Autor: Vortex Cultural

  • Resenha | Geovani Martins – O Sol Na Cabeça

    Resenha | Geovani Martins – O Sol Na Cabeça

    Geovani Martins é um jovem escritor nascido em Bangu, onde viveu em meio à comunidade, um Brasil paralelo que vemos em nossas TV’s de LCD, sempre na perspectiva de um Datena ou Bonner, o que faz com que nossa visão desses locais seja ofuscada, partindo de uma perspectiva distanciadora e negativa. Os contos de Martins dão outra perspectiva, ele admite em entrevistas não escrever com o objetivo de mudar a visão das pessoas para com a periferia, contudo, mesmo sem querer, ele consegue. Observando seus contos, muito bem escritos, em uma linguagem oralizada, principalmente no primeiro conto, o que não impede uma leitura leve e instigante, onde temos a impressão visual da história, bem como, já citado, a linguagem, os contos que nos colocam pelos becos das favelas devem ser lidos em voz alta, devem ser imaginados como se de fato estivéssemos lá, uma espécie de ensaio de imanência. Essa atitude nos faz, apesar de meros observadores dos contos, sentir que ali é assim que funciona, é assim que é, e não há muitas escolhas. Assim como no nosso mundo, ou em qualquer outro, o nosso mundo de asfalto, temos posições sociais a almejar, degraus a galgar para o sucesso, não é diferente lá, não são valores diferentes, apenas o conjunto sociocultural tem outro topo, tem outros caminhos para isso, o status social é tão importante quanto em qualquer cultura.

    Não há conto melhor que o outro, mas dependendo do que queremos ver podemos elencar alguns, como o primeiro, que esse, mais que os outros, deve ser lido em voz alta. Ele é em uma linguagem que não parece português, aliás, as palavras são em português, ou variações de palavras originárias, mas que perderam o sentido que damos comumente a elas, e muitas vezes não conseguimos pegar o fio que liga o significado anterior ao novo, gírias regionais, até mesmo microrregionais, só usadas naquele pequeno espaço de algumas quadras. Há uma real dificuldade na leitura desse conto, contudo, ele tem um fluxo interessante, de uma introspecção muito boa, é o simples relato de um dia de sol na praia.

    Outro conto narra a trajetória de uma noite de um pichador. Recém-pai, sempre pensando em seu filho Raul, quer largar a aventura, mas é impelido socialmente para isso, como se o encaixe de sua existência estivesse ali. A importância dessa narrativa é que se acompanhamos as noticias dos últimos 3 ou 4 anos lembraremos do caso de um pichador assassinado pela polícia em um prédio. Desse pichador ficaram resquícios de sua história nas redes, e é nítida a reação entre a notícia da mídia e o conto criado.

    Os contos em sua maioria deixam transparecer uma rotina pré-fixada, onde a maioria das crianças não têm a figura do pai, quando realizarão algo que pode afetar seu futuro invariavelmente pensam na mãe, que seu futuro não é uma questão de um leque de caminhos que se abre, mas alguns caminhos, sendo os melhores relacionados ao tráfico, onde maconha é algo comum e cocaína é a renda da favela, pois quem compra é a classe média que pode sustentar, e com esse dinheiro que entra é possível promover melhorias na comunidade, e por mais estranho e aparentemente contraditória que isso possa parecer, é o que é, e é o único meio no momento em que as pessoas das comunidades que circundam o tráfico de drogas podem sobreviver. O estado não penetra nesses lugares como estrutura de poder e de recursos para a integração com o asfalto, o único tentáculo do estado que chega é o da polícia, e a única politica vista por essas pessoas são algumas cestas básicas distribuídas em anos eleitorais.

    Compre: O Sol na Cabeça – Geovani Martins.

    Texto de autoria de Róbison Santos (Críticas de Livros).

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  • Resenha | Hellsing

    Resenha | Hellsing

    Dinâmico, gráfico e um dos responsáveis pela mudança na narrativa do seu gênero, Hellsing é um mangá de ação publicado originalmente em 1997, escrito e ilustrado por Kouta Hirano. Publicado no Brasil pela editora JBC, a compilação de 10 volumes seguiu o modelo de tankôbon já publicado pelo autor, formato em que cada volume conta com diversos capítulos e serve como uma publicação independente. Os volumes contam com bastante qualidade gráfica e reproduzem com fidelidade o material elaborado por Kouta. Além disso, é preciso elogiar os extras em cada edição, que não apenas contam com comentários e piadas do próprio criador, mas também trazem histórias adicionais do mesmo universo, produzidas antes que ele tivesse mais coesão.

    O foco da história é na Ordem Real dos Cavaleiros Protestantes, a Hellsing, organização secreta fundada por Abraham Van Helsing, o mesmo personagem do livro do Bram Stoker. O principal objetivo da organização é a defesa da Inglaterra de forças sobrenaturais, atuando onde o exército tradicional não consegue. A sua principal arma é um vampiro, Alucard, que serve fielmente a Integra Hellsing, herdeira da organização. Posteriormente, outras organizações aparecem, como a Iscariot, divisão do Vaticano com os mesmos fins, e a Millenium, uma divisão sobrenatural de soldados nazistas que conseguiram fugir da guerra e procuram estabelecer uma guerra eterna.

    A principal qualidade do mangá é a forma com que ele consegue desenvolver a história. O seu ritmo, baseado nos filmes de ação da época, funciona bem em conjunto com a ação frenética e desenfreada. Diferente de outros mangás, o autor não se preocupa em explicar minuciosamente todos os elementos ou estabelecer um sistema verossímil de poderes. O importante não é como o universo funciona, mas sim o que está acontecendo nele. Essa acaba sendo a principal contribuição de Hellsing para os mangás: trazer uma narrativa ocidentalizada e mais dinâmica para o gênero. Outro aspecto interessante é que, apesar do autor falar que Hellsing teve início como um mangá erótico, a única dica disso é na tensão sexual presente entre alguns personagens, sem necessariamente ser retratada graficamente. A única parte visual que se faz questão é a violência, tendo direito a empalamentos, decapitações e outros elementos que são os principais motivos para o mangá ser indicado para maiores de idade.

    Dos problemas, o principal é a exaltação aos nazistas, muito mais presente nas partes extras do que necessariamente na história. O autor em alguns momentos faz alguns comentários e desenhos desnecessários de suásticas que poderiam ser encarados como preocupantes, apesar do tom de piada. Os traços também podem gerar alguma confusão, principalmente nos momentos em que muito elementos aparecem na página, mas não é algo que está presente em todos os momentos do mangá.

    É importante falar que Hellsing é um produto da sua época e vários elementos gritam isso. O traço utilizado pode ser encontrado em diversas produções contemporâneas, algo que o próprio autor deixa claro ao compará-lo com Trigun, lançado dois anos antes. Além disso, a temática utilizada, de um universo sombrio povoado por criaturas sobrenaturais era lugar comum na década de noventa. Não à toa que Buffy: A Caça-Vampiros, O Corvo e Entrevista com o Vampiro são produções lançadas nesse mesmo período. Até mesmo o nome dos capítulos pode acabar datando o período de produção, já que são baseados em jogos da época, e incluem claras referências para o autor. Como é o caso de Castlevania, que não apenas divide a temática de criaturas sobrenaturais, como o próprio nome do personagem principal do mangá é o mesmo que o de um dos personagens do jogo, sendo Drácula escrito ao contrário.

    Pelas características já faladas, Hellsing é um mangá de leitura fácil e descomplicada. Acaba sendo uma ótima opção para uma leitura depois do trabalho, já que não precisa de muito raciocínio pra ser compreendido, tal qual os filmes blockbusters de onde vem a inspiração para o seu ritmo. A única diferença é que eu não recomendaria pedir uma pizza e se entreter, já que a gordura pode acabar estragando as páginas.

    Texto de autoria de Caio Amorim.

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  • Crítica | Cinquenta Tons de Liberdade

    Crítica | Cinquenta Tons de Liberdade

    Se a série literária Cinquenta Tons já não provou a todos nós o quão vazia é sua história, o terceiro filme da trilogia segue os passos do seu material fonte, Crepúsculo, e seu final gira em torno de casamento, gravidez e uma grande ameaça. E continua tão vazia e fraca quanto um episódio 14 de uma temporada de 22 episódios em uma série já fadada ao fracasso na sua décima temporada.

    Anastasia (Dakota Johnson) e Christian (Jamie Dornan) finalmente se casam e partem para uma extensa lua de mel, até que são avisados da volta de um conhecido inimigo que busca vingança e passam a temer que o sonho se destrua antes que tenha realmente começado.

    O primeiro filme da trilogia, Cinquenta Tons de Cinza, o mais defensável dos três, tinha um design de produção e uma fotografia muito bem casados para reproduzir sensualidade a cada momento do relacionamento de Anastasia e Grey, a trilha musical também era muito bem empregada. Nesse terceiro tudo isso vai por água abaixo de vez, a química do elenco já está esgotada – provavelmente porque ninguém ali está feliz por ter que participar disso pela terceira vez – e a diversidade sexual crescente parou lá na metade do segundo filme, Cinquenta Tons Mais Escuros, porque a dinâmica do sexo continua a mesma.

    Porém a disposição de rir de si mesmo ainda é presente, o filme apela para ironias e situações tão absurdas que chega a ser engraçado, como o título do filme Cinquenta Tons de Liberdade aparecer exatamente no plano que mostra o casal trocando alianças ou o momento que Christian faz um aviãozinho com uma colher de sorvete no meio das pernas de Anastasia. Estando pior do que já foi, 50 Tons ainda faz rir, pelo menos.

    Tendo problemas parecidos com o segundo filme, ainda mais com a mesma direção, esse último capítulo tenta ganhar fôlego nas suas personagens coadjuvantes e acaba ficando extremamente caricato. O primeiro filme tinha um mérito por ter uma direção feminina e as personagens femininas parecerem mais críveis, agora com James Foleya direção masculina só parece prejudicá-las. Anastasia continua tendo suas nuances e mesmo entrando em incoerência constante, é o desenvolvimento mais interessante. Mas sua amiga, sua cunhada e sua sogra ganham arcos próprios e nenhum deles funciona. Todas as mínimas situações que vão brotando na raiz principal do filme são episódicas e sem peso, elas aparecem e somem sem grandes consequências e só servem para disfarçar uma tridimensionalidade de personagens e para tapar tempo. Parece uma novela de duas horas e nesse contexto isso não é nada positivo.

