007: Marcado Para a Morte poderia ter sido o início de uma era pródiga na adaptação dos livros de James Bond de Ian Fleming se não tivesse sido encerrada tão precocemente. O início do filme de John Glen abre com uma ação de treinamento envolvendo três agentes 00 comandados por M (Robert Brown), e o personagem de Timothhy Dalton não demora a aparecer frustrando em parte o plano dos vilões que queriam matar todos os agentes, mas não sem deixar perdas, como a dos espiões 002 e 004. O longa já demonstra a gravidade que será sua tônica já nesse início.
O clima da obra lembra os futuros longas de Martin Campbell — 007 Contra Goldeneye e 007: Cassino Royale — no sentido de perverter a fórmula e estabelecer um estilo diferente e renovado, ainda que use bastante os chavões do personagem cinematográfico, há um apego maior ao 007 de Fleming, até por preocupação do próprio Dalton.
A trama é bem simples, quase simplória, e envolve a proteção do agente 007 a um desertor da KGB. O drama possui as mesmas questões banais e maniqueístas do que era comum na cultura pop da época ao lidar com a Guerra Fria. Ainda se acrescenta vários momentos com elementos árabes, como os Mujahidin, descrito por Bond como a resistência afegã — um grupo de guerrilheiros afegãos contrários à intervenção russa.
Essa versão de Bond soa mais violenta que os filmes anteriores, imitando os heróis de ação que faziam sucesso na década de 1980, além de referenciar ao personagem literário original, que era mais frio do que a versão de Roger Moore. Essa talvez seja a encarnação mais parecida com a recente de Daniel Craig. Outro ponto importante diz respeito aos vilões, que deixaram de ser meros cientistas loucos e irreais.
As lutas aqui são bem mais agressivas que nas produções anteriores da franquia. Bond causa queimaduras nos inimigos, os fere com água fervendo em uma cena de ação dentro de uma cozinha, espanca sem dó capangas, causa explosões. A ação mais direta e franca e é o diferencial principal entre essa fase e a anterior.
O agente americano Felix Leiter retorna. O personagem estava fora desde 007: Viva e Deixe Morrer e é basicamente introduzido para que o público lembre dele antes da próxima aventura onde ele seria importante. No elenco outro destaque é que Moneypenny finalmente trocada, saindo Lois Maxwell e entrando Caroline Bliss. Curioso como não há nenhuma necessidade de explicar essa mudança, aparentemente o espectador era mais acostumado com isso.
007: Marcado Para a Morte tem alguns elementos bem diferentes do restante da saga, como pouco flerte entre as mulheres e o espião, fruto obviamente da recém-descoberta do vírus HIV. Possui um final cínico, e dentro do escopo de filmes da franquia acaba sendo um dos mais subestimados e injustiçados mesmo entre os fãs.
007 Contra GoldenEye é o primeiro filme de uma nova era do personagem — agora interpretado por Pierce Brosnan —, rompendo com o estilo anteriormente estabelecido por Timothy Dalton e inaugurando uma versão mais leve, mas também repleta de ação. A obra de Martin Cambpbell é marcante não só pela troca de ator no papel do agente secreto, mas também pela abordagem pós Guerra Fria que ainda tem de lidar com essas questões novas.
Na trama, o agente tem que impedir que o controle do poderoso satélite GoldenEye caia nas mãos dos inimigos britânicos, pois consegue causar pane em qualquer equipamento eletrônico do mundo. Os primeiros momentos do filme remontam ao conflito ocidental contra os soviéticos em uma base russa. A ação entre o protagonista e seu amigo Alec Trevelyan, o 006 vivido por Sean Bean, estabelece que a obra terá muitos momentos de ação com sequências viscerais que afastam a abordagem debochada da fase de Roger Moore, ainda que a personalidade do Bond de Brosnan tenha algumas similaridades com Moore.
Essa versão rompe com quase tudo que foi estabelecido anteriormente. Desde a posição do chefe do MI-6, M agora é interpretada por Judi Dench, a Moneypenny vivida por Samantha Bond, restando apenas Desmond Llewelyn como Q, já bem veterano e em vias de se aposentar. Brosnan foi cogitado para substituir Moore após ter feito a série Remington Steele, mas teve que aguardar uma fase com Dalton à frente do personagem. Isso de certa forma foi uma boa escolha, pois ele adquiriu experiência com filmes de ação e amadureceu sua versão de herói de ação.
