Autor: Vortex Cultural

  • Resenha | Outros Tempos – Mauro Iasi

    Resenha | Outros Tempos – Mauro Iasi

    Outros Tempos (Mórula Editorial), do poeta e militante Mauro Iasi, compreende poemas produzidos entre 2008 e 2017. Os temas presentes são: resistência política popular, violência contra os menos favorecidos, prisões particulares, desencanto com o mundo e, apesar de todos os pesares, otimismo para com o futuro. Pesquisador, professor universitário e filiado ao Partido Comunista Brasileiro, (PCB) Iasi tem um eu lírico que pulsa dar voz aos poemas que despertem e chamem o povo à luta. Uma poesia de resistência para ser declamada para multidões.

    Do ponto de vista técnico, em Outros Tempos, os versos não têm forma fixa, não tem rimas aparentes, mas encantam pelo ritmo, pela forma como abordam os temas e pela concisão vocabular – que intensifica o significado das palavras. Ou seja, ocorrem rimas pelo sentido do verso, e não exatamente pela repetição de certas letras ao fim das linhas.

    Alguns poemas são versos de protestos retirados de violentas notícias de jornal; uma poesia que busca transformar o sangue que foi derramado em assunto de reflexão e despertar político-empático de quem o lê. Versos potentes que chamam atenção para a perda do nosso senso de comunidade, pois a violência contínua assombra e transforma tentativas de humanização em constante medo do dia-a-dia. É na passividade de não nos envolvermos que perdemos o outro e também a nós mesmos.

    As metáforas empregadas pelo poeta seguem o tema, entre outras coisas, das prisões que nos impedem de agir. Como exemplo, vejamos os versos de “Prisões inúteis”: Pesca funesta, caça / Camburões, delegacias / Galés modernas / Novos navios negreiros. Nesses versos, a comparação de camburões com navios negreiros (um paralelo com a letra de Todo Camburão Tem um Pouco de Navio Negreiro, d’O Rappa?), buscam reforçar a “pesca” predatória do homem pelo homem em camburões, delegacias, que, ao invés de trabalharem para ressocializar o preso ou suspeito, acabam por viola-lo, brutaliza-lo, reduzindo a humanidade de uma pessoa a um animal enjaulado. Logo o ciclo da violência não tem fim.

    Mas nem tudo são violências. A poesia de Iasi também se volta para o outro lado: a esperança, sentimento que ele evoca em, por exemplo, poemas em espanhol que homenageiam e revivem a memória de Salvador Allende, fundador do Partido Socialista chileno e presidente eleito do Chile entre 1970 e 1973, deposto pelo golpe militar do general Augusto Pinochet. Esses e outros poemas levantam a bandeira que a luta e manutenção por direitos civis é uma luta constante. As democracias são frágeis, nos ensinam os cientistas políticos, por isso é preciso poesia, é preciso luta, é preciso informação para estarmos atentos contra ameaças à coletividade e aos direitos humanos, estes os primeiros a serem rasgados ante governos ditatoriais. Por isso a poesia de Mauro Iasi é tão válida e oportuna. Leitura muito recomendada.

    Texto de autoria de José Fontenele.

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  • Primeiro Reinado (Atômico): O novo Godzilla quer o trono da cultura pop

    Primeiro Reinado (Atômico): O novo Godzilla quer o trono da cultura pop

    Embora o status icônico dos protagonistas do MonsterVerse (o universo compartilhado de monstros produzido pela Legendary Pictures e distribuído pela Warner, centrado em Godzilla e King Kong), com os dois filmes lançados até o presente momento, Godzilla (2014, dirigido por Gareth Edwards, de Monstros, Rogue One) e Kong: A Ilha da Caveira (2017, dirigido por Jordan Vogt-RobertsThe Kings of Summer), o cinema ainda não testemunhou abalos à altura de suas carreiras culturais. E o rastro deixado por ambos, embora não seja nada desprezível nas searas financeiras e culturais, não corresponde às expectativas mastodônticas dos estúdios e dos fãs, ansiosos por um afago na forma de blockbusters a personagens que antes só existiam nas produções originais da japonesa Toho ou em ocasionais (e frequentemente questionáveis) incursões hollywoodianas em busca de monstrodólares. A partir do final de maio deste ano, os espectadores poderão conferir o resultado da mais recente empreitada na mitologia dos ancestrais “Titãs”, em Godzilla II: Rei dos Monstros – e é possível que enfim tenhamos um filme mais naturalmente integrado ao estilo das produções da Toho, e mais digno das figuras portentosas que ostenta em trailers e artes relacionadas.

    No pontapé inicial do universo dos monstros, em 2014, houve uma preocupação louvável com os sensos de escala e proporção das criaturas em relação à existência humana e suas estruturas, apesar de um deslize básico em não explorar mais o maravilhamento e o terror da humanidade em descobrir os habitantes mais grotescos e imponentes do planeta (e explorar demais certos desdobramentos narrativos que pouco acrescentavam à costura geral da projeção); Kong, lançado há pouco menos de dois anos, resolveu em parte esta abordagem, mas ainda assim não apresentou o MonsterVerse em sua plenitude (e só amarrou marginalmente as pontas que ligam um filme a outro e os estabelece no mesmo universo — usando a cartilha do MCU, abrindo o jogo em definitivo somente em uma sequência pós-créditos). O benefício de tudo que foi tentado e realizado em duas produções bem distintas (Godzilla mais solene e reverente; Kong mais fantástico e menos impessoal) pode tornar o novo Godzilla, pela cabeça de Michael Dougherty (Contos dos Dias das Bruxas, Krampus), uma obra mais direta E ainda mais reverente, sem a necessidade de ancorar tanto as ações em descobertas e situações de verossimilhança, uma vez que a ideia agora é justamente a de dar aos monstros o espaço necessário pra que surjam das entranhas da terra e tomem o palco principal.

    A escolha de um diretor como Dougherty, cujos filmes anteriores apresentaram horrores suburbanos e familiares com bastante casualidade, não é à toa; transformar a franquia de vez em uma bonança de criaturas mitológicas ultra-poderosas tende a reduzir a relevância do fator humano, algo impensável pros padrões hollywoodianos mas amplamente ambicionado por fãs mais empolgados. O elenco do filme traz figuras queridas da cultura pop, como Vera Farmiga, Millie Bobby Brown, Charles Dance e Kyle Chandler (todos nomes bem ambientados em produções de gênero e fantasia no cinema e na televisão), mas os elementos que ancoram o interesse do público, desde o anúncio do projeto e ainda mais após a divulgação de seus trailers e cartazes, são obviamente os monstros: King Ghidorah, um tradicional e mortífero oponente de Godzilla; Mothra, uma valorosa aliada do Rei dos Monstros em momentos cruciais; Rodan, um daikaiju também tradicional e de natureza um pouco questionável; além, é claro, de Godzilla e de outros nomes supostamente presentes na vindoura exibição.

    Tantos monstros denotam uma mudança salutar na filosofia por trás de alguns blockbusters contemporâneos: a perda do receio de fazer filmes realmente fantásticos, sem a necessidade quase obsessiva em prendê-los ao chão e tentar ancorá-los em uma realidade *compreensível* (do ponto de vista de alguns produtores e profissionais da área). Uma mudança certamente influenciada pela essência dos filmes da Marvel posteriores ao primeiro Vingadores (e a subsequente aceitação destes pelo público – em especial na forma de rechonchudas bilheterias), mas que não foge das raízes dos monstros da Toho. À exceção do até hoje reverenciadíssimo Godzilla original, de Ishiro Honda, os kaijus do estúdio japonês que se adonou deste nicho cinematográfico sempre foram caracterizados por investidas cada vez maia fantásticas e simbólicas no cinema, e uma mitologia crescente cada vez mais rica e espraiada, às vezes até mesmo descentralizando os filmes da figura do Godzilla com resultados interessantes e curiosos – uma abordagem que engrandece os planos do MonsterVerse atual e possibilita eventos dignos de quem ainda espera pela mesma grandiosidade da franquia japonesa aliada aos valores de produção que Hollywood tem a oferecer.

    Godzilla II: O Rei dos Monstros talvez não tenha a elegância estética (ironicamente) contida de seu predecessor, ou mesmo a diversão nada melodramática de Kong – A Ilha da Caveira (convenhamos, os fãs amam qualificar monstros como Ghidorah como “eventos em nível de extinção” e pensar nas consequências fictícias de suas aparições e confusões com Godzilla & cia.), mas é um forte candidato a se tornar (enfim) a demorada materialização das criações da Toho em meio a Hollywood. Que se aventure em entregar uma obra que permita aos horrores biológicos deste universo os holofotes, proporcionando uma quase inédita (no Ocidente) sensação de diminuição cósmica diante das cataclísmicas personagens da saga japonesa de alegorias científicas e arqueológicas, é uma conquista e tanto; uma capaz de deixar as marcas profundas que o distanciamento dos filmes anteriores do legado da Toho impedia.

    Texto de autoria de Henrique Rodrigues.

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  • Crítica | We The Animals

    Crítica | We The Animals

    Na mais rasa das investigações acerca do cinema, a identificação ainda aparece como força motora de nosso engajamento. Aos 20 minutos de We The Animals eu já sabia que esse seria um texto diferente para mim, talvez seja assim para muita gente que se proponha a escrever sobre ele. O filme trata da infância de uma maneira que se dificilmente você não se identifica, pelo menos te toca, sutilmente, no espaço do peito que escondemos a inocência já perdida de ser criança, o diretor Jeremiah Zagar não constrói um filme de respostas ou decisões fáceis, ele entende que a questão aqui é experimentar e observar mesmo que tudo seja novo e estranho.

    Pelos olhos do filho menor de um conturbado casal, acompanhamos três irmãos de idades muito próximas que precisam lidar com amadurecimentos súbitos e as constantes brigas entre seus pais. Em meio a agressões, fugas, brincadeiras e descobertas sexuais, o pequeno Jonah (Evan Rosado) compartilha seus pensamentos mais íntimos e puros.

    O personagem de Rosado nos permite ter acesso a um espectro da infância muito palpável, ele convive com uma mãe doente sem entender o que a faz estar mal e observa seus irmãos mais velhos crescerem sem compreender muito bem o que é isso. Constantemente ele é lembrado que sua pele é mais escura do que a de algumas pessoas e que tem gente igual a ele, mas Jonah não sabe o que isso significa. Seu colega, um rapaz mais velho, desperta faíscas estranhas que ele também não conhece. E ser criança não acaba sendo estar em um mundo á parte? As respostas não são claras e as informações são nebulosas enquanto as cores vibram, vibram até nos mais rabiscados dos desenhos.