    A má vontade de todas as áreas do longa é tão visível que quase dá pra ver as  engrenagens da indústria cinematográfica produzindo dinheiro fácil em meio ás cenas. É preguiçoso desde fazer um vilão com o cabelo jogado na testa e com olhos exageradamente vermelhos da forma mais caricata possível até a sequência de flashbacks que fecha o filme. Podia ter parado no primeiro, as problemáticas ainda seriam uma questão, como o lugar da personagem de Anastasia, mas ainda teria teus méritos, agora já foi. E foi sem causar um tesão sequer. De novo.

    Texto de autoria de Felipe Freitas.

  • Resenha | O Último Lobisomem – Glen Duncan

    Resenha | O Último Lobisomem – Glen Duncan

    Era uma noite de lua cheia. Não. Não era. Isso é clichê demais e certamente nada tem a ver com o livro. Aliás, a primeira coisa que salta aos olhos é o quanto o autor foge do lugar-comum ao contar a história de um lobisomem, Jake Marlowe, que logo de início fica sabendo ser o último de sua espécie.

    Jake vagou pelo mundo durante duzentos anos, à mercê de seus apetites lunáticos e atormentado pela memória de seu primeiro assassinato. Ao saber ser o último, perde a vontade de viver e decide ficar – diferente da música de Raul Seixas – “esperando a morte chegar”. Morte que virá na pessoa de Grainer, um matador de lobsomens profissional.

    Indo na contramão dos livros de criaturas fantásticas da moda, em que vampiros são os protagonistas e lobisomens, meros coadjuvantes, presentes apenas para preencher a história com um pouco mais de ação, Duncan coloca Jake como ponto focal da narrativa. E, para evidenciar ainda mais sua importância, “deixa” que ele mesmo conte sua história, através dos diários que escreveu durante toda sua vida. Jake é sarcástico e tem crises existenciais. Sua linguagem reflete a dicotomia entre o lado humano e o animal que aflora a cada lua cheia. Enquanto humano, é um homem inteligente e culto, que discorre sobre moralidade, filosofia, religião e afins. Enquanto animal, apesar da selvageria latente, seu pensamento se torna mais objetivo e claro. Satisfaz sua necessidade por comida e sexo com um planejamento metódico na medida que seus instintos lhe permitem. Diferente do homem, o lobisomem quer viver.

    E o autor brinca com essas duas personas e seus linguajares. Nos trechos em que descreve seus momentos como lobisomem, a linguagem é vulgar, muitas vezes chula, repleta de palavrões e descrições cruas, sem rodeios, de sexo e violência. E, principalmente nesses trechos, há algo que muitas vezes faz com que o leitor saia da imersão no universo narrativo: a tradução. Há diversas gírias e expressões cuja tradução soa estranha, como se tivessem sido traduzidas ao pé da letra ou pelo Google Translator.

    A trama se arrasta nos dois primeiros terços do livro. O leitor acompanha Jake indo de um lado a outro, bancando James Bond, lutando contra vampiros, fazendo fugas espetaculares. E, entremeado a isso, o leitor vai conhecendo seu passado e de que forma se tornou um lobisomem. Em vários momentos, pensei “Agora vai!”, tendo a impressão – que se provava errônea – de que a história iria deslanchar e que algo relevante iria acontecer. A narrativa apenas ganha corpo, e o protagonista ganha um propósito, quando Tallula surge e passa a fazer parte da vida de Jake.

    É uma leitura agradável e divertida, que foge do convencional ao colocar o lobisomem como protagonista e não como coadjuvante. Mas justamente esse fator poderia ter sido melhor aproveitado. Tornando assim, os dois terços iniciais mais interessantes e envolventes.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.

  • Resenha | Notas do Subsolo – Fiódor Dostoiévski

    Resenha | Notas do Subsolo – Fiódor Dostoiévski

    Resenhar Fiódor Dostoiévski é ingrato. O que ainda se pode falar sobre esse que é considerado por muitos o que chegou mais perto de entender o Humano? Notas do Subsolo (L&PM Pocket) foi publicado em 1864 e rende venerações e interpretações diversas até hoje. Um livro provocativo e perturbador, no mínimo, e que tenta desvendar a “eterna contradição humana”, como sintetizado por Machado de Assis em A Igreja do Diabo, o nosso Machado, por sinal, lia muito Dostoiévski.

    Notas do Subsolo é um monólogo dividido em duas partes onde o narrador é um ex-funcionário público que, após ganhar uma herança, resolve se mudar para os subúrbios de São Petersburgo. Ao adotar o novo modo de vida modesto e por ocasião dos quarenta anos (uma longevidade surpresa), resolve defenestrar contra tudo e contra todos os inconformismos que ficaram presos na garganta.

    Sozinho, mas escrevendo a todos os homens sobre as qualidades podres do “homem do séc. XIX”, mostra a razão na insanidade, a felicidade na infelicidade, o amor no desamor, o prazer na dor, etc para nos vender a ideia de que o homem do séc. XIX é no mínimo desonesto para com os demais. E para ilustrar esse homem, ele mesmo, do subsolo, conta seus prazeres niilistas, sombrios, mas também frágeis, de quem sobreviveu com carências à face.

    O subsolo é sua base. Ele escolhe descer no menor degrau possível para observar toda a pirâmide social que tem diante de si; os aristocratas, os funcionários públicos, os burgueses, o clero, os militares, todos escondem parcelas degeneradas desse homem do Séc. XIX. Sua motivação em escrever parece ser a própria antítese em sobreviver, pois se por um lado afasta o sombrio ao escrever (ou pelo menos tenta iluminar qualquer escuridão), por outro é como se cortejasse a própria ruína em suas palavras.

    Isto é o que ele nos vende: a sensualidade da contradição entre o falar e o agir. Ficamos fascinados por seu ódio, sua violência cotidiana, sua grosseria que nos esquecemos de sua baixeza ética e moral. Nos concentramos nas palavras de um narrador que tem por única qualidade não mentir, e deixamos de lado seus desvarios para com o outro, “A violência é tão fascinante e nossas vidas são tão normais”, já cantava Renato Russo.

    Cada qual fará o seu julgamento, esta é a certeza do homem do subsolo. Cada qual fará a sua leitura deste que é um dos livros mais recomendados possíveis. A edição pocket da L&PM é boa, agradável e realmente cabe no bolso. Deixemos a superfície por um momento, vamos ouvir o homem do subsolo.

    Texto de autoria de José Fontenele.

    Compre: Notas do Subsolo – Fiódor Dostoiévski.

  • Resenha | Pokémon: Red Green Blue

    Resenha | Pokémon: Red Green Blue

    Lançado originalmente em 1997, com roteiro de Hidenori Kusaka e arte de Mato, Pokémon Adventures (Pocket Monsters Special no Japão), conta em seus primeiros três volumes, intitulados Pokémon: Red Green Blue, a estória de Red, um jovem da cidade de Pallet que tem como sonho se tornar um grande mestre Pokémon. Pokémon Adventures tem como base os acontecimentos do Jogo Pokémon Red e Green (posteriormente foi lançado a versão Blue) lançado para o Game Boy, a plataforma portátil da Nintendo, em 1996. Diferente da animação adaptada para televisão no mesmo ano, o mangá possui uma estória bem linear com acontecimentos que se entrelaçam com o tempo, mesmo não seguindo a estória exata do jogo.

    Durante uma caçada Pokémon, Red se encontra com Blue e se tornam automaticamente rivais. Red decide se tornar mais forte e para isso se envolve numa jornada de se tornar um mestre Pokémon. Assim, procura a ajuda do Professor Carvalho, um velho cientista recluso em sua cidade natal, e que Red mais tarde vem a descobrir ser o avô de Blue.

    Com a ajuda do Professor, Red começa sua viagem pelo continente de Kanto para coletar todas as oito insígnias Pokémon que irão permitir que ele entre na grande Liga Pokémon, desafie os maiores mestres de todos os tempos e assim se torne o maior Mestre Pokémon de Kanto. Red também terá que se juntar a novos aliados para combater a terrível Equipe Rocket, uma organização maligna que está atrás do uso de Pokémons para fins ilícitos.

    No decorrer das aventuras do protagonista, as semelhanças das estórias comparadas ao jogo são mais ou menos as mesmas, mas com algumas variações. A cada cidade, Red tem que resolver um problema relacionado a um personagem chave para garantir sua contenda com o líder do Ginásio Pokémon local para conseguir sua insígnia, ou apenas para atrapalhar os planos da terrível Equipe Rocket. Porém, dessa vez, os líderes de Ginásio Brock e Misty não se juntam a Red como no anime, e nada de Jessie e James nem Meowth nesse mangá, e sim uma segunda protagonista feminina, a treinadora Green, se junta a Red e Blue para combater os vilões.

    Mesmo sendo apenas três volumes, a estória não se torna corrida. Não que os personagens secundários sejam bem explorados e desenvolvidos. Algumas páginas até utilizam caixas de texto excessivas para explicar alguns acontecimentos, mas considerando se tratar de uma aventura básica de ação, não chega a atrapalhar a trama. Os cenários estão sempre em movimento com a jornada de Red, e alguns outros personagens estão sempre retornando para ajudá-lo em alguma coisa, diferente do conteúdo original, onde essas aparições são mais raras.

    A arte do mangá de Mato é bastante parecida com a arte utilizada para divulgação dos jogos, o que torna o mangá um pouco mais próximo da fonte original se comparado com o anime, que possui um visual próprio, trazendo tanto os Pokémons quanto os personagens humanos mais próximos ao que vemos no jogo. As cenas de combate são bem elaboradas e dinâmicas, sendo divertidas de visualizar, além de algumas rápidas referências que vêm de jogos subsequentes ao qual este mangá se baseia.