Visualmente há uma grande diferença para os outros filmes, aqui o uso de efeitos especiais mais caros começa a ser utilizado, e marcas antigas como o caráter galanteador do personagem retornam, além de um claro cinismo por parte dos personagens periféricos. Se a Guerra Fria era repleta de maniqueísmos, aqui temos um roteiro que transita por lugares não tão comuns ao personagem, principalmente por conta do personagem de Bean que retorna nove anos após sua “morte”, como um anti-herói vingativo que usa a máscara do vilão e pretende discutir a ética do sistema.
Os outros vilões são bastante peculiares e complicados. Por mais que haja semelhanças de Trevelyan com outros bons personagens como o Raoul Silva, de Javier Bardem, em 007: Operação Skyfall, a motivação é pouco desenvolvida. Outra personagem “estranha” é Xenia Onatopp, de Famke Janssen, que apresenta um estereótipo complicado ao agir como uma ninfomaníaca e sociopata. Se a intenção era se distanciar do espectro do fantasma da Guerra Fria, não houve sucesso, pois se iguala a mulher russa a uma louca, naturalmente perversa e pervertida, um arquétipo xenófobo e tolo.
Do pano de fundo, há momentos curiosos como 007 agindo sozinho boa parte do tempo, evitando instalações do MI-6, simulando uma espécie de início de carreira que seria retomada futuramente em 007: Cassino Royale. Os cenários também diferiam das fases Dalton e Moore, até mesmo o carro muda, saindo o famoso Aston Martin pela BMW Z3, obviamente com diversas melhorias, ainda que sub-utilizados.
O filme perde fôlego ao se aproximar do final e a morte do vilão é baseada no clichê de queda, semelhante ao que aconteceu em Duro de Matar e Batman, fato que reforça a ideia de que James Bond geralmente retrata as manias e tendências culturais de sua época.
007 Contra GoldenEye é um filme conhecido também por elementos externos ao cinema, especialmente por conta do jogo de tiro em primeira pessoa do console Nintendo 64, que ajudou a revitalizar a marca. Um bom início para Brosnan, que apresentou para o mundo uma versão sedutora do herói e trouxe de volta a Bondmania para uma nova era, ainda que tenha problemas de concepção severos e uma dificuldade de abandonar a exploração dos soviéticos como vilões, mesmo pós queda do Muro de Berlim e dissolução da União Soviética, e esse apego se arrastaria por quase toda a fase do novo intérprete.
007 Contra Octopussy, filme de John Glen e o penúltimo de Roger Moore como James Bond. A trama se inicia com um agente do MI-6, de patente 00, morto diante das câmeras, segurando um Ovo Fabergé falso, e recai sobre o agente secreto a investigação desse estranho caso.
Claramente, Moore está cansado, já não está tão disposto quanto nos filmes anteriores. Se em 007: Somente Para os Seus Olhos ele já estava bem envelhecido, a situação, como era de se esperar, piora bastante no filme seguinte. Se percebe facilmente rugas e marcas de expressão em sua expressão. A Octopussy, do título, é filha do Major Dexter Smythe um rival de Bond assassinado por ele. Mesmo com a intenção de vingança, a personagem de Maud Adams tem que se unir com o agente para enfrentar os planos megalomaníacos de Kamal Khan, personagem do icônico (e aqui bastante caricato) ator francês Louis Jordan, e de mais um conjunto de estereótipos árabes bem complicados, mas ainda assim, icônicos, como era comum na exploração dos temas de Ian Fleming, criador do agente secreto.
O longa, apesar de possuir o nome de um livro de Fleming, quase não tem elementos do texto, sendo o personagem Smythe um dos poucos momentos citados na obra original. Além disso, esta é a primeira aventura com Robert Brown oficialmente como M, além disso, a Moneypenny de Lois Maxwell apresenta uma nova secretária do MI-6, Penelope Smallbone (Michaela Clavell), que curiosamente, não retornaria em 007 Na Mira dos Assassinatos. Desde Somente Para Seus Olhos os produtores se preparavam para se despedir do intérprete, e para isso, ensaiavam inserir um novo elenco de coadjuvantes para o futuro.