    O menino foge do mundo real enquanto rabisca o que tá dentro da tua cabeça, e assumindo que estamos tendo a perspectiva de seu mundo, a cinematografia de We The Animals acerta muito pela forma, as luzes sempre remetem a sonhos presos entre a realidade e a uma fantasia muito particular. E mesmo que o filme possa parecer estilo por estilo, Zagar nunca deixa a narrativa cair nesse espaço do gratuito, porque o elenco é dirigido com naturalidade e muita verdade, os diálogos e os planos são desmembrados suavemente para dar ao longa uma aura quase documental.

    É um texto diferente porque acredito que o longa, particularmente, atinja cada pessoa das mais variadas profundidades, nas sutilezas me identifiquei com Jonah e me recordei da época que li O Oceano no Fim do Caminho, de Neil Gaiman, em uma cena específica a criança protagonista do livro testemunha uma cena que ela não compreende o que está acontecendo, mas sente que algo está errado, algo no ar a faz deduzir isso. Eu era um pouco mais velho do que a personagem do livro e já sabia o que aquela cena significava, e tudo dentro de mim era empatia. Zagar sabe o que está fazendo quando em um filme como esse, ele cria pontes de identificação tão poderosas que raiva e amor em uma família coexistem de forma convincente aos nossos olhos, e tudo que existe dentro da gente no fim do longa é empatia, porque nas diferentes relações isso acaba se comunicando com todos nós.

    Texto de autoria de Felipe Freitas.

  • Resenha | Melodia do Mal – John Ajvide Lindqvist

    Resenha | Melodia do Mal – John Ajvide Lindqvist

    Melodia do Mal (Tordesilhas), do sueco John Ajvide Lindqvist, é um thriller sobrenatural que, em longo prazo, se propõe a investigar o desenvolvimento da empatia nas pessoas e quais comportamentos ou emoções seriam mais características dos seres humanos. Tudo isso por conta de Theres, a protagonista da história, uma menina que, fora a aparência, não sabe muito sobre como ser humana, para dizer o mínimo.

    A história começa com o músico fracassado Lennart Cederström encontrando uma menina dentro de um saco na floresta. Ela foi deixada para morrer em uma pequena cova e Cederström a encontrou quando, na verdade, procurava cogumelos. Aliás, ele só a acolhe por conta de ela cantar divinamente, algo que ecoa como o mito grego de Orpheu. Esse poder sobrenatural da música faz com que ele a leve para casa e resolva não comunicar às autoridades, mas mantê-la como uma filha escondida no porão. O filho do músico, Jerry, quando descobre, tem ciúmes da Pequenina, e vamos descobrindo o quando essa família é fragmentada.

    O casamento de Cederström não ia bem e seu filho é um canalha em desenvolvimento pleno. Jerry gosta de extorquir os pais e começa a ser violento com a menina, mas ela não chora, revida com mordidas, e o menino gosta, pois a brutalidade dela é algo que o interessa e excita. Além da violência, Theres têm problemas de empatia; ela parece não sentir carinho ou afeição pelas outras pessoas.É fria, tem a atenção para dentro de si e vai se revelando uma criança sobrenaturalmente perturbada, algo como um ser desconhecido vestindo uma fantasia de humana (Donnie Darko feelings).

    Logo chegamos ao primeiro ponto de virada do livro, Theres mata seus pais postiços e o livro ganha uma névoa constante de violência em qualquer situação. A sensação é justamente essa: uma menina sem pudores quanto à morte, porque como ela não se vê parte da humanidade, Theres encara uma predadora da espécie humana. Além do mais, para a menina, os humanos, ao morrer, deixam uma “fumaça” que ela pode respirar após a morte para preencher o vazio dentro de si.

    Um livro complexo, sem dúvidas, que tenta investigar a maldade e a construção da empatia humana. Todos os personagens têm uma atmosfera de desajuste, de violência física ou sexual ou de simplesmente não ligar para os outros. É uma investigação sobre a humanidade com alguns dos piores exemplares possíveis de pessoas. Continuamos a leitura por conta disso, talvez.“Melodia do mal” tem quase 500 páginas, uma dezena de personagens, arcos complexos e carrega uma névoa tarantinesca sobre si.

    O estilo de Lindqvist é conciso, detalhista e acolhe muitas referências atuais e mitológicas, o que torna a narrativa ainda mais palpável e assustadora. Leitura para dormir com aquele frio na espinha.

    Texto de autoria de José Fontenele.

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  • Piores Filmes de 2018

    Piores Filmes de 2018

    2018 chegou ao fim e com ele uma série de filmes que adoraríamos não ter visto. Mas como não é o caso, decidimos fazer aquele resgate heroico de tudo o que tem de mais descartável nos cinemas no ano que passou.

    (confira também nossa lista de Melhores Filmes de 2018).

    10. O Paradoxo Cloverfield (Julius Onah, 2018) – Por David Matheus Nunes

    O Paradoxo Cloverfield era um filme que tinha tudo para dar certo. Após o bom Cloverfield: Monstro e o ótimo Rua Cloverfield, 10, que deixou as expectativas lá no alto, o novo capítulo da franquia decepciona. Se em “Monstro” temos uma inexplicável criatura destruindo Nova Iorque, em “Rua n. 10”, temos uma jovem encarcerada num bunker no meio de uma invasão alienígena. “Paradoxo” vemos uma competente equipe de astronautas numa importante missão de acionar um acelerador de partículas. A missão fracassa e o planeta Terra desaparece, deixando os astronautas à deriva, ao mesmo tempo em que coisas estranhas começam a acontecer. Apesar de situações bastante interessantes que flertam entre o suspense e o terror, o filme se perde em diversos momentos, fazendo com que o espectador se interesse e perca o interesse diversas vezes, o suficiente para colocá-lo na lista dos piores do ano. O pior é que O Paradoxo Cloverfield é até agora o principal e mais importante filme da franquia. Se colocado na linha do tempo dos 3 longas lançados até agora, o filme é o ponto de partida, ou seja, explica o porquê da existência do monstro de Nova Iorque e o porquê da invasão alienígena. Então, o “peso” que esse filme tem e seu saldo insatisfatório, abaixa ainda mais sua nota, o que é uma pena.

    9. Nada a Perder: Contra Tudo. Por Todos (Alexandre Avancini, 2018) – Por Filipe Pereira

    Depois do “fenômeno” de bilheteria que foi Os Dez Mandamentos: O Filme, a Record atacou novamente com outra bilheteria gigantesca cujas salas apesar de esgotadas estavam na maior parte das vezes vazias. Nada a Perder é uma historia inédita mas a originalidade não é o suficiente para considerar o longa de Alexandre Avancini nem ao menos passável. As passagens de tempo são confusas, todas as pessoas reais do filme são mostradas de maneira caricata e Petrônio Gontijo faz um Edir Macedo que varia entre o psicopata indócil e o obstinado que acredita ter uma missão e que se vale de toda sorte de mentiras e argumentos fracos e lugar comum para fazer isso. Apesar de não ser uma novela condensada no tamanho de um filme o roteiro é tão mal construído que deixa lacunas tão ruins quanto as do outro filme, sem falar que seu conteúdo é ofensivo para quem não é crédulo no evangelho que faz com que todo cristão pareça uma pessoa má e falaciosa, sendo ainda mais vergonhoso para quem é religioso por conta dessa construção de arquétipo e clichê.

    8. Uma Dobra no Tempo (Ava DuVernay, 2018) – Por Filipe Pereira

    Após Mogli, de Jon Favreau, a Disney percebeu que seus longa live action tinha uma tendência, quando era um filme que reproduzia fielmente uma obra animada como Bela e a Fera, a chance de ser sucesso era maior, e uma historia nova e inédita tinha tendência de fracassar. Foi assim com Christopher Robin, O Quebra Nozes e A Dobra no Tempo, filme de Ava DuVernay (responsável pelo ótimo Selma e o razoável A 13ª Emenda). No entanto, a adaptação do livro de Madeleine L’Engle é horrenda em muitos sentidos, o visual é espalhafatoso, a maquiagem terrível, Oprah Winfrey parece ter saído do mesmo baile de carnaval que George Clooney participou em Batman & Robin, os personagens infantis não tem carisma, a historia é confusa… DuVernay pesou demais a mão e certamente não é mais tratada como uma diretora incapaz de errar, ainda mais após um equívoco tão indiscutível quanto este.

    7. O Predador (Shane Black, 2018) – Por Bernardo Mazzei

    Estou surpreso que essa tranqueira não está no topo da nossa lista. Venom é uma desgraça muito menor que O Predador, o que não significa dizer que o filme do vilão do Homem-Aranha seja algo mais do que um cocô rolando no vento. Mas enfim, falemos rapidamente dessa belezura que foi O Predador. Quando os planos de uma retomada da franquia do alien caçador foram anunciados com Shane Black capitaneando a empreitada foram anunciados, havia uma esperança de que a mística dos dois primeiros filmes fosse recuperada, afinal, Predadores e os dois Alien versus Predador não fizeram muito bem para o nosso extraterrestre de dreadlocks preferido. No entanto, o que aconteceu tornou essas três películas mais dignas, porque meus queridos, o novo longa é uma tragédia.

    Black se uniu ao seu parceiro Fred Dekker, roteirista com uma certa experiência em arruinar franquias e personagens icônicos (assistam RoboCop 2 e Robocop 3 pra entenderem o que ele e Frank Miller fizeram), para conceber essa película. Porém, a realização é deprimente (para dizer o mínimo). O filme não funciona em absolutamente nada. Como ficção científica é péssimo, como comédia involuntária perde a graça em dois tempos e como filme de ação é confuso. Alguém me disse para ver o filme como uma sátira, mas só consigo entender como deboche. O filme é confuso, com situações mal amarradas pelo roteiro, propostas absurdas e o terço final, além de ser uma zona narrativa completa, tem um epílogo que cospe na cara do espectador e do fã mais antigo da franquia. Ah, o filme teve toda a parte final refilmada porque nas exibições-teste, os espectadores não gostaram e o estúdio também não. Aí as refilmagens foram exigidas. Se com as refilmagens o filme é essa maravilha, prefiro nem imaginar como ele era antes.

    6. Batman Ninja (Junpei Mizusaki, 2018) – Por Dan Cruz

    “Batman Ninja é tão ruim que parece que foi o Dan quem escreveu o roteiro!”, disse o meu irmão em um grupo de amigos. E eu concordei com ele veemente! Explico: no meu grupo de amigos, sou o único que nunca fui um grande fã de animes e mangás. Como jogamos RPG juntos há bem mais de uma década, certa vez tentei “mestrar” uma aventura oriental e… Bem, por não curtir o gênero, foi desastroso!