    Comparado ao jogo, Pokémon continua sendo uma história rasa e superficial. Não que este necessite de uma densidade maior de roteiro, porém, comparada ao conteúdo que se baseia e ao público direcionado, possui uma trama interessante, fluida e curiosa o suficiente para manter uma leitura periódica.

    Compre: Pokémon RGB.

    Texto de Bruno Gaspar.

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  • Resenha | Jeremias: Pele

    Resenha | Jeremias: Pele

    Normalmente quando escrevo para ao site busco manter uma estrutura com uma breve introdução, sinopse, discussão sobre o quadrinho e por fim uma avaliação se vale a pena ou não a leitura da HQ. Tal como o quadrinho de Rafael Calça (roteiro) e Jefferson Costa (arte) vamos mudar tudo e fazer algo diferente: leia, simplesmente leia esse quadrinho. Que me desculpe os outros autores que participaram da MSP, e muitos com grandes histórias, mas Jeremias – Pele é, em minha opinião, o melhor título lançado pelo selo até então.

    O primeiro ponto para sustentar essa minha afirmação é que esse quadrinho transcende os seus objetivos primários, não se trata apenas de entretenimento ou mesmo de arte se levarmos a discussão para esse campo, mas de uma abordagem que faz com que a história se embrenhe por questões sociais extremamente relevantes para o nosso país, nesse caso o racismo. Não se trata aqui de falso moralismo, mas o quadrinho toca onde a ferida dói, em nossos preconceitos básicos, de enxergar o negro em funções consideradas menores dentro de uma divisão social do trabalho, de considerar que uma pessoa negra não possa ser bem sucedida a não ser em profissões pré-estabelecidas e muitas vezes caricatas.

    Pele aborda também o bullying que esse grupo social sofre diretamente, como mostrado pelos colegas de turma do Jeremias e outros de maneira indireta (num típico exemplo de racismo velado), como é o caso da professora do protagonista que distribui profissões aos seus alunos para um trabalho escolar. Se isso não fosse o bastante, o quadrinhos também destaca pontos que nos fazem refletir: por que o negro ou o pobre não tem o direito de sonhar? Por que não se pode concede a essas pessoas a possibilidade de ao menos almejarem uma melhor situação na sociedade? São questionamentos são apresentados durante a história tanto de forma direta quanto indireta.

    Não se pode esquecer também de alguns personagens coadjuvantes, principalmente os pais de Jeremias. O inconformismo do pai não se trata de raiva devido aos problemas do filho, mas uma questão geracional que ele passou e vê seu filho em uma estrutura social muito parecida, o que faz entender a explosão de nervos e como a embalagem do preconceito pode mudar, mas não o seu conteúdo. O mesmo se pode dizer da mãe e o seu relato sobre sua infância e seus cabelos e como ela passou por um processo de aceitação para ter o visual dos dias de hoje.

    Enfim, uma HQ sensacional, de uma importância tremenda para os nossos dias e que certamente, tendo em vista o alcance de Maurício de Sousa, fará um belo trabalho educacional desde a mais tenra idade até os mais marmanjos. Destaque para o trabalho de arte de Costa, que possui um traço dinâmico, e utiliza as cores em prol da narrativa, além de diversas referências espalhadas ao universo da Turma da Mônica, e claro, ao movimento negro. O álbum ainda conta com um belo texto de quarta capa do rapper Emicida. Como dito anteriormente, Jeremias – Pele transcende a própria mídia e vai além pela crítica e pelo posicionamento. Aliás, deve-se louvar uma leva de artistas e quadrinhos nacionais que tratam de questões sociais e realizam uma justa e necessária crítica ao nosso contexto atual.

    Compre: Jeremias – Pele.

    Texto de autoria de Douglas Biagio Puglia.

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  • Resenha | Brasil: Nunca Mais – Paulo Evaristo Arns e Projeto Brasil

    Resenha | Brasil: Nunca Mais – Paulo Evaristo Arns e Projeto Brasil

    Dom Frei Paulo Evaristo Arns, falecido em 2016 aos 95 anos, organizou essa obra de pesquisa extremamente elucidativa sobre a tortura na ditadura militar brasileira (1964-1985) e sua função corroborativa na manutenção do regime instaurado nesse período.

    O Regime Militar Brasileiro, de acordo com a obra, iniciou sua caminhada ainda ao final da segunda guerra mundial, com a recente aproximação dos exércitos brasileiro e estadunidense. Essa aproximação rendeu além da mudança de estrutura galesa para a ianque no centro militar tupiniquim, uma mudança no pensamento de ordem e visão do inimigo externo, base do mundo bipolar que se instaurava, despontado mais intensamente durante a guerra da Coréia.

    Essa estrutura militar foi entre outros fatores, politico e econômicos, a ponta de lança da situação que viria a se tornar os anos de chumbo. Somando esse fator à entrada de divisas e armas diretamente nas unidades federativas brasileiras, principalmente nos governos alinhados e vendo com bons olhos os amigos americanos do norte, bem como o inicio da propaganda comunista prepararam o canteiro para que dali 15 anos toda a democracia e liberdade fosse suprimida.

    De acordo com os escritos essa parceria resultou na vinda de Daniel Mitrione, agente da CIA especializado em tortura. Esse especialista ensinou, utilizando mendigos, os agentes destinados a operar as agências de segurança interna como os futuros DOPS e DOI-CODI. Sendo um alerta em texto inicial do livro o fato de alguém torturar uma pessoa três ou quatro vezes passar a se “viciar” em tais atos, sendo o epílogo elucidativo no aspecto filosófico, apontando uma objetificação do torturado perante o carrasco.  No desenrolar das páginas fica claro que o aspecto chocante dos relatos é na verdade secundário. O que a pesquisa prova é a ligação entre a tortura e a manutenção do regime.

    Muitos dos que viveram e relatam hoje não reproduzem a visão de que essa época foi de trevas, muito pelo contrário, enaltecem os bons tempos do regime como de crescimento e melhora. Contudo, os números não mentem, como a superinflação e o arroxo salarial. Mas o que surpreende são discursos ouvidos hoje negacionistas quanto à tortura ou, pior, justificando-a como necessária, pois o Brasil estava afundado em grupos terroristas.

    A obra compilada dessa pesquisa, a qual chega até nós apenas como vislumbre, pois está resumida no livro, expõe incontáveis casos de tortura aplicadas à pessoas que não tinham relação com a resistência, muito pelo contrário, muitas vezes eram apenas usadas para encobrir crimes praticados pelas forças de repressão e/ou como bodes expiatórios justificando perseguições à estudantes e religiosos. Esses certamente os que mais sofreram, pois os movimentos sindicais, políticos e do campesinato estavam praticamente anulado já antes da tomada do poder, durante alguns anos foram minados pelo crescente financiamento  do Tio Sam nos estados brasileiros. A orquestra tocou em 1964 a marcha fúnebre, mas teve anos de ensaio para tudo sair perfeito no dia da apresentação.

    Todos os políticos que defenderam reformas de base foram processados, muitos  torturados apenas ao bel prazer, o medo instaurado mantinha uma superfície de ordem, mas ordem pelo medo. O regime não aceita criticas, trata tudo e todos como potenciais “subversivos”, para usar o termo da época.

    Brasil nunca mais não trata apenas do passado, trata do que os homens são capazes de realizar, a inquisição instaurada no Brasil naquele momento não fez distinção à idade, sexo ou raça, atacou a todos com, inclusive para a época, ilegalidade. Atos contra a própria constituição vigente, incluindo a máxima  jurídica in dubio pro reo, foram invertidas totalmente na cabeça de quem detinha o poder político, econômico e, sem sombra de dúvidas, militar.

    Compre: Brasil – Nunca Mais.

    Texto de autoria de Róbison Santos.

  • Crítica | Operação Red Sparrow

    Crítica | Operação Red Sparrow

    Francis Lawrence e Jennifer Lawrence têm uma parceria de anos, o diretor comandou os últimos três filmes da franquia que levou a jovem atriz ao estrelato, Jogos Vorazes. O trabalho de Francis na série de filmes sobre a revolucionária Katniss foi marcado pela grandiosidade que ele deu à franquia, com um controle requintado de cinematografia e design de produção, mas focando mesmo nas artimanhas e temáticas mais adultas e sérias que os últimos filmes possuíam. Jennifer Lawrence seguiu o mesmo caminho. A parceria dos dois rendeu frutos preciosos que chegam até ao novo filme deles, Operação Red Sparrow, que acaba sendo nada mais do que o esperado.

    Dominika (Jennifer Lawrence) é uma ex-bailarina prestigiada que acaba sendo recrutada para o mais importante programa de espionagem russo, que treina “sparrows”, homens e mulheres que usam da sensualidade e sedução para conseguirem o que o Estado precisa. O treinamento é violento, Dominika se destaca e recebe a importante missão de encontrar um traidor, para isso terá que se relacionar com o agente americano Nathan (Joel Edgerton).

    Tecnicamente, Francis está ainda mais apurado, a cinematografia cinza contínua dá espaço para momentos de uma fotografia mais quente muito bem colocados e coerentes. O filme não foca na ação, mas quando a situação é mais violenta, o amarelo fica presente e sempre destaca a cor mais presente em todo o longa, o vermelho. Presente no título, a cor vermelha está em todas as cenas, ela segue os passos da protagonista desde suas apresentações de dança até seu constante contato com sangue, dá identidade á personagem principal e ao próprio longa.

    O longa está mais para um thriller denso do que um filme de ação como a promoção dele possa ter deixado parecer, os muitos diálogos costuram acontecimentos arrastados e blocos claramente separados, essa estrutura dá um tom significativo para o longa mas acaba o enchendo de excessos, alguns dos blocos só servem para esticar a trama principal e criar novas subtramas que fazem o filme perder ritmo, principalmente no confuso segundo ato. A sensação é que a história se acha mais complexa do que realmente é e tenta dar meias voltas enquanto um espectador um pouco mais atento já consegue enxergar os caminhos que a história vai levar, as opções são muito limitadas para a trama querer parecer tão complexa.

