antecessor, o apreço visual é ainda mais presente e refinado, enquanto o roteiro parece não se resolver nunca.  Cores invadem os cenários e fazem com que tudo pareça um pesadelo sedutor que se materializa em ambientes muito bem projetados para criar uma Nova York diferente, um pouco envelhecida e fantasmagórica. Os efeitos práticos nesse novo capítulo também se destacam, um belo trabalho de maquiagem deixa as cenas de violência mais trabalhadas e detalhadas, acabam satisfazendo os mais loucos por sangue.

    Já a trama não sabe para onde ir, é possível ter o longa em uma perspectiva que a narrativa não seja o real objetivo, e sim a megalomania da violência e as matanças dessas bruxas, como um bom filme trash, mas se o longa se inicia aprofundando na mitologia dessa história é impossível não esperar um roteiro no mínimo coerente. As ações das personagens são duvidosas, as histórias entrelaçadas não fazem sentido e no fim parecem um desperdício de tempo, além do final apressado, tal qual Suspiria.

    Ao desfecho de A Mansão do Inferno a sensação que fica, felizmente, não é negativa, pelo contrário, mesmo tendo esses tropeços de roteiro o filme ainda é bastante divertido. Sendo visualmente bem acabado e tendo uma trilha-sonora eficaz em criar uma atmosfera singular, o segundo capítulo da trilogia das bruxas de Argento pode acabar se tornando o preferido de alguns e respeitado por muitos, acaba sendo uma pena perceber que ele carrega um potencial não alcançado.

    Texto de autoria de Felipe Freitas.

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  • Resenha | Filhos do Éden: Universo Expandido – Eduardo Spohr

    Resenha | Filhos do Éden: Universo Expandido – Eduardo Spohr

    Em meados de 2007, quando A Batalha do Apocalipse, de Eduardo Spohr, foi lançado, eu era um atento consumidor do conteúdo do site que lançou o primeiro volume do que viria a se tornar a Tetralogia Angélica. Peguei o livro emprestado com um amigo e achei razoável: um bom cenário, mas o desenvolvimento narrativo não tinha nada de revolucionário – ainda que o autor nunca tenha sugerido que fosse. Mais de dez anos e outros três livros depois eu me deparo com Filhos do Éden: Universo Expandido.

    Apesar de parecer um cenário rico e que pudesse trazer muitas informações que fossem relevantes para os fãs, é difícil mostrar ainda mais conteúdo depois de escrever quatro livros naquele mesmo universo. E é exatamente isso que acaba acontecendo: tudo parece raso e repetitivo, funcionando apenas como uma grande enciclopédia ou livro de apoio à série. Se para um leitor de apenas um dos livros já se torna complicado, que dirá para os leitores casuais que tenham acompanhado todas os volumes. A forma como as coisas são apresentadas produz uma sensação mais próxima aos livros de RPG que propriamente de algo que queira expandir o universo.

    Na verdade, absolutamente tudo o que surge nesse livro remete a um livro de RPG: capa dura, ilustrações, boxes, formato, entre outras coisas. E a parte mais engraçada é que ele arranha a superfície: as estatísticas para jogo estão lá, mesmo que tímidas e mal balanceadas em um capítulo no fim do livro. O produto final acaba sendo uma publicação que parece ter sido pensado com esse intuito, mas sem coragem para faze-lo.

    Outra ponto curioso foi da publicação foi um capítulo elaborado e desenvolvido apenas para com o objetivo de auxiliar os leitores da obra a escreverem suas próprias histórias no universo. Não há um preciosismo no cenário, onde as coisas são e devem ser, apenas da forma com que foram mostradas. Além disso, são dadas diversas dicas de narrativa que podem ajudar muito no processo de quem nunca tentou algo do gênero, ainda que um capítulo como esse se mostra um pouco deslocado do conceito da própria publicação.

