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  • Crítica | Os Infratores

    Crítica | Os Infratores

    Poster de os infratores

    Os Infratores (Lawless, 2012), filme dirigido por John Hilcoat (A Estrada), com roteiro de Nick Cave adaptado de um livro escrito por Matt Bondurant, neto de um dos personagens principais do longa, que é baseado em fatos reais.

    O filme nos conta a história dos irmãos Bondurant, que vivem no Condado de Franklin, Virginia. Na década de 1930 durante a recessão americana e portanto, com o cenário da lei seca. Os irmãos são Jack (Shia Labeouf) o mais novo, que tem sempre de provar o seu valor aos outros. Forrest (Tom Hardy), o mais velho; chefe da família, e Howard (Jason Clarke), o mais temido dos três, muito por seu comportamento explosivo.

    A família toca uma espécie de restaurante, posto de gasolina e base de operações para outros negócios, que agora com a lei seca, se resumem a fazer um Whisky clandestino de boa qualidade. Atividade que apesar de ilegal, é amplamente aceita e difundida entre as pessoas da região. O problema se inicia com a chegada do corrupto agente federal de Chicago, Charley Rakes (Guy Pearce), que deseja organizar o comércio de bebidas daqueles caipiras. Fazendo valer a sua autoridade sobre um xerife, que também não concorda com seus métodos.

    Rakes é um personagem enjoado, que destoa de todo aquele universo em que está inserido. Com trejeitos afetados. Um penteado dividido que é mantido com obsessão e um exagero constante no uso de sua colônia. Guy Pearce faz um bom trabalho na construção desse papel, apesar da pouca exigência de um personagem linear, sem nuances e traços contraditórios. Que não deixa dúvidas, nem ao espectador mais desatento, que se trata do vilão da trama.

    Somos apresentados também, a duas personagens femininas, Maggie Beaford (Jessica Chastain), uma dançarina da cidade que vai para o interior em busca de uma vida mais calma e acaba se tornando uma espécie de faz-tudo dos negócios dos Bondurant: garçonete, contadora, além de namorada de Forrest. A outra mulher da história é Bertha Minnix (Mia Wasikowska), filha de um pregador, que se apaixona por Jack, e acabam mantendo um romance proibido. Ambas as personagens pouco movimentam a história ou tem uma real importância naquilo que somos apresentados. Elas servem mais como um artificio para humanizar os heróis do filme, e de certa forma, transformar aquela história de crimes e violência, em uma história de família.

    Apesar dos créditos iniciais de ‘Os Infratores’ nos dizer que se trata de uma história baseada em fatos reais, tudo no filme funciona como se fosse uma saga de um pescador e seu peixe de 100 quilos no lago, contado enquanto se passeia por algum reduto longe da cidade. Quase tudo tem um certo exagero, tanto na velocidade com que as coisas acontecem, a proporção que os fatos tomam, e principalmente, as cenas de ação e tiroteios, longe de qualquer veracidade do nosso mundo. Mas que nos deliciaria ao ser contada como um “causo” do interior, repleto de lendas e folclore em torno da misteriosa família Bonderant, tida como invencível por toda região.

    Com homens da lei que agem por maneiras escusas. E transgressores honrados e corajosos, que não causam nenhum mal para aqueles que são bons. ‘Os infratores’ define muito bem quem é vilão e quem é herói. A única ambiguidade que vemos se dá na forma dos personagens Jack e Forrest, que são uma espécie de reflexo invertido. Enquanto o primeiro sempre foi um tipo avesso a violência, beirando a covardia, Forrest era o primeiro a se apresentar a ela. Em contrapartida, quando o assunto eram os negócios, Forrest era conservador, preferia manter sua vida tranquila, sem incomodar ninguém, para também não ser incomodado. Já Jack, era ambicioso, disposto a quase tudo pelo sucesso, venerando inclusive, o mafioso Floyd Banner (Gary Oldman) – que infelizmente faz um papel bem pequeno no filme e acredito que poderia ser melhor explorado.

    Com uma bela fotografia de Benoît Delhomme; direção competente de Hilcoat, principalmente nas cenas de ação, sempre intercaladas com cenas cotidianas que aprofundam e nos fazem simpatizar por aqueles personagens. Além de retratar o espaço e o tempo que aquela história se passa. Somado também a uma leve mistura de gêneros como Western e Gangsters, ‘Os Infratores’ se mostra um bom filme sobre um “causo” passado adiante por vários contadores de história.

  • Crítica | Marcados para Morrer

    Crítica | Marcados para Morrer

    A onda de filmes com o estilo handcam parece longe de acabar. Depois de virar praticamente o padrão em produções de terror, e algumas tentativas em outros gêneros, como Poder Sem Limites e Projeto X, a bola da vez é o policial Marcados Para Morrer. David Ayer, roteirista de filmes como Dia de Treinamento e o primeiro Velozes e Furiosos, escreve e dirige o longa sobre uma dupla de jovens policiais de Los Angeles (vividos por Jake Gylenhaal e Michael Peña). Apesar desta já ser a terceira vez de Ayer na direção, a impressão é que o negócio dele é só escrever mesmo.

    Ao optar pela estética de câmera na mão, o diretor parece ter apenas seguido uma modinha, e não tentado oferecer uma experiência até então inédita no gênero ação. Os problemas começam quando não apenas os policias gravam seu dia-a-dia (a desculpa que é o projeto acadêmico de um deles), mas os bandidos também se filmam só pra tirar onda. Então não há uma única filmagem, e sim uma colagem de várias só pra possibilitar que outros ambientes sejam mostrados sem quebrar a proposta. Até aí, nada demais, vários filmes fazem o mesmo. Só que em vários momentos temos ângulos de handcam que não fazem o menor sentido considerando as câmeras presentes no local. E em outros, uma câmera assumidamente convencional toma conta, ou seja, fugindo da ideia inicial. Essa esquizofrenia da direção, também aplicável à edição, aliás, acaba privando o filme daquilo que o estilo câmera na mão oferece de melhor, a imersão total na narrativa. Ficam somente os aspectos negativos, como qualidade de imagem inferior e lacunas na história.

    Caso tivesse sido filmado inteiro de maneira convencional, Marcados Para Morrer poderia ter sido um ótimo filme. Isso porque o roteiro é muito bem trabalhado, em especial em relação aos protagonistas. Amigos de infância, praticamente irmãos, os dois policiais revelam toda sua humanidade de modo bastante crível. Durante as patrulhas, eles conversam sobre tudo de suas vidas pessoais com um tom de intimidade e camaradagem que só parceiros de longa data poderiam ter. Alternando-se a isso, as situações tensas e até macabras que o trabalho joga diariamente pra cima deles, e como ambos reagem, lutando pra não serem afetados mais do que o suportável.

    A dura realidade impacta diretamente na visão romântica, principalmente de Brian (Gylenhaal), de que eles são super-heróis que vão salvar o mundo. Patrulhando as regiões mais barra-pesada da cidade, os personagens acabam se destacando e entrando na mira de um perigoso cartel mexicano. A presença violenta de gangues latinas, em conflito com os já estabelecidos negros, criou um cenário bem interessante e inclusive realista. Pena que isso, até pelo tempo e proposta, não foi tão desenvolvido.

    Em relação aos atores, os dois se saíram muito bem, há uma inegável “química” (totalmente heterossexual) entre eles. Gylenhaal se esforça e consegue convencer como durão, mas seria exigir demais dele a ausência de sua marca registrada: o olhar de cachorrinho triste está lá, nas cenas mais emotivas. Peña, não tão famoso de nome mas com um rosto reconhecível (de filmes como Invasão do Mundo, Crash, Torres Gêmeas, etc.) teve um trabalho consideravelmente mais fácil, viver um latino expressivo e tagarela. O resto do elenco está dentro do esperado no pouco espaço que tem, apelando pra estereótipos do gênero. Vale destacar a presença de Anna Kendrick, que já provou ser uma atriz competente, apesar de estar na Saga Crepúsculo.

    Naquilo que pretendia inovar, Marcados Para Morrer sinaliza que handcam talvez não combine com filmes de ação. Contudo, se enquanto experiência do ponto de vista técnico, o resultado não foi dos melhores, não deixa de ser uma boa pedida por cumprir a função básica do cinema: contar boas histórias.

    Texto de autoria de Jackson Good.

  • Review | Fez

    Review | Fez

    FEZ, um jogo que passou por um desenvolvimento conturbado, cinco anos de produção – Isso já é muito para um jogo AAA, imagine um independente – Prêmios concedidos pelo conceito em 2008. Atrasos, e mais atrasos no lançamento. Para entender um pouco melhor, recomendo o documentário Indie Game: The Movie. Mas finalmente no início de 2012, FEZ veio a público, e eu poderia parar por aqui dizendo apenas uma coisa, é uma obra prima, e nada que eu disser vai fazer jus a experiência com o jogo.

    FEZ, antes de mais nada, é um jogo de plataforma 2d, em um mundo 3d, em que a sua jogabilidade é sempre baseado em 2d, mas você rotaciona o mundo. Nada de novo até aqui, Paper Mario iniciou esse conceito, Crush fez um bom sucesso também e até um jogo em Flash, chamado Sky Island (http://www.newgrounds.com/portal/view/566594), já tinha feito isso. FEZ porém usa esses elementos de um modo tão único e criativo que dá uma roupagem completamente nova à essa jogabilidade. Torcendo cada vez mais suas noções de perspectiva, usando essa rotação do cenário, não apenas como um bônus. Mas sim, como se todo o jogo fosse baseado apenas nela. E o que veio depois foi apenas para completar o todo e fazê-lo um jogo único.

    A história de FEZ é a seguinte: você controla o personagem Gomez, que vive em um mundo 2d. Há inclusive uma brincadeira, de louvor ao cubo, mas que alguns não acreditam que ele realmente exista. Até que um dia, Gomez conhece um misterioso artefato, o Hexaedro, que dá a ele um chapéu mágico – que é o que nomeia o jogo. E esse chapéu dá a Gomez a habilidade de percepção do mundo 3d. E agora ele terá que salvar esse artefato, capturando os cubos que o formam, para evitar o colapso do universo. Com um plot simples, FEZ não está muito interessado em lhe contar uma história, a história maior é a própria experiência com o jogo. É um game designer convidando você para dar um passeio naquele universo que ele criou, com todas as referências de outros jogos, e autorreferências que ele inclui. Um dos exemplos de autorreferência muito bem inseridos é que em determinados pontos, o jogo simula um crash, um computador religando e você começando na tela de início tudo de novo. Referência clara a primeira exposição do jogo no PAX.

    exemplo de complexidade da primeira fase de FEZ
    Screenshot da primeira fase, acredite, é a menos complexa de todas.