    A protagonista carrega o filme inteiro, mas parece que Francis não soube diferenciar o trabalho com a atriz nos seus últimos filmes e nesse. É uma interpretação inexpressiva boa parte do tempo e que ocasionalmente explode, isso funcionava com a Katniss, e por isso não parece caber na personagem Dominika, parece repetido. O restante do elenco é funcional, mas nenhum tem grande tridimensionalidade, o personagem de Edgerton ganha um espaço desnecessário antes dele se tornar de fato importante na trama e soa pura encheção de linguiça.

    Com um plot bastante interessante, como o de se treinar espiões e espiãs especialistas em sedução, Operação Red Sparrow é uma doa indicação, mas é uma pena que o filme não decida o que quer ser e acabe deixando bons filmes que ele poderia ser pelo caminho. Tem um tom emergente e violento muito imersivo e seus melhores momentos são em cenas mais gráficas, a violência e a nudez cabem no contexto e dão a verossimilhança necessária. Mas a parceria de Francis e Jennifer segue os moldes dos últimos trabalhos dos dois e por isso não surpreende, como temática avançam, mas como execução pararam no tempo, não digo que não quero mais um trabalho juntos porque sempre pode acontecer uma surpresa, mas acho que Francis Lawrence vai ter que tirar um tempo para se repensar.

    Texto de autoria de Felipe Freitas.

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  • Resenha | Mitologia Nórdica – Neil Gaiman

    Resenha | Mitologia Nórdica – Neil Gaiman

    Neil Gaiman tem seu lugar assegurado em torno da fogueira dos grandes contadores de histórias. Não é de hoje que o autor britânico, erradicado nos Estados Unidos, desvenda os cosmos mitológicos ao redor do globo. Tudo ganhou forma com Sandman, onde ele usou inspirações de várias mitologias para criar uma própria ao redor dos perpétuos e seus reinos; depois, povoou alguns de seus livros, como Os Filhos de Anansi, Deuses Americanos, etc, com os próprios deuses mitológicos; agora, com Mitologia Nórdica, publicação da editora Intrínseca, o autor reivindica o assento dos primeiros poetas da humanidade que compilaram os mitos de seus povos. Neste livro, especificamente, reconta os nórdicos.

    O ponto de partida de Mitologia Nórdica são as diversas traduções da Edda em Prosa, de Snorri Sturluson e Edda Poética, textos com mais de novecentos anos de idade; com esse material e dicionários a mão, Gaiman selecionou as histórias de que dispunha mais informações, em conjunto com certa ordem cronológica dos mitos, e preencheu as lacunas com seu próprio oficio de contador de histórias. O resultado é um livro informativo, coeso, bem estruturado e literariamente agradabilíssimo que apresenta de forma muito honrada os mitos nórdicos aos leitores.

    Quinze mitos povoam o livro e, do primeiro ao último, o material é pródigo por incitar uma ordem no caos mitológico. Decerto, excluindo a criação e o desfecho nórdico (o relembrado Ragnarök), as histórias não aconteceram na sequência proposta pelo autor, contudo, o ordenamento facilita a compreensão do leitor no meio do emaranhado de deuses, gigantes, heróis, encantamentos e maldições perpetuados pelos poetas do passado.

    Escrita afiada, o inglês tece ótimos diálogos com seus personagens. Só para citar os que mais aparecem, Odin, o Pai de Todos nórdico, varia entre momentos de sabedoria (afinal ele deu um olho por isso) e outros de estupefação, sem qualquer descrédito ou perda de qualidade; Tor é um brutamontes que fala sem qualquer zelo, orgulhoso por seus instrumentos de poder; Loki é o instrumento do caos, deus da trapaça e da enganação, sibila para armar conflitos entre os deuses e seus inimigos, e quando é pego, sempre consegue se safar. Outros deuses e variados gigantes compõem o cenário, todos encarnando em diálogos bem feitos os princípios que defendem ou suas vontades e propósitos.

    Diferente de livros do tipo Mitologia para apressados e parecidos, Mitologia Nórdica não entrega pílulas sem sabor traduzidas a esmo, ao contrário, temos um livro muito bem pensado, de leitura fácil e encantadora, que não peca por alguma superficialidade. O grande mérito da obra também reside no fato de não substituir outros livros sobre aquele passado mitológico, mas antes, os atualiza e serve como porta a imaginação dos povos nórdicos. Livro muito recomendado.

    Texto de autoria de José Fontenele.

    Compre: Mitologia Nórdica – Neil Gaiman.

  • Resenha | A Vaca de Nariz Sutil – Campos de Carvalho

    Resenha | A Vaca de Nariz Sutil – Campos de Carvalho

    Campos de Carvalho não é um escritor comum, e é por isso que o lemos. Apesar de o autor ter escrito mais textos, ele reconhece apenas quatro romances como suas obras legítimas, Vaca de Nariz Sutil, em um excelente trabalho da editora Autêntica de relançar as suas obras (Carvalho faleceu em 1998), é um deles. Neste livro, tratamos sobre os vestígios da guerra.

    O romance acompanha um veterano de guerra condecorado, sem qualquer nome, frustrado, com memórias violentas sobre o passado e perdido na vida. Ele, que conta a história em primeira pessoa, divide um quarto de pensão com um surdo-mudo, Aristides, próximo a um cemitério. Lá conhece o zelador e sua filha, Valquíria, ao qual se afeiçoa.

    Lido como surrealista ou non-sense, a certeza é que o autor pode causar desconforto à primeira leitura devido à forma incomum ao qual conduz a trama; concentra-se nos abstracionismos, usos de filosofias catedráticas e cotidianas, epifanias, referências à História da Arte ou Antiguidade Clássica, fluxos de consciência se chocando com qualquer informação e o mundo em si, a única porção física que pode garantir a segurança do leitor, despedaçado, fragmentando-se assim como a consciência de seus personagens.

    Mesmo com todas as características incomuns que citei acima, o que Carvalho ensina é que um bom escritor tem que ter domínio sobre seu próprio texto e as escolhas narrativas que faz. Por isso, seu êxito é ordenar o próprio caos nas páginas. Mesmo questionando a sanidade do narrador de A Vaca de Nariz Sutil, sentimos a lucidez que impulsiona a leitura, o que vaga é o pródigo fluxo de consciência dele; interfere sobre todos os acontecimentos, questiona o presente, desanda em referências pessoais e resgata o passado bélico como uma ferida nunca fechada.

    Narrador dúbio, desconfiamos se tudo não passa de um sonho de alguém sedado por sua sobrevivência à guerra (aliás, em certo ponto se intitula herói sarcasticamente, como se o combate fosse tão surreal quanto o fluxo desordenado de suas memórias). Outra característica é o niilismo presente até o fim do livro. O personagem encara seu fracasso e caminha até ele sem se importar; não lhe cabe questionar ou mudar os acontecimentos, apenas Valquíria foge à realidade porque é irreal. Ou será que é irreal porque é real? Nunca saberemos.

    Livro para ser lido mais de uma vez, como quando observamos as nuvens e tentamos acertar as suas formas várias vezes. Em cada uma delas, quem sabe acertamos? A graça é ler de novo.

    Texto de autoria de José Fontenele.

    Compre: Vaca de Nariz Sutil – Campos de Carvalho.

  • Resenha | Os Filhos de Anansi – Neil Gaiman

    Resenha | Os Filhos de Anansi – Neil Gaiman

    Neil Gaiman é o bardo moderno que mistura histórias mitológicas com cotidianas. Em Os Filhos de Anansi, publicação da Editora Intrínseca, não é diferente. Partindo do pressuposto de como seria a vida de alguém filho de um deus antigo, e não qualquer um, mas Anansi, a aranha tecedora de histórias primordiais, Gaiman cria uma narrativa bonita e atual sobre reconciliação e herança familiar.

    Anansi é a Aranha que surrupiou as histórias do Tigre. O Tigre era o primeiro dono das histórias, mas elas eram violentas, sangrentas, duras, e por isso ninguém as gostava de escutar, mas quando a Aranha as reivindicou, os ouvintes passaram a contar e ouvir histórias com mais gosto. E por isso todos dizem que as histórias pertencem a a ela.

    Charlie Nancy é um homem pacato vivendo em Londres prestes a se casar, na bagagem familiar, uma mãe morta e um pai desaparecido. Quando sua mulher pede para que ele chame o seu pai (o mesmo que gostava de fazer piadas com ele quando criança), a festa de casamento, Charlie telefona para uma antiga vizinha e descobre que seu pai está morto. Certo de que gostaria de dizer muitas coisas ao pai, ele volta para casa e encontra duas informações surpreendentes: tem um irmão e ambos são filhos de Anansi, um deus africano que toma a forma de aranha.

    Os irmãos nada se parecem, enquanto ele é quieto, introvertido e envergonhado, Spider tem poderes, é expansivo e consegue tudo o que quer. Encontram-se em Londres por conta do casamento de Charlie e aí começam os problemas de convivência; não conseguem dividir o mesmo espaço, mesmas vontades e o mesmo passado. A desunião entre os dois leva a um conflito que envolverá não só os próprios filhos, mas todos os familiares e amigos ao redor.

    Gaiman costura o passado com o futuro de forma elegante e mítica. Ao se apoderar do mito de Anansi para contar a história, toma liberdades interpretativas sobre a teia de seus personagens, intercalando-os ou remodelando como um arquiteto invisível por trás de suas tramas pessoais e familiares. Os Filhos de Anansi é uma história de reparação familiar, união e desunião a ferro e fogo, temperada com folclore e música. Charlie Nancy não é um semideus como seu irmão, mas quando canta, as coisas acontecem da forma que ele quer. Música é sua magia, um Orfeu vestido de aranha. O complicado é fazer um introvertido cantar, aí está a chave.

    Os Filhos de Anansi pode ter um começo devagar, mas engrena muito bem. Uma história saborosa, familiarmente crível e mitologicamente bem feita. Livro muito recomendado.

    Texto de autoria de José Fontenele.

    Compre: Os Filhos de Anansi – Neil Gaiman.