Esse, aliás foi o filme que competiu nos cinemas contra 007: Nunca Mais Outra Vez, o famigerado filme de Irvin Kershner que recontava a história de 007 Contra a Chantagem Atômica. Obviamente, a recepção de público e crítica foi mais amistosa com o filme Glen, embora fosse difícil de comparar as produções, visto que o tom e a trama não possuem nenhuma similaridade.
O filme acerta por não se levar a sério. O ápice é uma cena onde se chega ao cúmulo de colocar um flautista entoando a música tema do agente para encantar uma serpente. Outro ponto digno de nota é a sala dos generais soviéticos, que lembra uma variação mais escurecida da sala de guerra de Dr. Fantástico de Stanley Kubrick. No entanto, o pastiche de Cuba, presente no início do filme quando 007 entra em cena é demasiado ridículo, o que salva essa sequência é a cena de Moore pilotando um avião em um pequeno hangar, em mais um momento puramente cômico do longa-metragem.
007 Contra Octopussy é sem dúvida um dos filmes que mais apela para a fórmula humorística da fase Moore, e na maior parte do tempo, esse aspecto funciona, mesmo com o desfecho conveniente e forçado. O que realmente depõe contra o filme é a clara indisposição do protagonista, ainda que essa não seria a última incursão do ator no papel.
Roger Moore marcou a memória da cultura pop como o James Bond com mais aparições em filmes, sete no total, e certamente, 007: O Espião Que me Amava é o mais elogiado de sua era. Décimo filme da franquia, se localiza no cenário político da Guerra Fria, começando com o sumiço do submarino russo chamado Potemkin, fato que faz Bond ter contato com a agente XXX, Anya Amasova (Bárbara Bach). Dos roteiros protagonizados por Moore, esse é que tem o cunho político mais evidenciado.
Moore está bem à vontade no papel. O intérprete não é conhecido por ter um grande talento dramático, mas aqui transborda carisma e charme. Trejeitos e olhares que expõe se tornaram características básicas da personagem, influenciando até no modo de agir de outras versões. É curioso como mesmo sendo bem diferente de Sean Connery, sua atuação ainda remete diretamente ao comportamento comum do agente. O olhar direto para a câmera (e consequentemente para o público) eram tão marcantes e equivalentes à postura altiva de Connery, enquanto acendia um isqueiro com um cigarro pendurado na boca, facetas de um homem educado, fino e que sabe seu lugar nesse mundo.
O roteiro de Christopher Wood guarda muitas semelhanças com o visto em Moscou Contra 007, não só pelas semelhanças entre Amasova e Tatiana Romanova, a bondgirl que co-protagoniza o filme dos anos sessenta, mas também pela cooperação entre agentes britânicos e soviéticos, rimas visuais e até por uma longa sequência em um trem que percorre a Europa. A distinção mais visível entre as obras é o uso mais livre dos gadgets de Q (Desmond Llewelyn), como relógios que recebem mensagens em plena década de 1970, mas o restante da atmosfera é bem semelhante, claro, sem perder a identidade própria desta aventura.
Esse é o filme que ficou famoso pelo Lotus Sprit, carro anfíbio charmosíssimo que ajudaram a fazer a fama de Moore como o Bond mais fantasioso e fantástico. O diretor Lewis Gilbert brinca com vários clichês da marca, como lutas na neve, vilões deformados, a exemplo de Jaws/Dentes de Aço feito por Richard Kiel. Esses aspectos ajudam a tirar um pouco a seriedade do filme, mas o equilíbrio entre momentos mais grotescos com os sóbrios são bem encaixados, resultando no mais exitoso da franquia nesse quesito.
