Categoria: Cinema

  • Crítica | Chico: Artista Brasileiro

    Crítica | Chico: Artista Brasileiro

    Chico - Artista Brasileiro - poster

    Há dez anos, Chico Buarque foi tema de uma série documental lançada em home video em 13 volumes. Analisando a própria carreira, cada filme era dedicado a uma de suas vertentes musicais, bem como a família, a literatura e a todas as outras características que definem este grande compositor brasileiro.

    Diante de um lançamento ainda recente, o documentário Chico – Artista Brasileiro poderia soar redundante. Afinal, neste período, a carreira do músico e escritor foi renovada somente com um novo álbum, Chico, e o romance O Irmão Alemão, além de uma constante reverencia a qual o país tem com este compositor, símbolo da canção brasileira, obra de análise de diversos críticos e estudos literários e notícia para os jornais mais risíveis, focados em seus atos do cotidiano no Rio de Janeiro.

    Neste documentário de Miguel Faria Jr. – diretor que biografou anteriormente Vinícius de Morais – a figura do músico é novamente louvada sem medo de uma repetição temática, abrangendo de maneira geral sua figura a partir de depoimentos do próprio autor. Pequenos pontos de sua biografia são apresentadas somente como base para exaltá-lo e situar comentários a respeito da carreira, trazendo à tona uma versão mais íntima e pessoal de suas concepções. Além da figura conhecida, explorada e amada, Buarque se revela um homem ligado à cultura desde a infância, com percepções coesas sobre o significado da arte e a composição musical e literária. Retirando a sua fama, o músico se considera ordinário, um erudito que reconhece a difícil composição da arte e a delicada matéria da vida, sábio ao lidar com a solidão inerente ao homem. Ao explorar esta via, o documentário se revela franco ao desmistificar o personagem Chico Buarque e destacar o homem com anseios e medos como qualquer um, sem que a fama, e o pavor de subir ao palco, fosse transformadora.

    Como é comum em muitos documentários musicais, uma vertente que vem sendo bem desenvolvida no país nos últimos anos, com grandes registros sobre Paulinho da Viola, Cartola entre outros compositores, algumas canções são apresentadas na íntegra. Tentando diferenciar-se da mera reprodução, regravações foram feitas especialmente para o documentário em um show particular em que a câmera transita brevemente pelos cenários emulando intimidade. Em destaque, a sempre incrível interpretação de Ney Matogrosso que canta As Vitrines e o belo dueto de Biscate entre Mart´Nalia e Adriana Calcanhoto.

    A jornada termina rente ao presente, na composição de seu último romance, uma obra memorialística ficcional desenvolvida a partir de um irmão alemão descoberto em momento posterior da vida, apresentando trechos da narrativa na voz de Marília Pera. Aos 71 anos de idade, com mais de dois terços da vida sob a luz dos holofotes, Chico Buarque se mantém como uma grande referência musical no país. Sem nenhuma vontade de se aposentar, como se sua trajetória já não fosse grandiosa o suficiente, o músico escritor ainda deseja mais.

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  • Crítica | É o Amor

    Crítica | É o Amor

    É o Amor - Poster

    A vida imita a arte, e arte é um reflexo da vida olhada através de vidros curvados e obturadores, pincéis e acordes. É muito fácil encontrar em peças de arte tão abrangentes quanto o cinema um tanto de nossa vida. Mas talvez o diretor já experiente Paul Vecchiali desconfiasse deste poder e buscasse falar a todos os amores ao mesmo tempo, sempre de uma forma severamente cínica e desconfiada da instituição do Amor, e lançando luz sobre a ideia de que, embora seja um símbolo ao qual todos queiram se apegar, este símbolo mostra-se como uma espécie de espectro debochado ou como uma barata, que foge cada vez que acendemos a luz, e quando foge deixa o sentimento de constrangimento.

    O amor é aqui uma desculpa para derramar sangue, trair expectativas e atuar como raiz e fruto da descompensação sentimental. Pessoas que não amam o que fazem, jovens héteros que não compreendem o amor, velhos gays que se amaram demais de forma platônica e hoje não sabem como lidar um com o outro.

    A palavra-chave para o verborrágico filme É o Amor é dissonância. Logo na primeira cena vemos um monólogo patriarcal sobre o comportamento da sociedade em torno do que fazemos entre quatro paredes. Em seguida uma discussão banal entre um casal de uma pequena cidade no interior francês, inicialmente com o enquadramento no marido que chegou tarde e tenta dissuadir a esposa em sua chateação de estar sentindo-se sozinha. Ela argumenta que ele que a convenceu para sair do emprego que gostava e onde tinha amigas. Sua argumentação tem pouco efeito no marido, e por consequência pouco efeito em nós. Os efeitos sonoros diegéticos de pratos e garfos tilintando sem que os vemos nos faz pensar nos movimentos da esposa. A imagem que vem, ainda sem sabermos como é seu rosto, é de uma típica megera. Em seguida, o mesmo diálogo, mas com o enquadramento ancorado na esposa. Vemos então que sua fala não é amarga, é solitária e triste, e que quando ri o faz como estratagema para aceitação de uma condição de deslocamento. O tilintar dos pratos e garfos em uma casa minúscula mostra uma pessoa que se esforça para fazer muito com pouco e fazer o dia ancorado naquela casa algo um pouco menos monótono. Ela quer trair o marido. Ele acha absurdo. Ela acha mentira. Ele diz que a ama. Ela quer que ele sinta mais do que diz.

    O mesmo recurso é usado posteriormente e demonstra a tese defendida de que, quando não se enxerga o outro, a palavra e os afagos se dissolvem no ar. Com um dos personagens centrais sendo um ator insatisfeito com sua carreira e monólogos bastante expositivos, a impressão é que se está vendo uma peça teatral, inclusive pela forma propositalmente desleixada que a trilha sonora é inserida misturando aquilo que os personagens ouvem com o que não deveriam ouvir. É o Amor defende que a tristeza do amor é que ele é, justamente, como no teatro e cinema, apenas uma farsa ensaiada.

    Texto de autoria de Marcos Paulo Oliveira.

  • Crítica | Meu Amigo Hindu

    Crítica | Meu Amigo Hindu

    Meu Amigo Hindu - posterApós ficar anos sem filmar, Hector Babenco retorna à condução de longas-metragens, retomando um estilo muito comum dentro da literatura e de algumas escolas de cinema, conferindo no roteiro uma história autobiográfica. Meu Amigo Hindu possui um caráter ainda mais pessoal que simples histórias de um cineasta já perto do fim da vida, uma vez que seu cunho emocional é grande.

    A rejeição da persona detestável de Diego Fairman (Willem Dafoe) é construída sem mostrar os atos de ódio que ele provocou. O método é um pouco rápido, justificado pelo fato do personagem estar doente, em uma fase moribunda, mas a falta de explicar os atos que fazem dele uma persona non grata não se justifica, e apela demais para a suspensão de descrença do público, carecendo de cuidado em introduzir os sentimentos extremos ao espectador.

    As fases distintas da vida privada de Babenco são mostradas por meio de cenas intimistas, que dependem de um apego aos personagens. O grave problema tanto no drama de câncer terminal quanto nos conflitos internos entre personagens é que não há espaço em tela para o desenvolvimento destas intrigas. Tudo gira em torno de Fairman e de seu intérprete, incluindo aí a linguagem em inglês, mesmo o filme se passando no Brasil, uma interferência para abraçar Dafoe ainda mais injustificada do que em O Beijo da Mulher Aranha.

    A brevidade dos estágios de tratamento faz todo o efeito dramático soar como eventos superficiais, fato esse que denigre demais a história. O misto de drama e humor negro também soa estranho em meio à pretensão de apresentar uma despedida da vida e do cinema, algo piorado pelo fato do filme não ser um desfecho oficial da carreira de Babenco. A tentativa de poetizar a trama através da interferência de autor/personagem soa forçada e sem significado.

    O roteiro trata com cinismo único o modo de lidar com a morte e até os improváveis dribles dados na entidade, banalizando não só a brevidade da vida como também os eventos ocorridos no filme. A segunda metade melhora ligeiramente, mostrando o processo de escrita de um novo roteiro, com a possibilidade de um recomeço que tem seu ápice na metalinguagem da obra.

    O período após a doença é menos verborrágico, sendo assim distinto da primeira parte. O entendimento da história passa a ser mais do público do que do artista, fato que ocasiona uma das poucas características longe de críticas. A gangorra emocional decorrente do estado depressivo do personagem ao menos é exemplificada em detalhes, mostrando os altos e baixos comuns desta condição, variando da melancolia até a esperança gratuita em alguns momentos, atingindo de forma interessante o desequilíbrio comum a essa doença da psiquê de Babenco/Fairman.

    Outro bom momento é o retrato de suas esposas, com Xuxa Lopes e Bárbara Paz sendo bem executadas por Maria Fernanda Cândido e pela própria Paz. Entre as outras atuações, não há qualquer destaque digno de nota, exceto pela entrega de Dafoe ao papel, fator obrigatório, evidentemente, já que todo o argumento narcista de Babenco gira em torno de seu personagem, um enfado tanto para as pessoas que o cercam quanto para o espectador que o assiste, resultando em um longa frígido e carente de inspiração.

  • Crítica | Lola Contra o Mundo

    Crítica | Lola Contra o Mundo

    Lola Contra o Mundo - poster

    O apreço por contar uma trajetória cinematográfica por meio de imagens é mostrado no primeiro take de Daryl Wein em seu Lola Contra o Mundo. Caso quisesse expressar o mote de seu roteiro sem a narração da personagem-título, a mensagem já seria passada. Lola é interpretada pela nova queridinha do cinema independente norte-americano, Greta Gerwig, ainda antes de seu sucesso em Frances Ha, curiosamente interpretando uma menina alternativa, deslocada e levemente insana, mas com nuances completamente diferentes entre as personagens.