    O sistema de fases do jogo é bastante complexo. Em cada uma delas você pode ter um ou mais objetivos, mas você tem uma linha de grandes fases que dão acesso a outras menores, ou até algumas que são apenas uma sala. Em cada fase, você pode ter que coletar um fragmento de cubo. Um cubo em si. Ou resolver um “desafio secreto” dos quais falarei mais a frente. Essa estrutura de fases dentro de fases dá ao jogo uma sensação de profundidade cada vez maior. Até pelo fato de cada um dos grandes cenários terem um tema e um motivo próprio, todos seguindo a linha principal do jogo, o Pixel Art baseado em Tetris. Um ponto importante, com tantos níveis que podem ser acessados, o uso do mapa se faz essencial. E um dos poucos problemas que FEZ apresenta, é justamente no mapa. Ele tem problemas de perspectiva, alguns bugs, que fazem com que você fique perdido sobre qual ponto você está observando. Depois de perceber os problemas, você consegue contorná-los com alguma paciência. Mas para evitar as frustrações possíveis, é bom que o jogador se acostume cedo com os problemas do mapa, e consiga se ajustar.

    Infelizmente, FEZ tem além do problema com o mapa, outro um pouco mais problemático, é um problema de performance e drop de framerate quando o jogo faz o salvamento automático. Do meio pra frente, é bem possível que você sinta engasgos, que comprometem um pouco da jogabilidade. Nada que tire os méritos do jogo, mas que deve ser destacado.

    Aproveitando que falei de Pixel Art, toda a parte visual de FEZ é um ponto que merece quantos elogios forem necessários. Aqui temos a primeira imagem disponível de FEZhttp://forums.tigsource.com/index.php?topic=354.0. E podemos compará-la com o que aconteceu cinco anos depois de desenvolvimento. Tudo é pixel art, com um uso de cores fantástico. O jogo tem um tipo de passagem de tempo, que serve apenas para fins estéticos, e mudança de cores do background, simulando um poente, ou nascer do sol. Além da própria estética das construções, que tem um nível de detalhamento individual de cada ponto, na maioria das vezes baseada em peças de Tetris, que é muito fácil você se pegar parando por um tempo, só pra observar melhor os detalhes que foram ali inseridos.

    Os detalhes do cenário são tão bem inseridos, que muitas vezes não tem apenas fins estéticos, e esse talvez seja um dos pontos mais inesperados e brilhantes de FEZ. Os desafios secretos que citei anteriormente, muitas vezes são baseados em um tipo de mix de criptografia e esteganografia (acalme-se, você não vai precisar ser um gênio da criptoanálise para concluir o jogo). O que acontece é o seguinte: espalhado pelo mundo, você tem dicas visuais sobre como resolver certos desafios. Logo no início, por exemplo, você tem um tipo de uma sala de aula, que explica, de modo vago e em nenhum momento didático, nem aos moldes de tutorial. Tudo sutil, como resolver ou decifrar certos enigmas. Apesar disso não ser absolutamente necessário para o cumprimento do objetivo inicial, de capturar 32 cubos, salvar o hexaedro e assim o universo. Caso você queira completar e coletar os 32 cubos e os 32 anti cubos existentes no jogo, você vai ter que quebrar a cabeça. Fazer anotações das pistas disponíveis, usar um celular pra decifrar um QR code. Até a trilha sonora do jogo, quando passada por um espectrograma, aparecem mais coisas escondidas, imagens, números, QR Codes.  Enfim, FEZ é um jogo cheio de mistérios, que ao observamos o próprio processo de desenvolvimento do jogo, é fácil fazer uma conexão com o game designer que projetou tudo aquilo. Ou seja, é um jogo autoral, com muito do seu criador inserido nele.

    Mistérios da trilha sonora
    Harry Truman, no espectrograma da música.

    Sobre a trilha sonora, além dos seus mistérios escondidos que você pode conferir mais aqui: http://kotaku.com/5904168/fezs-soundtrack-is-full-of-mysteries-too. Ela foi desenvolvida por um artista de chiptune chamado Rich Vreeland, sob o codinome de Disasterpiece. Além de ser ótima como um aspecto isolado, e que cabe perfeitamente na sua biblioteca do iTunes, no jogo, o cuidado para compor a ambientação é tanto, que mesmo em um jogo tão leve como ele é, em uma fase passada em um cemitério, adquire um tom mais obscuro e tenso, chegando a causar alguns arrepios. E a trilha sonora é parte fundamental para isso.

    Apesar de todos esses elogios, ainda assim é difícil de explicar porque FEZ agrada tanto, que me faz colocá-lo junto a outros clássicos como um dos jogos que mudaram um pouco do conceito que eu tenho dos jogos eletrônicos. Talvez seja uma mistura do lúdico com o desafio misterioso. Beleza visual e sonora. O poder do jogo te surpreender em uma situação simples, mas ao mesmo tempo impensável, brincando com todas as noções de perspectiva e retorcê-las cada vez mais. Talvez sejam todos os mistérios e enigmas aliados ao fato de ser um dos jogos mais autorais que pude apreciar. Cada um dos detalhes que dão a impressão de terem sido pensados exatamente para construir o todo. Talvez até o absurdo carismático que seja o Gomez, com seu chapéu, que te conquista logo de início apesar de nunca proferir uma palavra e ser um apanhado de Pixels. Ou talvez seja tudo isso junto. Essa união de pequenos detalhes que agrade tanto em FEZ e faça dele um dos melhores jogos dos últimos anos.

    FEZ foi criado e idealizado por Phil Fish, lançado pela Polytron em 13 de Abril de 2012. Distribuído pela Microsoft Games,  e está disponível para Xbox 360 (XBLA).

  • Crítica | Moonrise Kingdom

    Crítica | Moonrise Kingdom

    Wes Anderson é conhecido por seus personagens estranhos e histórias um tanto surreais que, ao serem embaladas em uma direção de arte cuidadosa, constroem universos que parecem funcionar no limite entre a realidade e uma espécie de conto de fadas. Em Moonrise Kingdom, seu filme mais recente, essas características aparecem com clareza e montam um filme leve, divertido e extremamente autoral.

    O filme se passa em uma minúscula ilha na costa leste dos Estados Unidos, nos anos 60, onde vivem Suzy e Sam, uma “menina problema” e um garoto órfão. Os dois se conhecem por acaso, iniciam uma correspondência e planejam uma fuga através de uma trilha indígena famosa na região.

    Suzy e Sam se encontram por serem desajustados. Ele é órfão e detestado por seus colegas do grupo de escoteiro, ela é a filha problema de uma família “perfeita”, famosa pelas brigas violentas na escola para meninas. No entanto, conforme o filme avança vemos que todos os personagens, dos pais de Suzy ao chefe dos escoteiros, são igualmente desorientados em relação a vida e aos seus papeis no mundo e é Anderson ironiza com precisão esse desajuste entre as expectativas infantis e a desorientação dos adultos.

    Em vários momentos Moonrise Kingdom faz versões em miniaturas de filmes grandiosos: a uma sequência construída exatamente como um filme de guerra, a perseguição com motos de brinquedo a própria fuga que lembra clássicos como Bonnie e Clyde e Monika e o Desejo. Mas Anderson transforma os soldados em escoteiros e um casal de ladrões em duas crianças fugindo de casa, ele fala de pessoas comuns, pequenas e perdidas e do ridículo que as cerca.

    A paleta de cores do filme é toda construída com cores primárias ou pasteis e retoma os mesmos toms que o diretor vem usando desde seus primeiros filmes. Essa escolha, aliada a fotografia lavada, com cara de polaroid, ajudam a deslocar o filme para uma época e um lugar fora do tempo, tornando-o esse conto de fadas torto. O Narrador e a montagem evocam ainda os filmes da Nouvelle Vague, clara referência de Wes Anderson com sua simpatia por anti-heróis e desajustados, mas sempre de forma mais simples e infantil, como se o próprio cinema não merecesse ser levado a sério.

    Dessa forma, Wes Anderson articula os elementos recorrentes de seu cinema com um elenco notável e uma protagonista adorável e carismática para criar um filme que fala de um tema possivelmente dolorido, mas que o faz de forma leve, divertida e irônica. Moonrise Kingdom é irônico em cada imagem e finalmente faz jus ao humor ácido de Wes Anderson, além de ser seu melhor filme desde Os Excêntricos Tenenbaums.

    Texto de autoria de Isadora Sinay.

  • Crítica | Curvas da Vida

    Crítica | Curvas da Vida

    Curvas da Vida é o primeiro filme dirigido por Robert Lorenz, parceiro de longa data de Clint Eastwood, tanto na produção como em assistência de direção em vários projetos. O filme traz o próprio Eastwood atuando em um filme que não dirige, coisa que não acontecia desde Na Linha de Fogo de 1993.

    O longa conta a história de um veterano olheiro de baseball, Gus (Eastwood), que enfrenta problemas com a sua visão, que é parte fundamental para seu trabalho, em que observa bons jogadores em ligas menores para entrarem no Atlanta Braves. Gus vive de cidade em cidade, solitário, praticamente morando em hotéis baratos. Apesar das dificuldades, o personagem ama a vida que leva e, principalmente, o baseball. Klein (John Goodman) chefe e amigo de Gus percebe que seu principal olheiro está passando por problemas e pede para Mickey (Amy Adams), filha de Gus, para que o acompanhe nessa viagem para observar Bo Gentry, pois ele teme que esses problemas possa lhe custar o emprego e assim a própria vida de Gus.

    Mickey é uma workaholic e ambiciosa advogada e se vê obrigada a acompanhar o pai, deixando em segundo plano um importante caso na empresa, que lhe renderia a sociedade. Obrigada porém por ela mesma no que ela define como algo que não deveria se preocupar e sim abandona-lo, como ele mesmo fez no passado. Porém, simplesmente não consegue. Temos ainda Johnny (Justin Timberlake), um ex arremessador descoberto por Gus, que ao sofrer uma lesão é obrigado a se aposentar prematuramente. Agora, Johnny trabalha como olheiro dos Red Sox e assim cruza novamente o caminho de Gus e, por consequencia, de Mickey.

    Curvas da Vida nos trás um personagem recorrente de Clint Eastwood: O velho rabugento, resmungão, que de alguma forma está sendo colocado para escanteio e tem que provar o seu valor, não para si próprio, já que ele sabe do que é capaz, mas para aqueles que o acham ultrapassado. Ao mesmo tempo que Gus sabe a habilidade de um rebatedor apenas pelo som do contato entre a bola e o bastão, mal consegue usar uma máquina de escrever, quem dirá um computador. Dessa forma, corre o risco de ser substituído por um novato que se baseia apenas em estatísticas fornecidas por programas que nunca se sentou numa arquibancada para analisar a capacidade de um jogador. Nesse ponto específico do mundo do baseball, parece que vemos uma antítese do que nos foi mostrado em Moneyball de 2011.

    Além desse conflito entre o valor do tradicional, os velhos métodos com os novos e o progresso inevitável. Há também o conflito entre pai e filha, em que o primeiro ao mesmo tempo que quer o melhor para a vida de sua filha, ou pelo menos o que ele considera ser o melhor para ela. Uma vida confortável que ele mesmo não pode ter em função do seu trabalho acaba por impedir que ela seja feliz ou realizada. O personagem de Timberlake nos ajuda a delinear o relacionamento entre pai e filha, pois o filme traça um paralelo entre a relação de Mickey e seu pai e como isso influencia em todos os outros aspectos de sua vida. Ao mesmo tempo que ela consegue alguma aproximação com o Gus, fazendo-o conversar, falar sobre o passado, por mais difícil que isso seja para o personagem de Eastwood, ela também se aproxima de Johnny e talvez pela primeira vez consegue cultivar um sentimento real e amoroso por alguém.