    E como uma das principais características dos já citados RPGs, está a qualidade gráfica. A Verus, selo de fantasia da Editora Record, não poupou esforços em colocar uma capa dura belíssima, num papel com pegada melhor que muito manual de Dungeon & Dragons que eu já tive acesso. As ilustrações são um ponto a parte. Elaboradas por Andrés Ramos, as imagens do mundo e dos personagens são de tirar o fôlego, tudo isso num papel de alta qualidade, o que só aumenta a beleza do conteúdo.

    Filhos do Éden: Universo Expandido não entrega exatamente aquilo que promete, mas o acerto, mesmo que acidental, pode trazer um material divertido e interessante para quem já é fã da série e procura por si só, ou na companhia de outras pessoas, criar suas histórias por lá, seja escrevendo ou jogando.

    Compre: Filhos do Éden – Universo Expandido.

    Texto de Caio Amorim.

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  • Crítica | Era Uma Vez Um Deadpool

    Crítica | Era Uma Vez Um Deadpool

    Que a campanha de marketing do universo cinematográfico de Deadpool é fantástica, nós já sabemos. Assim como o personagem cartunesco da Marvel, o mercenário tagarela das telas rompe diversas vezes a quarta parede, se dirigindo diretamente ao espectador, seja nas telas do cinema, seja pelas redes sociais. O empenho de Ryan Reynolds com o personagem fez com que o ator se reerguesse e se reencontrasse nas telas e tudo vem sendo alegria desde então, mesmo com a violência absurda e o linguajar pesado e obsceno, recheado de cinismo, ironia e humor negro, que o anti-herói prolifera sem nenhum tipo de pudor, deixando constrangido até mesmo o mais “mente aberta” dos seres, fato este que provou que o cinema pode ser violento, quase sem limites, o que abriu as portas para outras produções que tentaram alcançar o mesmo nível, como é o caso do excelente Logan e o controverso Venom.

    Pelo fato de ser uma produção para maiores, obviamente, os mais jovens teriam que ficar de fora, afinal, a violência explícita e o conteúdo quase sempre falando de sexo e drogas, não é mesmo para todo tipo de público. O problema é que os jovens adoram o personagem e não gostariam de ficar de fora dessa “experiência Deadpool”. Assim, os produtores resolveram criar uma nova versão do corte original, retirando todo o sangue possível, trocando piadas, “bipando” outras e adicionando cenas inéditas não aproveitadas, além de ter inserido o filme nos mesmos moldes de um conto de fadas, uma maneira interessante de novamente vender o filme para o público no melhor estilo Deadpool.

    Alguém aqui se lembra de um filme lançado em 1988, chamado A Princesa Prometida? Na trama, um avô lê para seu neto uma história da vida de uma princesa. O menino é vivido pelo ator Fred Savage, mais conhecido aqui no Brasil como o protagonista Kevin Arnold da série Anos Incríveis. Pois bem, sequestrado por Deadpool e colocado exatamente no mesmo quarto do filme oitentista, o ator é forçado a conhecer a história do mercenário tagarela, o que deixa a experiência um pouco mais interessante.

    Era Uma Vez Um Deadpool, para os fãs “normais”, tem cheiro forte de caça-níquel. Primeiro porque as mudanças no corte e cenas inéditas, embora estejam presentes, não acrescentam muito à experiência, principalmente se você é adulto e já assistiu Deadpool 2. E segundo que, se você se encontra inserido no primeiro por que, provavelmente não irá assistir ao filme novamente e procurará assistir somente às mudanças e pesquisará a respeito das comparações pela internet (lembrando que isso não é uma regra).

    Caso você seja um fã mais “hardcore”, a experiência será completa, porque parte divertimento, será comparar as cenas com o filme original. O mesmo é dito para os menores de idade, que poderão assistir ao filme sem medo, sendo que essa, de fato, é uma ótima saída para tornar o filme palatável para quase todo o tipo de público.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

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  • Resenha | Elegia do Irmão – João Anzanello Carrascoza

    Resenha | Elegia do Irmão – João Anzanello Carrascoza

    Elegia do Irmão, da Editora Alfaguara, é o novo romance do experiente contista João Anzanello Carrascoza. Espécie de diário familiar construído em capítulos curtos e sentimentais, o livro é escrito por um narrador sem nome que deseja registrar e homenagear os passos de sua irmã, Mara, diagnosticada com uma doença grave que a levará à morte.