    Apesar da cena da praia, que inicia a trama, mostrando a areia suja e com lixo, os momentos posteriores visam contradizer de maneira óbvia o conceito de que aquele mundo ruiu. Lola é surpreendida por seu até então namorado Luke (Joel Kinnaman), que entrega a ela uma aliança, o símbolo máximo de compromisso matrimonial, e como “toda” mulher, ela cede ao sonho com o seu parceiro. O chamado à aventura acontece com pouco mais de sete minutos, quando Luke cancela o pedido de casamento duas semanas antes da festa, fazendo Lola mergulhar em uma profunda depressão, tornando seu sofá e cobertas em objetos apetecedores.

    A resistência ao sentimento depressivo permeia o seu entorno, começando com a visita de seus pais e conhecidos. Adentrar no mundo dos solteiros torna-se algo ameaçador e digno de anti-fantasias, imaginando péssimas transas no meio de um bar, sonhos estes provindos da frustração de estar novamente sozinha, depois de 12 anos de relação e beirando os 30.

    A busca por uma fuga da condição forçada de solteira faz Lola se agarrar em qualquer possibilidade de companheirismo, mesmo em amigos de longa data. Mesmo diante disso não há qualquer possibilidade de sucesso nestas empreitadas. Cada um dos fracassos a faz retornar ao pensamento originário, de só conseguir sair da miséria existencial com o causador de seu recente estado depressivo. A câmera de Wein não se engana ao mostrar o apartamento dos seres logo após o orgasmo que pretensamente viria para redimir o casal. O que sobra é a solidão inexorável de uma vida que não tem mais condições de ser compartilhada.

    As superações e não superações da relação fazem crescer uma enorme distância entre as partes, um abismo de proporções dantescas, exacerbado pela estética romântica do filme. A máscara de mentor é compartilhada por diversos personagens, cada um com seu momento mágico de sabedoria e vulgaridade moderada. Mesmo diante dessas figuras, Lola é obrigada a se autocriticar, e ver em si a profunda análise do fracasso e da própria culpa, cuja demora em ser praticada provocou um sem número de afastamentos.

    A trajetória de Lola se finda de um modo condizente com a realidade agridoce do roteiro, e em seu microuniverso consegue ser absolutamente plausível, e até otimista. O intimismo da proposta fílmica ganha ares de maturidade totalitária, sem abrir mão da delicadeza sentimental e das mostras de apoio mútuo, inerentes à qualquer relação de confraternização saudável. Lola Contra o Mundo pode ser lido facilmente como uma jornada de autodescoberta, em que o principal inimigo e aliado é o próprio homem em plena existência.

  • Crítica | 007: Um Novo Dia Para Morrer

    Crítica | 007: Um Novo Dia Para Morrer

    007 - Um Novo Dia Para Morrer - poster

    É impossível seguir um padrão. Por mais que se busque o linear, até o mais fervoroso fã de Harry Potter, Star Wars ou Crepúsculo vai achar prós e contras nos episódios favoritos de cada um. É bom que se saiba que esses produtos, encapados como se fossem o mais nobre Cinema, são feitos para fãs e abertos a todo tipo de debate e discussões. Quando 007 – Um Novo Dia Para Morrer estreou, a internet ainda era um luxo, mas uma coisa já se podia afirmar: o filme é o Batman & Robin das aventuras de James Bond, e este parece ser um fato difícil de se contestar.

    Logo na cena inicial, é impossível não rir com Bond surfando no litoral norte-coreano (?) vestido numa espécie de papel alumínio (??) com pranchas equipadas com armamento militar (???). É o tipo de comédia involuntária que, quanto mais se leva a sério, pior fica. Só faltou a MGM chamar o Joel Schumacher pra direção, bem antes do cara tentar se redimir com o mundo em dois bons episódios de House of Cards, em 2013. Boa tentativa, só que não.

    Pierce Brosnam nunca foi um Bond cool, e uma edição ruim entre as cenas dramáticas para ajudar o ator, enfim, não ajuda muito. Brosnam tem essa expressão natural de “eu sei o que você tá pensando, bonitão”, e na mitologia do espião isso encaixa mais que perfeitamente, contanto, é claro, que o ator não ligue o modo-automático para tentar entender os mistérios de uma incógnita em forma de personagem. Bond, nos livros, é uma sombra, o X das questões onde é jogado para resolver, e tentar sobreviver. O filme de 2002 não consegue ser mais infantil e deselegante, com subtramas políticas profundas como pouco mais que um copo d’água; mero produto de exportação.

    Na iminência de uma guerra entre as duas Coreias, a história tenta nos convencer que Bond sabe o que faz, quando é difícil de nos fazer acreditar na sua boa pontaria. Ao descobrir, por exemplo, da possível existência de um traidor, ou traidora, dentro da agência pra quem trabalha, a MI6, Bond prefere jogar esgrima e transar num cisne de gelo (o fogo é grande!) do que prestar serviços à embaixada britânica, afinal já virou rotina enfrentar os procurados pela Interpol. Por essas e por outras, Um Novo Dia Para Morrer (interminável) é o mais perto dos piores filmes de Jackie Chan e Os Pequenos Espiões que nosso agente já chegou; é a consolidação da falta de sorte de Sean Connery e Roger Moore, quando disseram-nos que já estavam velhos para acertar a mira. O mundo é um lugar frio, sim, mas o filme escolhe a pior maneira de demonstrar o que poucos ainda não sabem.

    E que abertura cheia de faíscas, mulheres de gelo e escorpiões é essa? Nem Madonna e Halle Berry na causa, aliás, deixemos Berry fora disso; aluguel é caro. Mas quer saber o que é legal na vida? Os Vilões de Bond? Sim, a maioria, em especial o icônico Jaws, de 007-Contra o Foguete da Morte, mas no caso, bacana mesmo são dois carros (não tão legais assim porque não são Transformers) correndo no gelo e explodindo montanhas árticas com mísseis atômicos – com uma desculpa qualquer para a brincadeira acontecer. É no que o filme se molda, em torno de uma grande piada, cuja melhor cena de ação, vulgo caricatura, é a famosa sequência que Speed Racer em 2007 quis se inspirar e reproduzir, mas até essa referência os Wachoswki conseguiram estragar. Parabéns.

    Promessas de Réveillon, piadas de português, alienação, cosplay da Madonna e cachorro. Outra coisa que também não falta nesse mundo é fã de James Bond, mas com um representante assim para o universo de espionagem criado por Ian Fleming, (“Parece que seu amigo acabou de vazar“, diz Bond a seu inimigo durante um acidente de avião), fica difícil afirmar que vida de fã é um mar de diamantes. Nem sempre.

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  • Crítica | O Pequeno Príncipe

    Crítica | O Pequeno Príncipe

    Pequeno Principe - Filme

    A obra de Antoine de Saint-Exupéry se mantém como uma narrativa metafórica universalizando, através de suas personagens, sobre sentimentos. Normalmente lido na tenra idade, O Pequeno Príncipe carrega uma bonita mensagem sobre amizade e conhecimento na trajetória de um garoto que vive em um asteróide e, ao encontrar um aviador perdido, passa a acompanhá-lo.

    Recentemente, a obra caiu em domínio público, proporcionando, além da venda natural de diversos objetos relacionados à obra, edições diversas para novos leitores, além desta adaptação produzida pela França. A trama se baseia em parte na trajetória do próprio autor, um aviador morto em combate. Lançada um ano antes de sua morte, a história focava em aspectos essenciais da vida, reflexões provavelmente desenvolvidas em contrapartida aos horrores da guerra. Dialogando com a própria personagem, além de pintá-la em aquarelas, formatando também seu perfil estético, a narrativa se tornou um marco e, ainda hoje, traz bastante apelo.

    Aliada a uma metáfora de cunho moral com uma interpretação pessoal para cada leitor, a história é anacrônica em relação aos tempos de hoje. Se compararmos outros lançamentos infantis com informações em excesso, carregada de signos e cores, parece evidente que a história foi fundamentada para um público anterior a este momento presente. Desta maneira, o filme tenta reiventar a própria narrativa, inserindo a história do príncipe em um contexto atual, além de explorar um viés metalinguístico, inserindo um personagem que reflete a figura do autor.

    Na trama, uma garota na pré-adolescência vive com a mãe, responsável por uma vida extremamente regrada. Como vizinho, as duas tem um louco aviador que envia para a garota a primeira página de O Pequeno Príncipe. A leitura cativa a menina e lhe inspira a pedir mais informações sobre as aventuras da personagem. O filme mantém a dinâmica do livro apresentando um autor narrando a história em terceira pessoa. Porém, em paralelo, há o desenvolvimento breve da vida da garota, obrigada a seguir uma rotina focada no sucesso escolar. Um argumento que conecta com o período contemporâneo e gera o conflito para a história simbólica que o contrapõe.

    Esteticamente a animação é eficiente ao trabalhar com dois conceitos visuais distintos: o cotidiano da garota composto pelo estilo computadorizado e a história do príncipe narrada com maior apelo artístico, emulando um estilo stop motion, mantendo o requinte da história original e claramente demonstrando uma intenção de distanciar o público da estética vista anualmente em animações diversas.