    Curvas da Vida não é uma obra prima e tem seus problemas. O principal deles está em seu terceiro ato um pouco corrido para conseguir ligar todas as pontas soltas do filme a tempo. Além de uma história previsível em boa parte da projeção em que se algo diferente acontece quase sempre dá sinais de que servirá para um gancho futuro na história. Em contrapartida, é uma história muito bem contada. De forma leve, até despretensiosa. Com um elenco que funciona muito bem, desde Eastwood, e seu recorrente papel de um velho aparentemente ultrapassado pelo novo e que precisa provar que ainda tem algo a oferecer. Amy Adams, que ao mesmo tempo que pode ser doce e sensível, mas também é dura e corajosa. John Goodman e Justin Timberlake, com papéis menores, mas que encaixam perfeitamente e nos fazem nutrir simpatia por seus personagens.

    Com um roteiro de Randy Brown que beira a inocência e belas tomadas de Robert Lorenz que remetem à própria direção de Eastwood. Uma ótima fotografia de Tom Stern, outro parceiro de vários projetos da dupla Eastwood e Lorenz. Curvas da Vida parece um oásis de paz, em um cinema com cada vez mais necessidades frenéticas, e com certeza fará o seu dia melhor.

  • Crítica | 007: Cassino Royale

    Crítica | 007: Cassino Royale

    Em 2002, no lançamento de 007 – Um Novo Dia Para Morrer a franquia do agente secreto tentava, sem muito sucesso, mudar de estilo. Havia uma tentativa de alinhar sua história aos dias de hoje, colocando em xeque a função do próprio James Bond em um mundo não mais polarizado. O último filme com Pierce Brosnan fez sucesso, mas trazia a tona um exagero nas cenas de ação, escondendo o roteiro fraco. Aos poucos, o futuro de James Bond nos cinemas foi sendo questionado. A composição de suas produções atingiram uma crise criativa que gerou o adiamento de um novo filme e, logo após, a liberação de Brosnan como o agente do MI6. Em parte, porque, finalmente, produtores haviam adquirido os direitos para filmar Cassino Royale, primeiro livro escrito por Ian Flemming, filmado para a televisão em 1954 e como sátira em 1977 no filme com Peter Sellers e Ursula Andress.

    Apresentar o começo da história de James Bond necessitaria de um novo ator e também rever a estética ao realizar uma produção que tanto fosse fiel ao original, quando refletisse uma maneira nova de apresentar a personagem. Aproveitando o sucesso de Identidade Bourne com sua ação realista, trouxeram as telas um agente mais cru e brutal em Cassino Royale.

    Dirigido pelo mesmo Martin Campbell que trouxe a franquia de volta em 1995, com Brosnan, em 007 Contra GoldenEye, a produção é uma estupenda construção cinematográfica, equilibrada entre a tradição e o novo. Concebendo com cuidado uma espécie de origem da personagem, sem perder o charme tão característico de vinte filmes anteriores.

    Mesmo situada no começo de sua carreira, a trama se desenvolve no presente atual, distorcendo a cronologia para um melhor resultado. O filme inicia-se em preto e branco, reverenciando produções antigas e marcando a idade da personagem, com um Bond prestes a matar um traidor, logo após adquirir sua licença para matar. Novo no cargo, é um agente mais violento, sem o esnobismo futuro e próximo aos tempos de hoje que procuram heróis imperfeitos.

    O filme costura bem as cenas de ação e a trama intricada de investigação. A ação bem executada por Campbell produz uma tensão real no público, principalmente por usar o mínimo de efeitos digitais. O roteiro bem realizado permite plena compreensão da investigação que culmina no jogo de cartas no local do título.

    Nunca houve tanta tensão em um jogo de Poker. A história de Le Chifre, que tem como único elemento bizarro chorar lágrimas de sangue por um problema lacrimal, é conduzida com excelência. Faz do jogo um espaço a mais para o suspense que cresce em confronto com Bond, que nunca se mantém incógnita, sendo uma constante ameaça.

    A personagem desenvolvida por Craig é o James Bond mais físico até então. Mesmo trajando o impecável terno, não há momento ruim para perseguir assassinos por telhados ou em uma corrida frenética com o famoso Aston Martin. Além da iconoclastia da personagem que não se importa com o tipo de bebida que toma, desde que fique levemente embriagado. Zombando de suas características desenvolvidas anteriormente.

    O mérito desta produção é recolocar a personagem de novo no radar em uma roupagem que respeita tanto a tradição como agrega novos fãs da franquia. Ao retomar a única obra de Flemming não adaptada, um novo Bond surgiu, ainda com classe e mais próximo aos dias de hoje. Reintroduzindo o famoso agente de uma maneira única ao cinema.

  • Resenha | Os Caça-Fantasmas – Mangá

    Resenha | Os Caça-Fantasmas – Mangá

    Em 2009, quando os mangás finalmente entraram com força no nosso país, a NewPop resolveu buscar na gringa uma publicação um pouquinho diferente para lançar em terras brasucas. “Os Caça-Fantasmas” reunia um clássico do cinema com o estilo oriental de desenhar para trazer ao mercado nacional uma publicação para quem não era muito fã das loucuras dos roteiros japoneses mas gostava do traço “sujo” da galerinha do olho puxado. Então… Finalmente li o mangá e, abaixo, vou contar o que eu achei.

    O mangá dos caçadores de fantasma mais famosos do mundo traz três histórias que captam bem a essência da comédia que, tenho certeza, todos adoramos na TV. As estórias acontecem após os eventos do segundo filme da série, quando Peter e toda sua trupe de caçadores enfrentaram o poderoso Vigo. Na primeira aventura do livro, os Caça-Fantasmas precisam ajudar um diretor de teatro a enfrentar um fantasma que teima em atrapalhar as apresentações de sua peça. O arco principal do mangá coloca os caçadores contra um antigo inimigo de carne e osso que se alia a uma tropa de espíritos. Para fechar a publicação, uma assombração do mundo da moda decide transformar todos os habitantes de Nova Iorque em escravos de suas roupas e precisa ser confrontada pelos únicos que podem combatê-la. Sem contar muito de cada estória para não estragar a leitura, é isso que posso lhes dizer.

    A HQ é fácil de ler, apesar de suas 180 páginas (eu, por exemplo, li tudo em 30 minutos). O papel utilizado é bom (o título é impresso em papel Offset e tem a capa cartonada) e a impressão é de boa qualidade também. Todas as páginas do interior são impressas em P&B e tem um traço estilo mangá mesmo, como promete a editora. Mas algumas coisas não me agradaram muito.

    A principal delas, talvez, seja a orientação da leitura. Em 2009, quando a publicação foi lançada, a leitura “de-trás-para-frente” dos mangás já não era mais novidade. Peguei a edição para ler pois ela havia sido vendida como mangá, e esperava encontrar o típico estilo de leitura das obras orientais. Passada a primeira má impressão que tive quando comecei a ler a obra de forma ocidental, atentei-me um pouquinho mais ao traço dos artistas. São 4 desenhistas diferentes que produzem a arte das estórias, e para mim eles emulam o traço dos mangakás japoneses muito bem. A arte, entretanto, pareceu um pouco confusa em certos momentos, e os traços dos personagens principais não se assemelham ao dos atores dos filmes (talvez por um empecilho legal?). Exceção ao rosto do Winston, precisei esperar até os personagens se apresentarem para saber quem era cada um. Mesmo depois disso, como o traço muda um pouquinho de uma estória para outra, ainda confundi o Peter e o Ray algumas vezes (o único que escapou dessa confusão dos personagens foi Egon, graças aos característicos óculos fundo de garrafa).

    Também acho que todas as estórias presentes na publicação ficaram um pouco corridas demais, mas esta é apenas uma opinião pessoal. Acho que o mangá se sairia muito melhor e seria muito mais interessante se tivesse apenas uma grande estória, ou fizesse a ligação das pequenas em um grande enredo. As aventuras do início e final são muito melhores e mais divertidas que a principal, que é divida em quatro capítulos no meio da HQ.

    Há de se exaltar, entretanto, o tom humorístico dos roteiros. No geral, a arte não consegue ser tão engraçada quanto os diálogos da HQ, apesar de tentar, mas o livro tem um tom de humor muito legal. Os diálogos são cheios de piadinhas e referências a cultura brasileira, o que demonstra que a obra que chegou até as minhas mãos não foi simplesmente traduzida e sim adaptada. Neste ponto, “Os Caça-Fantasmas” acerta no tom e relembra realmente os filmes que eu vi antigamente.

    É uma HQ que definitivamente não tenta ser séria e por isso diverte em alguns atos. Com trechos de ação confusos em alguns momentos e arte não mais do que satisfatória, a HQ propõe alguns minutos de leitura leve e descompromissada que traz diálogos divertidos e humor estilo anos 80/90. Ao melhor estilo “fácil de ler, fácil de esquecer”, o mangá se mostrou aquém do esperado, infelizmente.

  • Review | Saints Row: The Third

    Review | Saints Row: The Third

    À primeira vista, Saints Row: The Third – que eu chamarei apenas de Saints Row daqui para frente, por brevidade – pode enganar um desavisado que não sabe bem do que se trata. Afinal, os elementos e semelhanças com GTA são tantas que o jogo pode parecer apenas uma cópia mal feita, aproveitando-se do intervalo de tempo entre dois lançamentos da franquia. Mas não: Saints Row, se encarado da maneira correta, pode render boas horas de diversão frenética e descerebrada.

    Sinceramente, da primeira vez que joguei Saints Row, fiquei com o pé atrás. Em uma seção de pouco mais de uma hora, admito que não entendi a proposta do jogo, e realmente sai com aquela sensação de que era só mais uma cópia barata de GTA e que não valia a pena perder meu tempo. Porém, resolvi dar mais uma chance ao jogo e mudei de opinião quanto a isso. Explicando logo essa comparação entre os jogos: Saints Row usa o tempo todo elementos dos jogos Sandbox mais consagrados, GTA principalmente, como o celular, os mapas, o modo de direção e até algumas coisas que foram inseridas por meio de Mods, como o para-quedas. Mas não o considero um plágio simplesmente, pois ele me parece muito mais uma sátira desses jogos.

    Aproveito então e digo: Saints Row não pode ser levado a sério em nenhum momento, tanto por sua trama absurda quanto pelos próprios modos de jogo e algumas missões que devem ser completadas. Muitas vezes me senti num filme de ação dos anos 80 com a roupagem dos anos 2000.

    O conceito de exército de um homem só é quase que uníssono num jogo em que não existe sistema de cover; o tiroteio franco, você contra centenas, já deixa isso bem claro. Outros exemplos de absurdos são uma arma que você pode carregar, um dildo de 1 metro de comprimento e roxo, balangando de um lado pro outro, para matar pessoas aleatórias. Mais um ponto é uma missão em que você vai resgatar um companheiro de gangue e ele está participando de uma orgia sadomasoquista. Resultado: você sai pelas ruas em uma carruagem puxada por ele mesmo pelado, apenas com uma sela de cavalo, e é perseguido por outras carruagens, também conduzidas por tração humana, que estavam naquela orgia. Isso já dá um pouco o tom do jogo. Além disso, Zimo (o mais velho PIMP de Steelport), que é salvo nessa situação um pouco desagradável, carrega um microfone o tempo todo e só fala com voz de auto-tune.