    Mais lembrado pelos seus livros de contos ou infanto-juvenis, a produção de romances de Carrascoza é pouca, mas apresenta um tema constante: a família. Em adicional, todas as famílias do autor passam por alguma espécie de ruptura calcada da relação direta com o tempo. Contudo, se nos livros anteriores conseguíamos ver a ação cronológica como peça principal da trama, em seu romance, o tempo age nas entrelinhas acelerando e extinguindo as esperanças sobre a vida de Mara. A “elegia”, originalmente um poema lírico triste que prenuncia ou anuncia morte, é, portanto, o registro do irmão de Mara para os últimos dias dela.

    Sobre o irmão de Mara, sem nome, podemos dizer que detinha por sua irmã o amor mais fraterno que se possa imaginar. Encontramos nele não exatamente o contraponto de Mara, mulher apresentada sempre como segura de si, independente e esperta, mas um homem sincero e aberto ao simples (porém rugoso) amor entre irmãos. Por conta disso e também pressentindo a dor da ausência futura, o irmão trata de descrever as situações do passado e do presente ao lado de Mara. Pululam cenas da infância, adolescência e vida adulta entre os dois. Em todas elas, a linguagem poética, sentimental e também fúnebre toma as linhas; antes que uma elegia, conseguimos ler uma homenagem sincera sobre uma vida que está condenada à morte.

    Desde o início sabemos que Mara vai morrer. Isso cria um efeito de cumplicidade e pêsames para com o narrador-irmão de forma que largar a leitura é como deixar de compartilhar aquele sofrimento humano: a iminência da morte. E como não largamos a mão dele, conhecemos Cravinhos (cidade natural do escritor e onde a trama é ambientada), e as histórias familiares que ainda sobrevivem na memória dos daquela família.

    Os pequenos capítulos do livro (momentos do diário), atestam o grande poder de síntese e clareza de Carrascoza. As palavras não sobram; são todas exatas, como pesadas a cada linha a fim de manter a mesma suavidade e beleza da narrativa. Assim, a história é sensível, podemos notar facilmente, mas carrega o tom fúnebre do porvir; por isso, todos os momentos onde as lembranças são alegres, sentimos também nós aquele vazio da ausência futura. O livro mantém essa ponte sensível entre as duas emoções e o efeito é dos mais complexos de se encontrar em Literatura – e dos mais belos de se ler. Desses livros que se nota a humanidade.

    Texto de autoria de José Fontenele.

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  • Resenha | O Sal do Leviatã – Alexandre Guarnieri

    Resenha | O Sal do Leviatã – Alexandre Guarnieri

    O Sal do Leviatã, da editora Penalux, é o novo livro de poemas do experiente Alexandre Guarnieri. O poeta tem outros cinco livros publicados, participação em diversas antologias e renomados sites literários, e foi o vencedor do Prêmio Jabuti pelo livro Corpo de Festim, em 2015. Depois de ganhar a maior condecoração literária do país, você, leitor, poderia achar que as ambições do poeta minguaram. Aí o nosso erro – o propósito do poeta é a própria Poesia; mergulhar mais profundo no universo da palavra a fim de conquistar uma nova dimensão real, apesar de fictícia, acima dele mesmo. E em seu novo livro é isso que encontramos: uma nova profundidade para a palavra.

    O fundo do mar é misterioso. Entre o universo e as profundezas abissais que nos cercam, conhecemos mais o céu que o oceano. Não por acaso, desde os sumérios (a primeira civilização da História, erguida entre os rios Tigre e Eufrates), o mar é criador de mitos – e o livro de Guarnieri nos brinda com isso. Divido em duas partes, Maré Alta e Mare Nostrum, o poeta se dispõe a versificar cada aspecto real ou fictício dessa imensidão líquida que nos rodeia. Uma tarefa ousada e ambiciosa que encontra forma tanto na versificação quanto na linguagem diversa empregada para ilustrar as sinuosidades marinhas.

