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  • Crítica | Indie Game: The Movie

    Crítica | Indie Game: The Movie

    indie game the movie

    Indie Game: The Movie, é um premiado documentário (Sundance 2012), criado, produzido, dirigido, filmado, fotografado, editado e escrito por apenas duas pessoas, James Swirsky Lisanne Pajot. Ou seja, bem ao padrão de uma produção independente. O filme foi financiado por dois projetos no kickstarter, o primeiro em maio de 2010, levantando os fundos necessários (U$ 15.000) em 24 horas e atingindo 23.341,00 ao final do funding. O segundo “financiamento”, para finalizar o filme, com objetivo de (U$ 35.000), conseguiu quase 200% de sua meta inicial, atingindo mais de 71 mil dólares. Provas de que a comunidade de games independentes, apoiam uns aos outros não faltam. Essa foi só mais uma.

    O filme não cai na fácil armadilha da comparação, colocando a indústria de games triple-A como vilões, e o pessoal do independente como os salvadores da cultura gamer. Pelo contrário, aqui o foco é total nos independentes e de seus valores por eles próprios, e não pela análise comparativa.

    O documentário tem entrevistas com Jonathan Blow, criador de Braid, Edmund McMillen e Tommy Refenes, criadores de Super Meat BoyPhil Fish, criador de FEZ. Além de algumas outras participações menores, todos relacionados a cena indie. Além de uma série de extras, como a entrevista com Alec Holowka, da Infinite Ammo, que foi a centelha inicial do filme. Algumas pequenas entrevistas com outros desenvolvedores. Além de adicionais sobre a própria produção do documentário, entre outras coisas. Todas usadas como material de divulgação entre o período de produção e financiamento do projeto.

    Com Jonathan Blow, o documentário explora a veia mais filosófica e artística dele próprio, tentando trazer à tona o que motiva, e o que é em sua essência o desenvolvimento de games, que não tem uma forte pressão de estúdios e a necessidade de vender milhões de cópias. Já com os outros participantes principais é mais explorada a motivação e a condição deles próprios, como desenvolvedores independentes.

    Os produtores tentam nos mostrar, que aquilo que está sendo produzido não é apenas um jogo, feito apenas para diversão pueril e nada mais. A obra produzida é um reflexo das pessoas nela envolvidas. É a forma que eles melhor têm pra se expressar. Dizer algo para o mundo, algo que representa eles próprios. O próprio Jonathan, em dado momento fala o seguinte (em tradução livre):

    Parte de tudo isso, é sobre não ser profissional. Muita gente vem pros jogos indies, tentando ser uma grande empresa. E o que essas empresas fazem, é criar produtos muito polidos, que atendem ao maior número de pessoas possível. Removendo todas as imperfeições possíveis. Se há um canto afiado, você confere se esse canto não vai ferir ninguém, ninguém irá se machucar com o seu produto. Criar esses produtos, polidos e comerciais é o oposto de se criar algo pessoal. O que é pessoal tem falhas, vulnerabilidades. Se você não vê a vulnerabilidade de alguém, você provavelmente não conhece essa pessoa o suficiente, ou de uma maneira verdadeiramente pessoal. É a mesma coisa com o Game Design, em que fazê-lo, é pegar minhas próprias falhas e vulnebilidades mais profundas, colocá-las no jogo, e ver o que acontece.

    Além disso,  o documentário investe uma carga bastante dramática, sobre o que tudo aquilo representa pra vida desses desenvolvedores e também para aqueles que estão no seu entorno. O que significa aquela realização, e tudo que foi deixado de lado na busca por esse sonho.

    Um outro ponto muito interessante, é que o documentário acerta em cheio com as escolhas daqueles que serão entrevistados e acompanhados no desenvolvimento, diria até que foi uma jogada de sorte, já que as filmagens começaram antes do lançamento dos jogos em questão. E o contraponto foi excelente, ao pegar o Team Meat (Super Meat Boy), um sucesso estrondoso de crítica e vendas, e FEZ, um jogo que passou quase 5 anos em desenvolvimento, prometia ser um dos maiores, mas que acabou perdendo muito da força, quase por um abandono da base de fãs que havia conseguido, que desistiram da espera.

    Enfim, Indie Game: The Movie, deve ser assistido, gostando você ou não de jogos de videogame. Porque além de sua ótima construção, também defende essa forma de expressão artística que muitos ainda teimam em desqualificar, considerando apenas como uma forma menor de entretenimento, muito porque não consegue enxergar o que está por trás do “apertar botões”, e entender o significado, o objetivo, que o game designer quis passar com aquela experiência.
  • Crítica | A Vida em Um Dia

    Crítica | A Vida em Um Dia

    A Vida em Um Dia

    Você consegue imaginar um filme feito com cerca de 80.000 clipes de vídeo e mais de 4.500 horas de material fornecido por milhares de pessoas do mundo inteiro? Acredito que é um pouco difícil para qualquer um imaginar e conceber isso, mas A vida em um dia (Life In A Day) está aí em toda sua grandiosidade para mostrar que a ideia não só é possível como também é preciosa.