  • Resenha | Não Há Nada Lá – Joca Reiners Terron

    Resenha | Não Há Nada Lá – Joca Reiners Terron

    Não Há Nada Lá (Companhia das Letras, pelo selo editorial Má Companhia), do escritor Joca Reiners Terron, é um romance poliédrico e caótico que tem como fio narrativo (ou filosófico), a literatura e a escrita em si. Trata-se de uma homenagem? Talvez. Ou quem sabe um emplastro de referências recheadas com ocultismo e linguagem culta? Talvez. Certeza apenas que, após a leitura, o leitor não será o mesmo. E isso é muito bom.

    A Literatura é algo que chacoalha a gente, não duvide, mas poucos escritores têm o poder ou a intenção de realmente fazer o leitor experimentar um pouco (ou muito) de desconforto. Terron segue os passos de William S. Burroughs (presente no livro), um pouco de Thomas Pynchon, pitadas de David Foster Wallace, Ricardo Piglia, temperadas com o mago Aleister Crowley (outra figura do livro), e outras  cositas paranoicas e tresloucadas, para fazer o leitor, desde o mais atento ao mais passivo, cair da cadeira e despertar os olhos para a leitura.

    A escrita concisa, rica em imagens e referências, é tecida com esmero vocabular e frases muito bem construídas. Por aí já percebemos os méritos literários do autor. A cobertura do bolo literário são as imagens paranoicas, distorcidas e grotescas que por vezes formamos durante a leitura do livro. Aliás, a figura poliédrica da capa, que posteriormente identificamos como o Tesseract, adentra as páginas do livro e dá pista de como a leitura e a escrita se reinventam dentro e fora de si.

    Esta metáfora digna de ouroboros, a transformação ininterrupta e canibalizadora, é o fio por trás de todas as cenas lisérgicas que pululam na leitura; não por acaso, o título da obra é um não-título na medida que disfarça, desentende, o que há lá. Ou seja, Não Há Nada Lá, porque sempre houve, mas em nano escala, em todas as dimensões e ao mesmo tempo. “O quê?” Perguntará o leitor. A escrita, o livro, pois, como o autor escreve em determinado trecho, “a palavra opera na mais negra das escuridões”.

    Livro pequeno, mas enfezado, desconcertante e surpreendentemente bem estruturado. A princípio, a suposta desorganização de capítulos (eles seguem ordem decrescente), buscam desnortear o leitor. Contudo, a sequência e fluência dos acontecimentos são narrados com domínio e concisão, as descrições são exatas, sem sobras e os diálogos bem projetados. O que arregala os olhos são mesmo as imagens esdrúxulas e os personagens Grande Guitarrista, Gui-o-Guri, Jaime Hendrix, Arthur Rimbaud, papa Pio XI, Fernando Pessoa, entre outros.

    Há algo em Não Há Nada Lá. Um livro bem escrito e desconcertante que presta honras à Escrita e aos Livros enquanto vórtices de criação e recriação do universo. Leitura bastante recomendada.

    Texto de autoria de José Fontenele.

    Compre: Não Há Nada Lá – Joca Reiners Terron.

  • Crítica | Bright

    Crítica | Bright

    bright

    Em um presente alternativo onde humanos e criaturas de fantasia – Orcs, Fadas, Elfos, Centauros, etc. – coexistiram desde o início dos tempos, o oficial Dale Ward (Will Smith) e o orc Nick Jakoby (Joel Edgerton) embarcam em uma noite de patrulha de rotina. Acabam descobrindo um artefato antigo, mas poderoso: uma varinha mágica, que pensava-se que havia sido destruída. E encontram uma escuridão que poderá alterar o futuro e seu mundo tal como o conhecem.

    Com roteiro de Max Landis e direção de David Ayer (Corações de Ferro, Esquadrão Suicida), o filme mostra uma Los Angeles em que humanos e criaturas fantásticas convivem, mas não em harmonia. Os orcs se dividem em guetos e disputam território entre si. Os elfos se acham superiores, frequentando apenas locais privilegiados da cidade. Por conta de um programa de inclusão, Ward é obrigado a trabalhar diariamente com Jakoby, orc que sonhava em ser policial. Usando a ideia clássica de parceiros antagônicos obrigados a conviver, no primeiro terço do filme o roteiro empurra goela abaixo uma série de obviedades e clichês sobre preconceito racial, bullying, violência policial e estratificação da sociedade. Esses assuntos são tratados de forma tão expositiva e didática que faz parecer que nunca tinham sido abordados antes.

    A narrativa não chega a ser chata, mas Ayer erra mais uma vez no ritmo e, principalmente, na ação. Apesar de alguns momentos de tiroteio e perseguições intensas, não há cenas memoráveis. Várias delas bem previsíveis e não provocam qualquer emoção. Não há nada memorável ou marcante. O terceiro ato tenta compensar a falta de ritmo do restante com cenas de ação em excesso, o que acaba sendo cansativo para o espectador.

    O estrelismo de Smith atrapalha, mas não chega a estragar o filme. Edgerton convence bem como orc, auxiliado, obviamente, pela ótima maquiagem. O que realmente importa é que a parceria funciona, a química entre os personagens (e os atores) funciona bem. E por ser tão convincente, faz o espectador se importar e querer saber o desenrolar da história.

    A premissa é bastante interessante, mas a narrativa é um tanto confusa. O roteiro peca pela falta de coerência e de clareza em vários momentos. A história mistura elementos demais sem ter o cuidado de amarrar as pontas soltas. É uma ideia que seria muito bem aproveitada em um formato mais extenso. Comecei a assistir achando que era uma série. E terminei tendo certeza que deveria ser uma série.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.

  • Resenha | Sandman: Prelúdio – Volume 3

    Resenha | Sandman: Prelúdio – Volume 3

    Sandman: Prelúdio é uma minissérie do Senhor dos Sonhos, escrita por Neil Gaiman e ilustrada pelo magistral J. H. Williams III. Os três volumes (dois capítulos em cada), narram a história que deixou Morpheus fraco a ponto de ter sido capturado por mortais na estreia do lendário título The Sandman, publicado em 1989, antes mesmo da criação do selo adulto Vertigo, da DC Comics. Nesta resenha, abordaremos o primeiro volume. Vamos para a análise do terceiro volume da trilogia.

    Sandman está perdido. Na Cidade das Estrelas, depois de ter encontrado seu Pai, o “Tempo”, na jornada para desfazer uma falha íntima que levou ao assassinato de uma versão de si, entra em confronto com estrelas e acaba dentro de um buraco negro, uma estrela morta. Dentro do fim, na ausência total de vida, o personagem revela que aquele era seu objetivo: encontrar sua Mãe, a “Noite”.

    Como expliquei na resenha do segundo volume, o Pai e a Mãe dos Perpétuos (seres que precedem os deuses mitológicos), não são apresentados em Sandman, mas em Sandman: Prelúdio, encontramos o Senhor dos Sonhos lidando com eles. As rusgas familiares são inevitáveis; não é qualquer um que os encontra para conversar sobre algo tão falível quanto a Existência. Tempo e Noite não tem qualquer ligação ou vontade de interferir no Fim das coisas porque sempre persistirão a qualquer colapso.

    Do outro lado do universo, Destino, o irmão cego de Sonho que tem o Livro do Destino acorrentado ao braço, defronta-se com algo que não existe em seu livro: um barco. O veleiro toma a visão do jardim de Destino e ele imediatamente o reconhece como obra de Sandman. O Senhor do Sonho, exausto e à beira da morte, é convocado por seu irmão para dar explicações sobre o barco. Não reconhecendo como obra sua, Sandman entra na embarcação e encontra seres de milhares de planetas; todos coexistem como últimos representantes da sua própria raça. O motivo deles estarem ali é o gancho para o final e resolução do conflito.

    O último volume de Sandman: Prelúdio é o mais filosófico e caótico da trilogia. Os grafismos de J. H. Williams III trabalham a imersão do leitor em páginas muito coloridas (essencialmente cores quentes), que simulam a atmosfera de um sonho. Tudo é real e ao mesmo tempo não é. Em adicional, a história também é mais explorada pelos desenhos, estes cumprem papel especial em contar o não dito, dialogando por vezes com a expectativa do porvir e a natureza simbólica do fim de todas as coisas.

    A caoticidade aparente deriva de os diálogos acompanharem, assim como nos volumes anteriores, os desenhos, ao ponto de o leitor ser atingido por uma espécie de onda narrativa, ou seja, grande volume de informação em curto espaço. Por isso “Sandman – Prelúdio” é para ser lido devagar, apreciando a disposição das imagens, as cores e os significados dos diálogos. Tudo impecável, “Sandman – Prelúdio” é uma obra excelente.

    Lembrando que Gaiman já confirmou o lançamento do Sandman Universe, que contará com quatros novos quadrinhos lançados em comemoração aos 30 anos do personagem. A primeira edição sai em agosto com volume único de The Sandman Universe, que mostrará os leitores o que tem acontecido no reino dos sonhos. As novas publicações serão: Dreaming, House of Whispers, Lucifer e Books of Magic.

    Texto de autoria de José Fontenele.

    Leia a resenha de Sandman: Prelúdio – Volume 1 e Volume 2.

    Compre: Sandman: Prelúdio.

  • Resenha | Sandman: Prelúdio – Volume 2

    Resenha | Sandman: Prelúdio – Volume 2

    Sandman: Prelúdio é uma minissérie do Senhor dos Sonhos, escrita por Neil Gaiman e ilustrada pelo magistral J. H. Williams III. Os três volumes (dois capítulos em cada), narram a história que deixou Morpheus fraco a ponto de ter sido capturado por mortais na estreia do lendário título The Sandman, publicado em 1989, antes mesmo da criação do selo adulto Vertigo, da DC Comics. Nesta resenha, abordaremos o primeiro volume.. Vamos a análise do segundo volume da trilogia.

    Todos os gatos sonham. Morpheus segue a jornada para resolver a causa da morte de uma versão sua, acompanhado por outro Senhor do Sonho, um Gato. Quem leu Sandman provavelmente se lembrará da história contada por um Senhor do Sonho com forma de Gato.