    Na primeira parte, os poemas se movimentam tal qual marés e carregam uma importante ressignificação: o mar menstrua. O mar é uma lavoura com safras colhidas pelos que sobrevivem à superfície. Com versos sem forma fixa e muitas assonâncias e aliterações, bem como sinais gráficos para simular o vaivém das ondas, o poeta resgata um conhecimento mitológico e científico que devolve ao mar o berço da Humanidade. E não apenas berço, as águas são um dínamo aos terrestres. As metáforas de mar como também máquina invisível do mundo intensificam sensivelmente os versos de forma que podemos ouvir as ondas ao redor – há uma catarse que resgata memórias de oceano.

    Na segunda parte, Guarnieri resgata o fantástico sobre o mar, os locais mitológicos rodeados por ondas, as grandes descobertas além-mar, os grandes perigos, os monstros que lá vivem, e o próprio enigma marinho: o desconhecido. Aqui os poemas assumem um tom mais descritivo, não encontramos as formas obtusas, e os versos nos sustentam pela fabulação e análise dos acontecimentos líquidos. Ainda encontramos assonâncias e aliterações, todas dentro de uma lógica interna afiadíssima com o vocabulário náutico e marinho. O verso é a nossa âncora.

    Quero ressaltar que o trabalho do autor em simular o caótico movimento marinho alcançou o seu objetivo. Sobretudo na primeira parte, todos os versos são malevolentes, carregam sal à própria palavra e parecem nos transpor à praia. (Mesmo eu que não sei nadar, passo a ter uma boa memória do oceano.) Vários versos são excelentes composições poéticas e, especialmente, “dínamo marino”, é para emoldurar na sala. O Sal do Leviatã é o resultado de muito trabalho sobre a palavra. Há um refinamento na composição poética que intensifica o objetivo do livro e o faz um dos melhores de poesia publicados no ano. Grande dica de leitura e tenha as meias limpas, porque você vai se molhar.

    Texto de autoria de José Fontenele.

    Compre: O Sal do Leviatã – Alexandre Guarnieri.

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  • Crítica | Dogman

    Crítica | Dogman

    Dogman, filme mais recente de Matteo Garrone, é exaustivo. Dividindo o mesmo cinismo relativo à derrocada moral da população suburbana da Itália com Gomorra, a obra que catapultou seu nome ao co-protagonismo do cinema europeu, trata-se de uma epopeia massacrante sobre o crime e a cultura de intimidação que o cerca – bem como sobre as chances nulas, quase além da compreensão, de dignidade e serenidade por parte de quem abraça esta vida dura a despeito das circunstâncias.

    Acompanhando a vida de Marcello (vivido por Marcello Fonte, premiado como Melhor Ator em Cannes por esta interpretação), um fragilizado e simplório tratador de cães em uma decadente cidade costeira não-especificada, Dogman nos insere no contexto quase idílico dos seus dias (cuidar atenciosamente de cães, jogar futebol com amigos, fazer nada na companhia de amigos, entreter a filha pequena, Sofia, que teve com uma mulher com a qual não há mais reparação) mas logo revela a faceta sombria inescapável de alguém detido em um lugar tão impróprio para um cotidiano saudável: por baixo dos panos, Marcello é um traficante. E esta atividade paralela, embora pague por uma convivência mais agradável do que seria esperado para alguém de possibilidades tão ínfimas, acarreta também problemas que excedem a ginga do protagonista para resolvê-los, exemplificados na figura de Simone (Edoardo Pesce, também em grande atuação), um violento e insuportável ex-boxeador absolutamente entregue à cocaína, mais parasita do que cliente, e que Marcello a muito custo consegue manter a uma distância nada segura, tentando evitar ocasionais explosões de implicância e ignorância. Obviamente Simone não tem meios de manter seu vício cada vez mais glutão, mas assim como faz com todos ao redor, ele prensa Marcello com brutidão a esticar a paciência com seus calotes e não tarda a fazer com que o mesmo participe de alguns de seus crimes.