    Outro ponto interessante de Saints Row é sua utilização de referências não só dos jogos, mas também do cinema. Um exemplo é uma missão em que você deve invadir uma emissora de TV e o prédio e quase tudo da “cena” é baseado em V de Vingança. Outro caso é uma das gangues do jogo, os Deckers, com roupas e carros inspirados em TRON. Isso acaba proporcionando também algumas batalhas num tipo de realidade virtual, além de uma missão curtinha em que você tem que dirigir a icônica moto do filme. Só aí já é um ponto interessante, pode-se dizer que é o melhor jogo baseado no universo de TRON já criado. Outra coisa que me rendeu boas risadas é o prefeito de Steelport ser o Burt Reynolds.

    Não me estenderei muito pelo plot do jogo, até pelo nível de galhofa comum. Mas basicamente, dando seguimento a Saints Row 2, sua gangue – os Saints – se transformou em um império midiático com brinquedos, energéticos, marcas de roupa, comerciais japoneses. Depois de um roubo a banco mal sucedido, você vai preso, porém é solto pelo suborno de uma organização criminosa chamada Syndicate, que é a união de três outras gangues: os Deckers, Morningstar e Luchadores, esta última um bando de mascarados da luta-livre mexicana. Seu líder chama-se Killbane. No fim das contas, esse pessoal do Syndicate quer tomar o controle das operações dos Saints e, é claro, o negócio não é fechado.

    A partir daí se desencadeará a história com os Saints tentando retomar o controle da cidade de Steelport. Até que uma senadora conservadora, claramente inspirada na Sarah Palin (inclusive com cabelos e óculos parecidos) não admite uma gangue com tanto poder de influência, causando tanto estrago, e é enviada uma organização paramilitar STAG (Special Tactical Anti-Gang) para acabar com a festa. Essa STAG, inclusive, conta com armas e equipamentos ultra futuristas. Ao final do jogo, você tem também dois finais alternativos, um mais galhofa do que o outro. Ambos brincam com clichês de Hollywood e filmes B: inclusive, na missão final do jogo, “putaria desenfreada” não define a quantidade de tiros e matança. Só jogando mesmo pra entender.

    Sobre os gráficos, nada demais, mas também nada que incomode. Para os personagens, o visual do jogo apela para um estilo puxado para o cartoon, um pouco do estilo de GTA IV, o que deve dar longevidade um pouco maior aos gráficos. Um ponto positivo é o visual da cidade em si. Vista de cima, com os edifícios e arranha-céus, foi feito um belíssimo trabalho; algumas vezes peguei algum helicóptero ou equivalente só para ver os grandes prédios e o design da cidade. O problema é que isso não se traduz na parte de baixo, em que há pedestres, motoristas aleatórios, porém não se tem a impressão de um cidade viva. Pouco se pode fazer no sentido de exploração de atividades que não tenham um objetivo claro, problema parecido com o que senti em Mafia II, por exemplo.

    Agora vamos aos problemas do jogo. Por mais galhofa que seja um título, com objetivo apenas de diversão, algumas coisas são inaceitáveis. Bugs são um desses casos. Não há o que justifique tamanha quantidade de bugs, que atrapalham e muito a jogabilidade e principalmente o cumprimento das missões. Os bugs são dos mais variados, desde congelamento da ação por alguns segundos até outros de movimentação – muito comuns em jogos Sandbox, é verdade. Alguns carros e até mesmo edifícios só aparecem no momento em que você já bateu neles. Num momento de missão, numa perseguição, isso é bastante incômodo.

    Faço uma ressalva aqui: a versão que joguei foi para PC e, ao que pude ler e obter informações, a versão de PC é a mais problemática de todas. Mesmo com os patches tentando resolver, alguma coisa acabou sobrando. E também já emendo a versão avaliada para dizer que é nítido que, para PC, o jogo foi só um porte, até mal acabado. Na troca de armas, na movimentação e até mesmo no sistema de mira, caso você esteja usando teclado e mouse, vai ter dificuldades. A sensibilidade vai ter que ser jogada lá pra baixo, deixando a troca de direção lenta às vezes. Sendo assim, o melhor para jogar Saints Row, mesmo no seu computador, é usando um controle: no meu caso usei o do Xbox 360 que melhorou sensivelmente a experiência. O que é uma pena, pois em shooters em geral eu dou preferência para o mouse, quando o jogo é pensado para usar um, é claro.

    Um outro problema (é uma opinião particular minha, e sei que muitos não compartilham) é a inclusão de zumbis, apesar do nível de galhofa aceitar qualquer inclusão inesperada. Essa história de zumbis em todo tipo de jogo… Vamos a alguns exemplos recentes: Red Dead Redemption, Call of Duty, Gears of War 3, entre outros. Ainda quando isso é feito por DLC, compra quem quer e tudo bem. Mas quando é no meio da história, eu não consigo engolir mais. Virou caça níquel. Vamos colocar uns zumbis, só pra tentar vender alguma coisa mais, ou subir a nota, como curiosidade. Se fosse apenas uma referência sacaneando isso, eu teria gostado. Mas não. Foi realmente uma tentativa de colocar o modo zumbi no jogo. Em uma ilha separada. A sorte é que, como jogo no PC, depois de fechar a história, instalei um mod que me deixa refazer as missões e alterar o cenário de algumas delas. Apenas retirei do mapa o “modo zumbi”.

    O parte sonora do jogo tem pontos altos e pontos baixíssimos, a trilha sonora tem músicas interessantes e variadas. No bom estilo da rádio do GTA, com breaking news inclusive. As dublagens são bem feitas, com vários estilos de vozes para os seus personagens, isso é tudo muito bom. Porém toda a parte de efeitos sonoros do jogo, teve pouquíssima atenção, pra não dizer nenhuma. O efeito sonoro dos tiros é ridículo, dos carros pior ainda. Todos praticamente com a mesma base. Enfim, faltou o mesmo cuidado com a dublagem para os efeitos sonoros.

    Um último ponto é o fator humor do jogo. Apesar das boas piadas e referências, que te fazem rir pelo inesperado e absurdo – como derrotar um “boss” com um peido enlatado – algumas dessas piadas são legais na primeira vez, na segunda já não têm tanta graça, e na terceira você já está saturado daquilo. Isso acontece algumas vezes no jogo. É o caso do Zimo, que fala só com auto-tune: lá pela quinta ou sexta vez, você não quer mais ouvi-lo falando, ficou apenas chato.

    Minha conclusão é que Saints Row: The Third vale a pena como diversão, e se encarado apenas como diversão pura e simples. Sem se levar a sério, o jogo leva missões inovadoras e tem um bom fator replay, pela grande quantidade de side missions. Eu, por exemplo, terminei a história com algo perto de 9 horas de jogo e ainda tinha pela frente muitas coisas para fazer pela cidade: colecionáveis a explorar, missões variadas. A dificuldade do jogo é bem tranquila, rendendo algum desafio, mas sem nunca exigir muito daquele que joga. Enfim, é um bom temporão entre GTA’s, que apesar da proposta diferente, tem sua jogabilidade similar.

    Saints Row: The Third foi lançado em 15 de novembro de 2011 para os consoles Xbox 360 e Playstation 3, e para PC em 16 de dezembro de 201. Foi desenvolvido por Volition, Inc. Distribuído pela THQ.

  • Resenha | Vaporpunk

    Resenha | Vaporpunk

    vaporpunk

    O steampunk surgiu como um subgênero literário e evoluiu para uma estética presente em diversas mídias, inclusive cinema e games. Pode ser definido como um cruzamento entre ficção científica e ficção histórica, apresentando realidades alternativas onde o avanço tecnológico aconteceu mais rápido, empregando o maquinário disponível na época (quase sempre o século XIX). Os cenários explorados costumam ser a Inglaterra Vitoriana ou o Oeste Selvagem norte-americano.

    A proposta de Vaporpunk – Relatos steampunk publicados sob as ordens de Suas Majestades, publicado pela Editora Draco, é um exercício de imaginação no mínimo curioso: como Brasil e Portugal seriam sob a ótica steampunk? Organizada por Gerson Lodi-Ribeiro e Luís Filipe Silva, a coletânea consiste em oito contos (ou noveletas, como eles preferem chamar) de escritores dos dois países, que trazem diferentes e criativas visões sobre o assunto.

    A Fazenda-Relógio, de Octavio Aragão, trata de autômatos substituindo a mão de obra escrava nas lavouras de café do final do Império, e a revolta dos negros com a abolição que, na prática, os condenou a morrer de fome. Curtíssimo, o conto traz uma boa ideia, e só, pois não há espaço para se desenvolver.

    Os Oito Nomes do Deus Sem Nome, de Yves Robert (sim, ele é português) é uma história de espionagem com elementos sobrenaturais, com o steampunk como pano de fundo. Essa ligeira “fuga” da proposta, aliás, está presente em outras das noveletas. Nesta, vemos o que acontece quando Portugal se torna uma potência mundial graças a um sinistro acordo com divindades africanas.

    É impossível não pensar em A Liga Extraordinária ao ler Os Primeiros Astecas na Lua, de Flavio Medeiros Jr, disparado o conto mais massa véio do livro. Num contexto onde a evolução tecnológica antecipou a Guerra Fria e a corrida espacial (!), aqui entre Inglaterra e França, acompanhamos outra trama de espionagem, pelo ponto de vista de um agente duplo britânico que espiona para os franceses. Alguém se esqueceu de avisar o autor sobre a proposta da coletânea, pois Brasil e Portugal mal são citados. O que não tem a menor importância, pois ele, numa empolgação sem freio, mergulha em mil referências à literatura da época, com direito a H. G. Wells e Júlio Verne como ministros dos países rivais, e várias das criações de ambos dando as caras. Com um final surpreendente, Os Primeiros Astecas na Lua daria um filmaço.

    Gerson Lodi-Ribeiro apresenta em Consciência de Ébano um mundo onde Palmares evoluiu de quilombo para uma grande nação independente que divide espaço com o Brasil dos portugueses e uma colônia holandesa no Nordeste. Uma pena que não haja nenhuma pista sobre como isso aconteceu, pois é um cenário bastante interessante. O foco é em um agente de uma organização secreta palmarina, que decide trair sua missão e destruir a arma secreta de seu governo: um vampiro indígena. Aqui o steampunk (presente com a construção de uma hidrelétrica) é uma mera desculpa para se contar uma história sobrenatural densa e pessimista. Vale mencionar o esforço do autor em relação à linguagem empregada, que simula perfeitamente algo escrito no século XIX.