    Sendo uma narrativa breve, a produção se expande além da história original, desenvolvendo uma aventura com a garota em sua procura pelo pequeno príncipe de verdade. Esta parte trabalha os mesmos paralelismos fundamentais da obra de Saint-Exupéry e seus conceitos, como amor e amizade. Uma conexão que promove a obra original e simultaneamente renova-a em um processo semelhante ocorrido com Charlie Brown e Snoopy, outra franquia antiga que foi reapresentada ao novo público em Snoopy e Charlie Brown – Peanuts, O Filme, mantendo o público fiel e, simultaneamente, expandindo sua tradição. Um feito merecido para que grandes histórias permaneçam no imaginário coletivo infantil.

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  • Crítica | Little Boy: Além do Impossível

    Crítica | Little Boy: Além do Impossível

    Little-Boy-movie-poster

    Era uma vez um garotinho chamado Pepper (Jakob Salvati), que morava com sua família – pai, mãe, irmão mais velho – na costa oeste dos EUA, na época da Segunda Guerra Mundial. Pepper sofria bullying na escola, por ser menor que as demais crianças de sua idade e seu apelido era obviamente Little Boy. Seu único amigo era seu pai, James (Michael Rapaport), com quem vivia grandes aventuras. London (David Henrie), o irmão mais velho, não conseguiu se alistar e, por causa disso, é James quem vai para a guerra no Pacífico. A partir daí, Pepper se esforça para fazer o possível – e o impossível – para que seu pai retorne logo.

    É nesse tom fantasioso, misturando realidade e a visão infantil de Pepper, que o diretor/roteirista, Alejandro Monteverde, conta sua história. As soluções narrativas utilizadas por ele – tanto a narração em off, pelo protagonista já mais velho, quanto um momento histórico relevante visto pelos olhos de uma criança – remetem a várias outras obras e, infelizmente, não consegue aplicar essas técnicas tão bem quanto as demais – Peixe Grande, A Vida é Bela, Esperança e Glória.

    Tomando como ponto de partida o dito que “a fé move montanhas”, o diretor tenta construir uma parábola que aborda superficialmente a questão da fé em si e da fé como instrumento de manipulação, da intolerância e do preconceito, do bullying. Não só o mote que norteia a história e que é repetido à exaustão, como também o uso de outras histórias bíblicas como exemplo (ou muleta) para alguns eventos, dão ao filme um viés religioso que talvez incomode alguns espectadores. O roteiro até flerta em alguns momentos com uma certa crítica à mitologia cristã, mas é tão en passant que mal pode ser considerada.

    Um problema recorrente são os trechos que acontecem fora do universo de Pepper – as cenas da guerra e do combate dos samurais. Elas parecem tão caricatas quanto as cenas dos filmes de Ben Eagle (Ben Chaplin), o personagem das histórias em quadrinhos que o pai de Pepper costumava ler com ele. São pouco realistas, limpas demais, teatrais demais e, por conta disso, tiram o espectador da imersão na história que, por si só, já não é muito envolvente. A fotografia é boa, mas não se pode dizer o mesmo da montagem, que insiste em intercalar “os dois mundos” sempre que Pepper enfrenta uma situação difícil. Fica nítido o esforço do roteiro para direcionar e manipular os sentimentos do espectador. E a trilha sonora contribui com essa percepção, tendo vários elementos banais, lugares-comuns postos ali “apenasmente” para emocionar o público.

    O elenco está bem, com destaque para a mãe de Pepper, Emma (Emily Watson) e para o próprio Pepper, que consegue conquistar a simpatia do espectador, sem exagerar na atuação. O roteiro dá muitas soluções simplistas e, por isso, previsíveis. Pode-se notar isso principalmente no desfecho da história. Teria sido corajoso demais se o roteirista tivesse optado por um happy-end menos clichê. Enfim, é um filme feito para comover a plateia.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.

  • Crítica | Viver É Fácil Com Os Olhos Fechados

    Crítica | Viver É Fácil Com Os Olhos Fechados

    viverOs road-movie nos conquistam pelo seu desprendimento e sua falta de responsabilidade com narrativas lineares que desconstroem a coerência de fórmulas extintas ou incongruentes para a atualidade, de um Cinema leve e solto como Paris/Texas ou Além da Estrada tão bem representam, e o fazem a olhos nus. A estrada nos oferece salvação, danação, nos oferece um esquecer, mesmo que breve, dos problemas que tentamos deixar para trás, nos oferece perigo e nos blinda da rotina da qual escapamos a cada quilômetro rodado. Foi com Corrida Sem Fim, do genial Monte Hellman, em 1971, que uma geração inteira ganhou representação através da rebeldia e do desejo de libertação dos dogmas do passado, tudo filmado à base de asfalto e cheiro de gasolina (O passado não mais existe, e o futuro está sempre além da próxima curva). É claro que depois vieram Godard, Miller, Rocha, Lynch e Spielberg, todos se aventurando pela estrada, até chegarmos a 2013, até o momento presente, o futuro que ninguém se interessou.

    Todavia, Viver É Fácil Com Os Olhos Fechados merece destaque no subgênero de estradas e horizontes por apresentar como protagonista-mote um professor, numa clara analogia ao aprendizado que o tempo nos traz, na exuberância de situações feel-good ou conflitantes que a estrada acarreta a quem se aventura por suas veredas. O tempo da película é calcado em leveza e numa moral da história que, por combinar com a essência do filme inteiro, mantida num bom fluxo e ritmo de digressões positivas e propositais, torna a obra uma experiência completa em suas pretensões, sendo essas reforçadas pelas músicas dos Beatles, banda reverenciada o tempo todo e que condiz, totalmente, com os elos emocionais que o filme deseja traçar com o espectador.

    Acontece que nos anos 60, o emotivo e impulsivo Antonio (Javier Cámara, um dos musos de Almodóvar) atravessa a Espanha para encontrar seu grande ídolo, John Lennon, e no meio do trajeto conhece a moça Belém e o garoto Juanjo, típicos personagens de road-movie em típicas situações de pássaros livres, sem teto ou destino traçados. Contudo, é nos clichês que o filme aposta ao reciclá-los de maneira tão jovial e descompromissada, até mesmo divertida, tendo na persona dos três protagonistas o poder de compor um filme triplo, dentro de um só. Quando o protagonismo coletivo conta uma história, feito os recentes Spotlight e Branco Sai, Preto Fica, o resultado quase sempre é melhor, e neste caso, com certeza o é, deixa o filme ainda mais adorável, seja exibido numa iminente sessão ao ar livre, seja com toda a família.

    Só pra fechar, nota-se como é curioso, em especial e demasia, assistir a como o cinema nos quatro cantos do mundo está se aventurando cada vez mais em gêneros, e subgêneros, que só expandem as possibilidades de experimentação artística. Seja no Brasil, no Irã ou na Suécia, são menos previsíveis os estereótipos dos Cinemas desses países. Não se espera mais apenas filmes de deserto do Irã, ou os mesmos dramas repetitivos da Suécia, ou só filmes carnavalescos de técnica fraca da América Latina. Outros contornos parecem se desenvolver, e outros tipos de cinema procuram se reinventar no decorrer das rodovias do tempo. E é nesse meio tempo, como já acontece, que vamos começar a apreciar cada vez mais e melhor outros gêneros, formas e ensejos que, inevitavelmente, surgirão prontos a debulhar mundo afora e adentro das telinhas e das telonas por onde não deixamos de nos aventurar.

  • Crítica | Tangerine

    Crítica | Tangerine

    tangerine-poster

    Tangerine é um filme tão à parte da normatização do cinema americano (e mundial) que não tem como passar despercebido. É uma alegoria por si só, nua e crua, filtrada pelas lentes de três iPhones 5s e camadas de cores quentes, evidenciando um universo tão sexual para quem o observa de fora, e frio para quem nele sobrevive. Não é fácil vencer a vida do jeito que as transgêneras quase conseguem – ensaiam melhor dizendo, entre muita correria e baldes de urina na peruca – aqui, o drama tem preço e custa caro. A vida na América é cada vez mais plural, na América e no mundo, e Tangerine é um manifesto, parada gay realista de 90 minutos sobre representação (a palavra da vez) e lugar de fala.

    Porque hoje, num contexto de Twitter, todos podem falar, mas aptos a ouvir nós nem sempre estamos, fala sério. Sabemos tudo, ou não é? Apenas alguém que conhece e entende um universo tão rico e marginalizado quanto dessas mulheres, mulheres que lutam para ser reconhecidas como tal, ou como não-binárias (orientação avessa à construção social de masculino-feminino, o que remete ao clássico de Godard), e principalmente para não terem sua honra destruída, sequer cogitaria em montar um retrato tão sincero e vibrante do quebra-cabeças que é o mundo LGBT.

    A partir de uma aventura bem simples, no calcanhar de duas prostitutas em Los Angeles, onde o sol não é para todos, onde Hollywood aloja uma parte ainda mais simples e invisível, digna do cinema drogado e marginal de um brasileiro feito Sganzerla ou Andrea Tonacci, podemos sentir o empoderamento de personagens à beira da sociedade, à beira de uma cidade de Angelinas e Brad Pitts na qual nunca ganharam o brilho que, só por continuarem na luta, já seriam dignas de tê-lo. Como diria Rocha: Um iPhone na mão e uma ideia na cabeça. Pena que no tempo de A Idade da Terra ainda não havia iPhone para expandir, ironicamente, o potencial de uma realidade.