    Eis o conto: os gatos dominavam a Terra antes dos homens e os escravizaram continuadamente. Eram reis que mantinham a subserviência da espécie humana. Certo ponto os homens passaram a sonhar em tomar o lugar dos gatos e esse sonho coletivo fez com que as pessoas destronassem os felinos. O Gato do Sonho, em Sandman, é um Senhor do Sonho que vaga contado aos gatos para sonharem novamente com a época em que eles eram reis. Se os gatos retomarem esse sonho, poderão novamente ocupar o seu antigo posto.

    Fecho o parênteses do Gato do Sonhar para retomar ao Prelúdio. Os dois Senhores do Sonho vagam até os confins do universo até se depararem com as Parcas (ou Moiras), Cloto, Láquesis e Átropos, a trindade fiandeira que decide o passado, presente e o futuro das pessoas. Entidades da Antiguidade Clássica Grega que poderiam, na mitologia de Sandman, também ser substituídas pelas Nornas da Mitologia Nórdica. As três advertem os Senhores do Sonho sobre o comportamento incomum dele em tentar desfazer o passado por egoísmo, ao que Morpheus se esquiva e sai da presença delas.

    Em seguida, os dois Senhores do Sonho se deparam com uma criança próxima da Cidade das Estrelas, seu nome, enigmático, é Esperança. Eles pretendem chegar a cidade para barganhar com estrelas negras, mas antes, Morpheus tenta pedir um favor ao seu Pai. O Pai e a Mãe dos Perpétuos não são mencionados em The Sandman, apenas em Prelúdio ficamos sabendo que os Perpétuos derivam de “Tempo” e “Noite” (com essa definição, Gaiman se aproxima da Mitologia Grega ao descrever que os universos e os Perpétuos derivam de apenas dois seres primordiais).

    Morpheus barganha para que seu pai refaça o passado. A relação familiar não existe e o Tempo se esquiva porque não caber a ele desfazer um erro do filho a custo de bilhões de vidas que serão apagadas por conta da mudança. Gaiman trabalha com a perspectiva dos multiversos e relações de causa e efeito temporais, ou seja, cada mudança, por menor que seja, no passado, acarreta novos seres e novos desdobramentos em todos os universos possíveis. Não cabe ao Tempo, portanto, livrar a prole e os universos do seu fim; o Tempo é inexorável e infinito. Sem sucesso com o pai, Morpheus chega a cidade das Estrelas, é capturado e logo está à beira da inexistência.

    Nos grafismos, o segundo volume de Overture é menos inventivo e onírico que o primeiro. Os desenhos de J. H. Williams III acentuam mais as formas físicas dos seres conscientes e atmosfera ao redor. A palheta de cores continua vasta, percorrendo as cores frias e quentes com voracidade e acentuando as ações dos personagens de Gaiman com zelo. As cenas se acomodam pelos ambientes com naturalidade e mesmo o diálogo críptico de várias páginas é bem compreendido pelos leitores. Várias imagens são duplas ou dividem entre si a mesma gama de tonalidades, trabalho magistral de organização e coloração.

    Sandman:– Prelúdio – Volume 2 é tão bem feito quanto o primeiro e o mais significativo dos três porque expande a mitologia por trás dos Perpétuos; entendemos melhor os conflitos entre eles, a origem, a relação “familiar” e como os sentimentos particulares e tidos como “humanos” interferem na tomada de decisões das tramas. Uma obra sensacional que alia clareza textual, grafismo cuidadoso e trama envolvente. Muito recomendada.

    Texto de autoria de José Fontenele.

    Leia a resenha de Sandman: Prelúdio – Volume 1 e Volume 3.

    Compre: Sandman: Prelúdio.

  • Resenha | Sandman: Prelúdio – Volume 1

    Resenha | Sandman: Prelúdio – Volume 1

    Sandman: Overture, traduzido pela Panini Comics como Sandman: Prelúdio, é uma minissérie do Senhor dos Sonhos, escrita por Neil Gaiman e ilustrada pelo magistral J. H. Williams III. Os três volumes (dois capítulos em cada), narram a história que deixou Morpheus fraco a ponto de ter sido capturado por mortais na estreia do lendário título The Sandman, publicado em 1989, antes mesmo da criação do selo adulto Vertigo, da DC Comics. Nesta resenha, abordaremos o primeiro volume.

    Todas as criaturas podem sonhar e para cada uma delas existe uma versão própria do Senhor dos Sonhos. Logo no início do Prelúdio somos apresentados a flores alienígenas que sonham. Repentinamente aqueles vegetais dotados de consciência passam a duvidar da natureza do Sonhar e isso acarreta a morte de uma versão do Senhor dos Sonhos. Isso nunca aconteceu antes.

    Temos um corte. Na cena seguinte Morpheus marca uma conversa com o Coríntio e os leitores ficam sabendo mais informações sobre esse personagem secundário e assassino, mas antes que o Sonho possa finalizar a visita, ele é invocado por uma força misteriosa. Morpheus sente que a pressão esmagadora da invocação significa problemas e, por isso, decide reunir seus objetos de poder no Sonhar.

    A força misteriosa o arrebata e logo Morpheus é jogado em um descampado oculto com outras figuras ao seu redor. Todos aqueles outros seres são ele mesmo. O Senhor dos Sonhos os reconhece e todos se reconhecem entre si; são Sonhos de todas as formas de vida de todos os universos que existem. Espelhos de mesma essência: o Sonho.

    Gaiman desenvolve a mitologia por trás do Senhor do Sonho ao deixar claro que todas as partículas sonham, desde a primeira forma de matéria até todas as outras que virão em todas as realidades possíveis. Voltando à história, quando todos eles param de se analisar, revelam o motivo da reunião: um Senhor do Sonho foi morto e essa ausência é capaz de criar uma anomalia que levará toda a Existência à morte.

    A partir daí, o Prelúdio acompanha Morpheus na jornada até a solução do assassinato. Rapidamente ficamos sabendo que o Senhor dos Sonhos sabe a causa do fim, pois mesmo a versão morta é parte da essência de cada um deles. A jornada, portanto, não é de investigação, mas de reparação de uma falta cometida pelo próprio Morpheus que originou o assassinato dele mesmo.

    Sandman: Prelúdio, é uma jornada íntima. Morpheus não é mortal, mas é tão falível quanto. Gaiman dota seus Perpétuos de méritos e falhas que se assemelham aos deuses politeístas mitológicos (a mitologia de Sandman explica que os Perpétuos são os predecessores dos deuses falíveis e imortais). Morpheus carrega defeitos de caráter que apenas foram amadurecidos com a disposição da eternidade para si. Antes, quando ainda era jovem (embora isso soe estranho) , cometia enganos.

    Em todos os aspectos, o volume é impecável. Textos curtos e suficientemente significativos por conta de Gaiman; páginas desenhadas com vigor, cores vivas e ousadia por parte do experiente J. H. Williams III. Como representar os elementos oníricos de uma forma inteligível e sedutora? Sandman: Prelúdio é a resposta. Atmosfera asfixiante e paralelamente fascinante. O zelo na produção de todas as histórias do personagem estão em outro patamar de criação artística. Impecáveis.

    Texto de autoria de José Fontenele.

    Leia a resenha de Sandman: Prelúdio – Volume 2 e Volume 3.

    Compre: Sandman: Prelúdio.

  • Crítica | Blow-Up – Depois Daquele Beijo

    Crítica | Blow-Up – Depois Daquele Beijo

    Apesar de inaugurar uma transição relevante no cinema de Michelangelo Antonioni, o auge na forma do cinema do cineasta italiano já alçava ares de grande pessoalidade e também universalidade desde O Grito, filme que marcou a passagem do neo-realismo italiano para o existencialismo, atravessando títulos de notável influência como a trilogia A Aventura, A Noite e O Eclipse, passando por O Deserto Vermelho (primeiro filme onde Antonioni trabalhou com cores) e culminando em sua primeira incursão internacional, o enigmático Blow-Up – Depois Daquele Beijo.

    E dentro da temática existencialista, Antonioni desenvolveu um notável apreço sobre o estudo da natureza social através da incomunicabilidade e a solidão como resultado iminente. Antonioni voltava seus holofotes especialmente para o cotidiano burguês marcado por abundância material, ostentação e valorização das rígidas condutas sociais, mas incompleto e tedioso por dentro. Dentro deste círculo vicioso e de aprisionamento, “Depois Daquele Beijo” atravessou os anos firmado como o ponto de transcendência na temática predileta de Antonioni, explorando aqui o mundo sair de sua terra natal e rodar em cenários ingleses.

    E Thomas (David Hemmings), nosso protagonista, é a personificação exata dessa incomunicabilidade e seus efeitos sociais. Ele é um dos fotógrafos mais bem pagos e requisitados da Londres dos anos 60, dirige um Rolls Royce, possui uma casa espaçosa e sempre tem diversas modelos a seus pés se entregando carnalmente para serem fotografadas por ele. Apesar disso, a vida de Thomas é marcada pelo tédio constante, um escravo das amarras sociais que lhe enxertam num marasmo cotidiano do qual o fotógrafo só se sente liberto diante de um comportamento angustiante e grosseiro, no qual trata suas modelos de forma machista e abusiva, assim como chega ao ponto de comprar uma enorme hélice apenas porque possui dinheiro suficiente para isso. É neste mesmo dia, num dos rompantes para quebrar sua rotina, que Thomas presencial um casal apaixonado se beijando num enorme parque. A cena, tão parte do cotidiano, lhe instiga. Thomas começa a fotografar o casal, e logo é notado pela mulher, que pede seu filme para que as fotos não sejam reveladas. Recusando o pedido, Thomas mais tarde descobre que entre suas fotografias (numa sequência enérgica e vibrante) está o possível registro de um assassinato, e partir dali a narrativa será centrada nas tentativas de Thomas em descobrir o que sua câmera realmente capturou.