Mesmo o cenário completamente louco de laboratório submarino do vilão é legal. O Karl Stromberg de Curd Jürgens não parece tão ameaçador, mas cabe bem ao estilo de aventura escapista que a adaptação de Ian Fleming apresenta. 007: O Espião que me Amava possui alguns problemas que certamente não seriam tão facilmente ignorados, sobretudo com sexismo, mas considerando sua época e o fato dos filmes de 007 replicarem sempre a cultura vigente há de se relevar boa parte dos seus pecados, já que está certamente está no hall das melhores aventuras do personagem, atendendo as expectativas de bons combates, romance e, claro, ações de investigação, em uma época onde o auge do escapismo residia exatamente nesse tipo de produção.
Em 007: Os Diamantes São Eternos a demanda pelo retorno de Sean Connery foi finalmente atendida, mas sem desconsiderar os momentos urgentes da última aventura de James Bond, em 007: A Serviço Secreto de Sua Majestade. O início da trama mostra o personagem em uma jornada de vingança violenta, indo atrás dos homens da Spectre em busca da vingança pela morte de sua amada esposa.
O curioso aqui é o tom desse início, bastante diferente do restante da aventura, funcionando como um prólogo. Resolve as questões pendentes para enfim apresentar uma nova trama, a última envolvendo a super organização Spectre. Connery, volta bem envelhecido, por mais que entre esse e Com 007 Só Se Vive Duas Vezes tenha se passado apenas quatro anos, o tempo parece pesar. A maquiagem não disfarça as marcas de expressões e sinais da idade, e até a peruca com tons grisalhos denuncia que Bond está velho demais para esse tipo de ação.
Essa obra também marca um tom mais humorístico nas ações de 007. A dupla de vilões secundários também colabora para essa sensação, Mr. Wint (Bruce Glover) e Mr. Kidd (Putter Smith) são caricatos e, claramente, um casal gay. Para além da condição homofóbica com que são tratados, possuem visual bastante esquisito, acompanhado de um comportamento obsessivo e compulsivo. Colocar no papel de vilania pessoas que fogem da normalidade do herói branco heteronormativo era uma das marcas mais tortas da franquia, e com a saída de Connery isso pioraria, já que era ainda mais comum apelar para isso na fase mais cômica protagonizada por Roger Moore.
Até existe alguma coragem no filme ao colocar a Moneypenny de Lois Maxwell como agente de campo, algo inédito e que seria referenciado por Sam Mendes em 007: Operação Skyfall, mas geralmente, a trama gira em torno dos chavões de 007. A versão de Blofeld feita por Charles Gray por sua vez é menos empolgante que a de Donaldo Pleasence ou Ted Savalas, a máxima de colocar sempre um novo intérprete para fazer o vilão atingiu aqui seu desgaste.
Além do começo truncado, o desenrolar dos fatos soa estranho. Guy Hamilton já havia feito 007 Contra Goldfinger, filme menos pretensioso, mas bastante divertido dessa fase, entre outros aspectos por ser repleto de coadjuvantes carismáticos. Isso passa longe de acontecer em 007: Os Diamantes São Eternos, pois é arrastado e pouco dinâmico, com reviravoltas tolas e um protagonista indisposto e preguiçoso, fato que fazia jus a procura dos diretores por uma nova encarnação do agente de Ian Fleming.
Durante o decorrer da década de 1980 várias obras infames ganharam projeção e publicidade em meio ao público médio, e sem dúvida, 007: Nunca Mais Outra Vez se destacou por fazer parte desse cenário. O filme que traria Sean Connery para seu papel mais famoso tem trama muito semelhante a 007 Contra a Chantagem Atômica e é fruto de uma briga judicial entre os escritores desse roteiro. Na trama, Bond recebe uma convocação para recuperar bombas nucleares roubadas pela organização Spectre, tradicionalmente presente nos livros de Ian Fleming.
Para além da exibição, a obra é mais conhecido pela polêmica envolvendo os direitos autorais. Kevin McClory produtor e co-autor do roteiro do filme de 1965 ganhou ação na justiça dos Estados Unidos e pôde fazer seu próprio filme com o personagem desde que este fosse produzido após 1975. Nas discussões a respeito disso Connery sugeriu que o personagem estivesse de fato mais velho e maduro, mas a ideia foi descartada e fingiriam que ele era o mesmo personagem de sempre, mesmo com o intérprete já vivendo personagens mais veteranos, a exemplo de Robin e Marian, O Homem Que Queria Ser Rei e tantos outros.