    Mas se hoje, em 2016, temos 56 opções de gênero no Facebook, por que ainda precisamos de Tangerine? Pela mesma razão que os niggas americanos quiseram boicotar esse Oscar, e pelo mesmo motivo que David Bowie, em 1971, atualizou as definições de gênero – na cara da sociedade, e de salto alto. Nem tudo é cor, brilho e Beyoncé no mundo arco-íris, e no uso de metáforas intrínsecas a história (e narrativa), o diretor e roteirista Sean Baker traça um mosaico contemporâneo sobre as vísceras e o DNA que habitam e compõem os símbolos máximos das diferenças sociais: as travestis, os negros e os pobres. Os gomos da mexerica a ser descascada e assim remoída, com suas sementes analisadas e degustadas com caráter de emergência, de pressa, como se o mundo e os armários pegassem fogo e não houvesse tempo pra estereótipos. Nada é hilário, tampouco ordinário para nós, os cúmplices dos passos de quem destila as gírias e os palavrões dos guetos, na certeza dupla que 1) sempre haverá realidades dispostas a se apresentar a cada esquina, e que 2) sempre existirá lugar para todas no Cinema.

    Uma das melhores ambiguidades do filme diz respeito a própria identidade sexual dos personagens. Em nenhum momento especula-se se alguém, na história, já se submeteu a mudança de sexo ou não, ou seja, seriam elas transsexuais ou travestis? Nada disso importa, contudo, à medida que o filme especula as proezas e os altos e baixos de uma narrativa que abraça os detalhes e os tons mais claros e escuros de um universo curioso, que atrai e causa repulsa na maioria do povo. Como não se emocionar com o apelo de Alexandra para que sua parceira de guerra, Sin-Dee, a perdoe pelos erros do passado? Não há outro universo para os aliens da heteronormatividade vigente, e às vezes deveras indecente. Como diria a internet: o dia é da mulher, mas a noite é da travesti.

    As atrizes Mya Taylor e Kitana Rodriguez merecem os aplausos e a admiração que o público em 2015 só achou válido dar a Eddie Redmayne por sua Garota Dinamarquesa. Isso porque em Tangerine é nítido como a escolha certa de um elenco melhora o que já nasceu brilhando feito ouro, e gostoso feito fruta proibida, quando um elenco tem e ostenta (naturalmente) total propriedade de encarnar suas personas, mas não como as preparações de Daniel Day-Lewis e outros atores: vivem o personagem muito antes do filme sequer ser imaginado. Na pele.

    E não é para menos. Acredito 100% ser necessário negritude na veia para ser fiel com o público no papel de um escravo africano, por exemplo. Pois por melhor que seja Gael García Bernal em Má Educação, assistir a Mya Taylor rasgando na tela os dramas de alguém com seu perfil é, descartando amadores, o puro espetáculo de um espetáculo puro! Tangerine é isso: é carnaval sem fantasia, cara sem maquiagem, é mais um degrau para a visibilidade do leque sexual humano, é bicha preta com orgulho tanto de sua condição quanto de sua força e de seu caráter transformadores, mas, acima de tudo, não reforça, pelo contrário, humaniza a imagem caricatural de quem veste e é o símbolo máximo das liberdades sociais e de expressão individuais.

     

  • Crítica | The Diary of a Teenage Girl

    Crítica | The Diary of a Teenage Girl

    The Diary Of a Teenage Girl 1

    Narrado a partir de gravações de sua protagonista Minnie – executada pela inspirada e surpreendentemente expressiva Bel PowleyThe Diary of a Teenage Girl é o belo filme de estreia da atriz californiana Marielle Heller (de Caçada Mortal e Spin City) como diretora, além de ser baseado na graphic novel homônima de Phoebe Gloeckner, produto que causou furor por sua temática interessante.

    O roteiro de Heller é focado no despertar da feminidade e sexualidade de Minnie, que acaba se envolvendo primariamente em uma relação proibitiva, mas que a faz queimar etapas na volúpia e no jogo de sedução inexorável a quem se torna ativo em uma relação amorosa ou sexual. A evolução da moça é pontuada por situações engraçadas, graves e contadas da forma mais sincera possível, em um estilo que mistura desenhos e animações para evocar os sentimentos e sensações contraditórios da personagem, unindo paixão e talento na mesma mistura inebriante e irresistível.

    Através de sua sexualidade latente, ela acende o fetiche no mais próximo de homem ativo e devorador que lhe cerca, e tudo é conduzido de um modo muito corajoso e inusual, distante demais do estilo retrógrado que tipicamente permeia esse tipo de filme. A atuação de Powley funciona magistralmente graças à ótima escada que Kristen Wiig faz para ela, revelando finalmente uma faceta reservada que funciona, mas o fundamental é o roteiro muito bem urdido.

    Não há qualquer receio em retratar uma mulher cuja fome sexual é imensa, sem precedentes moralistas que barrem suas ações ou os acontecimentos do argumento. Nem a feminilidade, nem a juventude são coibidas, ao contrário, são louvadas livremente, usando o estilo documental para mostrar ao espectador que tal atitude deve prevalecer acima de qualquer preconceito.

    A jornada de Minnie não é só apresentar o desabrochar sexual, mas também a autoaceitação, descobrindo aos poucos o que a faz feliz e satisfeita, driblando causos como solidão, amor alheio e próprio e transformando em discussões maduras e adultas que não demonizam sequer questões tabus como prostituição e uso indiscriminado de substâncias ilícitas. The Diary of a Teenage Girl é um filme interessante tanto por seu formato quanto pelo conteúdo, servindo como diálogo entre as gerações mais antigas e a que acaba de entrar no período da puberdade.

  • Crítica | Dior e Eu

    Crítica | Dior e Eu

    Dior e Eu - poster

    Tendência de consumo em vendas, principalmente em grandes centros mundiais, a moda se tornou um representativo, muitas vezes elitista, formado por um grupo de estilistas que partem de preceitos básicos de estética e arte para lançarem linhas e coleções que se destacam e posteriormente são copiadas e replicadas ao redor do globo.

    Mesmo o leigo no assunto não precisará de nenhum conhecimento prévio sobre o tema para assistir o documentário Dior e Eu. Dirigido por Freréric Tcheng em sua segunda incursão no mundo da moda – foi co-editor de uma biografia sobre o estilista Valentino e está dirigindo outro longa sobre este universo – a produção adentra os bastidores da composição de uma das coleções da famosa marca quando o estilista belga Raf Simmons assumiu o cargo de diretor criativo na companhia, após uma época conturbada em que o estilista anterior, o inglês John Galliano, foi demitido após comentários antissemitas.

    A obra apresenta a composição de um atelie de alta costura, sendo capaz de narrar uma história e, ao mesmo tempo, se desenvolver como um produto que acaba demonstrando a excelência da marca. Fundada em 1946, a Christian Dior S.A se mantém como uma conceituada empresa francesa de moda, um legado que seu criador desenvolveu nos dez anos em que esteve a frente da marca quando saiu de cena após um ataque cardíaco. A importância deste é tamanha ao ponto do fundador se tornar também um personagem do documentário, uma inspiração onipresente que adentra a trama devido a leitura de trechos do diário do estilista, potencializando a força desta figura máxima aos olhos de seus colaboradores.

    Se a visão geral de um desfile de moda sempre gera um estranhamento e certa incompreensão de como tais roupas, muitas vezes destoantes do vestuário cotidiano, se transformam em tendência, a composição de cada coleção passa pelas etapas fundamentais de qualquer criação, principalmente quando atreladas a uma empresa. Com um censo de grande cooperação em que cada membro da equipe reconhece o trabalho do outro visando o produto final, centrado no desfile anual da Dior. Os bastidores justificam quanto a dedicação é alta e também a cobrança para compor vestidos que se destacam por um trabalho artístico artesanal. A própria arte é reverenciada na moda, no caso na inspiração de Raf, tanto ao conceber sua coleção como planejar o cenário para o desfile, situando o vestuário como um objeto de composição mercadológica e artística simultaneamente.

    Com uma narrativa linear que abrange depoimentos diversos da equipe, a preparação da coleção e do desfile adquire um outro lado demonstrando que mesmo que um estilista esteja a frente da criação, é fundamental a colaboração de todos os integrantes do ateliê. Personagens que trabalham quase anonimamente mas que são reverenciados no final por sua paixão. Avesso a estrelismo, Simmons se destaca como um homem intenso e sensato, centrado na sua intenção artística e capaz de dialogar com a equipe sem nenhum maneirismo. A produção acompanha-o por oito semanas, desde sua contratação até o desfile da coleção.

    O documentário produz um olhar breve e focado sobre o universo da moda, coerente e equilibrado em uma narrativa dramática para que as personagens reais adquiram carisma evitando a monotonia didática. Como é de se esperar, o filme se encerra com cenas do desfile e faz bom uso da câmera lenta para captar a reação do público perante cada vestido e as modelos de feições sutis exibindo objetos cobiçados e analisados por uma rede de jornalistas e críticos. Ainda que os números confirmem que Raf foi responsável por reequilibrar o prestígio da Dior e lhe dar um faturamento maior do que concorrentes, enquanto Dior e Eu dava continuidade a sua campanha de lançamento iniciado em 2014 (no país, o filme foi lançado em agosto do ano passado), Simmons pediu demissão após três anos e meio a frente da marca desejando percorrer novos caminhos.

    Compre: Dior e Eu

  • Crítica | Ídolo

    Crítica | Ídolo

    IDOLO 1

    Trabalho de pesquisa intensa e devoção extrema a uma das figuras mais importantes do cenário futebolístico brasileiro, Ídolo é um documentário de Ricardo Calvet, mergulhando no culto merecido ao Nilton Santos, lateral esquerdo, enciclopédia do futebol e maior herói da história do Botafogo Futebol e Regatas, ao lado de Garrincha.