    Fica claro, entretanto, que o que menos interessa ao roteiro do próprio Antonioni em parceria com Tonino Guerra (mais tarde indicado ao Oscar por Amarcord) e baseado no conto As Babas do Diabo de Julio Cortázar, é qualquer resultado de sua investigação ou as consequências de seu envolvimento com Jane (Vanessa Redgrave, belíssima), mulher que fotografou no parque. Antes disso, Antonioni transforma seu filme num estudo imagético da luta contra a solidão, da luta contra a desesperança de um cotidiano nada desafiador, e não é por acaso que o cineasta explora com eficaz ambientação a Londres dos anos 60 marcada pela libertação através do sexo, das drogas e do rock’n roll. Icônicos, inclusive, são os momentos que o filme incorpora esse espírito libertino na sequência musical com os The Yardbirds, que teve entre seus integrantes grandes músicos como Jimmy Page (integrante do Led Zeppelin), Eric Clapton e Jeff Beck. Assim, Antonioni transcende a sua própria superfície ao construir Depois Daquele Beijo como um estudo da força e do poder das imagens e suas representações  de uma época e significados pessoais. Isto fica particularmente claro na intensa coloração da direção de arte e da iluminação de Carlo Di Palma, que fundem os personagens a paleta de cores urbana das locações, em especial a cena do parque, mergulhada num verde que representa a liberdade de Thomas pela captura da imagem e em sua própria composição narrativa com as fotografias em seguida. Colabora também a trilha sonora de Herbie Hancock, pontual nos momentos em que se faz necessária e ausente nos momentos em que o silêncio se revela a chave para a imersão.

    E neste aparente jogo de gato-e-rato, Antonioni evoca as questões sobre o que é autêntico na imagem, na busca da verdade além de sua superfície, discurso metafísico esse que viria servir de inspiração para obras de cineastas renomados como Stanley Kubrick e Terrence Malick. A busca por respostas é lenta, reflexiva, mas em momento algum sua finitude para estar entre os interesses de Antonioni. Suas imagens falam por si só, mas estará nelas a verdade, tal qual nas fotos tiradas por Thomas no parque? Em todo este mosaico, temos simbolizado a prisão social na qual o homem, desde os primórdios dos tempos, se mantém.

    E no desfecho surreal onde acompanhamos uma partida de tênis aparentemente imaginária, Blow-Up – Depois Daquele Beijo dialoga com a fuga da realidade cotidiana e com o poder da construção da imagem. É o cinema valorizando o cinema. E poucos em sua carreira falaram disto como Michelangelo Antonioni.

    Texto de autoria de Rafael W. Oliveira.

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  • Crítica | Vingadores: Guerra Infinita

    Crítica | Vingadores: Guerra Infinita

    Como eu havia escrito no meu texto sobre as expectativas em torno de Vingadores: Guerra Infinita, a hora havia chegado. O filme que marca os 10 anos do conhecido Universo Cinematográfico Marvel – UCM chegou aos cinemas com muitas dúvidas, desde as mais óbvias no que diz respeito ao encaixe de dezenas de heróis e seus coadjuvantes em tela, passando pelas apostas sobre qual herói seria o candidato a morrer e a partir os corações dos fãs, até a pergunta mais óbvia e com extrema relevância para a trama: onde está a Joia da Alma?

    Vingadores: Guerra Infinita entrega aos fãs e ao espectador aquilo que satisfaz desde os mais aficionados até aqueles que não estão tão familiarizados assim com o UCM e melhor, além de encher os olhos daquele que assiste, causando as mais diversas sensações, amarra todo o universo iniciado em 2008 com Homem de Ferro, tendo Pantera Negra como último “representante”, solucionando todas as dúvidas e amarrando todas as pontas soltas no decorrer do caminho, além de jogar no ar muitas outras perguntas que, talvez comecem a ser respondidas nas produções Homem-Formiga e a Vespa, Capitã Marvel e, obviamente, na quarta aventura da equipe que estreará somente em 2019, embora já esteja em estágio final de filmagem.

    Tentando evitar spoilers ao máximo neste texto, Guerra Infinita, como todos já sabem, marca a busca do vilão Thanos (Josh Brolin) pelas Jóias do Infinito e tem como ponto de partida os minutos seguintes da cena pós-créditos de Thor: Ragnarok, quando a nave da nova Asgard é abordada por outra gigantesca nave. Logo em seus primeiros minutos o filme já mostra quem de fato é Thanos e ele é assustador. Assim, deu-se início ao maior filme da curta, porém, de sucesso história da Marvel.

    Logo no início desse texto foi falado que um dos maiores desafios da produção seria encaixar tantos heróis, protagonistas e coadjuvantes em tela, e após o término do filme, tem-se se a sensação que cada um dos milhares de nomes que aparecem nos créditos finais, desde a direção de Joe e Anthony Russo, passando pela história escrita por Christopher Markus e Stephen McFeely, até prestadores de serviço como o “cozinheiro de Robert Downey Jr”, ou o “cabeleireiro de Don Cheadle”, merecem ser aplaudidos de pé. O cuidado com a história é tão minucioso que coisas “bobas”, mas que poderiam ter ficado de fora estão lá. Um pequeno exemplo disso é que devemos lembrar que Bruce Banner (Mark Ruffalo), por exemplo, abandonou o planeta ao final de Vingadores: Era de Ultron e ficou anos fora do ar, enquanto, na Terra, acontecia os eventos de Guerra Civil, Homem-Formiga, Doutor Estranho, Homem-Aranha: De Volta ao Lar e Pantera Negra. Banner acaba sendo atualizado de algumas coisas de uma maneira muito divertida.

    Aliás, Banner, a julgar pelo que aconteceu nos últimos anos, está mais leve, sem aquela agonia constante que o personagem entregava nos demais filme e isso contribui para alguns momentos de humor serem protagonizados por Mark Ruffalo. Humor esse que está presente em todo o transcorrer da fita, cada um a sua maneira. As partes dos Guardiões da Galáxia são tão autênticas que parecem que foram escritas por James Gunn e isso foi bem acertado no filme, já que aqui, um não invade o território do outro no que diz respeito ao estilo de cada personagem e assim, meio que temos um núcleo de personagens habilidosos com o humor e outro núcleo bem mais sereno. Tudo isso aliado à diversas cenas de luta e ação desenfreada, todas muito bem feitas e bem resolvidas.

    Em Guerra Infinita todo herói tem seu momento de protagonismo. O roteiro e a direção, de maneira habilidosa, cedem espaço para todos, sem exceção, algo que foi muito bem construído por Joss Whedon no primeiro filme, mas totalmente esquecido pelo diretor em Era de Ultron e pelos Irmãos Russo em Guerra Civil, quando há momentos em que Visão (Paul Bettany) e Feiticeira Escarlate (Elizabeth Olsen), dois dos mais poderosos no campo de batalha, simplesmente desaparecem, buscando de maneira preguiçosa, deixar a batalha mais equilibrada. Aqui, ninguém é esquecido e pra adicionar ainda mais um desafio para produção, ainda temos gratas surpresas, como o retorno de alguns bons personagens, além da inclusão de outros novos. Contudo, com relação ao seu herói preferido, fica o alerta de que você poderá ficar um pouco decepcionado se considerarmos o tamanho de sua expectativa. Guerra Infinita não tem tempo para desenvolver os personagens e as relações entre eles e os motivos são tanto relacionados ao desenvolvimento da produção, como ao desenvolvimento da história, porque Thanos, simplesmente, não deixa. E isso nos leva a dois destaques: o já mencionado titã louco e o deus do trovão, Thor (Chris Hemsworth).

    O Thanos de Brolin é incrível. Ele não é um vilão clássico, megalomaníaco, que busca somente destruir tudo e todos em busca única e exclusiva de poder, desbancando Loki (Tom Hiddleston) do trono de melhor vilão do UCM. Thanos tem um propósito até justificável e percebe-se que ele sofre por carregar esse fardo, tanto que a cada conquista, em vez de comemoração, vemos certo desânimo em seu semblante e chega num determinado momento em que você fala consigo mesmo “vai, Thanos!” tamanha a serenidade do personagem. A clássica vilania fica por conta de seus filhos Fauce de Ébano (poderosíssimo), Proxima Meia-Noite, Corvus Glaive e o brutamontes Estrela Negra.

    Já Thor sofreu mudanças significativas em Ragnarok e o personagem, dentro dos principais, foi o que mais evoluiu se levarmos em conta seus dois primeiros filmes que foram ruins e suas duas participações nos dois primeiros filmes dos Vingadores. E também, o contato junto dos Guardiões, fez com que o semideus se sentisse em casa, se encaixando na equipe como uma luva. Thor sempre foi um herói dotado de extrema arrogância e em Guerra Infinita podemos perceber que ele é um grande guerreiro.

    Muito se especulou sobre a empreitada ser um enorme filme que foi dividido em duas partes, assim como as produções finais de Harry Potter, Crepúsculo e Jogos Vorazes e embora, ambas histórias tenham tido filmagens simultâneas, optou-se por ser duas produções distintas e com títulos próprios e o que se vê em Guerra Infinita é a síntese disso. Um filme próprio, com começo, meio e fim bem distribuídos. Além disso, ao término da produção, fica claro que o filme é sobre Thanos, algo que foi incrivelmente acertado, deixando a entender que o próximo será sobre a equipe.

    O sentimento que Guerra Infinita deixa é de alegria e dever cumprido, o que aumenta ainda mais a expectativa para o próximo filme que chega aos cinemas daqui aproximadamente um ano. Enquanto isso, ficamos no aguardo da San Diego Comic Con em julho, que pode trazer as primeiras imagens e informações da misteriosa conclusão da história.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

  • Review | The OA – 1ª Temporada

    Review | The OA – 1ª Temporada

    The OA tem muita sorte, na verdade sorte não é a palavra mais correta, já que é um certo mérito, mas é de fato muito feliz de ter um esqueleto narrativo interessante, porque se dependesse do restante… Séries se vendem pelos seus pilotos, é o episódio mais importante de qualquer produção seriada, é ele que apresenta personagens, narrativas, plot e ainda instiga. Essa é sua função. E passar do piloto de The OA não foi nada fácil. Os outros sete episódios deixam bem claro que os problemas se estendem por toda a temporada e a culpa não é o possível desinteresse de quem assiste.

    Prairie é uma mulher cega que desapareceu durante sete anos, sem pistas, e que retorna com a visão misteriosamente recuperada, cicatrizes nas costas e se denominando a OA. Ela decide reunir um grupo de cinco pessoas para contar sua história e com isso entramos numa rede de temáticas, desde ficção-científica ao metafísico-espiritual.