    Unidade em Chamas, de Jorge Candeias, mostra um corpo militar português às vésperas de uma guerra. O diferencial é que tais soldados estão em uma grande frota de dirigíveis, chamados aqui de “passarolas”. Pelo ponto de vista de um recruta, vemos a dureza do cotidiano dos soldados, se preparando para um combate que eles nem sabem direito contra quem ou por que, além da tensão racial provocada pela união com outra tropa reunida e treinada em segredo nas colônias. Ainda que peque pela narrativa excessivamente descritiva ao tratar do treinamento e do funcionamento das aeronaves, nas entrelinhas percebe-se um cenário fantástico, de modo que esta noveleta sem dúvida merecia ser expandida em um romance.

    Uma interessante discussão moral/ética sobre se criar ou mesmo reproduzir a vida através da Ciência pontua A Extinção das Espécies, de Carlos Orsi. Protagonizada por um jovem Charles Darwin, em sua célebre viagem a bordo do HMS Beagle, a história também foge um pouco da ideia do livro. Há uma passagem pelo Rio de Janeiro, mas o foco mesmo é na Patagônia argentina, onde os gaúchos estão em guerra contra os indígenas da região. Conceitos de armas biológicas, robótica e até nanotecnologia rendem alguns momentos perturbadores.

    O nível cai um pouco com Os Dias da Besta, de Eric Novello. A trama parte da investigação sobre a presença de uma criatura metamorfa no Rio de Janeiro. Mas aí vemos um Brasil próspero e se destacando na corrida tecnológica sob o governo de D. Pedro II, Conde de Tunay com um super agente secreto/inventor, Princesa Isabel aviadora liderando um grupo de piratas, diversas invenções mirabolantes, intrigas internacionais… falta foco. Ao jogar tantos conceitos poucos trabalhados, a história parece um aleatório capítulo do meio de algum livro.

    João Ventura, mais do que qualquer outra coisa, presta uma homenagem à figura histórica do inventor português Padre Manuel Himalaya com O Sol é que Alegra o Dia… Abordando a energia solar em diversas aplicações, este é de longe o conto mais leve da coletânea. Interessante, porém incomoda um pouco o tom documental adotado pra contar um grande período de tempo em pouco espaço. A impressão é estar lendo um livro didático ou um artigo de enciclopédia.

    Mesmo com a oscilação de qualidade entre os contos (até porque seria injusto e ingênuo esperar o contrário), Vaporpunk só teve a ganhar com essa diversidade enorme entre as histórias. Cada autor soube imprimir seu estilo, tom e interesse específicos, seguindo (ou desviando elegantemente) a linha-mestra do steampunk em terras lusófonas. Leitura mais do que recomendada.

    Texto de autoria de Jackson Good.

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  • Anotações na Agenda 12 | A Makita Vidente

    Anotações na Agenda 12 | A Makita Vidente

    Bem-vindos à bordo. Bruno Gaspar, Flávio Vieira (@flaviopvieira), Rafael Moreira (@_rmc), André Kirano (@kiranomutsu) e Jackson Good (@jacksgood) se reúnem para ler os comentários e emails dos últimos episódios lançados. (mais…)

  • 10 atores que poderiam ter sido James Bond

    10 atores que poderiam ter sido James Bond

    Com o sucesso de Skyfall, nada melhor do que algumas notícias, matérias e curiosidades sobre o agente secreto mais famoso do mundo. Dessa vez, uma singela lista de 10 nomes que em algum momento foram cogitados para interpretar 007 nas telonas.

    10. Richard Burton

    Richard burton poderia ser 007

    Richard Burton, ator galês que atuou em clássicos como Cleópatra e tem sete indicações ao Oscar, entre melhor ator e ator coadjuvante (apesar de não ter vencido nenhum). Também fez o papel de O’Brien no filme 1984. Pois bem, o criador da série de livros de James Bond, Ian Fleming, foi quem indicou Richard Burton como o seu preferido para o papel quando a primeira adaptação ao cinema foi sugerida, no final dos anos 50. Em uma carta escrita por Fleming em 1959, ele declara que Burton seria de longe o melhor James Bond.

    9. Cary Grant

    Cary Grant foi considerado para ser o primeiro James Bond

    Cary Grant, ator inglês, com um currículo de mais de 70 filmes na carreira, além de duas indicações ao Oscar e de um Oscar honorário. Foi considerado para o papel de James Bond para o primeiro filme da série. 007 Contra o Satânico Dr. No. O ator, porém, não queria assinar com os Cubby Broccoli e Harry Saltzman para várias sequências do personagem. Com isso, tivemos o icônico Sean Connery, como o primeiro – e melhor – agente 007.

    8. Adam West

    Adam West como James Bond

    Santo Batman, dentre todos dessa lista, o que me deixou mais chateado por não ter sido um Bond foi o Adam West. Imagine se tivéssemos dois personagens icônicos com um só ator. West foi considerado para dar continuidade ao 007 depois de 007 – Os diamantes são eternos, substituindo Sean Connery. E, caso você não saiba, Adam West é quem dava vida ao Batman na clássica série dos anos 1960. Agora imagine a situação que poderíamos ter, um crossover entre feira da fruta e Viva e deixe morrer – prefiro nem me arriscar a algum trocadilho óbvio fazendo sacanagem com o nome.

    7. Michael Billington

    Michael Billington possível james bond

    O ator britânico mais conhecido pela série de ficção científica dos anos 1970, UFO, é o ator com mais testes para filmes do James Bond até hoje, com testes para os seguintes: Viva e deixe morrer (1973), 007 contra o Foguete da Morte (1979), Somente para Seus Olhos (1981) e 007 Contra Octopussy (1983). Ele ainda fez uma participação como um agente soviético que James Bond mata no início de O Espião que Me Amava (1977). Eu não tenho certeza, mas acho que Michael Billington deve encarar o Roger Moore como o seu grande nêmesis da vida.

    6. James Brolin

    James Brolin um dos possíveis James Bond

    Pai do ator Josh Brolin, fez tester para interpretar Bond em 007 Contra Octopussy, que acabou tendo o retorno de Roger Moore para o papel. Porém, os testes feitos por James Brolin podem ser vistos nos extras da coleção recentemente lançada, Bond 50.

    5. Sam Neill

    Sam Neill como possível James Bond

    O norte-irlandês Sam Neill, mais conhecido pelo seu trabalho em Jurassic Park, já interpretou um espião na série de TV Reilly, Ace of Spies. Por seu papel nessa minissérie, foi cotado para interpretar 007 no cinema. Neill falou em outubro de 2012 ao Belfast Telegraph sobre o assunto: “Felizmente, não me ofereceram o papel. Havia muitas outras pessoas que seriam melhores para ele, e eu não teria gostado de atuar como James Bond.”

    4. Mel Gibson

    Mel Gibson um dos possíveis James Bond

    De acordo com o roteirista de Viva e Deixe Morrer, Tom Mankiewicz, era forte a ideia de Mel Gibson para interpretar Bond dentro da produtora United Artists. Mankiewicz disse em 2009: “Alguém me disse o seguinte, ‘Fale para Cubby Broccoli (produtor da franquia) que o Mel Gibson seria ótimo para o papel’. Então, ao conversar com Cubby, ele me disse, ‘Eu não quero fazer um filme do Mel Gibson, quero fazer um filme de James Bond’.”

    Se Adam West foi o que mais me gerou decepção ao saber desses possíveis Bond’s, Mel Gibson com certeza é o segundo colocado. Consigo até imaginar James Bond com a cara do Mel Gibson, em algum deserto asiático, perseguindo um soviético vestido apenas de tanguinha e se autoproclamando o aiatolá dos vermelhos.

    3. Hugh Jackman

    Hugh Jackman possível James Bond

    O eterno Wolverine Hugh Jackman foi cotado para substituir Pierce Brosnan depois de Um Outro Dia Para Morrer. Mas ele saiu do páreo justamente por estar interpretando Wolverine. “Eu recebi uma ligação do meu agente dizendo, ‘Há um possível interesse para você interpretar James Bond, o que acha?’ No momento eu não tinha interesse, estava para começar as filmagens de X-Men 2 e o Wolverine já marcaria demais minha carreira. Eu não queria fazer dois personagens tão icônicos ao mesmo tempo”, disse Hugh Jackman para a Press Association em 2011.

    Eu acho que Hugh Jackman seria uma boa escolha para o Bond, ainda mais se houvesse alguma possibilidade de crossover de papéis. Imagine só, 007 sacando suas garras de adamantium para enfrentar um vilão de 3 metros de altura e dentes de aço. Tenho a impressão que seria uma galhofa inacreditavelmente boa.

    2. James Purefoy

    James Purefoy possível James Bond

    O ator que depois viria a interpretar Marco Antonio na série Roma, James Purefoy, foi um entre tantos os atores que os rumores envolviam para representar James Bond depois de Pierce Brosnan. Alguns outros nomes eram Jude Law, Heath Ledger, Eric Bana e até Orlando Bloom (uma risada longa e exagerada, pelo nome de Orlando Bloom como Bond). Voltando ao ator em questão, Purefoy, no programa Good Morning America em 2004, quando perguntado se ele praticava a atuação para James Bond em frente ao espelho, respondeu: “Apenas quando estou sozinho em casa”. Funny Guy esse James não é. Mas no fim das contas, o que aconteceu é que, no treinamento do MI6, o Daniel Craig sentou a porrada em todo mundo, e só para ele foi concedida a licença para matar. Tomar martinis batidos, não mexidos. E algumas Bond Girls.

    1. Idris Elba

    Idris Elba possível James Bond

    A estrela de Skyfall, Naomie Harris, recentemente disse que Idris Elba conversou com a produtora da série, Barbara Broccoli, sobre a possibilidade de atuar como 007. Elba, no entanto, disse que são apenas rumores. Mas também disse que ser o primeiro Bond negro seria uma grande honra.

    0,5. Paulo César Pereio

    Mas e se houvesse uma versão à brasileira de James Bond? Quem seria o mais indicado para o papel? Eu votaria com certeza em Paulo César Pereio. Um Bond decadente, gordo, desgostoso com a vida. De bar em bar, no centro de São Paulo tomando cachaça pura porque acabou o dinheiro pros martinis. Lembrando de seus bons tempos, com alguma Bond Girl de respeito – Sonia Braga, Matilde Mastrangi, Helena Ramos. Ou até mesmo quando era expulso das surubas por mau comportamento. Não sei se seria um bom filme de ação, muito menos um filme de 007. Mas provavelmente seria uma ótima pornochanchada. E se tivesse alguma frase narrada pelo próprio Pereio, concorreria a filme do ano.

  • Crítica | Gran Torino

    Crítica | Gran Torino

    gran torino

    Gran Torino foi o último filme de Clint Eastwood em que ele apareceu como ator e parecia, antes do anúncio de Curvas da Vida, que seria efetivamente seu último trabalho de atuação. Ao abandonar o posto de protagonista de suas próprias histórias, Eastwood construiu um filme que fala justamente de legado e tradição.

    No entanto, a tradição aqui vai além do ritual vazio ou da admiração desinteressada pelas coisas “antigas”. Tradição em Gran Torino passa pelo respeito profundo às origens e à identidade.