    A câmera acompanha um torcedor muito próximo de Nilton, que se torna o primeiro narrador do filme, essencial pela estreita relação com o ex-atleta, em especial nos seus últimos anos de vida, quando Santos estava debilitado. Através das confissões dos entrevistados, constrói-se uma panorama de sua vida, desde a infância até os primeiros passos no futebol. O passado de Nilton é intimamente ligado ao clube, tanto que, por um tempo, ainda garoto, ele vivia alojado nas dependências da instituição.

    O filme expõe momentos espinhosos, através do depoimento de Célia, esposa do ex jogador, que assume sempre achou que Santos se doou muito mais ao time em comparação com os benefícios que a associação desportiva contemplou ao seu ídolo, exceto é claro, os temos de maior necessidade, com o agravamento da saúde deste. A gratidão foi sentida a partir do apoio no momento derradeiro da existência de Nilton Santos, onde as despesas médicos ficaram mais caros. Assistir ao sofrimento de uma pessoa tão iconoclástica é surpreendente, e o caráter do filme dribla a pieguice de exibir um sujeito admirável em posição de pena.

    Há um equilíbrio entre momentos históricos pessoais e os feitos no desporto, desde os lamentos pela derrota em 1950 e sobre sua posição de reserva, até a descoberta de Mané Garrincha, assim que chegou do Bonsucesso para o alvinegro carioca, detalhando os conselhos que o lateral dava ao exímio driblador.

    Como era esperado, o filme faz um intenso estudo sobre tática e raça esportiva, mostrando desde as frustrações de 54 em que a seleção brasileira perdeu para a Hungria de Puskas e Kocsis, bem como o surgimento da primeiro título, na Suécia, onde o time sobrou, principalmente graças ao surgimento de Pelé e Garrincha e, claro, a solidez da defesa capitaneada por Bellini e Nilton. Dedica-se um belo pedaço de filme mostrando os campeonatos estaduais, torneios que resultavam em uma rivalidade bem maior do que a vista atualmente.

    Talvez falte a Ídolo, uma mão uma pouco mais ativa de seu diretor, mas a evolução de seu personagem de estudo é muito bem representada, tanto em informações como em resgate emocional, resultando em um filme tributo bonito, reunindo falas interessantes dos envolvidos com Nilton Santos e dizeres do próprio, formando um quadro nostálgico que faz ainda mais sentido para os torcedores do Botafogo e demais crentes na figura do ídolo.

  • Crítica | Minha Irmã

    Crítica | Minha Irmã

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    Dirigido por Ursula Meier, a produção Minha Irmã optou por um caminho não convencional para narrar uma história única. Na trama, Simon, de 12 anos, passa o dia numa estação de ski na Suiçam roubando bens de turistas e usando o dinheiro para poder levar comida para a casa da irmã mais velha onde vive.

    Escrito pela diretora em parceria com três colaboradores, o roteiro enfrenta um problema grave de unidade durante a narrativa, a história incomum precisaria trabalhar melhor o protagonista. Faltam cenas que complementem as ações da subtração dos pertences que Simon nunca irá ter, fazendo alusão a sua infância perdida e ao seu caráter em formação. Focar somente nas cenas em que ele rouba por roubar não contribui muito a obra. Ele e sua irmã são grandes personagens que acabaram sendo desperdiçados por uma narrativa boba.

    Apesar de se manter fiel a esta proposta uma boa parte do filme, nas vezes onde escorrega, a história perde a força que poderia ter. Por mais que opte por menos dramaticidade, as ações pontuais não fazem muito sentido depois da repetição extrema e a falta de ligação entre elas. O roteiro só se salva depois da reviravolta do meio pro final da história, onde a qualidade aumenta bastante e deixa-o muito mais interessante, pena que somente na parte final.

    A direção de Ursula Meier conseguiu se manter coesa dentro da narrativa, porém o filme perde a força que poderia ter tido. Não faz sentido a utilização em excesso dos tempos mortos, eles soam jogados, sem um propósito maior eles não enriquecem, pelo contrário, dá uma noção de que a sua direção tenta emular um realismo que não coube para a história, para tentar uma originalidade que ela não possui. A direção ganha força nas partes do filme onde o protagonista interage com a irmã.

    Kacey Mottet Klein não comprometeu o filme, porém o jovem só contribuiu com alguma qualidade nas cenas com outros atores. Nas poucas vezes em que aparece, Léa Seydoux mantém a boa atuação. Destaque ainda para a curta participação especial de Gillian Anderson.

    A edição é de longe a pior coisa do filme. Nelly Quettier deixou uma narrativa lenta, sem ritmo, enfadonha que pode deixar o espectador sem interesse. Ela só se destaca nas cenas entre Simon e a irmã. A fotografia de Agnés Godard contribui pouco. Mesmo estando em um local paradisíaco como uma estação de ski durante o inverno, os enquadramentos não são bonitos, por mais que tentem metaforizar a vida pobre do protagonista, eles seriam muito mais interessantes se mostrassem o contraste de uma estadia feliz em um local bonito com a sua vida vazia e marginal.

    Minha Irmã só vale a pena para quem quiser assistir um filme diferente que se passa em uma ambiente não usual. No mais, é esquecível.

    Texto de autoria de Pablo Grilo.

  • Crítica | Boneco do Mal

    Crítica | Boneco do Mal

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    Protagonizado pela renomada figura de Laura Cohan, que faz a Maggie Grind de The Waking Dead, o longa de William Bren Bell,  Boneco do Mal, resgata um temor antigo, focado nas figuras inanimadas de brinquedos malditos, em um filão que compreende A Boneca do Diabo de Tod Browning, Brinquedo Assassino e o recente spin-off de Invocação do Mal, Annabelle.

    Greta Evans (Cohan) se muda para uma casa antiga a fim de trabalhar como cuidadora de uma criança. Ao chegar à casa isolada dessa família britânica, a moça já leva um falso susto, sem ter sequer o apoio de uma trilha sonora misteriosa. O desígnio de Greta envolve o menino Brahms, único descendente dos Heelshire, que por sua vez jamais teve uma babá americana. O mais pitoresco é que a família do rapaz o trata como um ser comum, mesmo o moço sendo um boneco.

    Os componentes humanos da casa de campo são a senhora Heelshire, vivida pela veterana Diana Hardcastle, e seu esposo senhor Heelshire, interpretado por Jim Norton. A dupla serviria de base moral para a história, já que o passado dos dois atores é bastante prolífico. Apesar das negativas em relação à identidade do menino, os familiares assumem que ele não é propriamente normal, e provam que há uma presença na casa acompanhando-os, como em inúmeros filmes clichês recentes.

    Greta esconde um passado de abusos, o que faz dela a perfeita mulher solteira procura, outro arquétipo típico de filmes de horror em especial na década retrasada. Surge então um montante enorme de momentos genéricos e convenientes, com ligações da moça com sua terra nativa, onde as violências que a menina sofreu com seu antigo amante são contextualizadas. Tal situação poderia ser melhor explorada, caso o a intenção do roteiro fosse a seriedade, mas a questão está apenas como enfeite.

    Bell já havia dado à luz a outro filme polêmico: Filha do Mal. A opção desta vez é por um terror mais grotesco e injustificado, que tem por base um humor involuntário bastante curioso. O medo que Greta tem na figura de porcelana não se justifica de modo algum, já que a criatura pseudo sobrenatural não lhe ataca, fazendo dela seu objeto de mimo e devoção.

    O desfecho faz referência aos primeiros capítulos da saga Sexta-feira 13, em especial as partes um e dois, dada sua solução final. Apesar da extrema tosquice, a perseguição no terço final chega a divertir, fórmula que talvez garanta possíveis continuações, ao contrário de seu primo A Forca, que foi um fracasso. Em uma semana de exibição, Boneco do Mal conseguiu pagar o seu baixo orçamento, driblando até a falta de carisma de Cohan e seu par Rupert Evans, com situações tão risíveis que fazem reenquadrar o filme em uma categoria mais trash do que sua premissa anunciava.

  • Crítica | Micróbio & Gasolina

    Crítica | Micróbio & Gasolina

    Microbio e Gasolina

    Fugindo um pouco do estereótipo de sua filmografia – ao menos da mais conhecida – Michel Gondry produz um filme interessante sobre a tenra infância, flertando com os melhores e mais inspirados momentos de Chris Columbus. Micróbio & Gasolina conta a história de dois meninos marginalizados, no colégio e em suas casas, vividos por Théophile Baquet e Ange Dargent, uma dupla cuja química é invejável, funcionando em praticamente todos os momentos escapista que lhe ocorrem.

    A trama gira em torno do desajuste da dupla, que convive com o cruel panorama comum escolar, no qual qualquer diferença, mínima que seja, é motivo para exclusão e bullying. Os motivos que levam os dois a serem marginalizados são diferentes, já que Theo Leoir (Baquet) tem um forte cheiro de combustível graças à natureza do trabalho de seu pai, mecânico de automóveis, enquanto Daniel Guerrét (Dargent) é maltratado apenas por ter feições ainda andrógenas, frutos de uma pré-puberdade complicada. O caos instaurado em suas casas os faz tencionar criar um carro improvisado, disfarçado de casa, e partir em uma aventura pitoresca que começa na dificuldade de manter o foco na construção do veiculo.

    Apesar do tema infantil, o roteiro de Gondry abraça questões comuns também à fase da vida adulta. O uso da família de Guerrét é bem explícito em relação a isso, especialmente no drama de sua mãe, Marie Therese, vivida por Audrey Tautou, que sofre de um infortúnio. Porém, a obra não é tão focada em detalhes, por se tratar de um texto leve que prima pela experiência de vida de um infante, mas que também não deixa de ser grave por isso.