    Ao contrário do que consegue fazer com paciência e gentileza com os cães dos quais cuida, Marcello não consegue estabelecer algo além de uma relação de submissão com Simone; a dinâmica entre ambos é a mais sufocante possível, e tanto a integridade física quanto a resolução civil de Marcello parecem sempre a um passo (dado por Simone, logicamente) da implosão completa. Marcello, afinal, é incapaz de se desvencilhar do magnetismo maldito de Simone, conservado através do mais puro bullying – e não somos surpreendidos, conforme a trama avança, quando atitudes mais e mais tóxicas e violentas produzem ocorrências mais e mais arriscadas e danosas, enquanto Marcello é tragado pelo vórtice de destruição que o indiferente Simone deixa como rastro.

    Garrone exerce uma precisão absurda pra construir atmosferas e estabelecer personas em seus mergulhos no submundo do crime de baixo clero; dispensando sutilezas mas compensando esta exposição com imensa naturalidade de diálogos (o roteiro é assinado pelo próprio Garrone, junto a Ugi Chiti e Massimo Gaudioso) e situações (méritos de Garrone como diretor, em especial de atores, e dos próprios atores, incrivelmente à vontade em seus papéis), o realizador incrementa vários desdobramentos do longa, que poderiam soar melodramáticos demais, como incidentes adequados dentro da escalada súbita (mas nada imprevisível) das inconsequentes incursões de Marcello nos golpes e roubos de Simone — desfechos coerentes com os crescentes riscos e sanguinolência. À medida em que Marcello começa a ser encurralado pela estupidez que segue Simone onde quer que ele vá, e seus atos desencadeiam reações onde até mesmo a morte de Simone por seus amigos é discutida, Garrone conduz a claustrofóbica narrativa dando pequenos sinais de que Marcello zarpou em direção a um destino nada alentador, e que a passividade covarde diante de Simone provavelmente só será rompida quando as consequências forem graves demais para serem ignoradas.

    Através de um desfecho duro e violento (e não seria de outra forma), porém sensato pro realismo desumano da saga de Marcello e Simone, Dogman reserva uma clareza total para as pretensões de Garrone: assim como acontecia nos núcleos de Gomorra, há uma colisão inevitável entre o que as personagens pretendem e o que de fato são capazes de empreender diante das próprias maquinações do mundo do crime e dos excessos que invariavelmente alcançam quem dança rente ao precipício. Que Marcello esperasse domar e acalentar Simone como a um cão descontrolado, em nome da própria estima, já seria insolência suficiente naquela realidade avilanada; que como resultado disso ele se torne apto (e adepto) a detonar o que lhe sobra de humanidade e civilidade, é o cerne do mundo que o longa apresenta, onde o crepúsculo da sociedade eventualmente devora a todos.

    Texto de Henrique Rodrigues.

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  • Crítica | Face a Face

    Crítica | Face a Face

    Muitas vezes estigmatizado pelo sofrimento apresentado em cada uma de suas peças – as ideias do cineasta e dramaturgo sueco Ingmar Bergman chegam a seus limites de intensidade e crítica.

    O cinema de Ingmar Bergman, especialmente os lançamentos posteriores a Persona (1966), é muitas vezes reconhecido pelo pessimismo e por cravar raízes no estudo da psique humana. Em Face a Face, o autor não aborda apenas sua obsessão pela devastação psicológica e o despropósito existencial, como também apresenta outros temas recorrentes em sua obra: a importância da família e a iminência da morte. Mesmo com suas distinções, é um filme onde todas as ideias apresentadas pelo cineasta ao longo de sua extensa filmografia estão potencializadas.