    Para clarear as coisas, a série tem um saldo positivo, conquista e constrói engajamento, mas como já dito, tudo por causa da ideia que se passa, não pelo todo. A estrutura narrativa é falha demais, enquanto não expõe quase nada e gera infinitas questões, também verbaliza situações e exagera na explicação super expositiva. Enquanto faz personagens terem arcos sobrando (como uma paquera no colégio, por exemplo), outros ficam completamente deficientes de tridimensionalidade ou informações.

    O roteiro e a montagem também não conseguem distribuir as narrativas, são blocos extensos que te fazem esquecer do outro e vice-versa, e de repente o tédio já é presente e um maior interesse em um do que no outro também. Não há fluidez e várias vezes falta ritmo. A personagem principal frequentemente deixa de ser uma personagem e passa a ser a materialização de um desejo da série de ser pedinte e isso nos tira um pouco da imersão, e por fim, a série tem um desequilíbrio gigante em criar mais questões do que respostas, longe do público querer tudo na mão, mas a sensação que fica é que mistérios são mistérios apenas por serem, e não há muita recompensa do lado de cá. Resta esperar o que está por vir, em cegueira.

    Mas calma, que bela história. Não aparece ideias tão interessantes assim faz tempo, toda a “mitologia” criada é instigante e nas horas mais difíceis é o que nos mantém presos aos episódios. É um plot visivelmente pensado com carinho e cheio de camadas que nos fazem se interessar mais e mais e ficar encantados quando aos poucos podemos ver certos potenciais e caminhos. A câmera é muito boa e a melhor amiga da própria história quando ajuda a contá-la. Nos dá informações preciosas em planos simples e cria atmosferas pontuais, junto com uma fotografia muito chapada, clara e bonita.

    A música é boa e certeira para criar grandes momentos, as atuações são funcionais e as personagens transmitem relacionalidade apesar do roteiro desequilibrado. The OA cumpre o papel de ser entretenimento na maior parte do tempo, falha na estrutura seriada, traz ideias incríveis e temáticas carregadas de potencial, consegue ser diferente como parece querer ser e isso acarreta em muitos mind blowings, mas precisa melhorar bastante para ser de toda boa.

    Não conquista à primeira vista, mas às vezes o que importa é que toca lá no fundo, e quanto toca…

    Texto de autoria de Felipe Freitas.

  • O que esperar de Vingadores: Guerra Infinita

    O que esperar de Vingadores: Guerra Infinita

    Queridos amigos, finalmente a hora chegou. O filme mais aguardado de 2018 e, talvez, da década, aqueleque celebra os 10 anos do Universo Cinemático Marvel – UCM, chega aos cinemas nesta semana. Vingadores: Guerra Infinita marca o final da “primeira perna” iniciada lá em 2008 com Homem de Ferro e desde então, o UCM trilhou um caminho de extremo sucesso com mais altos do que baixos, consagrando-se com filmes como o já citado Homem de Ferro, a primeira aparição dos Vingadores em tela, a grata surpresa chamada Guardiões da Galáxia, o ótimo Capitão América: O Soldado Invernal e, por último, Pantera Negra, o maior sucesso do estúdio.

    O objetivo da Marvel, desde o início, foi criar um universo coeso, dando espaço aos seus principais heróis, mas colocando algo maior como pano de fundo. E agora, olhando para trás, fica mais que claro que o plano era esse desde o início. E é isso que pode fazer com que Guerra Infinita seja considerado em breve o maior filme da história do cinema, tanto em termos de bilheteria quanto em termos de importância para a cultura pop mundial. Poderá representar para nossos filhos e netos o que Star Wars representou para nossos pais e para nós.

    Quando o “chefe” Kevin Feige anunciou durante um painel da San Diego Comic Con, em 2006, que em breve haveria um filme do Homem de Ferro e que mais adiante os fãs iriam ver os Vingadores juntos na tela grande, o sentimento era de desconfiança embora o público ali presente tivesse ido à loucura. A desconfiança vinha pelo fato de que tínhamos pouquíssimos filmes de heróis com qualidade, vide Superman estrelado por Christopher Reeve, o Batman de Tim Burton, O Cavaleiro das Trevas, de Christopher Nolan e, por quê não, Homem-Aranha, de Sam Raimi. Nessa lista, podemos citar também o primeiro X-Men, que estreou no final dos anos 90 e que marcou o início desse novo boom de filmes de heróis. Com isso em conta, o plano da Marvel era ambicioso e deu certo. E a fórmula, a julgar pelos personagens e histórias de Stan Lee e Jack Kirby era basicamente, transpor aquilo que estava nos quadrinhos para o cinema: personagens carismáticos, tom leve e cor, muita cor, tudo que a Disney (dona da Marvel) gosta. Então, o sucesso do estúdio se resume numa única palavra: merecimento.

    Ainda assim, acreditamos que nem só de merecimento e trabalho vive um filme. Obviamente, as pessoas tratam seus projetos como filhos e ali se investem muito dinheiro, muito trabalho, estresse, noites sem dormir e etc, sem contar que estamos falando da indústria do cinema, que infelizmente acaba por privilegiar cifras em vez de um bom entretenimento. É raro quando as duas coisas acontecem juntas. E para que Guerra Infinita seja um sucesso aos olhos dos fãs, o filme precisa ser bom e juntar num só escopo todos os heróis dos últimos 10 anos, somados com alguns dos principais coadjuvantes do universo. Um desafio absurdo, mas ainda assim, o filme poderá ter um saldo muito positivo. A partir daqui, vamos tratar de teorias de como será o enredo do filme. Vale destacar que este que vos escreve não leu absolutamente nada sobre o filme e o que for escrito aqui é o que poderá ou não acontecer, a julgar TÃO SOMENTE pelos trailers lançados.

    Os heróis não devem se encontrar durante o filme, ou caso se encontrem, a reunião deverá acontecer somente nos estágios finais da fita. É certo que os Guardiões da Galáxia irão interceptar os destroços da nave que transportava a nova Asgard, após os eventos de Ragnarok e que Thor (Chris Hemsworth) será resgatado. Loki (Tom Hiddleston), provavelmente será resgatado por Thanos (Josh Brolin) e se aliará novamente ao Titã Louco. Tanto Thor, quanto os Guardiões estão familiarizados com as Jóias do Infinito e isso, provavelmente, os obrigarão a ir atrás do Colecionador (Benicio Del Toro) em busca de alguma informação. Podemos chamar esse núcleo de Cósmico para facilitar um pouco as coisas deste grupo formado por Thor, Senhor das Estrelas (Chris Pratt), Gamora (Zoe Saldana), Mantis (Pom Klementieff), Drax (Dave Bautista), Nebulosa (Karen Gillan), Rocky (voz de Bradley Cooper) e Groot (voz de Vin Diesel).

    Na Terra é muito provável que os heróis resgatados pelo Capitão América (Chris Evans) ao final de Guerra Civil estejam operando na clandestinidade, justamente por serem foragidos e tomam conhecimento de que algo está acontecendo após Visão (Paul Bettany) sofrer um ataque dos filhos de Thanos, Corvus Glaive, Proxima Meia-Noite e Fauce de Ébano, o que obriga a equipe se dirigir até Wakanda em busca de algum auxílio. Vamos chamar esse núcleo de Vingadores Secretos e o grupo pode ser formado por Capitão América, Viúva Negra (Scarlett Johanson), Falcão (Anthony Mackie), Feiticeira Escarlate (Elizabeth Olsen) e Visão.

    Aí teremos um terceiro front, o de Nova Iorque, que será formado por Homem de Ferro (Robert Downey Jr), que estará usando a famosa armadura Bleeding Edge, que nos quadrinhos é construída com tecnologia Extremis, Doutor Estranho (Benedict Cumberbatch), Wong (Benedict Wong) e Homem-Aranha (Tom Holland).

    E aí você pergunta: mas e o Hulk? O papel de Bruce Banner (Mark Ruffalo) pode ser mais importante do que se imagina, uma vez que parece que será ele que fará o elo entre os 3 fronts. De alguma maneira, Banner cairá da Nova Asgard para o Sanctum Sanctorum, sendo o responsável por alertar Tony Stark e Stephen Strange da ameaça que está por vir. Assim, de alguma maneira, o front de Nova Iorque se unirá ao núcleo cósmico para enfrentar Thanos em algum local fora da Terra. E é aí que as coisas devem ficar interessantes. Será sensacional ver Homem de Ferro, Homem Aranha e Doutor Estranho interagindo com os Guardiões da Galáxia.

    Enquanto isso, novamente Banner será um mensageiro, indo até Wakanda, alertar sobre o perigo iminente os Vingadores Secretos que ganharam a adição do Soldado Invernal (Sebastian Stan), Máquina de Combate (Don Cheadle), Pantera Negra (Chadwick Boseman), Shuri (Letitia Wright) e Okoye (Danai Gurira).

    Acreditamos que será basicamente esse o cenário de Guerra Infinita e é muito provável que heróis como Gavião Arqueiro (Jeremy Renner), Homem-Formiga (Paul Rudd) e Vespa (Evangeline Lilly) não apareçam, ou caso ocorra, a participação em tela deva ser bem reduzida. De qualquer forma, a participação desses heróis terá muita importância em Vingadores 4, o que leva a crer que eles, talvez, possam aparecer junto da Capitã Marvel (Brie Larson), ou em alguma situação que remeta à heroína, numa cena pós-créditos.

    De qualquer forma, reunir essa quantidade de personagens em cena, com diversos protagonistas, não deve ter sido uma tarefa fácil para os Irmãos Russo e para os roteiristas Cristopher Markus e Stephen McFeely e demais membros da absurda produção. Por conta disso, é possível que seu herói predileto, infelizmente, tenha uma participação que não lhe agrade, mas creio que todo mundo trabalhou para que ninguém ficasse sem o seu momento.

    Por enquanto o que nos resta é aguardar só mais um pouco para assistir parte da história do cinema sendo feita. Avante, Vingadores!

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.