    Todos os obstáculos apresentados na jornada escapista de ambos fazem lembrar valores pouco em voga em um mundo globalizado, como a soma de forças pelas vias da amizade e do companheirismo representada pelos personagens, dois “fracassados”, apelidados pejorativamente de Micróbio e Gasolina, vencendo difíceis situações.

    A versão mirim de road movie inclui o desapego extremo pelos bens materiais das duas crianças – fator comum dentro do comportamento inocente – e um modo muito belo de encarar as agruras da vida e da viagem, mesclando juventude e romantismo, com uma sensibilidade que destoa inclusive dos outros personagens da fita. A sensação de cooperação mútua não é vista, fora do círculo interno de Daniel e Theo, por mais ninguém como algo tão vivo. Tampouco se nota a mesma paixão por explorar novos mundos e novas experiências como se vê no desejo do ideário dos dois amigos, argumento utilizado como um belo modo de contrapor a crescente depressão de todos os adultos da obra.

  • Crítica | Zoolander

    Crítica | Zoolander

    Zoolander 1Paródia escrachadíssima sobre o universo fashion dos super-modelos, Zoolander é um filme dirigido, estrelado  e produzido por Ben Stiller. Os primeiros minutos apresentam um complicado cenário político baseado na paranoia típica das histórias de espionagem, escondendo os personagens poderosos sob cenários sombrios e silhuetas que discutem o futuro da humanidade, que, por sua vez, jaz na futilidade.

    A figura ideal para se infiltrar na misteriosa questão deveria ser alguém poderoso, chamativo e igualmente ignorante, é neste ponto que entra a figura de Derek Zoolander (Stiller), que faz um modelo no auge de sua carreira, que basicamente, se prepara para uma nova pose, chamada de Magnum, tão importante que é guardada a sete chaves, longe da espreita dos tabloides. A surpresa ocorre pela perda do título de maior top model, sofrendo, a partir daí, uma intensa crise de identidade, sem caminhos para traçar. A dor da substituição é tão grande que o artista aparenta não ter mais um rumo para seguir, destacando-se o grande vazio existencial que já o consumia, mas que não era perceptível graças à fama infinita que o rodeava.

    Na tentativa de se reconstruir, Derek procura seu pai, Larry (John Voight), trabalhando junto com ele como minerador, apesar de sua incrível incapacidade de carregar peso ou de realizar qualquer trabalho que demande esforço manual. O choque ocorrido com ele faz ele se enxergar como um pária em ambos os ambientes familiares que conhece, o que o torna alvo fácil para propostas indecentes, vindas da figura que mais se aproxima de um vilão nesse jocoso e debochado cenário, com o estilista Mugatau, interpretado por um Will Ferrell que varia entre o exagero extremo canastrão e afetação ponderada, em uma caricatura de uma rainha má e megera dos clássicos contos de fada de Disney. A trama em si envolve um terrível caso político, com a possibilidade de assassinato de um diplomata estrangeiro.

    Toda a graça do filme está nas palhaçadas interpretadas por Derek – que sequer sabe quantas sílabas possui seu nome e sobrenome –  e seus rivais, Hansel (Owen Wilson), seu principal antagonista no mundo fashion, igualmente encantador, ao menos de acordo com os padrões imbecis e banais estabelecidos pelo roteiro de Stiller, Drake Sahter  e John Hamburg além, claro, da figura de Mugatu e seus sidekicks. As piadas funcionam basicamente por fazer troça com um ambiente onde a idolatria é o lugar comum, levando em conta piadas que remetem a um nível de pensamento bastante baixo, desconstruindo o objeto de adulação de uma indústria que lucra bilhões de unidades monetárias, usando de gags cômicas das mais bobas para mostrar um argumento inteligente, apesar da fala simplória.

    A cena de disputa entre Zoolander e Hansel rivaliza com a lavagem cerebral que o protagonista sofre, para se tornar alvo fácil da estranha missão que lhe é incumbida. A quantidade de participações especiais é enorme, indo desde David Duchovny, como um ex-modelo de mão tão paranoico e ansioso quanto seu Fox Mulder, e David Bowie, que faz a si mesmo como juiz da disputa entre os dois astros. O papel mais significante entre as pessoas ditas normais é da repórter Matilda Jefferies (Christine Taylor), que evidentemente tem problemas com sua aparência, por ter sido uma pessoa obesa no passado e ter sofrido com bulimia.

    Zoolander consegue reunir pastiche com um estilo de vida extravagante e extremamente sexual, sem apelar para nudez ou para qualquer proximidade da dita “vulgaridade”. O filme desconstrói a superioridade normalmente atribuída aos mais belos homens do planeta, mostrando-os como bárbaros incapazes de tarefas simples, como ligar um computador desktop. Stiller consegue elevar um personagem, que não tinha ido além de dois curtas bastante tímidos, ao patamar de herói de um filme que trata com esperteza um mundo repleto de conceitos e certezas superficiais, através de uma mensagem simples e não panfletária, mesmo com toda a acidez eufemística presente no argumento.

  • Crítica | Zoolander 2

    Crítica | Zoolander 2

    Zoolander II 1

    Lançado quinze anos após o sucesso do primeiro filme, Ben Stiller resgata Derek Zoolander do ostracismo, começando seu Zoolander 2 com a mesma cena que abre o trailer que fez sucesso internet à dentro, mostrando o assassinato do astro Justin Bieber, postando sua foto póstuma no Instagram. É neste aspecto que mora um dos piores defeitos do longa, já que grande parte das boas piadas são entregues no material de divulgação, e não são bem desenvolvidas no decorrer da exibição.

    A intenção de Stiller é em reverenciar seu colega Drake Sahter, morto em 2004, ressuscitando sua co-criação em mais uma tentativa de revival esbarra em uma inspiração bastante fraca. O ex-modelo está no ostracismo, tendo todo seu hiato explicado através de um flashback curto, que visa atualizar o público e inserir o personagem em uma outra época. O anacronismo dos habitantes daquele antigo micro verso até funciona como piada, ainda que não sustente todo um filme sozinho. O chamado à aventura, ocorrido através de uma participação bastante engraçada de Billy Zane faz encontrar Derek e Hansel (Owen Wilson), que não se encontravam desde o acidente que mudou por completo a vida de ambos.

    O conflito de inimizade entre os dois fashionistas, visto no primeiro capítulo, é substituído por uma mágoa profunda, que faz ate perguntar qual era a intenção do texto de Stiller, John Hamburg, Nicholas Stoller e Justin Theroux, já que as melhores sacadas ocorre com Hansel, e não com o personagem titulo. O roteiro é confuso, escrito a oito mãos, fator que ajuda inclusive a explicar a demora em lançar em circuito comercial, gerando até a ácida comparação metalinguística, quanto a dificuldade de Zoolander em se adaptar aos novos tempos.

    A tentativa de fazer o drama engraçado ir para outro nível, atingindo camadas de evolução à vida adulta, com responsabilidades familiares esbarra em um texto muito confuso, que não consegue harmonizar sequer as participações especiais, ponto alto da outra versão. Sequer as personagens Valentina Valencia (Penelope Cruz) e Alexania Atoz (Kristen Wiig) conseguem fugir da mediocridade ultrapassada, com poucos momentos de um humor que supere os defeitos de mediocridade. A maioria das surpresas positivas, inclusive dessas personagens, já foram utilizadas nos ultimos trailers, fator que quebra o impacto destes momentos, claramente em uma tentativa desesperadas dos produtores em resumir tudo que havia de bom no filme nos teasers.

    A franquia deixa o arquétipo de comedia histericamente risível para se tornar uma auto parodia, uma escolha que tenciona ser corajosa, mas que resulta em um produto pífio. Ao mesmo tempo em que Stiller é generoso com seus colegas, em especial com Wilson e com o antagonista Jacobim Mogatu de Will Ferrell, falta uma direção mais ativa, fator que faz perguntar inclusive o motivo de Stoller não ter o feito, já que escreveu parte do roteiro e vinha de boas empreitadas, com Vizinhos e Cinco Anos de Noivado, explicado somente pelas dificuldades de agenda e talvez pela insistência de Stiller.

    Não há reprise dos momentos que fizeram do primeiro filme uma diversão descompromissada que surpreendia por um sub texto sagaz e debochado, o que é uma pena, já que Zoolander 2 não convenceu o público, mesmo com a onda nostálgica que afetou Hollywood recentemente, aproximando este muito mais do pouco elogiado Debi e Loide 2 do que há Tudo Por Um Furo, que conseguiu reverenciar e apresentar algo novo. A partir destes defeitos, é natural entender a baixa bilheteria, que reflete a falta de sincronia com a atualidade.

  • Crítica | A Bruxa

    Crítica | A Bruxa

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    De todos os gêneros temáticos do cinema, o terror talvez seja o que tem maior facilidade para divulgação e propagação de filmes ruins, especialmente pela baixa dificuldade em produzir toda sorte de criatura amedrontadora ou plot repleto de sustos. São poucos produtos que transcendem a barreira do pré julgamento, a exemplo dos clássicos de William Friedkin, Stanley Kubrick e Roman Polanski. O ideal que A Bruxa de Robert Eggers é atingir este mesmo filão onde se encontram Bebê de Rosemary, O Exorcista, O Iluminado e Repulsa ao Sexo, utilizando um conjunto de lendas e temores tradicionais da literatura de horror, se valendo de contos orais e escritos para montar o seu texto.

    O roteiro de Eggers foca em um clã cristão de nome jamais dito, que é afastado de seu vilarejo graças a um suposto pacto demoníaco. O patriarca William (Ralph Ineson) refuta esta possibilidade e sob protesto aceita seu exílio, levando sua esposa Katherine (Katie Dickie), três crianças e seus dois filhos mais velhos, Caleb (Harvey Scrimshaw), que desenvolve seus primeiros impulsos sexuais ligados a puberdade, e Thomasin (Anya Taylor-Joy), que começaria por ser os olhos do espectador e que evoluiria no decorrer do drama.