    Produzido da parceria entre a Scott Free UK (do aclamado diretor Ridley Scott) e o YouTube, o filme conta o que estava se passando ao redor do mundo no dia 24 de julho de 2010 através dos olhos de pessoas ordinárias. Adentramos o íntimo da vida pessoal de pessoas que talvez jamais venhamos a conhecer, mas que nem por isso deixamos de ter um sentimento de empatia por elas.

    O filme é belo e inspirador. As mais diversas cenas são apresentadas, desde a hora em que todos estão se levantando para mais um novo dia até o momento que a noite cai e as pessoas se despedem dele. Diversas culturas e costumes são reunidos mostrando as mais diversas formas de existir enquanto ser humano neste planeta. Somos todos pessoas diferentes e com pensamentos diferentes, porém unidos pela humanidade.

    O diretor brinca em diversos momentos do filme fazendo perguntas como “O que você ama?” ou “Do que você tem medo?” e o mundo responde em mais sequências de cenas simples, porém intensas. Intensidade essa provocada pela sensação de que existe um mundo gigantesco lá fora muito maior do que aquilo que conhecemos. Um dos personagens mais marcantes do filme é um ciclista coreano, o qual já inicia dizendo que não importa saber se é do norte ou do sul, que está viajando o mundo descobrindo novas culturas e engrandecendo a si mesmo enquanto pessoa.

    A vida em um dia é uma epifania de que ninguém nesse mundo está sozinho e nenhuma vida que nele está presente é dispensável. Através dos fatos mais comuns e simples do dia a dia de várias pessoas do mundo atingiu-se a grandiosidade. Muitas vezes nada de especial precisa acontecer para fazer com que um determinado dia valha a pena. Viver é enxergar a beleza nas pequenas coisas e nos pequenos momentos. É basicamente isso o que A vida em um dia nos mostra: a vida em sua plenitude.

    Texto de autoria de Pedro Lobato.

  • Crítica | Até Que a Luz Nos Leve

    Crítica | Até Que a Luz Nos Leve

    Até Que a Luz Nos Leve

    Incêndio de igrejas. Violência. Satanismo. Essas são apenas algumas das figuras negativas que são associadas a um gênero peculiar de música: o Black Metal. Trata-se de uma vertente do rock extremo que começou a mostrar suas caras a partir dos anos 80 e desde então gerou várias polêmicas ao longo dos anos. Até Que a Luz Nos Leve (Until The Light Takes Us– 2008) nos é trazido pelos diretores Aaron Aites e Audrey Ewell para, em tom de documentário, apresentar um pouco da realidade da cena deste gênero a partir da visão de músicos que fizeram parte da gênese do mesmo.

    Ao longo do filme, duas são as principais figuras que nos acompanham para apresentar as motivações, a história, as razões do que viria a ser a ideologia propagada pelo black metal norueguês: Gylve “Fenriz” Nagell (Darkthrone) e Varg “Count Grishnackh” Vikernes (Burzum).

    O cenário gélido da Noruega, país em que os precursores desse movimento foram criados, ilustra bem a forma de expressão fria e crua do estilo. Marcantes e envolventes são os momentos em que Fenriz caminha pela floresta silenciosamente, expressando subjetivamente a sua forma de fazer arte. Varg, por outro lado, é entrevistado na cadeia em que está preso. As versões dos fatos que fizeram surgir o movimento vão sendo apresentadas de maneira sincera e esclarecedora, justificando lucidamente os propósitos do estilo que foi criado.

    O black metal surge como forma de protesto. Uma força obscura que busca a autonomia cultural, a liberdade de expressão e de pensamento. Seus adeptos buscam reivindicar laços históricos e culturais negando o conformismo ideológico trazido pela globalização.

    Para atingir essa reivindicação, muitos deles praticaram assassinatos e queimaram igrejas. Varg foi o exemplo mais claro e famoso dos que foram acusados por tais crimes. Seu caso repercutiu na mídia quando, em 1993, assassinou Euronymous, seu colega e integrante da banda Mayhem. Ele alegou autodefesa, mas foi também condenado pelo incêndio de igrejas. A partir desse ponto, a imagem do black metal começou a ser rechaçada pela mídia.

    “Estava em todos os jornais e é aí que nós teríamos algo com o que nos preocupar”, diz Fenriz. “Cena Satânica” foi a divulgação descontrolada por parta da mídia, mesmo não tendo nenhuma relação com tal ideologia. O modo como o movimento foi dispersado fez com que tomasse um rumo completamente diferente do que seus “fundadores” queriam. A filosofia do círculo foi deixada de lado e novos e desvirtuados valores, foram criados. Uma nova figura fantasiosa havia surgido e assim se alastrou. Uma “marca” foi criada.

    Fica em extrema evidência que, no interior da mente desses músicos, o black metal não se trata apenas de um estilo musical, mas de uma filosofia. Não se trata de ganhar apenas dinheiro com álbuns e produtos, nem de fama ou reconhecimento. Trata-se de liberdade.

    Das palavras do próprio Varg: “Eu prefiro morrer lutando pelo que acredito a viver por qualquer outra causa.”

    Até Que a Luz Nos Leve é um documentário poderoso e muito interessante para todas as pessoas que são fãs dos diferentes gêneros do rock, e até mesmo para os curiosos que procuram entender fenômenos artísticos e culturais. Obscuro e intenso são duas palavras que ilustram bem a profundidade da arte proposta pelo black metal.

    Texto de autoria de Pedro Lobato.