    O mesmo que aconteceu com minha sessão de RPG pode ser visto em Batman Ninja: clichês e mais clichês de desenhos e séries japonesas são derramados em cima do espectador sem critério algum. A premissa da história parece até interessante: um experimento do Gorila Grodd no Asilo Arkham causa um acidente que manda Batman, seus aliados e vilões para o passado, mais precisamente no Japão feudal. A estética e estilo de animação do anime não deixa muito a desejar, mas o roteiro é tão fraco que, antes mesmo da metade do filme já vemos um castelo se transformar num robô gigante! E daí pra frente, só piora, com cada vez mais estereótipos que misturam elementos de anime e tokusatsu, desenfreadamente, sem qualquer compromisso em contar uma história coesa ou, no mínimo, que respeite tanto os fãs quanto a cultura oriental.

    Se fosse algo claramente feito para ser uma sátira, como a franquia Lego, talvez até teria algum mérito. Mas o filme se leva a sério, e isso faz com que fique simplesmente intragável. Parece até que fui eu que escrevi o roteiro!

    5. A Freira (Corin Hardy, 2018) – Por Felipe Freitas

    James Wan, a mente responsável pelo universo iniciado no primeiro Invocação do Mal, já admitiu que é nos filmes derivados que eles se divertem. Porém, essa brincadeira toda não rendeu nenhum spin-off digno dos filmes principais, e o mais recente A Freira consegue ser o pior de todos. A personagem, vilã de Invocação do Mal 2, assim como Annabelle ganha seu filme solo em uma história de origem, mas sai pela culatra e a maior prejudicada é a própria freira. Sua imagem acaba sendo desgastada e quase vulgarizada, toda a atmosfera acerca dela perde a força em uma narrativa simplória, com tentativas falhas de reverter clichês e sequências de horror e suspense nada eficientes.

    O universo segue ganhando fortunas em bilheteria, mas A Freira prova que falta coração nesses capítulos da franquia, pois não apresenta carisma em suas personagens principais e nem sabe aproveitar a figura de sua vilã. E além de estruturalmente problemático, é um tédio. Que venha Invocação do Mal 3 e a revelação de qual monstro vai ganhar seu próprio filme ruim.

    4. Megatubarão (Jon Turteltaub, 2018) – Por Douglas Olive

    Hollywood tinha algo a nos comunicar aqui, com um tubarão pré-histórico zanzando livre e faceiro nos oceanos, em pleno século XXI. É o retorno dos que não foram, e a caça ao antigo que precisa morrer, mas nunca de verdade; ele é rentável, mina de ouro. Remakes atrás de remakes, grandes histórias são esvaziadas em função do espetáculo e de um entretenimento oco. Megatubarão foi um dos piores filmes de 2018, e não é preciso ir muito longe (salve o trocadilho “se aprofundar”) para descobrir o porquê.

    Digno de dó, o filme da Warner Bros, um misto exemplar de ação com uma pobre ficção científica bitolada, narra aos trancos e barrancos o resgate de um grande número de pessoas presas num submergível ameaçado pela presença de uma máquina colossal de matar, dona das águas e do que ousar ameaçar o seu trono marítimo. O bicho só não é mais falso e não tem um destino mais previsível do que o próprio filme em si, contando com personagens que existem apenas para ser ou a comida da fera, ou seus algozes imbecilizados, tentando enfiar um arpão no peixe a qualquer custo. Acredite: Megatubarão é mais um aviso desses bastardos inglórios que só se multiplicam, infectando os multiplex ao redor do mundo. Que Steven Spielberg, ou melhor, que um novo Spielberg tenha pena de nós.

    3. Círculo de Fogo: A Revolta (Steven S. DeKnight, 2018) – Por Bernardo Mazzei

    Quando o primeiro trailer desse filme surgiu online, parecia uma pequena crônica de uma tragédia anunciada. Toda a estética idealizada por Guillermo Del Toro havia sido abandonada em favor de algo que variava parecia a fusão de Power Rangers com Transformers. Pode até parecer exagero, mas a pasteurização visual é nítida, basta uma forçadinha na memória para recordar o primeiro e uma breve observada no que esse segundo filme é. Se fosse só isso, acredito que Círculo de Fogo 2: A Revolta seria um pouquinho mais tolerável. Mas não é. Além dessa pasteurização visual, toda a mitologia (se podemos chamar assim) criada por Del Toro para o primeiro filme foi jogada pela janela em favor de uma diversão escapista que não diverte em nada.

    Ainda que seja um filme para o público jovem, Círculo de Fogo 2 é extremamente infantil e eu não digo isso por causa da presença dos robôs e dos monstros. Todo o conceito estabelecido pelo primeiro é simplificado ao extremo, a fim de que o mínimo de dramaticidade pretendido seja praticamente arrancado a fórceps. Entretanto, isso não funciona. Os personagens são extremamente genéricos e alguns são mal concebidos, parecendo simples decalques de arquétipos já estabelecidos no cinema. Fora que as lutas entre os robôs e os kaiju, que deveriam ser a melhor parte de tudo, não tem a menor graça. Caso fossem boas, todo o roteiro boboca com o plot twist ofensivo à nossa inteligência seriam perdoados. Há quem reclame que o primeiro filme rouba elementos de vários outros filmes, de animes e mangás. Porém, aquele ao menos usa tudo muito bem. Já esse aqui no máximo é a cópia mal feita de seu predecessor, emulando de forma ruim tudo aquilo que o outro usou como inspiração e também não compreendendo a sua fonte.

    2. Cinquenta Tons de Liberdade (James Foley, 2018) – Por Flávio Vieira

    Se um dia você acreditou que existia fundo do poço isso se deu pelo desconhecimento cinematográfico a respeito da trilogia Cinquenta Tons, baseado no romance de E. L. James. Sim, depois de dois filmes insossos, que buscam uma ousadia e erotização inexistente, o terceiro filme da franquia conclui a série e faz os filmes anteriores parecerem obras de Bernardo Bertolucci, dado o fracasso do longa, inclusive entre os fãs.

    O desfecho da série, que buscava uma conclusão digna para o casal de protagonista falha miseravelmente em todos os fronts que ataca. A erotização é inexistente, a suposta “liberdade” envolta das questões sexuais de Grey e Steele não convencem, ainda que a personagem feminina se mostre mais bem resolvida, sexual e profissionalmente falando, deixando de lado a frigidez e a dependência do primeiro filme, enquanto os problemas de Grey em relação ao seu suposto abuso são apenas mencionados, deixando de lado qualquer desenvolvimento plausível em relação aos seus traumas e sua “libertação”. Se no trailer o longa tentava convencer o espectador de que entregaria um thriller, no longa isso tampouco funciona, as perseguições de carro beiram o marasmo, o antagonista é novamente reaproveitado em um plano bobo dotado de uma motivação ridícula. A estrutura narrativa funciona por blocos: viagens, cenas “eróticas”, discussões bobas entre o casal e cenas de sexo. O terceiro ato tenta quebrar esta fórmula por meio de uma tentativa frustrada de thriller, mas falha miseravelmente. Cinquenta Tons de Liberdade é um filme vazio, sobre o nada. Não existe evolução narrativa. Não existe desenvolvimento de personagem. Não existe roteiro. Difícil entender como existiu uma trilogia.

    1. Venom (Ruben Fleischer, 2018) – Por Dan Cruz

    Personagem de absoluto sucesso nos quadrinhos e desenhos animados nos anos 90, o vilão Venom era uma antítese do Homem-Aranha, que não só o odiava como também o conhecia intimamente, pois já tinha sido um simbionte do próprio Peter Parker. O Venom do cinema, não tem nada disso. Nenhuma relação com qualquer filme ou série do Cabeça-de-teia, nem mesmo com sua versão anterior em Homem-Aranha 3. Apenas o nome de seu hospedeiro é mantido, e Tom Hardy se esforça no papel de Eddie Brock dando a ele um tom de comédia pastelão que não combina em nada com o restante do filme.

    Roteiro fraco e cenas de ação coreografadas de forma absurda, utilizando-se de coincidências para fazer andar a história, o filme é um desastre narrativo do começo ao fim. A única coisa que se salva é o CGI – disfarçado em tomadas noturnas para não ressaltar a péssima qualidade da produção. Personagens são desperdiçados, diálogos forçados e piadas simplesmente não funcionam nesse filme caça-níquel. Fica evidente que a Sony apenas se aproveitou da popularidade do personagem enquanto estava impossibilitada de usar o Homem-Aranha devido a um acordo com a Marvel/Disney. Só não é o pior spin-off de filme de herói porque Mulher-Gato, de 2004, ganha esse título. Mas está bem perto!

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  • Resenha | Mulheres – Eduardo Galeano

    Resenha | Mulheres – Eduardo Galeano

    Mulheres (L&PM), de Eduardo Galeano é uma coletânea de textos feita pelo próprio autor onde homenageia diversas mulheres anônimas e famosas da América Latina e Estados Unidos. As histórias alternam-se entre contos, crônicas e pequenas histórias onde as protagonistas femininas estão presentes em sua singularidade e poder. Galeano explora uma diversidade de temas e o resultado são histórias saborosas com uma percepção crítica sobre a posição da mulher na sociedade.

    O escritor uruguaio é mais conhecido pelo livro “As veias abertas da América Latina” onde investiga a história da região desde o período colonial até a atualidade, mostrando a exploração econômica e política do povo latino-americano primeiro pela Europa e depois pelos Estados Unidos. Do estilo presente em “As veias…” entendemos que Galeano, também jornalista, torna o seu texto uma união de investigação jornalística e análise econômica e política. Em “Mulheres”, o estilo também paira sobre uma congruência de informação e análise sobre as personagens femininas.

    Do campo à cidade, do folclórico ao científico, do sonho à realidade, da democracia aos golpes militares, as mulheres que ganham vida nas páginas de Eduardo Galeano são múltiplas, com carências, afetos e falhas partilhadas por toda a humanidade. O estilo do escritor é preciso, sem embaraços de excessos ou carência de informações. Todas as histórias/crônicas funcionam por sua leveza, concisão e boa escrita. Livro excelente para homens e mulheres, e para tomarmos consciência de que a equidade dos gêneros é o mínimo que se pode pedir no século XXI.

    Texto de autoria de José Fontenele.

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  • Crítica | Assassination Nation

    Crítica | Assassination Nation

    O cinema sempre buscou congelar o tempo em tela, mas quando se fala de agora, os tempos são rápidos demais e as tentativas caminham a passos curtos. Assassination Nation talvez tenha encontrado a fórmula de congelar esse mundo que tudo parte do click numa tecla Enter: não se congela. O longa que foi comprado em Sundance pela produtora dos Irmãos Russo – os diretores de Vingadores: Guerra Infinita -, é a segunda direção de Sam Levinson e atira para todo lado quando o assunto é alfinetar as feridas mal cuidadas do modo de vida norte-americano, mas não que as críticas parem ali no continente de cima, Assassination Nation acaba falando com todos nós, mesmo que de forma desordenada.