O filme não possui boa parte das marcas do personagem, como os créditos iniciais, a trilha musical, etc. Sobraram os personagens M, Moneypenny, Q e, claro, a organização Spectre. Irvin Kershner, diretor de O Império Contra-Ataca foi responsável por conduzir Nunca Mais Outra Vez. O filme tem como bondgirl principal a belíssima Kim Basinger, que tem seu corpo explorado de modo mais agressivo do que era comum aos filmes do espião britânico. Max Von Sidow como Blofeld, tem em sua ação uma abordagem semelhante aos filmes de brucutus, com violência mais franca e estética semelhante aos filmes de soldado. Em alguns pontos, as brigas lembram o visto em Rambo: Programado Para Matar.
O filme é repleto de momentos bobos, como quando o herói derrota um brutamontes após jogar um líquido estranho, que parecia ser ácido, para depois descobrirmos se tratar da urina do espião. O filme ainda chega ao cúmulo de ter Rowan Atkinson, intérprete do clássico personagem Mister Bean, que anos mais tarde faria Johnny English, uma paródia aos clichês de 007.
Reza a lenda que McClory desejava que esse fosse apenas um de uma nova série de filmes do agente britânico, mas essa intenção não se materializou. Durante os anos 90, sua intenção era refilmar essa mesma história com o título Warhead 2000, e chamaria Timothy Dalton para fazer Bond, porém a justiça americana freou esse projeto. A julgar pela qualidade deste, foi melhor assim. Para Connery o filme ainda causou sensações mistas. Ao passo que ele recebeu o maior cachê pago a um ator britânico até a 1983, ele também conseguiu quebrar seu pulso, enquanto ensaiava uma coreografia de luta com o instrutor Steven Seagal.
Nunca Mais Outra Vez desperdiça o talento de Klaus Maria Brandauer, ator austríaco acostumado a papéis mais dramáticos e que aqui parece um bobo alegre. Além disso, o roteiro é fraco, as atuações são genéricas, a música tema é pouco marcante, e nem ao menos os cenários remetem às histórias de Fleming.
Com 007 Só se Vive Duas Vezes é o quinto filme da franquia do espião inglês. A história aborda a investigação sobre o desaparecimento de duas naves, uma americana e outra soviética, e a missão do agente vivido por Sean Connery em tentar descobrir o responsável pelo plano que pode causar conflito entre as duas maiores potências mundiais da época.
O tema do longa reflete muito bem o período envolvendo a corrida espacial entre as duas potências, além de referenciar Jornada nas Estrelas: A Série Clássica, bastante popular à época e estava em sua segunda temporada. Além disso, a velha fórmula das aventuras de James Bond se faz presente, gadgets criativos, moças bonitas, carros e estilo de vida luxuosos. Esse é o primeiro filme de Lewis Gilbert como diretor na franquia – ele retornaria em 007: O Espião Que me Amava e 007 Contra o Foguete da Morte, com Roger Moore no papel central. A questão mais marcante e positiva é como o super-agente é preparado, pois, ainda que em uma terra estrangeira e distante, ele parece ser íntimo de outras culturas e idiomas.
Ao mudar de cenário a obra exibe suas fragilidades. Se apela demais para clichês locais. Connery se disfarça de japonês, incluindo não só um penteado com uma peruca muito falsa que o faz parecer um noviço franciscano, como na maquiagem forte que faz com que seus olhos fiquem puxados. Isso já era ofensivo na época e, obviamente, envelheceu bastante mal, para piorar ainda se mostra uma academia ninja nada discreta, que banaliza as práticas do ninjitsu e das artes marciais, desde o caratê até a esgrima samurai. Essa falta de sutileza causa um humor involuntário, onde claramente não era a intenção.
Esse é mais um filme de Bond que aborda a organização da Spectre. O clássico vilão Blofeld é interpretado por Donald Pleasence, dos clássicos de John Carpenter (Halloween: A Noite do Terror, Príncipe das Trevas e Fuga de Nova York). No entanto, sua atuação é discreta e confere ao personagem um ar de mistério.