    Walt Kowalski é um homem de origem polonesa que acaba de perder a mulher e vive distante dos filhos em um bairro tomado por imigrantes asiáticos. Kowalski é nacionalista e conservador e olha com desconfiança tanto para a nova população da vizinhança quanto para os filhos que compram carros japoneses e para a neta com piercing no umbigo.

    Por uma série de eventos, incluindo uma tentativa de roubo de seu Gran Torino, Kowalski se aproxima da família vizinha e acaba descobrindo que os imigrantes compartilham suas opiniões e sentimentos muito mais que a própria família. É quando vê o respeito e o cuidado com que as tradições são respeitadas que ele começa a desenvolver carinho pelos dois jovens da casa ao lado.

    A tradição enquanto algo que deve ser cuidado e respeitado é representada no próprio carro: esse Gran Torino não tem valor apenas por ser um carro de 1972, mas por ser um carro bem cuidado de 1972. A neta de Kowalski deseja o carro porque é legal ter algo “vintage”, a gangue local como uma forma de status, mas é Thao que herda o carro: apesar de não ter laços de sangue com Walt, é ele que entende o valor depositado ali.

    Se, por um lado, Eastwood defende a preservação e o respeito às tradições, por outro ele crítica o ritual que se torna vazio. Em Gran Torino a igreja aparece como um padre que mal chegou na idade adulta e não entende nada da vida; a instituição em si perdeu o sentido e continuar indo à missa ou se confessando se torna um teatro patético.

    Eastwood dialoga com sua própria imagem: seu personagem é construído em cima das expectativas e dos clichês que se acumularam nele, tanto pelos papéis no cinema quanto por sua posição de republicano. A cena final do personagem lembra a figura imponente dos filmes de Leone, o cowboy decadente de Os Imperdoáveis e o tipo de homem que ele encarnou tantas vezes em vários de seus filmes.

    A fotografia é toda lavada, como uma polaroid, e a direção de arte enfatiza a decadência do bairro. Gran Torino é um filme sobre tradição, mas reconhece em sua própria forma que algumas coisas estão ficando para trás.

    É um filme sobre fazer as coisas de uma certa maneira, sobre o valor que reside na permanência. É também um filme sobre legado: como e por que essa tradição tem que continuar, já que muitas vezes os laços que pareceriam óbvios não são aqueles que a sustentarão.

    Em Gran Torino, Clint Eastwood se volta sobre sua própria imagem e sobre tudo aquilo que dizem dele, e parece reafirmar e de certa forma justificar aquilo em que acredita. É um dos filmes mais otimistas do diretor e talvez aquele em que ator, diretor e personagem melhor se articulam.

    Texto de autoria de Isadora Sinay.

  • Crítica | Argo

    Crítica | Argo

    Quando se ouve o nome de Ben Affleck, muitas torções de nariz e desconfiança são dadas. Affleck não construiu sua carreira de maneira tão promissora enquanto ator, porém vem se destacando na direção. Argo é a prova viva da maturidade de Affleck no ramo cinematográfico, evidenciando que merece mais respeito e reconhecimento do que lhe dão de fato.

    Baseado em fatos reais, Argo se passa no contexto do auge da tensão entre EUA e Irã, no final dos anos 70 e início dos 80. Àquele tempo, os EUA haviam dado asilo político ao Xá Reza Pahlevi enquanto fundamentalistas iranianos invadiram a embaixada americana em Teerã, requerendo a extradição do mesmo. Porém, seis funcionários da embaixada conseguiram fugir e se esconder dentro da casa do embaixador canadense. Tony Mendez (Ben Affleck), agente da CIA especialista em “exfiltração”, desenvolve um improvável plano criando um falso longa-metragem de ficção científica canadense intitulado “Argo” e usando-o como desculpa para adentrar o país e retirar os fugitivos a salvo.

    A primeira coisa a se dizer do filme é que a clássica exaltação do heroísmo norte-americano está, sim, presente. Porém, Affleck tem o cuidado de iniciar a história explicando o contexto da época e mostrando a motivação do povo iraniano em suas manifestações. O que se segue dali em diante é a criação meticulosa de uma tensão sincera e real – tendo em vista que vivenciada pelos fugitivos em 1980 -, porém aos olhos da plateia, que acaba participando emocionalmente daqueles fatos (mesmo aqueles que já sabem do final da história). Affleck desenvolve o filme com uma direção muito segura e extremamente satisfatória, demonstrando que sua carreira como diretor só tem a se desenvolver.

    Em alguns momentos, o filme se diverte com as auto-referências a Hollywood, mostrando personalidades e vícios dos bastidores da indústria cinematográfica. John Chambers (famoso maquiador que venceu o Oscar por Planeta dos Macacos, interpretado por John Goodman aqui) e Lester Siegel (Alan Arkin) representam esses momentos do filme, que funcionam como alívio cômico no desenrolar do longa. Apesar de não serem tão expressivos assim para o desenrolar da tensa trama, não depreciam a obra final – principalmente ao considerar que os dois atores esbanjam conforto em seus papéis e o fazem muito bem. A atuação de Affleck é relativamente inexpressiva, mas coerente no papel de um agente da CIA, cujo emprego é lidar com tensão e com a vida de outras pessoas enquanto se está correndo risco da própria.

    Soma-se às qualidades do filme a fotografia, adequada à época retratada, e a trilha sonora, discreta porém intensa. A qualidade técnica de Argo como um todo é muitíssimo bem trabalhada e todo esse rigor merece ser reconhecido.

    Apenas em 1997 o ex-presidente americano Bill Clinton permitiu a publicidade deste caso, cujos detalhes eram confidenciais até então. Hoje temos o privilégio de ver essa história sendo contada nos cinemas e, felizmente, por um diretor tão competente quanto Ben Affleck.

    Texto de autoria de Pedro Lobato.

    Ouça nosso podcast sobre Ben Affleck.

  • Resenha | O Inimigo Final – André Bozzetto Jr.

    Resenha | O Inimigo Final – André Bozzetto Jr.

    o-inimigo-final

    O Inimigo Final parte de uma sinopse bem interessante: três personagens devem lidar com seu passado e confrontar aquilo que os  assombra para poderem seguir em frente. Um velho músico de rock, um jovem perdido na cidade grande e um homem arrasado com o fim de um romance são os personagens e o livro se propõe a mergulhar em um mundo escuro e boêmio e contar sua história ao som de rock and roll.

    Já de início essa proposta falha na linguagem: ela é artificial, rebuscada e um tanto clichê demais. Tanto a narração em primeira pessoa quanto os diálogos não soam como algo que realmente seria dito por aqueles personagens. Ainda que o autor se esforce pra incluir palavrões e gírias, tudo é muito correto, muito discursado, cheio de construções perfeitas gramaticalmente, mas que ninguém usa na realidade. O excesso de adjetivos também incomoda, eles são vazios e parecem estar ali apenas para dar ao texto um requinte que, além de falso, não condiz com o tema ou o cenário apresentados.

    O escritor também erra ao escolher aquilo que deve ou não dizer: a primeira história é apenas uma espécie de prólogo e várias informações são jogadas sem serem desenvolvidas. Não sabemos quem são realmente aqueles personagens ou qual o grande segredo do velho rockeiro e entretanto esse parece ser o segmento mais interessante dos três. Por outro lado, durante a segunda história (que compõe a maior parte do livro) tudo é excessivamente explicado, todos os sentimentos são didaticamente descritos e cada vez que alguém cita “AC/DC” o narrador adiciona desnecessariamente “a banda de rock australiana”.

    A presença do rock contudo é uma das coisas mais interessantes do livro. Bandas são citadas, os personagens fazem referência a trechos de música ou a trilha sonora de algum momento o que poderia dar ao livro um ar pop, uma atmosfera de cotidiano como a dos romances de Nick Hornby ou Jeffrey Eugenides, mas isso acaba se perdendo no meio da linguagem excessivamente rígida. Outro ponto forte é o projeto gráfico: a narração é interrompida por poemas do livro que o personagem está escrevendo e as páginas entre os capítulos trazem imagens de paredes quebradas, como a dos bares sujos que são citados o tempo todo.

    No fim, Bozzetto parte de uma ideia original, mas é condescendente demais com seus personagens: eles são unidimensionais e moralistas, o protagonista da segunda história soa como uma versão idealizada do próprio autor na adolescência. Falta crueza a “O Inimigo Final”, tanto na linguagem quanto na trama, Bozzetto quer trabalhar com anti-heróis, mas lhe falta apresentar suas falhas honestamente. É um livro que deveria olhar para autores como Bukowski, John Fante e até Hemingway, mas ignora essas referências e acaba se tornando apenas pretensioso.

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    Texto de autoria de Isadora Sinay.

  • Crítica | Contato

    Crítica | Contato

    poster do filme contato

    Contato (1997) é a adaptação, dirigido por Robert Zemeckis, do livro homônimo de Carl Sagan. É uma obra de ficção científica e um bom exemplo de uma grande produção, que tem mais a dizer que apenas um belo espetáculo visual.

    O filme nos conta a história de Ellie (Jodie Foster), uma pesquisadora de física astronômica que desde a infância, incentivada por seu pai, nutre um fascínio pelo cosmo e, depois de formada com louvores no MIT, declina o convite para ocupar uma cadeira no corpo docente de Harvard para trabalhar com rádio astronomia em um projeto de busca por inteligência extra terrestre (SETI) em Porto Rico e depois consegue financiamento para assumir o Very Large Array (VLA), no Novo México.

    Contato brinca em vários momentos com essa mistura de ficção e realidade, com observatórios reais e discursos reais do presidente dos EUA, Bill Clinton, colocados no contexto do filme (ele não atuou, foram usadas imagens pré existentes), além de âncoras reais da CNN, – esses sim trabalhando para o filme. Zemecks usaria esses mesmo recursos novamente em Forrest Gump. Em Contato, temos uma aproximação maior daquelas situações que são exploradas no filme e que, dados os fatos, seriam de certa forma plausíveis caso viessem a acontecer.

    Antes de mais nada, o filme é um espetáculo visual, apesar de não ser apenas isso. Com um início belíssimo, de uma tomada como se a câmera estivesse na estação espacial, o filme inicia se afastando da terra, do sistema solar, da via láctea e da galáxia. Belas representações, tanto do céu, quanto de galáxias inteiras são abusadas no filme, o que me lembrou dos melhores momentos da série Cosmos, do próprio Carl Sagan, porém aqui com um orçamento muito maior e, por consequência, muito mais trabalhado esteticamente.

    Além de tudo isso, Contato é um filme corajoso pelos temas que aborda. A começar por sua protagonista, uma cientista brilhante, que é a grande responsável por uma das maiores descobertas da humanidade e que se vê em conflito em diversos momentos pelo fato de ser uma mulher enfrentando o mundo machista da própria ciência e também por seus posicionamentos políticos e religiosos. Além da própria Jodie Foster contribuir muito com a credibilidade passada para o papel.

    É corajoso também por seus temas e suas críticas, muito delas herdadas de toda a obra de Carl Sagan. Para entender um pouco melhor essa crítica, busco falar um pouco do plot, que segue com Ellie e seu projeto SETI, o qual está prestes a perder o apoio do governo. É quando eles encontram um sinal de rádio, que não parece ser um alarme falso. Não é um pulsar, uma interferência ou estática, mas sim uma inteligência tentando estabelecer contato, tentando passar uma mensagem. Primeiramente só são detectados alguns números inicias da mensagem, números primos, que segundo Ellie seriam a prova de uma inteligência alien e não algo da natureza.