    Logo após Cenas de um Casamento, Bergman mais uma vez reúne Liv Ullmann e Erland Josephson para contracenarem juntos. Ullmann é Jenni, uma psiquiatra que tem sua carreira em ordem e a vida pessoal prestes a um total colapso. Usa seu ofício para ajudar outras pessoas, se importa genuinamente com seus pacientes – sobre todas, Maria – que necessita de cuidados especiais. Em tratamento com outro médico, Jenni também sofre de arrebatadora depressão e se sente isolada pelo marido e insegura em sua relação com a filha. Com a casa em reformas e o marido em viagem, ela parte para morar temporariamente com os avós quando em completo desgosto consigo mesma, tenta suicídio.

    O longa é uma obra que não confronta sua protagonista com outros personagens ou situações, mesmo que se trate de Tomas, outro psiquiatra interpretado por Josephson. Como o título da obra sugere, esse confronto acontece na intimidade da protagonista e entre seus próprios sentimentos. Assim, Jenni enxerga sua vida deterioração a medida em que não encontra mais satisfação em nenhuma oportunidade.

    O autor se vale de alguns recursos para representar isso em cena. O primeiro deles é a cenografia: sempre opressora com o expectador e pronta para também sufocar quem está exposto ao filme. No momento em que Jenni volta à sua casa abandonada e encontra dois homens que tentam abusar da psiquiatra (eles estão em companhia de Maria – em crise), fica claro o estado de espírito devastado em que a doutora se encontra, por suas ações tomadas (mesmo após a tentativa de agressão ela prontamente vai socorrer sua paciente) e o ameaçador vazio representado em tela. Sonhos e fantasias que também são constantes em outros filmes do autor (Morangos Silvestres, Persona, Fanny & Alexander) – representam o inconsciente da psiquiatra a partir de quando tenta a própria morte, eles escancaram seu passado, suas frustrações e seus desejos em uma manifestação ensaística.

    Existe uma preocupação por parte de Sven Nykvist, diretor de fotografia e colaborador habitual de Bergman em preencher a tela com sombras – a ponto de muitas vezes lembrar a técnica chiaroscuro. Acontece com o cenário e com a face dos personagens, em alguns momentos, especialmente os de maior angústia, os olhos de Ullmann estão totalmente cobertos pela escuridão.

    Bergman, alternando sonho e lucidez, conduz todo sufoco e teatro subjetivo como uma ópera – tendo como finalidade a vertigem e reconhecimento com a decadência apresentada. Enquanto Jenni mergulha em sua essência subconsciente, mais o diretor coloca o dedo na ferida para questionar as escolhas pessoais e profissionais que fazemos em vida. Acontece uma espécie de compensação quando ela atravessa todo esse sofrimento e decide encarar um recomeço: a doutora encontra a sua filha, Anna, que se sente insegura quanto ao estado mental da mãe. É mais uma vez a incerteza assombrando qualquer otimismo possível para o futuro, e assim Face a Face abandona o expectador: a mercê do lado sombrio presente em cada alma viva.

    Texto de Gabriel Caetano.

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  • O Cinema e o Trabalhador

    O Cinema e o Trabalhador

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    Imagine este cenário: trabalhadores suados, com sede (sem direito a beber água, para não prejudicarem a produção), num ambiente totalmente fechado, cuja temperatura de 29°C se junta à umidade que impregna o ar.

    Embora essa cena tenha sido exibida em algumas obras da sétima arte, ela também fez parte de várias realidades, como por exemplo no século XVIII, em Manchester, Inglaterra, numa fábrica de algodão. Se no cinema ela dura alguns minutos, no cotidiano desses trabalhadores ela se estendia por 14 horas (às vezes 17), dias, meses e anos seguidos, sem férias, 13º ou qualquer outro direito trabalhista conquistado posteriormente.

    Charles Chaplin, com toda a sua sensibilidade e genialidade, nos aponta a falta de respeito pelo ser humano, e o abuso do patrão sobre o trabalhador, em 1936 com Tempos Modernos. Retratando os primeiros tempos da industrialização e do capitalismo, mostrando-nos as condições sub-humanas a que o “proletariado” era submetido, através do personagem Carlitos, em cenas como a da esteira rolante (cuja velocidade é frequentemente aumentada, a partir das ordens do presidente da fábrica, que se comunica por um telão).