    Na cidade de Salem – em referência a histeria acerca das bruxas de Salem -, algumas autoridades começam a ter seus dados pessoais invadidos por um hacker e vazados na internet, mas o que inicia apenas com um político e o diretor da escola passa a atingir boa parte das pessoas da cidade. No colégio, Lily (Odessa Young) reage aos recentes acontecimentos com suas melhores amigas Bex (Hari Nef), Em (Abra) e Sarah (Suki Waterhouse) enquanto lida com seu péssimo namorado (Bill Skarsgard) e frequentemente envia fotos sensuais para o homem que ela nomeia de “Papai”. Não demora muito até que Lily se torne uma vítima dos vazamentos online e juntamente com suas amigas se vê no meio de uma onda de violência extrema que explode na cidade.

    Assassination Nation começa avisando do conteúdo que estamos prestes a ter acesso: homofobia, transfobia, estupro, violência e masculinidades frágeis estão entre os gatilhos que o filme promete, e isso é o primeiro indício que assim como o mundo virtual a narrativa se apoiará nos exageros. O longa se desenrola no primeiro ato em sequências estilizadas que parodiam a seriedade caricata dos filmes teen e por isso, em primeira instância, ganha a atenção do espectador mais engajado, mas também deixa claro que não é uma produção das mais comuns. A narrativa é frenética e como já citado nesse texto, Sam Levinson parece compreender bem o lugar disso em um filme sobre o poder da internet, uma cena atropela a outra enquanto plots e questões são vomitadas na sua cara como um feed do facebook.

    Nudez, vidas feitas de aparências, julgamentos rasos acarretados de comentários online, hipocrisia dos que estão no poder, violência gratuita, masculinidade frágil e armamento são algun mas das temáticas tocadas durante toda a experiência, mas indo para tantos lados que naturalmente Assassination Nation perde o peso. Tudo parece ser construído para complexidades que nunca chegam a acontecer, muitos desses temas permanecem unidimensionais até o fim, final esse que abusa do caricato e do discurso direto, onde está a maior parte dos gatilhos prometidos de início. Mesmo que o roteiro se perca, essa característica gráfica de toda a situação agrade aqueles que gostam de horror, há sequências muito bem filmadas, o filme em si é visualmente muito bem resolvido, a estilização extrapola mas acerta a maioria das vezes.

    O elenco principal, formado pelas quatro amigas, é afiado e entrega algumas performances que lembram o ótimo Spring Breakers, Odessa Young e Hari Nef  têm as melhores cenas. Sam Levinson transparece em tela um ótimo trabalho com elenco e identidade visual, é bem intencionado a maior parte do tempo e instiga discussões pertinentes, tanto para os Estados Unidos quanto para o Brasil que recebe um novo governo em 2019, mas peca pelo excesso e por momentos manchados por uma certa pretensiosidade não muito bem-vinda. Assassination Nation nasce atual e arriscado, quase megalomaníaco, e deve ser assim ainda por um bom tempo.

    Texto de autoria de Felipe Freitas.

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  • Crítica | Suspiria (2018)

    Crítica | Suspiria (2018)

    Quantas vezes o cinema já nos fez questionar a existência de um remake? Em tempos que só grandes marcas atraem pessoas ao cinema, é cada vez mais comum surgirem projetos que buscam revisitar histórias que já deram certo, e na maioria esmagadora das vezes já deram o que tinham que dar. O Suspiria de 1977 realizado pelo italiano Dario Argento, um dos mestres do horror, tem a sua marca na história do gênero e se tornou um clássico, a ideia de fazer um refilmagem pareceu um equívoco desde o início. Porém, Luca Guadagnino entrega exatamente o que prometeu quando assumiu o projeto, uma reimaginação.

    Susie Bannion (Dakota Johnson) é uma dançarina de Ohio que vai até a Berlim de 1977 fazer uma audição para entrar numa renomada escola de dança comandada por Madame Blanc (Tilda Swinton) e um conjunto de mulheres. Após ter sucesso no teste, Susie conhece Sara (Mia Goth) e aos poucos vai construindo uma relação muito íntima com Blanc em ensaios intensos para um espetáculo. Enquanto isso, um psiquiatra da cidade busca o paradeiro de sua paciente Patricia (Chloe Grace Moretz), uma estudante da academia de dança que diz ter descoberto que as mulheres que comandam o lugar são bruxas.

    Desde os primeiros momentos do filme fica bem claro que o lugar é realmente comandado por bruxas, isso possibilita que tenhamos também a perspectiva deste grupo em momentos pontuais da narrativa, as conversas entre elas atravessam as cenas como os suspiros e passos faziam no original. É interessante e muito enriquecedor este núcleo de personagens pois além de humanizá-las de certa forma, também faz com que o exótico sobre a natureza delas não seja superficial, suas ações ganham mais peso. E o roteiro é muito feliz em estender esse trabalho de tridimensionalidade em todas suas outras narrativas, um exemplo é como a mitologia trabalhada por Argento em sua trilogia (Suspiria, Inferno e Mother of Tears) é aprofundada, fica evidente como o roteirista David Kajganich e o diretor entraram de cabeça no universo e beberam da fonte para criarem novos caminhos.

    E ao mesmo tempo que o longa abraça o sinistro de sua temática, é gostoso perceber como isso se relaciona a um mundo frio e de puro horror que a Berlim da época representava. Resulta em um contraste estilizado e bem dosado, Luca brinca com movimentos de câmera audaciosos e pontuais em meio a cores opacas e corpos performáticos, e o seu trabalho com o elenco é tão bom quanto em seus filmes anteriores. Johnson faz uma Susie ambiciosa e com uma coragem no olhar que a torna tão misteriosa quanto as mulheres que cuidam do lugar, de fato a melhor performance de sua carreira até então. Swinton por sua vez brinca com a fama de “camaleoa do cinema” e entrega não só uma performance, mas três, todas fascinantes. O longa não perde em suas coadjuvantes, que são muitas, mas Goth na personagem Sara traz um frescor que lembra as melhores heroínas dos filmes de horror, ansioso para seus próximos trabalhos.

    E quando se fala em entrelinhas, Suspiria deve corresponder de forma diferente para cada um, como já dito é um roteiro de muitas camadas e tridimensionalidades, as temáticas devem chegar das diferentes formas em diferentes espectadores. E deve ser esse um dos motivos da recepção mundial ter sido tão 8 ou 80. Mas Guadagnino não deve ter isso como uma surpresa, é um desafio reimaginar um filme clássico e ele conseguiu com mérito. O novo longa é atual e único, se encaixa no momento social que lidamos nesses tempos, como o feminismo, se encaixa no atual momento do gênero de horror no cinema, e há muito o que dizer. Um filme no ponto. Assustador ao nível de dar espaço ao belo enquanto tudo é caos, o final marcante é um exemplo disso. Dança é poder e poder é arte.

    Texto de autoria de Felipe Freitas.

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  • Resenha | Barcelona não é Espanha – Márcio Menezes

    Resenha | Barcelona não é Espanha – Márcio Menezes

    Barcelona Não É Espanha (Editora Rubra), do escritor carioca Márcio Menezes é um romance açucarado e despretensioso sobre vida em outro país. Despretensioso porque carrega o tom de uma conversa de bar, mas eficaz e muito bem estruturado sobre como a vida de um imigrante ilegal, nos tempos atuais, carrega uma esfera particular de caos e incerteza de que qualquer coisa, qualquer coisa mesmo, pode acontecer.

    Na trama, acompanhamos um personagem sem nome (alter ego do escritor?) que viaja com a namorada a Espanha para juntos se estabelecerem lá. A diferença é que ela tem um passe universitário e ele não. Os meses passam e a relação entre os dois, em um país estrangeiro, perde o sentimento que havia antes. Ela passa a trabalhar nos fins de semana para ganhar alguma renda e ele continua um “observador das ruas”, na melhor das hipóteses, aprendendo sobre aquela cidade e arranjando outros relacionamentos. A visão sobre a capital catalã se modifica. Se antes, os dois a observavam pelas propagandas como cosmopolita e acolhedora, logo começam a notar os moradores ultrapatriotas que depositam nos estrangeiros a causa de todos os males possíveis.

    Esse o ponto alto e reflexivo do livro: o desafio da imigração na nossa aldeia global (vide o trabalho do filósofo Marshall McLuhan). Menezes dialoga com outros escritores cosmopolitas, como Salman Rushdie, Amós Oz, Kazuo Ishiguro, e aqui no Brasil, Bernardo Carvalho, João Paulo Cuenca e Tatiana Salém Levi, por exemplo. A diferença, contudo, é que o imigrante ilegal de Menezes é um brasileiro tentando o passe definitivo no outro país, e descobrindo, ao contrário do que pensava, que o brasileiro se define mais como um luso-africano do que um latino-americano.

    Outro ponto muito positivo é que o texto de Menezes integra acontecimentos reais. Em várias passagens encontramos uma preocupação do autor em relatar quais acontecimentos políticos estavam acontecendo naquele momento e no futuro próximo de Barcelona. Novamente, não se trata apenas de uma obra de ficção, mas de uma espécie, guardada as devidas proporções, de um livro de jornalismo literário por conta da precisão de expor os fatos políticos e sociais que também afetavam a vida do personagem ficcional.

    Estilo despretensioso, acuidade ao relatar as informações reais, desventuras (você já doou sêmen, roubou obras de arte, foi cobaia para jovens cabeleireiros, foi iluminador de espetáculo pornô, para sobreviver?), sexo, perseguições, referências musicais espantosas, e nazistas, preenchem as páginas de Barcelona Não É Espanha.

    Texto de autoria de José Fontenele.

    Compre: Barcelona Não É Espanha – Marcio Menezes.

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  • Crítica | Suspiria (1977)

    Crítica | Suspiria (1977)

    Um dos mestres do horror no cinema, o italiano Dario Argento é responsável por um dos filmes mais importantes e cultuados do gênero, Suspiria de 1977, clássico que influenciou décadas e ganhou remake pelas mãos de Luca Guadagnino em 2018. Argento baseou-se no livro Suspiria de Profundis de Thomas De Quincey para criar a mitologia iniciada timidamente no longa, na qual três bruxas milenares espalham dor e morte sob o mundo, a Mãe das Trevas que reside em Nova York, a Mãe das Lágrimas em Roma e por fim, a Mãe dos Suspirios na Alemanha, esta última presente nesse primeiro capítulo da Trilogia das Três Mães, composta também por Inferno (1980) e Mother of Tears (2007).