    Ellie, enquanto cientista, começou a espalhar a palavra mundo afora, já o governo, através do departamento de defesa americano, começou a sentir a necessidade de manter aquilo em sigilo. E instaurou a ameaça de militarizar suas pesquisas, mesmo sendo uma atividade civil.

    O que eles descobrem, além dos números primos, é que os aliens estavam mandando a primeira transmissão televisiva que a humanidade enviou pelo ar, que foi o discurso de abertura das olimpíadas de 1936, na Alemanha, por Hitler. Neste ponto temos mais uma crítica a nossa sociedade como um todo. Hitler é um produto da nossa sociedade, onde qualquer ser pensante não se orgulha de compartilhar a mesma estrutura de cromossomos que ele, portanto, uma crítica a nossas atitudes como seres humanos, que por mais que superemos tal situação ruim, por mais que uma ideia seja derrotada, ela deixará eternamente uma marca, um risco na nossa história.

    Seguindo, havia ainda uma terceira camada de informações, essa sim que mudaria o rumo da humanidade: Um conjunto de dados, criptografados, que estabeleciam um padrão, mas ninguém conseguia encontrá-lo. A partir disso o filme tenta traduzir no momento  Eureka de Ellie o sentimento da descoberta científica. De algo que estava ali o tempo todo e que era tão simples. Só era necessário um passo a mais de compreensão, um olhar distorcido para que o avanço fosse possível.

    A partir desse momento, descobre-se que esses dados eram projetos, plantas, de uma máquina da qual ninguém sabe o real objetivo.  Apenas decidem construí-la, afinal, era possível, – mais um dos momentos de exaltação da ciência. Daqui pra frente, se continuar estragarei a experiência com o filme. O que posso dizer, é que há o envolvimento amoroso de Ellie com Palmer Joss (Matthew McConaughey), que também levará a questionamentos sobre fé e Deus, e como isso pode “justificar injustiças”, além do personagem David Drumlin (Tom Skerritt), que é uma espécie de antagonista da história, um homem sem muitos escrúpulos para atingir seus objetivos, numa representação clara da ambição e suas consequências.

    Fato é que o filme, tem seus furos de roteiro e seus clichês. Algumas situações são resolvidas rápidas demais e outras fogem um pouco do da lógica do restante do filme, como o fato de Palmer Joss ser um assessor da presidência americana para assuntos sobre religião, sendo apenas um escritor de livros que criticam a tecnologia e ciência que nos levam a uma sociedade mecanicista.

    Esses furos, porém, são muito pequenos e não atrapalham o que deve ser observado como foco principal, que são todas as críticas sociais que Contato trás consigo. Sua crítica a religião e a fé cega, juntamente com a política e os modos com que a política se conduz ou deseja conduzir a sociedade, dando crédito a grupos extremos calcados apenas em fé e descreditando aqueles baseados em pesquisa, ciência, em busca da verdade. Apenas pelo fato de que o grupo que crê, constitui uma maioria. Se voltarmos rapidamente à Hitler, este também, em dado momento foi apoiado por uma maioria.

    Contato, além de sua crítica, é um filme que exalta a ciência, o pensamento cientifico, o ceticismo e a busca pela verdade. E acima de tudo trata-se de uma homenagem a Carl Sagan, com billions and billions de suas citações adaptadas nas frases ou às situações dos personagens. Sagan, que apesar de não ter um trabalho científico tão notável, foi importantíssimo para toda uma geração, influenciada por seu trabalho de divulgação científica, não só no aspecto técnico e acadêmico – até por ter sido alguém que fugia dos padrões da academia. Mas também pelo incentivo a criatividade e seu modo de enxergar a nossa sociedade.

  • Resenha | Nós: Dream Sequence Revisited

    Resenha | Nós: Dream Sequence Revisited

    Uma das coisas mais impressionantes de ser ler histórias em quadrinhos é poder sempre acompanhar uma variedade de possibilidades na utilização da linguagem e das estruturas narrativas em seus desenvolvimentos. Quadrinistas sempre inovam e é o que Mario Cau faz em sua HQ Nós – Dream Sequence Revisited.

    “Nós” é uma história curta que brinca com a linguagem sequencial. Aproveitando o formato do álbum, o autor mescla a dinâmica de leitura de quadros juntando duas páginas como se fosse uma apenas. Usa e abusa de quadros arqueados e sequências horizontais para envolver o clima do sonho que o personagem está na história.  Esse é de fato o maior mérito de Mario Cau, que utilizou dessa técnica para dar um diferencial para uma história simples, mas significativa nos sentimentos que transmite.

    Outro diferencial do álbum “Nós – Dream Sequence Revisited” é a presença de um DVD, que contém uma motion comic com a mesma história do quadrinho – o qual não é tão impactante quanto a leitura do mesmo, mas cumpre seu papel em desenvolver a história sob óticas de linguagem diferentes – e informações sobre o autor. Alguns textos do autor contando um pouco do seu processo criativo e de como começou sua carreira, bem relevante para os mais curiosos em saber como funciona os bastidores do universo dos quadrinistas.

    Neste ponto, tomo emprestadas as palavras da professora Sandra Daige Antunes Corrêa Hitner, que introduz a HQ de Mario Cau dizendo que “a arte tem a capacidade de colocar em imagens os sentimentos mais profundos como uma espécie de arco-íris que atravessa as dores da alma e as possibilidades da vida”.

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    Texto de  autoria Pedro Lobato.

  • Resenha | Tex Gigante 27 – A Cavalgada do Morto

    Resenha | Tex Gigante 27 – A Cavalgada do Morto

    O sobrenatural sempre esteve presente no Velho Oeste americano. Regiões inóspitas e pouco povoadas, gente simplória e supersticiosa, mitos indígenas e o folclore europeu trazido pelos imigrantes; toda essa mistura resultou em várias lendas macabras, contadas ao redor da fogueira. Uma das mais famosas é a do cavaleiro sem cabeça, baseada num fato real ocorrido na metade do século XIX, e que inspirou inclusive o filme de Tim Burton. Agora é vez do maior cowboy dos quadrinhos enfrentar essa assombração no recente lançamento da Mythos Editora, Tex Gigante número 27, intitulado A Cavalgada do Morto.

    O perigoso bandoleiro Artur Videla assolou a região da fronteira com o México até ser capturado por quatro Texas Rangers que resolveram fazer dele um exemplo. Após decapitar o bandido, prenderam seu cadáver (com a cabeça no colo) num cavalo e puseram o bicho pra galopar pelo deserto. Muitos anos depois, com a lenda já criada, El Hombre Muerto ressurge e começa a matar. É então que Tex e seus parceiros são chamados para resolver o mistério, e sua mensagem é clara: fantasma ou não, chumbo quente é a solução.

    A série Tex Gigante traz sempre histórias completas e geralmente ilustradas por um artista convidado. Raras vezes, porém, um desenhista que já faz parte da equipe do personagem ganha essa honra. O escolhido da vez está entre os últimos: Fabio Civitelli desenha histórias de Tex desde 1984, e não é exagero nenhum dizer que ele se tornou o preferido dos leitores com seu traço limpo e elegante. Aqui ele aproveitou para dar maior atenção aos pequenos detalhes do desenho e até tentar algumas experimentações. Embarcando no clima de terror da história, ele abusou de contrastes entre luz e sombra (ou, muitas vezes, praticamente entre sombra e sombra) e inovou com alguns dégradés e efeitos esfumaçados, em especial nos cenários e paisagens – sem, contudo, deixar de lado a clareza de composição e a precisão anatômica que o consagraram. Apesar de alguns deslizes, como armas inexplicavelmente enevoadas quando o rosto do personagem está nítido, foi um trabalho impressionante. Só um adendo, Civitelli esteve em outubro no Brasil, na FestComix de São Paulo e na GibiCon de Curitiba, e se mostrou extremamente simpático e atencioso com todos os fãs. Um artista em todos os sentidos.

    O roteiro da edição ficou a cargo de Mauro Boselli, veterano escritor de Tex e outros personagens da editora Bonelli. Também ele está entre os mais apreciados pelos leitores, sempre se destacando por criar tramas nas quais aventura é a palavra- chave, sempre bem movimentadas e empolgantes. Outra característica marcante sua é apresentar coadjuvantes muito bem trabalhados. Como ele próprio declarou certa vez, todo mundo sabe que Tex e seus parceiros não vão morrer, então se a história tiver coadjuvantes interessantes, fica um tempero a mais. Em A Cavalgada do Morto ele usa de todos esses expedientes e mais alguns, como a divisão tradicional de Tex e Carson investigarem uma pista enquanto Kit Willer e Jack Tigre seguem outra. Também vale mencionar a presença de El Morisco, o “bruxo” mouro amigo do herói, recorrente em diversas histórias onde o ranger enfrenta algo sobrenatural. O roteiro funciona muito bem como um “filme” de western-terror, o único ponto fraco é a previsibilidade da trama, ao menos para leitores experientes em Tex.

    Nas bancas custando R$ 19,90, A Cavalgada do Morto tem 242 páginas e é recomendação máxima até pra quem não conhece o personagem, pois este é um excelente ponto de partida.

    Compre aqui.

    Texto de autoria de Jackson Good.

  • Filosofando o Pulp | Teletransporte, invenção final ou instantânea liquidez?

    Filosofando o Pulp | Teletransporte, invenção final ou instantânea liquidez?

    Muitos dos problemas da humanidade em toda a sua história são constantes: transcendem cultura, evolução tecnológica, clima etc. Constantes também se tornam as reclamações sobre estes problemas mais comuns: “Impostos são uma praga!”, guerra, fome, disputa territorial, distribuição desigualitária de riquezas e meios de locomoção ou transporte.

    Pois bem. Desde que surgiu a ideia do famigerado “Teletransporte” (ou teleporte), ele é imaginado como resolvedor das mazelas dos nossos meios de transporte atuais, dando um ponto final à questão por sua praticidade intrínseca e com resultados que poderiam ser comprovados quase que instantaneamente.

    Ressalto aqui que me refiro a qualquer tipo de “transporte instantâneo” sequer imaginado, desenhado ou descrito ao longo da história da humanidade. Ou seja, aparições instantâneas carregam um conceito similar ao do nosso teletransporte moderno e maquinário. Eis aí o trunfo do teletransporte antigo ao novo. Vais entender no decorrer do texto.

    O principal ponto do teletransporte moderno, que já foi experimentado e de fato funcionou (um experimento que resultou no “teletransporte” de um fóton), basicamente consiste em transmitir informações para que seja possível reconstituí-las na máquina de destino. Ou seja, não é possível transmitir ”magicamente” as mesmas partículas através do espaço-tempo de forma instântanea. O que acontece, então, com o corpo original? Pode-se dizer de forma simplista que ele é “diluído em bits/bytes” para que sejam transmitidos. Portanto, mantenha em mente este conceito para analisar o cenário aqui discutido.