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    Na cena onde o protagonista parece ser “engolido” pela engrenagem, faz-se uma alusão à despersonalização do individuo, assim como naquela em que ele testa uma máquina para alimentar o trabalhador, evitando assim, que este perca tempo se alimentando, já que o propósito era efetivar e maximizar o lucro, produzir mais em menos tempo e pelo menor custo.

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    Uma imagem que não poderia passar desapercebida é quando o ingênuo Carlitos pega uma bandeira sinalizadora que cai acidentalmente de um caminhão e, ao tentar chamar atenção do motorista,  é confundido com o líder de uma passeata e levado pelos policiais. Chaplin nos conta sobre a consciência das condições precárias impostas ao empregados, sua vontade de mudar isso, e a repressão que as autoridades exerciam.

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    Foi uma manifestação, em Chicago (Estados Unidos), em 1886, na luta por mais salários e a redução da jornada de trabalho, que originou o feriado comemorado no 1° de maio. Além de ser um destacado pólo industrial, esta cidade figurava no cenário mundial como um dos maiores centros sindicais. No primeiro dia do mês de maio, na penúltima década do século XIX, milhares de pessoas foram à ruas manifestar seu descontentamento, iniciando-se também, nos EUA, uma greve geral. Nos dias que se seguiram imediatamente, estabeleceu-se um clima de violência, ferindo dezenas de pessoas e matando algumas. Mas o ato que marcou definitivamente esta data, foi a prisão de 8 líderes, sentenciados ao enforcamento.

    No entanto, nem todo o trabalhador se propõe a lutar, de imediato, pelos direitos da sua classe. Alguns porque se acomodam, construindo um imaginário de que é essa a sua condição da sociedade. Outros porque o próprio sistema capitalista, de consumo, acaba colocando-os num impasse ideológico.

    É este impasse, o grau de precariedade das condições de trabalho (considerando esta força como mercadoria) e todas as relações de produção num universo capitalista, que o diretor Elio Petri tenta explicar em A Classe Operária Vai ao Paraíso (1971).

    Este filme italiano tem como protagonista Lulu (Gian Maria Volonté), um operário-padrão aplaudido pelos superiores e hostilizado pelos colegas de trabalho, que o identificam como alienado, entregue ao sistema. Até que Lulu Massa perde um dedo numa máquina, e começa a despertar para a exploração que lhes é imposta, começando uma luta interna de ideais.

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    Movimentos grevistas e repressão aos mesmos, também são questões abordadas em Germinal (1993) de Claude Berri, baseado no romance homônimo de Emile Zola (1881).

    Nenhuma palavra me pareceu tão justa quanto “abordadas”, porque os temas citados acima são tratados, por incrível que pareça, de uma forma mais superficial, dando ênfase realmente à diferença entre a burguesia e os trabalhadores, sendo que os primeiros vivem emersos em sua alienação, futilidades e opulente suntuosidade, como é mostrado na maioria das cenas que os retrata, em volta de uma mesa mais do que generosa. Já os segundos, vivem em condições, para as quais a palavra “miseráveis” ainda seria atenuante, chegando a oferecer sexo em troca de comida, e permanecendo numa situação sem qualquer individualidade, sem qualquer traço de personificação, num núcleo familiar descaraterizado, onde funcionam como meros fatores de contabilidade.

    Despida de qualquer ideologia pré-concebida, a sua luta é pela sobrevivência, a sua revolta é motivada pelo princípio da ação/reação (à exploração), e o próprio conceito de justiça acaba sendo deteriorado pela força das necessidades básicas, como nos mostra a cena em que o personagem de Gerard Depardieu (Toussaint) come a sopa que deveria ser o alimento do seu filho.