    No longa, a dançarina americana Suzy Bannion viaja até Fribourg na Alemanha para começar seus estudos de especialização em uma renomada academia de dança, mas sua chegada é conturbada ao ver uma aluna fora de si correndo do lugar durante uma tempestade. No dia seguinte, a notícia do destino da moça recai sobre a academia enquanto Suzy conhece as misteriosas mulheres que coordenam a instituição, aos poucos mais pessoas vão sumindo e a protagonista passa a desconfiar que o lugar possa ser morada para uma antiga irmandade de bruxas.

    Uma coisa interessante revendo o longa é perceber o quanto a atmosfera criada por Argento é marcante, gostando ou não, é uma produção que permanece por muito tempo no espectador. De fato, o maior acerto do filme é o seu visual surrealista baseado em cores fortes e brilhantes, presente em iluminações com o pé no fantástico e em cenários perfeitamente realizados, em linhas e formas. Forma-se uma imagem tão original e hipnotizante que assistir ao filme é como assistir a um pesadelo tão belo quanto sinistro, uma experiência imersa em paisagens sonoras incríveis, são sequências inteiras acompanhadas de murmúrios, gemidos e suspiros, com uma música poderosa criada pela banda de rock progressivo “Goblin”.

    Da parte do elenco, as mulheres que cuidam da escola são responsáveis por uma boa estranheza, algumas não tiram sorrisos assustadores dos rostos e
    outras assustam pelas palavras mansas e mascaradas, já as alunas da academia entregam ótimas cenas de perseguição quando Argento brinca de slasher, brincadeira essa que resulta em sequências memoráveis do longa, seja pelos gritos estridentes, o sangue estilizado ou pela violência gráfica que chega a arrancar risadas nervosas. A protagonista Suzy tem uma interpretação esforçada de Jessica Harper, é nela que o roteiro chega a funcionar pontualmente ás vezes, expondo sua personalidade quase sagaz e sua coragem.

    Porém o roteiro não volta a agradar em outras situações, é um argumento interessante que não sabe se desenrolar, os dois primeiros atos soam rasos
    narrativamente, e o final se apressa e não entrega o clímax que Argento parece ter a intenção de construir nos minutos finais, mas além desses últimos momentos o longa não perde em ritmo e nem em suspense. Mesmo expondo pouco do universo que se passa essa história, Argento sabe implantar doses de mistério que fazem o engajamento ir até o fim. E quando aparecem os créditos é muito fácil entender porque Suspiria é o que é, um suspiro refrescante num gênero que Argento tanto contribuiu.

    Texto de autoria de Felipe Freitas.

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  • Resenha | Primeiros Dias do Verão Eterno – Roger Lombardi

    Resenha | Primeiros Dias do Verão Eterno – Roger Lombardi

    Primeiros Dias do Verão Eterno (Editora Patuá), do escritor paulista Roger Lombardi é um agradável livro de contos que aviva o tema do estranhamento, do fantástico, do misterioso, assuntos significativos na Literatura Brasileira (latino-americana, principalmente) e resgata nomes como Murilo Rubião, Campos de Carvalho, mas até Machado de Assis, Aluísio Azevedo, Júlia Lopes de Almeida e Bernardo Guimarães.

    Mas vamos nos ater aos vivos. O livro de Lombardi nos apresenta 8 contos reunidos pela costura do estranhamento. Efeito dos mais potentes, em Literatura, as histórias extraordinárias (para fazer um paralelo com Poe), têm o poder de nos lançar um novo olhar ou entendimento sobre uma situação aparentemente normal ou corriqueira. E o autor faz isso muito bem em seus textos. Logo no primeiro conto “A macieira”, uma árvore dada a Josué por, ele acredita, Deus, desperta toda a vaidade do homem a ponto de ele se tornar um assassino a sangue frio de quem ousa tomar aquelas maçãs.

    Em “A cadeira”, na minha opinião o melhor do livro, as pessoas ficam em estado vegetativo ao se sentar em uma aparentemente simples cadeira em estilo barroco. Lombardi cria uma atmosfera incomum que gradualmente vai conquistando a ansiedade do leitor porque o mistério do móvel parece insolúvel e mirabolante. O desenvolvimento da trama é sólido, conciso, e passaram por minha cabeça Edgar Allan Poe, H. P. Lovecraft e principalmente “Ficções”, de Jorge Luis Borges.

    Aliás, sobriedade talvez seja uma das grandes qualidades do livro. Mesmo em histórias insólitas, não se pode colocar um dragão ou outro animal fantástico sem qualquer explicação na sala de jantar. O risco é o escritor se empolgar com a figura mencionada e esquecer de contar a história por trás daquele acontecimento. Em “A carona”, por exemplo, Lombardi se utiliza da figura de um anjo, contudo, diminui sua importância para que nos esqueçamos dele ou duvidemos que seja de fato um ser celestial. O efeito funciona porque, quase ao fim do conto, com a expectativa baixa do leitor, o autor utiliza o potencial do seu personagem fantástico para criar um final impactante e não premeditado. Os desfechos são o ponto forte; as histórias terminam com o gancho de Julio Cortázar.

    Contudo, tenho que deixar claro que algumas coisas poderiam ser melhoradas. O livro conta com alguns erros de revisão que acabam funcionando como quebra-molas inesperados da leitura; outras vezes peguei alguns trechos com rima ou eco entre as frases e isso não é muito agradável tendo em vista que uma das qualidades de uma boa escrita é a variabilidade de palavras utilizadas.A impressão é que embora os textos estejam bem estruturados com começo, meio e fim, com a temática bem costurada e precisos ao atingir seu efeito, alguns contos parecem mais acabados para alcançar todo o seu potencial. “A macieira” e “O oficial”, por exemplo, me pareceram menos trabalhados que as outras histórias.

    Este é o segundo livro de Lombardi e espero que o autor continue por esta vereda. Livro indicado para leitores do insólito e para quando notamos nossa cabeça embaralhada demais com o evidente cotidiano que nos atinge. Autores e leitores do incomum, uni-vos.

    Texto de autoria de José Fontenele.

    Compre: Primeiros Dias do Verão Eterno – Roger Lombardi.

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  • Resenha | O Longo Adeus a Pinochet – Ariel Dorfman

    Resenha | O Longo Adeus a Pinochet – Ariel Dorfman

    O Longo Adeus a Pinochet (Companhia das Letras), de Ariel Dorfman é um livro que mistura momentos de jornalismo literário e crônica política sobre a História chilena. O ponto de partida é a informação sobre a prisão do ex-ditador chileno Augusto Pinochet, em Londres, em 1998. A partir daí, o autor, que trabalhou para o ex-presidente Salvador Allende antes do golpe, agora exilado, percorre meio-mundo para recontar a memória do Chile e exigir justiça contra o ditador.

    A narração é ágil, mistura elementos do presente e do passado, e a impressão que temos é que Dorfman quer explicar muita coisa em pouco espaço porque algo impressionante irá acontecer. A escrita é ansiosa; como se o escritor estivesse a segundos de Pinochet e quisesse mostrar ao leitor a face mais profunda da ditadura chilena para que o motivo alegado pelo ex-general (insanidade mental), não cole para aliviar a pena dele. Dorfman é um participante da História do Chile.

    Como ex-assessor do ex-presidente Allende, primeiro presidente socialista eleito democraticamente na América Latina, o escritor viu a ditadura engolir os seus amigos e outros milhares de chilenos; Dorfman viu pessoas desaparecerem, bairros desaparecerem e, acompanhou, com a esperança de um exilado aos dezessete anos, que o crime do ex-general finalmente fosse julgado. Com a prisão do genocida, Dorfman quer observar e exigir justiça da primeira fila. Para isso, não cai no mérito legal do caso, coisa que poderia tornar o texto labiríntico e de difícil compreensão, ao invés, o autor se atém aos significados políticos e simbólicos dessa condenação.

    O passado perpassa o presente. A todo o momento temos flashbacks de uma história que ainda se repete: repressões, mortes, desaparecimentos, violência de todo o tipo, atrocidades, tudo documentado pelo escritor. Por isso a escrita de Dorfman é urgente, um grito que demorou anos para ganhar o mundo. O escritor acompanha o processo e, em uma narração que beira o autobiográfico, nos entrega um relato forte sobre a necessidade que os crimes cometidos contra a humanidade possam ser julgados em outros países.

    Texto de autoria de José Fontenele.

    Compre: O Longo Adeus a Pinochet – Ariel Dorfman.

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  • O Mercado Literário das Editoras Independentes | Editora Dublinense

    O Mercado Literário das Editoras Independentes | Editora Dublinense

    Para a quarta entrevista da série de Editoras Independentes do Vortex Cultural, conversamos com o editor Gustavo Faraon, da gaúcha Dublinense. A editora surgiu a partir da Não Editora, em 2009, e tem como objetivo um catálogo eclético, de valor literário e comercial, com literatura brasileira e estrangeira de ficção, negócios, humanidades, esportes, música e viagens. Confira o catálogo da editora em http://www.dublinense.com.br/livros/, mas não sem antes conferir a entrevista abaixo sobre o mercado editorial e o período de baixa do setor livreiro.

    Vortex Cultural: O mercado literário nacional segue a mesma perspectiva do país e passa por uma fase continuada de crise. Contudo, como explicar o surgimento de editoras independentes, bem como o maior espaço conquistado por elas, entre os leitores?

    Gustavo Faraon: Mas crise é oportunidade, sempre. E é justamente na esteira das (grandes) brechas deixadas pelas grandes e médias editoras que pequenas e minúsculas casas editoriais estão conseguindo atuar, com sucesso, sobretudo em nichos específicos.

    Vortex Cultural: A queda do número de livros vendidos parece estar concentrada nas grandes editoras (Companhia, Record e Sextante, principalmente). Isso significa que o modelo de trabalho das grandes editoras está ultrapassado?

    Gustavo Faraon: Acho que a queda não é exclusividade dos grandes. Muitos pequenos editores estão sofrendo muito nesse período. E, claro, esses momentos são sempre oportunidade pra todo mundo rever tudo, mas acho que é precipitado dizer assim de maneira peremptória que o modelo está ultrapassado. Sem dúvida precisa ser renovado e revigorado, mas tudo precisa, o tempo todo, dessa constante readequação, né? Então eu diria calma. (risos)

    Vortex Cultural: Outro grande problema para o mercado é que as grandes livrarias não estão repassando o dinheiro das vendas às editoras. Atualmente, o pior lugar para vender livro é em uma livraria? Por quê?

    Gustavo Faraon: Não é o pior lugar. As livrarias são importantíssimas enquanto espaços de descoberta, e o papel do livreiro me parece mais importante do que nunca. A questão é que um certo modelo de livraria me parece, este sim, um pouco esgotado, que é o modelo de servir como simples entreposto comercial de livros, sem curadoria, sem identidade, etc.