A música You Only Live Twice, cantada por Nancy Sinatra e composta por John Barry, resgata bem a atmosfera dos filmes de aventura dos anos sessenta, sempre frenéticos e repletos de uma violência irreal, bem no estilo que se espera de um Bond clássico. Com 007 Só se Vive Duas Vezes é mais um filme que se vale dos chavões do personagem de Ian Fleming e marcaria a despedida, ainda que breve, de seu intérprete.
Bem-vindos a bordo. Flávio Vieira (@flaviopvieira | @flaviopvieira) e Mario Abbade (@marioabbade) se reúnem para comentar sobre o encerramento da era Daniel Craig como James Bond nos cinemas. Quais foram os pontos altos e baixos, as polêmicas e o futuro da franquia.
Duração: 74 min.
Edição: Flávio Vieira Trilha Sonora: Flávio Vieira
Arte do Banner: Bruno Gaspar
Após um grande início adaptando uma obra de Ian Fleming com Cassino Royale; uma sequência sem roteiro devido às greves de roteiristas emQuantum of Solace; uma queda e ascensão dividida entre tradição e o moderno de Operação Skyfall e a retomada da estrutura clássica em 007 Contra Spectre, o longevo personagem James Bond, personificado pela quinta e última vez por Daniel Craig, tem sua missão derradeira em 007: Sem Tempo Para Morrer.
Finalizando a passagem do britânico pelo personagem, a produção do vigésimo quinto filme de James Bond foi carregada com uma maior expectativa do que suas predecessoras. O último filme com Craig, marco numérico sempre destacado pela mídia, foi marcado por entraves internos e externos à sua produção.
A princípio, Danny Boyle foi escalado como diretor, mas se justificando com o batido “divergências criativas” abandonou a produção e, em seu lugar, Cary Joji Fukunaga assumiu a cadeira, tornando-se o primeiro americano a dirigir uma produção Bond. Com a mudança, o início das filmagens foi reagendado para abril de 2019 e a estreia programada para abril de 2020. Naturalmente, a necessidade do distanciamento social deixou o lançamento em espera até setembro desse ano quando grande parte do mundo possui uma estrutura mínima para, munidos de vacinas e máscaras, estar no conforto do cinema sem correr risco de vida. O risco, aliás, fica por conta do próprio personagem central.
O início da nova trama se situa após os acontecimentos de Spectre e resume os elementos que definiram o novo Bond. Aposentado em um lugar idílico, ao lado de Madeleine Swann (Léa Seydoux), dá vazão aos laços sentimentais até o inevitável momento em que o passado retorna, explosivo. A grande cena de ação inicial é intensa, extremamente física, bem equilibrada entre a coreografia e um realismo possível, mantendo vigente a estética fundamentada por A Identidade Bourne e reverenciada pela versão de Craig. A cena intensa demonstra algo que o público da primeira temporada de True Detective já sabe: Fukunaga constrói cenas de ação com habilidade. A cena inicial injeta adrenalina antes da canção que abre o longa, No Time To Die de Billie Eilish.
Após os créditos de abertura, a trama salta cinco anos no futuro. Como desenhado desde a produção anterior, é a tradição que rege essa aventura final. Se no enredo anterior se descobre que as intrigas foram orquestradas pelo SPECTRE, aqui outro elemento tão poderoso quanto surge em cena, contrabalanceando as forças, mas com objetivos semelhantes: a vingança e a destruição mundial, características comuns da maioria dos vilões megalomaníacos da franquia.
Se em composições anteriores Bond pareceu um homem sem amarras, o personagem da geração 2000, composto de forma seriada em cinco produções, é formado com maior coesão cronológica e emocional. As perdas são lembradas com sentimento e dor e trazem a evidente constatação de que é necessário desapegar do passado para seguir, embora o passado profissional e as missões anteriores nunca fiquem, de fato, no passado. Entre o equilíbrio pessoal e emocional, e a frieza das missões cumpridas se destaque um personagem central que além da camada de espionagem, dos carros luxuosos, do esnobismo britânico e do diálogo feito de punhos, uma mensagem boba e simples de que os brutos também amam, sim.