    Com essas informações agora transitando entre as suas sinapses neurais, eu lhe pergunto: adentraria então tal máquina, sabendo que todas as moléculas do seu corpo estão sendo pulverizadas e sendo reconstruídas em outra máquina a milhares de quilômetros de distância?! Sabendo (ou sem saber, talvez) que, mesmo que a cópia física e celular seja perfeita, você nunca irá garantir que toda a sua consciência estará intacta “do outro lado”? Pode-se o imaterial se perder durante tal transmissão de informação? É a consciência, de fato, material? Alguém tem a resposta definitiva para isso? Certo, eu sei… A certeza corre como um fóton de nossas mentes diante de tais questões.

    Mas, além de tudo isso, para mim a grande pergunta nem é essa. Todas essas perguntas anteriores ainda têm como base a ideia de que é você, sujeito em primeira pessoa na perspectiva do mundo, você é quem vai sair do outro lado da máquina. Incompleto ou imperfeito? Talvez, mas ainda assim, em essência o mesmo ser que momentos antes ali não estava. Não, o meu maior receio e dúvida, que me deprime se algum dia eu viver para ver o teletransporte inventado é: não será EU quem sairá no outro ponto espacial conforme planejado. Acredito, sim, que ele funcionaria perfeitamente e transmitiria todos os dados necessários para que eu seja replicado, assim como as minhas memórias, consciência, razão e qualquer outra propriedade mental difícil de ser comprovada materialmente. Tudo isso estaria lá, perfeitamente como o que “saiu” daqui, mas quem estaria lá não seria eu, ser senciente e único como todos somos. Outra pessoa como eu estaria “lá”, outro humano com as mesmas memórias, mazelas, pensamentos e gostos estaria lá, mas não eu. Células iguais, pele, cabelo, mas não a minha pele.

    Outro ser desceria na plataforma final. Outro ser que se passaria por mim perfeitamente, com os mesmos movimentos, jeito de agir e pensar. Nem mesmo tal replicante saberia que é uma farsa, uma cópia, que nasceu de fato apenas quando saiu da plataforma de desembarque; seria o disfarce perfeito. Quem, eu me pergunto, em sã consciência levantaria dúvidas sobre a eficácia de tal invenção e a sua perfeição ao nos transportar (copiar) para outro lugar? Ninguém o faria! E, para ser bem honesto, creio que com o tempo todos se acostumariam com isso e nem faria tanta diferença assim no resultado final sobre o curso da evolução humana. Mas, mesmo acreditando nisso, ainda me assombro com a ideia de ter o meu ser desfeito em partículas para em seguida usarem essa informação para colocarem um substituto na minha vida com a enorme chance de ninguém nunca questionar que “aquele cara” sou eu.

    Correndo o risco de parecer um velho medroso quando no futuro longínquo inventarem tal equipamento, ao me negar a entrar em um deles, peço que não tomem a minha aversão por medo irracional. Longe disso, a negação raivosa que surgirá em mim se algum dia tentarem me colocar à força numa máquina dessas é provida de um pensamento cuidado sobre as diversas variáveis que envolvem o gracioso teleporte. Por isso lhe pergunto:

    Entraria sem receios todas as vezes que fosse usar tamanha invenção…?

    Texto de autoria de Amilton Brandão.

  • Crítica | Ruby Sparks: A Namorada Perfeita

    Crítica | Ruby Sparks: A Namorada Perfeita

    Ruby Sparks

    A comédia romântica não é um gênero conhecido pela imprevisibilidade ou pelas inovações: o roteiro segue uma espécie de fórmula e é preciso fazer um filme simpático e divertido, mas todos os espectadores sabem que um casal se conhece, se desentende e fica junto no final. Sendo assim, o sucesso desses filmes se baseia no carisma e na química dos protagonistas, e também na parcela de “comédia” que torna agradável todo o caminho até um final já esperado.

    Ruby Sparks acerta exatamente em fazer um filme que trabalha muito bem a maior parte dos clichês do gênero, mas ainda assim inova o suficiente para se destacar do mar de filmes bonitinhos existentes.

    O roteiro escrito por Zoe Kazan (que também é a protagonista-título e neta do lendário diretor Elia Kazan) se foca em Calvin, um escritor prodígio que, dez anos depois do sucesso de seu romance de estreia, está em crise e com bloqueio criativo. Calvin não tem mais amigos e não interage com ninguém exceto seu irmão e psicanalista, até que um dia a protagonista do romance que ele afinal começou a escrever se materializa em sua cozinha e afirma ser sua namorada.

    Aqui está a maior originalidade do filme: Ruby Sparks não acaba quando os protagonistas finalmente ficam juntos. Ele começa aí, e sua trama não é composta das desventuras enfrentadas até que um descubra o amor do outro, mas justamente das dificuldades em se manter um relacionamento depois que o primeiro momento já passou. Ruby surgiu na mente de Calvin, logo, ela é a namorada perfeita, sua garota dos sonhos; mas, conforme ela vai vivendo no mundo real, sua personalidade ganha nuances. O que a torna encantadora também a faz inconstante, e a maior questão de Calvin vai ser aprender a lidar com algo que escapa completamente ao seu controle, mas que ele também não quer viver sem.

    Kazan acerta na construção de seus personagens: ambos são multi-dimensionais, parecidos com pessoas de verdade e parecem fazer sentido juntos. Mas, mais do que isso, Ruby é uma espécie de crítica ao estereótipo da menina problemática-mas-espontânea-e-adorável que vem proliferando nos últimos tempos. Sim, ela é adorável e também irritante, divertidamente espontânea, mas capaz de acabar de lingerie na piscina de uma festa cheia de gente importante. A visão da roteirista sobre essa legião de meninas “desajustadamente perfeitas” parece  estar expressa em uma fala do irmão de Calvin: “Mulheres esquisitas e bagunçadas, cujos problemas apenas as tornam mais adoráveis, não são reais.” E é justamente esse abismo entre a ideia na cabeça de Calvin e a menina de verdade à sua frente o assunto do filme.

    Ruby Sparks não açucara excessivamente seu tema: em alguns momentos a relação de Ruby e Calvin beira o doentio, e o final do filme traz uma cena bastante violenta. Ainda assim, o clima geral é alegre, romântico e otimista. Kazan e os diretores Jonathan Dayton e Valerie Faris (responsáveis por Pequena Miss Sunshine) conseguem resgatar um gênero que definhava visivelmente e inserir inteligência e reflexões válidas, sem perder o charme das comédias românticas tradicionais. Não é uma obra-prima do cinema, mas é um filme inteligente, divertido e a melhor comédia romântica em muito tempo.

    Texto de autoria de Isadora Sinay.

  • Você conhece Jack Reacher?

    Você conhece Jack Reacher?

    Criado no final da década de 90 pelo autor Lee Child, o militar Jack Reacher não gosta da alcunha de herói, normalmente atribuída a ele. Nascido em uma base militar em Berlim, formado na Academia Militar em West Point, Reacher serviu durante 14 anos na polícia militar, onde fez parte da 110º Unidade Especial de Investigações, formada para cuidar de casos difíceis envolvendo membros do exército dos Estados Unidos.

    A descrição da personagem pode trazer ao leitor uma proximidade com outro famoso herói fictício. Assim como Jack Bauer, da série 24 Horas, Reacher se dedicou a uma carreira para defender os Estados Unidos e, como Bauer, escolheu viver à margem para evitar o sistema em que outrora acreditava.

    Descrito nos romances como um homem de quase dois metros, porte físico natural e cabelos loiro escuros, a aproximação fica mais evidente: tanto Reacher quanto Jack Bauer representam um estilo de herói americano. O militar que distorce a lei para regê-la. A vantagem de Reacher é que, sendo personagem de diversas histórias, tem uma personalidade melhor delineada do que Bauer, mais direto e plano.

    Ao mesmo tempo em que uma adaptação será lançada no cinema, com Tom Cruise no papel, a Bertrand Brasil lança Alerta Final, quarta obra de Child no país, e relança a obra que originou o filme, Um Tiro, com nova capa. Uma oportunidade para conhecer este interessante personagem.

    A adaptação cinematográfica revela a potência de Jack Reacher. Embora não tão conhecido no país, seus livros atingem altas vendas no exterior, consagrando-se na categoria Best seller. Engana-se quem pensa que tal status faz das obras uma leitura simples e rasteira. Além da complexidade da personagem central, desenvolvida livro após livro, Child é capaz de engendrar uma narrativa policial que tanto explora a investigação do crime como destaca as habilidades da formação de sua personagem.

    Mais do que um lobo solitário, Reacher é um personagem sensível que, pela culpa do que realizou no passado, evita a alcunha de herói. Tem consciência da violência que pode desencadear. Além da natural força bruta, tem o agudo raciocínio de um detetive.

    O filme Jack Reacher, que estreia no Brasil em 11 de janeiro do ano que vem, tem como trama a história de um atirador de Indiana, preso após alvejar cinco pessoas aleatoriamente. Seu único pedido é que chamem Reacher para ajudá-lo no caso. Somente com esse pequeno argumento, Child parte de uma investigação bem conduzida, sem deixar de lado a ação, e apresenta uma intrincada rede de relações que justificam por que os cinco tiros foram disparados daquela maneira. A narrativa cinematográfica do autor permite que, já na leitura do romance, se criem cenários com riqueza de detalhes.

    Tom Cruise personifica Reacher na adaptação. Embora não tendo a mesma descrição, Cruise reconquistou seu prestígio como ator de ação em Missão Impossível 4: Protocolo Fantasma e tem no currículo boas interpretações, sendo possível que consiga compor a personagem com a angústia necessária para ser mais do que um simples herói de ação.

    Já no livro Alerta Final, situado em outro momento cronológico, Reacher vive solitário  quando um ex-militar à sua procura é assassinado. É o ponto de partida para que novamente a personagem saia de seu conforto e descubra quem são os responsáveis por procurá-lo quando deseja ficar em paz.

    Em uma época em que os heróis humanizados se tornaram padrão, um bom elemento que dá mais dramaticidade à personalidade, Jack Reacher precisa ser conhecido como um excelente exemplo deste tipo de herói desencantado que, ao lado da narrativa de Child, bem amarrada e construída, se destaca além de sua intenção de mero entretenimento.

    Os livros de Jack Reacher podem ser comprados aqui e abaixo você confere o trailer da adaptação.

  • VortCast 20 | V de Vingança

    VortCast 20 | V de Vingança

    Remember, remember, the fifth of November… Flávio Vieira (@flaviopvieira), Rafael Moreira (@_rmc), Pedro Lobato (@pedrolobato), Bruno Gaspar, André Kirano (@kiranomutsu) e os convidados Felipe Morcelli (@terra_zero) e Delfin (@DelReyDelfin) do Terra Zero se reúnem para discutir a obra de Alan Moore, David Lloyd e Steve Whitaker: V de Vingança.

    Duração: 119 mins.
    Edição: Rafael Moreira e Flávio Vieira
    Trilha Sonora: Flávio Vieira

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    Aos amigos Lucas Amura e Mari Bonfim pela leitura emocionante de trechos da obra original. Segue informações de contato:

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