    Vortex Cultural: Quais são os melhores parceiros para uma editora independente? Influenciadores digitais (booktubers, resenhistas de blogs, perfis de Instagram sobre livros etc) são os melhores aliados para vendas?

    Gustavo Faraon: Jornalistas, booktubers, instagramers, blogueiros, livreiros, curadores de eventos, mesmo agentes, pessoas à frente de instituições culturais e de fomento, gráficos, e voltando pra antes da produção, designers, revisores e até parceiro logístico. Todas as pessoas são muito importantes de se ter como parceiros de verdade.  E não é raro que as coisas se misturem. Um booktuber ou blogueiro que vai escrever uma resenha num jornal de grande circulação, um jornalista que vai virar curador de evento, e assim por diante. A coisa é complexa.

    Vortex Cultural: Por vezes as editoras independentes passam uma ideia de maior proximidade com o público que lê seus livros. É no melhor relacionamento com seus leitores que uma editora independente encontra sucesso? Quais outras características destaca como fundamentais?

    Gustavo Faraon: Sim, é verdade que esse relacionamento muito próximo existe de fato na maioria das vezes. E isso ajuda a editora a ficar mais atenta ao que pode ser legal pros seus leitores. Em grande parte isso acontece porque o editor é que vai contatar os blogueiros e booktubers, vai conhecer eles, é o editor que vai montar a mesa na feira, fazer a venda, conversar e ouvir os leitores, então digamos que é uma proximidade muito orgânica com todas as partes do processo e sobretudo com o público.

    Vortex Cultural: Por fim, qual comentário/informação acha pertinente destacar quando tratamos de editoras independentes?

    Gustavo Faraon: Que o conceito é amplo, impreciso, e que as editoras independentes TAMBÉM são muito diferentes entre si, e isso é que é lindo.

    Texto de autoria de José Fontenele.

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  • Resenha | Uma Dobra no Tempo

    Resenha | Uma Dobra no Tempo

    Uma Dobra no Tempo, é uma graphic novel publicada pela Darkside Books, baseada em um livro homônimo de fantasia e ficção cientifica escrito por Madeleine L’Engle (lançado em 1962). A adaptação ficou a cargo da quadrinista Hope Larson, e a tradução foi feita por Érico Assis.

    Em Uma Dobra no Tempo acompanhamos a odisseia interplanetária da garota Meg e seu irmão Charles Wallace para reencontrar seu pai, Dr. Murry,um brilhante cientista desaparecido há 2 anos. Calvin O’Keefe, um amigo muito leal, ainda se junta à aventura dos irmãos. A jornada começa com as senhoras Sra. Quequeé, a Sra. Quem e a Sra. Qual, uma trindade mística e desconhecida. As três velhinhas emulam outras trindades mitológicas como as Parcas, Graças e Fúrias (só para ficar na Mitologia Grega), e funcionam como as mentoras da história, explicando que sabem do paradeiro do cientista e que um grande mal ameaça o pai deles e a Realidade.

    Aos poucos, os personagens principais são apresentados à Sombra, um princípio oposto à vida. Mitologicamente falando, trata-se do Caos, um grande abismo indefinido que pretende abocanhar todos os universos. A diferença é que no quadrinho temos uma espécie de planeta onde a Sombra tomou conta das pessoas e é justamente lá que Dr. Murry está preso de forma inescapável.

    A história toda é uma metáfora de crescimento e enfrentamento das nossas fraquezas. Ao seguir a aventura de personagens adolescentes lutando contra uma Sombra primordial, talvez a própria que também criou o universo, observamos as escolhas deles na disputa contra seus lados negativos ou desconhecidos. Há uma (re)descoberta de afetos, segredos familiares, empatia, amizade e bravura.

    Na questão gráfica, Larson optou por quadrantes bem definidos sem invasão gráfica, notas de um estilo sóbrio e vintage. Os quadrinhos têm boa forma e facilmente conseguimos entender a sequência de diálogos e cenas. A quadrinista optou por uma tonalidade fria onde o preto, cinza e azul ganham as páginas com facilidade e não temos desenhos com riqueza de minúcias. Destaque para a edição em capa dura e o acabamento luxuoso, o que mostra, mais uma vez, o apreço da editora pelo produto que comercializa. Excelente edição, grande história e ótima dica de leitura!

    Texto de autoria de José Fontenele.

    Compre: Uma Dobra no Tempo.

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  • Crítica | O Conto

    Crítica | O Conto

    O Conto não é um filme comum. E nem fácil. A cineasta Jennifer Fox escreve e dirige sua própria história real de quando descobriu que ela foi vítima de abuso sexual aos 13 anos, o longa que é estrelado pela sempre boa Laura Dern, foi muito elogiado em Sundance e está sendo distribuído pela HBO. Esse primeiro filme fictício da diretora acaba se aproveitando da sua veia autobiográfica e traz uma perspectiva muito original da temática, é como presenciar as memórias mais íntimas de uma pessoa.

    Um dia a documentarista Jennifer Fox recebe uma ligação de sua mãe revelando que encontrou um conto que Jennifer escreveu aos 13 anos de idade, o qual narra em detalhes o abuso sexual sofrido pelo seu até então professor. Surpreendida pelo conteúdo do texto, a personagem de Dern sai em uma complexa busca por memórias escondidas que contrariam a versão da história que ela acreditava ser a verdadeira, enquanto compreende como teu presente fala tanto sobre seu passado.

    Extenso, o longa não denuncia sua duração por conta do ritmo balanceado do filme, Fox utiliza muito bem as peças que tem em mãos em seu favor, ficção e documentário se misturam homogeneamente para uma história autobiográfica muito dura. Aos poucos que a personagem central embarca nos questionamentos que a guiarão até o final, as primeiras reações dela são críveis e se beneficiam pela performance de Dern, a atriz reconhece a importância de seu papel e faz a altura, mas quem pega o filme pra si é quem encarna a jovem Jennifer de 13 anos, Isabelle Nélisse, é chocante para o espectador acreditar no absurdo das situações pelos olhares carregados de confusão da garota.

    O filme, inclusive, alterna entre as perspectivas de passado e presente de forma muito íntima, ficamos imersos nos pensamentos da personagem de maneira orgânica, tanto pelo roteiro quanto pelas escolhas fotográficas. Quando a jovem Jennifer conversa com a Jennifer já adulta, fica claro o sensível trabalho da diretora neste trabalho, o quão profunda é a dúvida? O que criamos pra deixar as coisas para trás? O Conto instiga e aponta exatamente onde deve, mesmo que algumas personagens permaneçam nebulosas, criando sobras no material final. Um filme pessoal e muito forte, e talvez uma das produções mais importantes na atual Hollywood do movimento #MeToo.

    Texto de autoria de Felipe Freitas.

    https://www.youtube.com/watch?v=e6Vi_K0M93c

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  • Review | Os Defensores – 1ª Temporada

    Review | Os Defensores – 1ª Temporada

    Após a estreia de Agentes da S.H.I.E.L.D, a primeira vez que se teve notícia de um novo seriado em que heróis da Marvel que não apareceriam no UCM – Universo Cinematográfico Marvel foi em 2013, quando foi anunciada uma parceria entre a Disney e a Netflix. Seria produzido então, uma temporada para maiores com um dos heróis mais queridos da Marvel: o Demolidor. A ideia era desenvolver a série do homem sem medo, respeitando a sua essência apresentada nos quadrinhos, se afastando e colocando, de vez, uma pá de cal por cima do túmulo da adaptação estrelada por Ben Affleck. Obviamente, o projeto não era simplesmente trazer o Demolidor para as telas, mas fazer com a Netflix o mesmo que a Marvel fez nos cinemas, criando um bloco maciço de heróis, com seus filmes solo e, consequentemente, colocando esses heróis juntos em tela, como aconteceu com os Vingadores. Tinha como objetivo reunir os Defensores para uma grande temporada. Além de Demolidor, que, à época, ganhou duas temporadas, Jessica Jones teve seus momentos de glória, assim como Luke Cage e, posteriormente, Punho de Ferro.

    Os primeiros trailers levaram o público à loucura, principalmente por causa da trilha sonora, embalada pelo contrabaixo e guitarra característicos, somada à voz única de Kurt Cobain em Come As You Are, uma clássico do Nirvana, e também pela interação entre Matt Murdock, Jessica Jones, Luke Cage e Danny Rand, personagens com características e humores extremamente heterogêneos, que nas imagens rendiam diversas alfinetadas e zoações, principalmente vindas de Jones, que quem a conhece sabe que se trata de um ser insuportável (no bom sentido).

    Era tudo tão promissor que a decepção, infelizmente foi alta.

    Os personagens seguem suas vidas exatamente dos pontos em que elas pararam em seus próprios seriados. Danny Rand, o Punho de Ferro (Finn Jones), continua viajando pelo mundo, junto de sua escudeira, Colleen Wing (Jessica Henwick), caçando o Tentáculo, sendo que, em sua última empreitada, o coloca de volta a Nova Iorque para uma investigação. Luke Cage (Mike Colter) deixa a prisão e volta para o Harlem, onde fica sabendo que jovens do bairro estão desaparecendo misteriosamente. A detetive particular Jessica Jones (Kristen Ritter) recebe uma ligação misteriosa sobre o desaparecimento de um funcionário de uma empresa que pode estar metida num perigoso empreendimento. Tudo isso acaba chamando a atenção da policial Misty Knight (Simone Missick), que prende Jones. É quando o advogado Matthew Murdock (Charlie Cox) entra em cena para defender a heroína mal humorada. Enquanto isso, somos apresentados a quem parece ser a principal vilã da série, Alexandra, vivida de maneira espetacular por Sigourney Weaver, e que parece ser a líder do Tentáculo, que até então não tinha aparecido em cena.

    Infelizmente demora para vermos todos os heróis juntos em cena. Claro que eles se encontram de maneira separada e isso rende bons momentos, como a primeira vez que Luke Cage enfrenta o Punho de Ferro, mas não demora muito para percebermos que os quatro, na verdade, estão investigando o mesmo assunto, que envolve aquele enorme buraco no chão que vimos na segunda temporada de Demolidor.

    Infelizmente, a série tem sérios problemas de ritmo e se torna muito arrastada em diversos momentos, tendo como seu melhor momento a primeira vez que os quatro se encontram, o que rende uma pancadaria em modo cooperativo, pois precisam fugir de um determinado local. Nem mesmo o retorno de Stick (Scott Glenn), enche de esperança os mais otimistas. Os ótimos trechos do trailer aparecem numa única cena e as piadas e alfinetadas mencionadas acima, já nem possuem tanto peso e graça. Outro ponto que deixou a desejar, foi em algo em que todos os heróis tem de melhor: a luta. Ora, Murdock é praticamente um ninja sinistro, tendo habilidades absurdas na luta, assim como Rand na arte do Kung Fu, aliado com seu punho, somados a Cage e Jones que sempre foram bons de briga. Mas em Os Defensores, as lutas são todas sem graças e muito mal feitas. Ok, não seria justo falar mal feitas, mas totalmente aquém do que se espera quando se trata desses personagens, principalmente quando se trata do Demolidor, cujas as sequências de luta da primeira temporada são fantásticas. Outro ponto que atrapalha e que é algo perdoável é a ausência de uniformes, o que limita a interatividade de Murdock com o restante do elenco, uma vez que o Demolidor é o único de fato a usar um traje de herói.