    A crença no deus do cristianismo comanda a casa, pautando os desejos e anseios da família, exceção feita em partes a figura de Thomasin, que em sua fase de crescimento começa a questionar certas normas sobre como deveria ser seu destino. A partir da mudança para as proximidades de uma floresta bastante antiga, eventos esquisitos começam a assolar a família, deixando o sentimento de abandono divino, graças as catástrofes ocorridas.

    Os infortúnios que acometem os cuidados da primogênita com seus irmãos não parecem ter ligação com a insatisfação que cresce em seu interior, ao menos não no começo. Com o desenrolar da trama, as possibilidades restringem as dúvidas de caráter a ela, apelando mais uma vez a associação do pecado à mulher, seguindo a tradição bíblica e do medievo, exemplificando de maneira bastante simples a fobia não só a criatura da bruxa como da mulher em geral, como detentora da iniquidade.

    O temor se pauta não em sustos, e sim no anseio pelo proibido, ajudado demais pela ilusão causada através da ignorância provocada pelo fanatismo religioso. A Bruxa é um terror de época impactante, interessante a um modo que há muito não se via, utilizando pouco de momentos cômicos e quando se apela a isto, apresenta-se um humor negro, fino, cruel e escatológico. Passa longe de ser um filme de horror comum e é uma estreia muito promissora de seu realizador no campo de longas metragens, especialmente por discutir veladamente sobre a misoginia normalmente associada a religião cristã e a dubiedade da figura amedrontadora.

  • Crítica | Um Homem Entre Gigantes

    Crítica | Um Homem Entre Gigantes

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    Um Homem Entre GigantesConcussion em inglês, em uma das raras vezes onde a inventiva tradução do título no Brasil acerta — conta a história do genial neuropatologista forense nigeriano Dr. Bennet Ifeakandu Omalu e o dia em que se deparou com uma morte misteriosa e sem muitas explicações, e viu se imbuído do espírito científico da ética na busca pela verdade e compreensão. Trata-se da morte de um famoso jogador de futebol americano pelo Pittsburgh Steelers Mike Webster, morto em 2002 devido a um ataque cardíaco e sofrendo sintomas de depressão, esquizofrenia e Alzheimer, apesar de tomografias não apresentarem nenhum indícios de tais transtornos, e rejeitado pela família, incapaz de lidar com a dificuldade de ter um homem de quase 2 metros e mais de 100 kg sem controle de si.

    Morta no plantão de Dr. Omalu, as características da vítima lhe chamaram atenção, e desta forma decidiu bancar do próprio bolso exames do cérebro do astro, chegando a conclusão, a partir de insights sobre casos de doenças semelhantes no boxe, de que as repetidas pancadas na cabeça chacoalhando o cérebro geram traumas internos que liberam proteínas tóxicas no cérebro capazes de deteriorarem-no de dentro para fora, fazendo com que a mente da pessoa definhe. Apesar das represálias e falta de entendimento do corpo médico da cidade, Dr Omalu submeteu os resultados a revistas científicas e batizou sua descoberta de ETC, ou Encefalopatia Traumática Crônica, transtorno que levou à morte de outros grandes astros do esporte, muitos deles por suicídio devido a confusão mental. Estima-se que um jogador de futebol americano da defesa leve cerca de 70 mil pancadas na cabeça ao longo dos anos com uma intensidade duas vezes maior do que o suficiente para que uma pessoa sofra uma concussão. É um trauma físico análogo a ser submetido a 25 mil batidas de carro ao longo da vida, de acordo com resultados publicados pela Universidade de Oklahoma.

    Dr. Omalu formou-se em medicina na Nigéria, epidemiologia na Universidade de Washington, uma série de mestrados em saúde e MBA’s e hoje é professor na Universidade da Califórnia. Mas Dr Omalu é um homem excêntrico. Extremamente sério, comedido e educado, falava com seus pacientes por tratá-los com o respeito devido e por sua formação católica.

    Uma preocupação central no filme era com a acurácia científica e histórica do caso, apelando para ferramentas narrativas fictícias em casos bem específicos, como o colega de trabalho Dr. Omalu, inserido na trama para representar as vozes da cidade que se opuseram à autópsia do astro Mike Webster. Devido a essas vozes e a falta de orçamento, Dr. Omalu teve de pagar os exames, que geraram os resultados da autópsia de seu paciente zero, valor que chegou alcançar os U$ 100 mil. A NFL tentou descriminá-lo e descredenciar sua formação e resultados em razão do impacto que isso poderia provocar no esporte.

    Will Smith entrega-se ao papel com grande propriedade — já tirando o elefante da sala, sim, ele merecia sua indicação no Oscar de 2016—, inserindo um olhar gentil, mas levemente oprimido pelo gigantismo do que o cerca, trazendo um sotaque bem ensaiado e que demonstra a óbvia convivência com o verdadeiro Dr. Omalu, embora todo o poder de sua interpretação não entre em ressonância com seu porte físico. Sua interpretação vai crescendo conforme se opõe à ignorância e se estabelece como alguém que merece o devido respeito por tudo que é, sem se abalar com a insistência das pessoas de não o reconhecerem como médico. O papel também foi aparentemente o responsável por conectar Will Smith com suas raízes africanas e ver a dificuldade que as pessoas de sua etnia enfrentam no dia a dia para conseguir demonstrar-se capazes, apesar de sua origem. Sua tristeza vem da incompreensão da inversão de importância das coisas e sentimento de engano quanto ao sonho americano.

    Não é filme sobre o futebol, embora faça um meio-campo evitando colocar o amado esporte como vilão, mas é basicamente um filme sobre força. Ao iniciar o filme com um belo discurso de Mike Webster, o diretor Peter Landesman demonstra reconhecer o domínio transformador e motivador do esporte, bem como sua beleza. Mas através da narrativa trata de demonstrar um outro poder que contrasta com o apresentado em campo e que não vem da luta corporal. O poder em questão é da busca do entendimento da realidade e a verdade. Dissolver os problemas, dirimir as dificuldades, compreender os processos e apresentar ao mundo por que este é o dever de quem pode fazê-lo e o direito de quem não sofre por não saber. O poder da ciência contra a ignorância dos negócios é sempre exaltado de forma apaixonada, principalmente em comparações entre os desmandes da NFL (Liga Nacional de Futebol Americano) com as atitudes da indústria do cigarro durante épocas anteriores.

    As grandes dificuldades do filme, no entanto, surgem na direção, fotografia e edição. A primeira não foi capaz de livrar-se de diálogos excessivamente expositivos para descrever o que os grandes atores em cena poderiam realizar muito bem, e nem sente vergonha de repeti-los, imaginando, talvez, que o assunto seja muito complexo. Em conjunto com a edição, não há esmero em dar algum tom ou ritmo em cenas mais intimistas, forçando cortes desnecessários e close-ups que só servem para oprimir e não aproximar. Nas transições de cena, principalmente naquelas que visam mostrar eventos simultâneos, não é claro que são acontecimentos ligados de alguma forma e deixam as cenas mais truncadas do que deveria. E se há um outro pecado é o fato de a cinematografia ser óbvia, e não se esmerar em criar quadros interessantes para a narrativa ou até mesmo bonitos. Por fim, Um Homem Entre Gigantes traz certa estranheza aos mais conhecedores do mundo do cinema ao trazer atores conhecidos em papéis que mal têm uma fala completa, deixando um suspense improdutivo sobre os atos daqueles personagens, sendo que na verdade estão apenas fazendo uma figuração de luxo mesmo.

    É com certeza um filme necessário, tanto pela sua história quanto como mensagem de empoderamento do povo negro e do racionalismo no combate do poder irracional e pragmático das máquinas financeiras, algo necessário em tempos onde mineradoras e indústrias petrolíferas têm voz na negação de seus impactos. Todo esse conteúdo é capaz de fazer relevar com facilidade as duas horas de filme e revigorar a fé na verdade.

    Texto de autoria de Marcos Paulo Oliveira.

  • Crítica | A Festa de Despedida

    Crítica | A Festa de Despedida

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    Up – Altas Aventuras, sem grau de comparação, mostrou para as crianças que a velhice nem sempre precisa ser tediosa, chata, sinônimo de sopa de ervilhas. Se a Pixar conseguiu nos passar essa impressão (e para crianças de todas as idades), um feito Herculano de nos divertir com um velhinho e seus balões, então 1+1 não precisa ser sempre 2, e idosos existem SIM, sentem fome, frio, e não merecem ser invisíveis após ter moldado nosso mundo e nos dar a chance de fazer o mesmo. E quando o marido de uma das moradoras de uma casa de repouso já está no pé da cova, uma máquina de eutanásia é usada por um grupo de amigos para trazer paz ao doente irreversível. Um filme que não se apoia em melancolia mas que não tira sarro da morte, A Festa de Despedida é um convite para revermos, racionalmente, os sentimentos que podem brotar nas nossas aventuras, tardias ou não, pelas extremidades da vida.