    A trama gira em torno de uma família de mineiros, cujo chefe, Toussaint, estimulado e em parceria com um operário recém chegado, Étienne (Renaud) com experiência em revoltas e contestações, resolve criar um “fundo de resistência”, como plano para a uma condição de sobrevivência, e todo este processo acaba levando a maiores tensões. Apesar de o próprio título, germinal, referir-se ao desenvolvimento da gestação e maturação dos movimentos grevistas desse período, e de haver algumas pinceladas dos discursos de Marx e Engels, esta obra aprofunda-se efetivamente é nas relações humanas, e nos mecanismos que condicionam e provocam comportamentos. Há na obra uma evidente intenção em mostrar os contrates, o que é favorecido também pela brilhante fotografia de Yves Angelo (quando contrapõe a luz dos aposentos burgueses ao opaco sombrio das minas e “casas” dos trabalhadores).

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    Mas se você, prefere não mergulhar em ideologias declaradas ou supostas e, em vez disso, deixar-se emocionar em alguns momentos, e entregar-se a reflexões sobre superação e ética, em outros, num contexto mais atual, aqui vão duas sugestões que também englobam a luta no mercado de trabalho, e os malabarismos necessários às adaptações, internas e externas, que este nos exige.

    “Há coisas que acontecem na vida e há coisas que você faz acontecer. É a diferença entre ter um plano e não ter.”

    Esta é uma das premissas que norteou Chris Gardner, um homem que viu afundar um negócio onde investira todo o seu dinheiro, afundou-se em dívidas, foi abandonado pela esposa, dormiu por algum tempo em banheiros públicos e abrigos para moradores de rua, e teve que cuidar sozinho de seu filho de cinco anos. Mas Chris é obstinado, e torna-se dono de uma grande corretora e, consequentemente de milhões de dólares.

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    A história real foi registrado num livro e, posteriormente, transformada em filme, sob a direção de Gabriele Muccino e a brilhante atuação de Will Smith, contracenando com seu próprio filho, Jaden Smith. À Procura da Felicidade (2006), apesar de trazer alguns pontos dramatizados ou açucarados pelo roteirista Steven Conrad, não deixa de emocionar e encorajar alguns daqueles que não conseguem ver um luz no final do túnel.

    Mas sejamos realistas! Claro que persistência e foco são essenciais, no entanto, não há tantos Chris por aí! Sabemos da crise de desemprego numa escala global. Jean-Pierre Dardenne e Luc Dardenne, sempre atentos para os temas em pauta, sabem disso, e os trazem esta questão, com o roteiro e a direção de Dois Dias, Uma Noite (2014).

    A história passa-se na Bélgica, e tudo se inicia quando Sandra (Marion Cotillard) é despertada pelo som do celular. A cena é praticamente um monólogo, pois não se ouve quem está do outro lado da linha, mas a forma como Marion se expressa diante da câmera, satisfaz plenamente a intensão dos diretores em seu enfoque psicológico.

    Quando se preparava para retornar ao trabalho, após um afastamento ocasionado por uma depressão, que parece superada, Sandra fica sabendo que seus colegas haviam aceitado a proposta da empresa em substituir a sua vaga por um bônus de mil dólares. Diante disso, ela tem apenas o fim de semana para fazê-los mudar de ideia, e começa uma maratona de visitas a cada um. Aqui, os irmãos Dardenne discutem a questão social.

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    As relações humanas são abordadas fora do núcleo familiar, embora a família seja usada como pretexto para a priorização do bônus, por parte dos outros funcionários. Este dilema sustenta o teor moral e ético da trama, e os conflitos externos, desencadeados pela fragilidade do mercado de trabalho, e pelo peso do seu retorno monetário, tornam-se reveladores de conflitos internos vividos pelos personagens.

    O tema central destes filmes é o trabalho… Será? Essas histórias (e todos os recursos cinematográficos que atuam como agentes simbólicos) nos levam a uma reflexão sobre algo que exige a busca pelo equilíbrio entre a razão e a emoção: as relações humanas, culturais e sociais!

    Texto de autoria de Cristina Ribeiro.

    Leia Mais: Top 10 – O Trabalhador e o Cinema.