    Na série, não sobrou espaço para os coadjuvantes. Misty (que aqui tem uma história de origem) e Colleen são os mais acionados e possuem bons tempos de tela, ao contrário dos queridos Claire Temple (Rosario Dawson), Foggy Nelson (Elden Henson), Karen Page (Deborah Ann Woll), Trish Walker (Rachael Taylor) e Malcolm Ducasse (Eka Darville), que ficam boa parte do tempo escondidos no departamento de polícia para que se mantenham seguros.

    E para piorar a situação, a Disney está desenvolvendo seu próprio serviço de streaming e os seriados solo vem sendo cancelados de maneira implacável e será muito difícil ver os Defensores em tela novamente. Precisamos torcer para que haja uma espécie de migração dos atores, saindo da Netflix e indo para a casa do Mickey Mouse. Só assim para vermos os heróis reunidos novamente, numa, quem sabe, segunda chance. Ainda assim, é uma série que vale a pena ser conferida.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

  • Crítica | O Mau Exemplo de Cameron Post

    Crítica | O Mau Exemplo de Cameron Post

    Como um irmão gêmeo do aguardado Boy Erased, O Mau Exemplo de Cameron Post fez barulho em Sundance desse ano ganhando o Prêmio do Júri ao trazer uma discussão muito delicada. Nossa personagem principal – interpretada pela veterana de 21 anos Chloe Grace Moretz – tem um namoro morno e uma relação limitada com sua tia, que cuida dela desde que seus pais morreram. Na noite do baile do colégio, Cameron e sua melhor amiga são flagradas aos beijos e isso faz com que ela seja enviada para um lugar que promete acabar com todos os comportamentos não-heterossexuais pelos estudos da Bíblia.

    Se em primeira instância, esperamos que a personagem de Chloe seja fortemente contrária às circunstâncias pelo efeito de narrativa, é neste momento que percebe-se que Desiree Akhavan, diretora do filme, caminha pelas sutilezas. As reações de Cameron refletem bem o turbilhão de pensamentos de uma adolescente em sua situação, elas são confusas, mínimas, praticamente incompletas, como se ela não tivesse certeza nem de quem é, do que sente, e se ela merece ou não estar naquele lugar.

    O filme só ganha quando deixa de lado soluções fáceis e opta por questionamentos carregados de culpa por parte da protagonista, e Chloe Grace Moretz entrega uma das suas melhores interpretações da carreira com esses recursos. O restante do elenco também se mostra bem e presente, mesmo que as personagens parem no meio do caminho de seus próprios desenvolvimentos, ao final da produção fica claro que isso é um problema ainda maior vendo o roteiro como um todo. Apesar da temática iniciar de forma promissora, a conclusão soa como rasa.

    O Mau Exemplo de Cameron Post trata bem de perspectivas divergentes e complexas em um coming of age, e escancara pelos detalhes as óbvias problemáticas de um lugar que usa a Bíblia como arma. É um filme pertinente para o mundo todo, mas se perde em desenvolver suas personagens e sua narrativa linear sem altos e baixos,  sendo quase episódico. Porém, apesar dos problemas, o filme vale pelos ganhos.

    Texto de autoria de Felipe Freitas.

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  • Resenha | Wayne de Gotham – Tracy Hickman

    Resenha | Wayne de Gotham – Tracy Hickman

    O Batman é, sem dúvida, um dos maiores heróis já criados. Preferido pela maioria das pessoas, o homem morcego, vivido pelo milionário Bruce Wayne, guarda diversos segredos, muitos deles devidamente apresentados, seja nos quadrinhos, seja nos filmes. Porém, talvez o maior segredo ainda não tinha sido revelado. Até agora.

    Coube a um veterano, Tracy Hickman, contar uma história nunca antes contada e para isso, pega como ponto de partida o já batido ”gatilho”, que transforma de uma maneira muito precoce o jovem Bruce Wayne em homem: o assassinato de seus pais.

    Talvez, o assassinato de Thomas e Martha Wayne seja a cena mais mostrada e recriada de toda a cultura pop. Além de vermos diversas vezes nos quadrinhos e nas animações, vimos algumas vezes na tela do cinema, como em Batman, Batman Eternamente, Batman Begins, em Batman vs Superman: A Origem da Justiça e no seriado Gotham. Aliás, como um easter egg super secreto, também temos algo sobre isso na abertura de Watchmen, onde, numa capa de jornal, podemos ver que o Coruja consegue impedir o assalto, salvando a família Wayne de seu trágico destino. Porém, impossível não falar da morte dos pais de Bruce quando se trata de Batman. Impossível não falar nesse drástico evento quando se trata de Wayne de Gotham.

    Na obra escrita por Hickman, Bruce Wayne, mais detetive do que nunca, está investigando sobre a morte de seus pais, e ao descobrir um diário, viaja de maneira interna para a Gotham do passado, onde um Thomas Wayne, médico recém-formado, se entrelaça de maneira bastante íntima com sua cidade natal. A mudança temporal é algo que acontece o tempo todo e não cansa o leitor.

    Um dos destaques do livro é que o autor consegue caminhar abertamente por diversos temas e gêneros, deixando o livro com uma cara de thriller policial de suspense, flertando diversas vezes com o drama, fazendo com que o Batman seja mais detetive do que herói, o que é um sonho para muitos fãs. Além disso, os principais antagonistas, coadjuvantes e parceiros do morcego estão lá. Podemos ver relações estreitas com o Coringa, com Alfred e até com o Comissário Gordon, o que mostra que a relação de Thomas Wayne com a cidade e seus segredos, tem um peso absurdo nas costas de Bruce que vai muito além da “simples” morte de seus pais.

    Uma das vantagens do romance é que o leitor, ao acompanhar as linhas escritas, pode usar da sua imaginação, recriando os momentos como se estivesse na sala do cinema, o que é um trunfo, e demonstra também as claras intenções de Hickman em um dia ver sua obra na tela do cinema, seja em filme ou animação, dada a precisão quase cirúrgica das situações, principalmente nos momentos de ação.

    Wayne de Gotham é uma grata surpresa e se torna uma leitura obrigatória para os fãs do Batman, mesmo muitas pessoas considerarem a obra como um caça níquel que busca apenas procurar pelo em ovo. Mas na verdade, Gotham tem muito mais mistérios que você imagina. Basta colocar na página 1 para perceber isso.

    Compre: Wayne de Gotham – Tracy Hickman.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

  • O Mercado Literário das Editoras Independentes | Arte e Letra

    O Mercado Literário das Editoras Independentes | Arte e Letra

    Thiago Tizzot, editor da curitibana Arte e Letra, é o quinto entrevistado da série do Vortex Cultural com editoras independentes. A editora nasceu em 2001 com a proposta de publicar livros que os donos gostariam de ler, depois, em 2006, nasceu a livraria homônima, na Alameda Dom Pedro II, 44, que se tornou point literário de cafés em Curitiba. Conheça o catálogo da editora em https://www.arteeletra.com.br/loja e confira a entrevista abaixo com o editor sobre como as editoras independentes atuam nesse momento de baixa do setor literário.

    Vortex Cultural: O mercado literário nacional segue a mesma perspectiva do país e passa por uma fase continuada de crise. Contudo, como explicar o surgimento de editoras independentes, bem como o maior espaço conquistado por elas, entre os leitores?

    Thiago Tizzot: Eu não sei se o surgimento de mais editoras tem uma ligação com a continuada crise que o país enfrenta. Acho que está mais ligado com um esgotamento do formato de consumo das pessoas. Há alguns anos era a busca pelo padrão, todo mundo queria o mesmo tênis, a mesma marca de roupa, participar do mundo. Hoje a procura é por coisas únicas, o comércio local, objetos individuais. E nesse ponto a editora independente pode fazer muito bem esse papel.

    Vortex Cultural: A queda do número de livros vendidos parece estar concentrada nas grandes editoras (Companhia, Record e Sextante, principalmente). Isso significa que o modelo de trabalho das grandes editoras está ultrapassado?

    Thiago Tizzot: Não só das grandes editoras, é mais difícil para elas porque precisam de um número muito expressivo de vendas para se manter. Mas o modelo de negócio do livro passa por uma mudança e ainda é algo que está acontecendo e não se pode dizer onde ele vai parar.

    Vortex Cultural: Outro grande problema para o mercado é que as grandes livrarias não estão repassando o dinheiro das vendas às editoras. Atualmente, o pior lugar para vender livro é em uma livraria? Por quê?

    Thiago Tizzot: O problema do repasse de dinheiro vai mais para o fato de que as grandes livrarias estão ultrapassadas e precisam se reinventar para poderem ficar saudáveis novamente. Por outro lado, temos livrarias independentes que são uma ferramenta importante de venda para as editora menores. O que aconteceu é que existem outras alternativas para a venda de livro. Mas vender livro é na livraria.

    Vortex Cultural: Em quais características diferem o modelo de negócios de uma editora independente e de uma de maior porte? Comente as que considera principais.

    Thiago Tizzot: As diferenças passam muito pelas dificuldades que cada um enfrenta. Por exemplo, uma editora grande precisa de muitas vendas para ter um sucesso e às vezes isso leva a busca por livros que tenham um potencial de vendas enorme. A independente não precisa de um número tão grande para ter um sucesso, claro que ela que vender muito, mas não precisa porque seu tamanho é menor. A consequência disso é que as grandes são muito mais pautadas pelo potencial de vendas e as independentes podem se concentrar mais na qualidade e no livro em si. Outro, claro, é o poder de investimento, as independentes dependem muito do custo do projeto para poder realizar um livro, nas grandes o limite é muito maior.

    Vortex Cultural: Quais são os melhores parceiros para uma editora independente? Influenciadores digitais (booktubers, resenhistas de blogs, perfis de Instagram sobre livros etc) são os melhores aliados para vendas?

    Thiago Tizzot: Um dos grandes desafios das independentes é fazer com que seus livros sejam notados nesse mar de lançamentos que acontecem todo o mês. Sem dúvida os meios digitais são um caminho para isso e com a falência dos cadernos sobre livros nos jornais e revistas a internet cada vez mais acaba sendo o único meio para se divulgar. Mas os melhores aliados para uma editora independente são seus autores e leitores. Nada melhor do que contar com um autor que compreende o trabalho da editora e sabe que a sua atuação é decisiva para o sucesso de um livro.