    Filme dócil, sábio, estilo A Cruz dos Anos, de 1937. Composto por zelo, representação dos desafios da melhor-idade e por imagens que afirmam (mas também contradizem) o pesar da morte, tema deveras cadavérico, ainda mais em caráter idoso, em recente já tratado diferentemente no belo Amor, de 2012, mas que no poder de um visual nostálgico de cores frias, também, são imagens que não deixam de lado o equilíbrio entre a relevância e o reconhecer da dor de quem fica, nítida no personagem do marido fiel, e o lado “deixa a vida me levar” de outras cenas e simbolismos presentes no filme, como a máquina que conta o tempo mas acaba se desregulando, ou seja, a importância do tempo varia de idade para idade! Um filme de proposta bergmaniana, com ecos das boas comédias irônicas do mestre sueco (O Olho do Diabo) e sua ótima direção cênica (Gritos e Sussuros), pincelado com o humor leve e ácido dos Coen e de outros artesãos do “riso involuntário”, um riso presente nessas comédias acidentais, em situações que não deveriam nos fazer rir, mas acabam nos lembrando de que este ainda é o melhor remédio – até para prolongar o difícil bye-bye.

    Nota-se o cuidado com os componentes de um asilo a céu aberto que resiste ao fim das coisas, da amizade, do fim do riso e do choro – no filme, um tempo usado para nos apresentar o peso das relações humanas diante da morte, numa espiral bem apresentada (e até divertida!) que elevam o drama ao patamar de uma leve e hipersensível comédia, com gosto gritante de comida de vovó. Cinema também é culinária, já afirmei aqui antes, e no que diz respeito ao “tempero” e outras metáforas gastronômicas em um filme, A Festa de Despedida é um cinema sereno, raro hoje em dia, avesso a apostar em quaisquer polêmicas para ser deliciosamente frágil, e fortemente seguro de seu ritmo, quase fabulístico, tal estivéssemos assistindo à adaptação de um conto de nossos avós, sentados na cadeira de balanço. É esse arranjo de elementos, traduzidos da vida para a literatura, a música, para o Cinema, (esses elementos presentes numa vida bem-vivida, entre guerras e abraços, entre a liberdade e os nossos laços) que também afasta as belas-artes da lata do lixo, como já afirmou Glauber Rocha, e as eleva, em plenitude, à vontade do público de rever o filme, reler o livro… revisitar a obra, mesmo se o preço para isso seja fazer escapar uma lágrima ou um sorriso.

  • Deadpool e o Fim da Moda dos Super-Heróis

    Deadpool e o Fim da Moda dos Super-Heróis

    Deadpool

    As caracterizações do gênero

    Normalmente se nomeia um gênero pelas características:

    – Narrativa
    – Caracterização dos personagens
    – Temas básicos
    – Ambiente
    – Iconografia
    – Técnicas
    – Estilos

    E a princípio, temos quatro grandes gêneros definidos por Aristóteles, que são: Comédia, Ação, e Tragédia/Drama e Thriller. Disso temos subgêneros, como o sci-fi, que normalmente se estabelece como drama por contar com embates existenciais, o papel do ser humano, seu destino e sobrevivência. Eventualmente há intercepção entre estes gêneros e subgêneros, como no caso da Soap Opera (Ex: Star Wars).

    Elementos em comum não são o bastante para a categorização. Normalmente identificam-se certos elementos bem específicos para perceber um gênero. Mas esta é a forma como identificamos a criação de um gênero, que é sempre a posteriori”, já que, em cinema, gênero sempre teve uma definição flutuante, pois um grupo de signos apenas se torna gênero de acordo com a percepção da crítica e do público. Você não cria um gênero, mas sim elege um gênero.

    Agora os filmes com super-heróis: não formam um gênero

    Tudo indica que o filme de super-herói não é um gênero em si, mas sim um gênero tautológico, ou seja, não existe realmente como gênero ou subgênero, mas apenas como formato.

    O termo Tautologia vem da lógica proposicional, em que uma sentença é tautológica se for verdadeira para valores diferentes de suas variáveis. Em português isso ganha status de redundância, mas neste contexto é quando um gênero passa a depender de certos signos independente do seu tema ou de sua dinâmica. Por exemplo, cinema surrealista é um “gênero tautológico”, pois independente de ser comédia, ação ou suspense, tem signos redundantes em comparação com outros filmes surrealistas e que o identifiquem como “surrealista”, mesmo que isso não diga nada sobre o conteúdo, mas apenas sobre o formato. Algo parecido acontece com as “escolas cinematográficas”, que apesar de possuírem signos em comum não representam um gênero.

    Tanto é assim que a saída dos estúdios para carregar o formato é atribuir gêneros com clichês mais bem definidos, mas usando como pano de fundo o mundo super-heroico. Você teve o filme de ação/assalto de Homem-Formiga, a aventura clássica de Capitão América: O Primeiro Vingador, o thriler político de Capitão América: Soldado Invernal e diversos outros expedientes para protelar essa deterioração do formato.

    A moda e seu ciclo

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    Certa vez, um amigo disse ter lido que Hollywood tira leite de uma vaca até secar e, quando o leite acaba, sacrifica a vaca com a paródia. Em meados dos anos 30, após um período de intensa popularidade, os Monstros da Universal só sobreviveram na forma de filmes que parodiavam esses monstros.

    E é mais ou menos assim que funciona, pois podemos delimitar as seguintes etapas do ciclo:

    – Enunciação
    – Solidificação
    – Apogeu ou Era de Ouro (Etapa onde geralmente surgem os clássicos)
    – Fórmula (Era dos tais “filmes eficientes”. Acontece quando o cinema já entendeu o que funciona)
    – Dissolução / desconstrução / crítica (Autorreferência, incômodo com o status quo)
    – Retomada / hibridização / sátira (O cinema ri de si mesmo e mostra o ridículo de seus clichês)

    A aplicação disso é não linear. Claro que surgem filmes antecipando essas etapas, mas a historiografia do cinema dá base a esse ciclo, como o cinema noir, que começou como uma espécie de paródia.

    Deadpool estreou com valores e recordes para o mês, para uma obra de classificação Rated-R, próximo de completar U$ 55 milhões em sua segunda semana de exibição, totalizando U$ 235 milhões, ultrapassando o até então vencedor da Fox entre os super-heróis X-Men 3: O Confronto com seus U$ 234 milhões. Mundialmente é o segundo da franquia, atrás apenas de X-Men: Dias de um Futuro Esquecido. O filme também quebrou todos os recordes para o mês de fevereiro, considerado um mês ruim para o cinema.

    Isso resume o filme num grande sucesso para seu orçamento abaixo dos U$ 60 milhões, com uma campanha de marketing genial por ser concisa e utilizar-se das redes sociais e do carisma de Ryan Reynolds como poucas campanhas conseguiram. A que mais se aproximou deste sucesso em rede foi a de Batman: Cavaleiro das Trevas, no já longínquo 2008, utilizando uma complexa campanha viral que incluiu corridas de caça a uma maleta do Coringa pelas principais cidades do mundo.

    Mas talvez o sucesso de Deadpool reflita uma questão bastante comum em Hollywood que se assemelha ao ciclo da moda nas passarelas. Assim como os estilistas, estúdios visam antecipar tendências e, quando possível, criá-las. Não à toa, é comum em um mesmo ano haver diversos filmes de uma mesma espécime ou até mesmo personagem (dois filmes do Mogli esse ano e um muito semelhante chamado Meu Amigo Dragão, bem como alguns filmes sobre o personagem Tarzan). E assim como a moda volta, se estabelece em ciclos que relativamente se repetem a cada determinado período de tempo, fazendo voltar inclusive as terríveis calças saruel, o cinema, a música, games e demais formas de cultura.

    O melhor exemplo deste tipo de ciclo, ou a forma mais simples de identificar a questão, talvez seja a música. Como uma variação e releitura do blues, o rock n’roll surgiu como uma resposta à música conservadora dos anos 50. Mas pelo dinamismo cultural e novas influências ele sofreu uma nova variação, mais pessimista e menos festiva (punk, entre outros), que foi se estilizando mais até ficar uma autorreferência, e então virar uma paródia de si em larga escala e mais popular (emo), sendo este o final do ciclo. Nesse ponto, o mercado esgotou-se, e aí o gênero precisa se reinventar.

    A paródia dos filmes de super-heróis

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    A paródia nos filmes de super-heróis como apontamento do fim do ciclo modal se deu bem antes, com Shane Black em Homem de Ferro 3 fazendo Tony Stark invadir covis usando armas feitas com brinquedos, e a gag do vilão étnico super poderoso, que no fundo não é tão super poderoso ou ameaçador assim. Ao antecipar-se ao momento de fim de ciclo, e pela falta clara de homogeneidade e estrutura narrativa, o filme levou duras críticas, mas principalmente pelos motivos errados. O vilão de brincadeira/ ator falido era apenas uma autorreferência de o que é um filme de super-herói.

    Em 1989 surgiu Batman, dirigido por Tim Burton, com uma proposta bem específica e concebida. Com o passar dos anos e tentativas fracassadas de estabelecer filmes semelhantes, os filmes do Batman foram ganhando contornos cada vez mais suaves, recebendo finalmente a sua paródia em 1998 com o filme Batman & Robin, por Joel Schumacher. Em 2000 surgiu X-Men com um argumento muito mais sério e baseado no subgênero sci-fi, o que ajudou a dar o tom das próximas adaptações em conjunto com Homem-Aranha, de 2002.

    Após Homem de Ferro 3 como representante da desconstrução do formato, pode-se olhar para Kick-Ass, Guardiões da Galáxia, Homem-Formiga, e até mesmo Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância), bem como Super, filme de James Gunn anterior a seu estrelato, como exemplos do mesmo momento. Estes filmes todos estariam então representando a dissolução do cinema de super-herói, e Deadpool é um passo além de todos esses ao estabelecer um teor autocrítico extremamente contundente. Para desespero ou não, sátira, ou autocrítica, é a etapa que surge antes da paródia dos irmãos Wayans.

    Texto de autoria de Marcos Paulo Oliveira.