Em entrevista a GQ em 2020, o ator afirmou que elevou o nível do personagem para outros. Sem dúvida, o sucesso da franquia se deve a sua capacidade de manter suas estruturas básicas, mas, na medida do possível, se adaptar a novos formatos narrativos. Sob esse aspecto, talvez a era Craig tenha sido a modificação mais inventiva de Bond. Trouxe não apenas novas camadas trágicas aos personagens como também a possibilidade de quebrar a forma física do agente, pois, lembrem-se, o ator foi criticado no início por seu físico e por ser loiro demais. Foram modificações como essas que permitiram que Lashana Lynch surgisse em cena como a primeira 007.
Sem Tempo Para Morrer é um falso título porque em um filme cuja missão é ser um desfecho a uma versão de Bond, tudo é uma celebração final. Em tudo há certo tom de morte e despedida como amigos que se desencontram, arqui-inimigos que se vão e, querendo ou não, não há nada de novo nessa narrativa. Mas, sim, uma conclusão natural de uma história iniciada em 2005 e que encerra seus enredos e o legado de Craig no papel.
O ator e sua modéstia têm razão. O marco deixado em sua passagem será um desafio à execução do próximo Bond. Mas também abriu espaço para que novas facetas sejam exploradas, sem medo de reinvenções e sem o excesso de amarras da tradição. Como um personagem com maior aptidão para se reinventar, os produtores Michael G. Wilson e Barbara Broccoli devem ter algumas cartas na manga para o futuro dessa nova Bond.
O início de 007 Contra Golfinger apresenta o James Bond original, Sean Connery, lidando com uma ação “típica” de espiões (ao menos dos super espiões) ao sair de um submarino para plantar uma bomba. O espião britânico era um sujeito único, bem humorado, charmoso e elegante. Era capaz de sair ileso, ostentando paletó e gravata elegante mesmo após causar tumulto com explosivos.
Para além da estrondosa música de abertura, executada por Shirley Bassey, Goldfinger possui a maior parte das marcas da franquia: a violência extrema que Bond é obrigado a impor, a sedução de belas mulheres, uso de carros de luxo, a presença de Félix Leiter (Cec Linder), o machismo galopante do herói, vilões característicos, as péssimas cenas em chroma key e, claro, todo o garbo do interprete escocês. Uma estrutura que seria utilizada em filmes posteriores com marcas que acompanhariam outros Bond.
A produção é a primeira dirigida por Guy Hamilton que faria ainda outros três da franquia, além do icônico Remo: Desarmado e Perigoso. O diretor ficaria tão marcado pela grandes cenas de ação em sua filmografia que foi cotado para conduzir Superman: O Filme, e, posteriormente, o Batmande 1989. Sua direção se destaca emvcenas de perseguição em alta velocidade, sempre muito tensas, e pelas inúmeras trocas de tiro e pelas lutas entre mocinhos e bandidos. Hamilton é também responsável pelos melhores momentos dramáticos de Connery, embora neste papel o que mais se exija dele é uma face sedutora e charmosa, não necessariamente dramática.
A trama apresenta a tradição narrativa de Bond, com o vilão central, o criminoso magnata Goldfinger, tentando destruir uma reserva de ouro americana. O personagem entra em cena antes dos personagens icônicos parceiros de Bond como M, Q e Moneypenny. Sua representação é de um sujeito maligno, mas não necessariamente megalomaníaco com planos de dominação mundial. Seu conflito com Bond se resume ao incômodo de ver seus golpes atrapalhados, além de dar vazão a sua extrema competitividade no golfe e o carteado. Mas também possui traços exagerados como as mulheres pintadas de ouro devido a traição. Um escapismo fantasioso que destoa um pouco da abordagem sempre austera do espião de Ian Fleming. A partir disso, o grau de eventos fantásticos ocorreriam mais vezes em produções futuras.
Além do personagem-título, o capanga Odjjob, um havaiano halterofilista executado por Harold Sakata, se destaca. Principalmente devido a sua estranha arma: uma cartola com abas afiadas, capaz de decepar até mesmo estátuas de gesso. As filmagens do capanga com o herói foram tão intensas ao ponto de lesionar Connery nas cenas de luta. O bandido se tornou tão icônico que foi representado fora das delas como no clássico jogo Goldeneye de Nintendo 64, como personagem para utilizar via código.