    Vortex Cultural: Com o maior número de editoras, feiras literárias independentes despontam e ganham corpo pelo país. Você acredita que essas feiras concorrem com as livrarias? Por quê?

    Thiago Tizzot: Não, elas se completam. A feira é um lugar efêmero, onde você pode encontrar escritores e editores, entrar em contato com a produção de um livro conversando com as pessoas. E lá os leitores conhecem outros livros e editoras que vão estar na livraria. A feira cada vez mais se torna um lugar para divulgação do trabalho das editoras independentes que se completa com uma futura venda nas livrarias.

    Vortex Cultural: Por vezes as editoras independentes passam uma ideia de maior proximidade com o público que lê seus livros. É no melhor relacionamento com seus leitores que uma editora independente encontra sucesso? Quais outras características destaca como fundamentais?

    Thiago Tizzot: Muitas vezes quando você entra em contato com uma editora independente você conversa com os donos, editores, com as pessoas que fazem os livros e isso, claro, gera uma empatia. Quando acontece essa proximidade a chance do leitor se interessar pelo trabalho é muito maior, uma vantagem que as independentes têm em relação as grandes. A outra coisa é a oportunidade de oferecer uma variedade de livros e autores, algo novo e original.

    Texto de autoria de José Fontenele.

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  • Crítica | Duro de Matar 4.0

    Crítica | Duro de Matar 4.0

    Duro de Matar é uma das bem mais sucedidas franquias do cinema. Ainda que tenha somente cinco filmes, as aventuras vividas pelo policial nova iorquino, John McCLane, sempre estrelado por Bruce Willis, caíram no gosto do público. O McCLane de Willis parece sempre de mal humor, regado de ironias, sarcasmos e cinismos e aparenta ser gente como a gente. É fácil nos enxergar em várias situações vividas pelo personagem.

    A franquia estabeleceu algumas regras básicas: McCLane deve sempre estar no lugar errado e na hora errada, assim como algo que já foi estabelecido com Max Rockatansky em Mad Max. Se no primeiro filme McCLane viaja até Los Angeles para surpreender sua esposa e se vê no meio de uma conspiração com feridos e reféns, no segundo, vai até Washington buscar a mulher no aeroporto e acaba por impedir um atentado terrorista e no terceiro, em casa, lida com um terrorista que tem interesses pessoais com McCLane e que coloca em risco toda a cidade de Nova Iorque. Já neste Duro de Matar 4.0, um pouco das regras são mudadas e McCLane, um policial “das antigas”, precisa lidar com o cyber terrorista Thomas Gabriel (Timothy Oliphant), após ser escalado pelo FBI para escoltar um hacker chamado Matt Farrell (Justin Long). Após McCLane e Farrell sofrerem um ataque, o policial percebe que seu dia será longo demais, mais uma vez.

    Devemos lembrar que os três primeiros filmes lidam com o terrorismo de uma maneira mais “aberta”, principalmente na segunda e terceira fita, onde as explosões e violência são escancaradas. Mas também, era uma época pré 11 de setembro, uma época até então que as nações (principalmente a americana) acreditavam ser indestrutíveis. É fato que o maior atentado terrorista da história mexeu com os americanos e mudou a maneira de se fazer cinema, mudando também, John McCLane. Por isso, colocar McCLane para enfrentar um cyber terrorista (após diversas mudanças no roteiro), talvez tenha sido a decisão mais acertada, mas também a mais errada.

    Claro que esperávamos a famosa interação do “tiozão” com as máquinas. Prevíamos boas situações constrangedoras, como piadas com a idade e coisas do tipo, mas a verdade é que não funcionou. Primeiro porque realmente faltou sensibilidade dos roteiristas em desenvolver algo que soasse mais natural na relação do nosso herói com o mundo das máquinas. Segundo porque a relação de McCLane com seu sidekick da vez não tem química alguma, ainda mais após termos um filme com Bruce Willis e Samuel L. Jackson em cena, algo que funcionou de maneira certeira. E por último porque o jeito “chato” de McCLane, dessa vez, não convence como antes.

    O maior problema de Duro de Matar 4.0 é que McClane virou justamente o que criticava, no caso, oherói perfeito, que é praticamente indestrutível. Como paródia de si mesmo, virou uma paródia da subversão que personificou.

    Ainda assim, o filme rende bons momentos e são nos momentos em que o protagonista está em terreno seguro, leia-se deboche, ação e pancadaria, como na perseguição de carros no primeiro ato, ou na cena em que enfrenta Mai Linh (Maggie Q), no segundo ato e quando dirige um caminhão, no terceiro ato (e que descamba para uma cena bem desnecessária que envolve um caça). Ah, a participação de Kevin Smith como um “nerd supremo” também é muito boa.

    A sorte de Duro de Matar 4.0 é que existe o quinto filme, que é extremamente ruim, sendo que um sexto filme está em desenvolvimento. Só nos resta aguardar e torcer para vermos o bom e velho John McCLane de volta.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

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  • Elseworlds | O Mega Crossover do Canal CW

    Elseworlds | O Mega Crossover do Canal CW

    O conceito do multiverso sempre existiu no universo da DC nos quadrinhos. Para quem ainda não está familiarizado, o multiverso é uma teoria onde existem diversos mundos paralelos com diversos tipos de realidade. No caso da DC Comics, existem diversas Terras, onde heróis como Superman, Batman e etc podem ser vilões, ou até mesmo heróis sob outros nomes, assim como vilões podem ser heróis, sendo as possibilidades infinitas. No universo da DC nas telas, capitaneada pela CW, não foi diferente, sendo que o multiverso já foi introduzido há tempos no seriado do Flash e o mega crossover do canal, nesse ano de 2018 veio pra mostrar que o multiverso é real e coloca praticamente tudo que já vimos sobre a DC Comics, seja nos seriados, seja nos cinemas, dentro do deste mesmo conceito e isso inclui de maneira espetacular o Flash do seriado dos anos 90; Smallville; o Superman vivido por Christopher Reeve e, até mesmo, os filmes do Batman, que foram dirigidos por Christopher Nolan, claro que nas suas devidas proporções, algumas delas apresentadas apenas como easter eggs.

    Elseworlds começa na Terra 90. Vemos um campo de batalha onde diversos heróis (que parecem ser da Sociedade da Justiça) estão mortos. O último sobrevivente é o l do seriado que foi ao ar nos anos 90 e novamente vivido por John Wesley Ship (velho conhecido dos fãs, uma vez que, além de ser o Henry Allen numa das Terras, é também o Flash Jay Garric de outra Terra). Flash confronta o Monitor, que aparenta ser um poderosíssimo vilão, porém, antes de ser derrotado, o velocista consegue fugir.

    Daqui para frente, vemos parte do universo da CW mexido de maneira intencional. Barry Allen/Flash, em vez de ser vivido por Grant Gustin é vivido por Stephen Amell e Oliver Queen/Arqueiro Verde é vivido pro Gustin. Claro que o verdadeiro Oliver e o verdadeiro Barry sabem que tem algo de errado, contudo, seus colegas do team Flash e team Arrow não acreditam numa só palavra que eles dizem e o que vemos aqui são situações típicas daqueles filmes e episódios ondem existem trocas de corpo, o que mesmo sendo clichê, é algo hilário. Um dos pontos interessantes é que Oliver Queen precisa ser o Flash e Barry Allen precisa ser o Arqueiro Verde, sendo que a personalidade violenta de Queen não se encaixa com a personalidade do velocista escarlate, assim como a personalidade pacífica e brincalhona de Allen, não se encaixa com a do arqueiro esmeralda, e isso acaba interferindo de maneira interessante no episódio.

    Não demora muito para termos o próximo surto da noite, onde os heróis vão até Smallville da Terra 38 procurar a ajuda da Supergirl (Melissa Benoist) e do Superman (Tyler Hoechlin). A pequena cidade é introduzida com o tema de abertura de Smallville – As Aventuras do Superboy, e se passa exatamente na mesma Fazenda Kent usada no seriado. Se Tyler Hoechlin não tivesse aparecido algumas vezes no seriado da Supergirl, seria perfeito que Tom Welling retornasse ao papel e seria então a primeira vez que o ator viveria, de fato o Superman.

    Esse tipo de homenagem permanece o tempo todo pelo crossover, até quando a investigação de Barry e Oliver os levam a Gotham City, também introduzida nesse universo pela primeira vez. Batman/Bruce Wayne abandonaram Gotham e as Empresas Wayne estão sob o comando de Kate Kane (Ruby Rose), que ajuda os heróis na busca de um psiquiatra do Asilo Arkham. Lá podemos ver alguns embates bacanas como o da Nevasca (Danielle Panabaker) enfrentando Nora Fries (a esposa de Mr. Freeze), vivida por Cassandra Jean Amell, esposa de Stephen Amell. Nesta cena, podemos ver uma espécie de museu sinistro com alguns artefatos interessantes, dentre eles, a máscara de Bane (Tom Hardy), de Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge. E vemos também a Batwoman pela primeira vez em ação. O jeito largado de Ruby Rose serviu perfeitamente para interpretar Kate Kane e a heroína e existem grandes chances da personagem voltar em outras participações e até mesmo ganhar um seriado próprio

    Porém, nem tudo pareceu ser bom em Elseworlds. Apesar de fazer a alegria dos fãs e de ter um roteiro bacana, a coisa fica muito feia quando a terceira e última parte começa. Apenas para esclarecer, apesar do crossover ser um único bloco, o primeiro episódio foi um episódio de Flash, o segundo, um episódio de Arrow e o terceiro, um episódio de Supergirl. Embora a realidade tenha sido gravemente alterada, onde o Superman é um ditador, que usa uniforme negro, o que vemos em tela soa cafona e sem vida alguma, o que deixa o crossover com uma mancha. Nem mesmo as participações do Caçador de Marte (David Harewood) e de Brainiac 5 (Jesse Rath) e o esperado embate entre dois Superman faz com que o espectador se prenda na cadeira e o que se vê, na verdade, é uma torcida para que o episódio acabe logo, o que é uma pena.

    De qualquer forma, ainda assim, Elseworlds é o quinto crossover da CW, e o melhor até aqui, mesmo limando sem dó os personagens de Legends of Tomorrow e reduzindo drasticamente a participação dos personagens centrais de cada seriado, o que foi acertado, já que Invasão e Crise na Terra X tinham personagens e heróis em demasia deixando os roteiros confusos e com alguns furos. Além disso, o crossover desse ano prepara para o que vem em outubro de 2019: Crise Nas Infinitas Terras, uma das maiores histórias da DC Comics e aqui no Vortex você saberá sobre todas as curiosidades deste grandioso evento.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.