Já a parte dos artefatos tecnológicos são bem mais tímidos do que produções recentes. Desmond Llewelyn apresenta para James um AstonMartin DB-5 modificado com radar e capacidade de mudar a placa de localidade e assento ejetor. O roteiro é cuidadosamente feito para dar vazão a cada uma dessas funções, não é exagerado como seriam nas fases menos comedidas.
A produção tem momentos bem engraçados, como a recorrência da piada do personagem principal estar sempre sendo desacordado, e outros de tensão, com direito a uma arma a laser que miram suas partes íntimas em um claro simbolismo a um ataque a sua virilidade, evento revisitado deem 007: Cassino Royale, quando o vilão chicoteia as partes do agente.
O final de 007 Contra Goldfinger embora seja um bocado estranho e confuso, cheio de reviravoltas, é charmoso, sabendo conduzir bem seus clichês. Resultando na adaptação mais acertada do diretor com o personagem, uma das narrativas mais icônicas baseada na literatura de Fleming.
Antes das leituras cinematográficas baseadas nos textos de Ian Fleming para o cinema, o episódio de Climax! apresentaria a primeira adaptação do famoso agente 007 para a televisão, com introdução de William Lundigan adentrando o tema principal de seu episódio: o jogo de carteado Bacará.
Por ser uma produção norte-americana, James Bond se chamaria Jimmy Bond. Enquanto o agente é interpretado por Barry Nelson como um cidadão americano, Clarence Letter (versão de Felix Leiter, vivido por Michael Pate) torna-se inglês. Extremamente fiel ao texto original, o episódio em preto e branco dirigido por William H. Brown Jr. se vale do repertório de seu realizador, produzindo um suspense bem registrado para sua época, capaz de chamar a atenção do espectador mesmo sem todo o glamour que seria marca registrada das produções de Albert R. Broccoli.
A atenção sexual de Bond não é tão desperta nesta versão, já que o personagem se interessa basicamente por Valerie Mathis (Linda Christian). O antagonista Le Chiffre é vivido pelo clássico ator Peter Lorre, que também havia executado o opositor na primeira versão do clássico de Alfred Hitchcock, O Homem Que Sabia Demais. Apesar de mais ameno, o personagem permanece muito cruel dentro dos parâmetros e ditames comuns ao modo de filmar da televisão dos anos 1950.
A construção do ideário de Bond já podia ser vista neste especial, ainda que em estágio embrionário e prototípico. Mesmo a tortura, que causou furor nos aficionados que assistiram ao reboot007 – Cassino Royale de Daniel Craig em 2006, é executada de modo agressivo, não deixando claro em tela qual foi o “membro” atingido pelo alicate do inimigo (apesar de que, pela posição da câmera, se pressuponha que o choque foi nos pés). Ainda assim, o retrato de uma sessão de tortura física e psicológica é explícito, em uma abordagem muito corajosa para a época.
O formato compreende semelhanças com um show de teatro dividido em atos, filmado a partir das atuações que ocorrem no ato da transmissão. Os momentos finais do episódio retratam uma reviravolta, longe de ser tão violenta quanto no texto original. As mortes são conceituadas em ambientes onde a câmera está ausente, respeitando-se a audiência que ficaria chocada com cenas de assassinato, a começar por ser um acinte a exposição irrestrita de armas em punho. O episódio de Casino Royale é um produto americano para americanos, mas é muito bem construído em volta de sua proposta, não ofendendo qualquer dos dizeres canônicos que seriam impostos em 1962 com O Satânico Dr. No.
O quarto filme da franquia James Bond, 007 Contra a Chantagem Atômica, teve a missão de ajudar a consolidar uma das maiores franquias da história do cinema em apenas três anos de diferença para o primeiro filme.
Após o agente Emilio Largo da criminosa associação Espectre roubar armas nucleares de um avião da OTAN e ameaçar detoná-las em cidades inglesas e americanas em troca de dinheiro, James Bond vai para as Bahamas com o objetivo de impedir a extorsão.
O roteiro sólido de Richard Maibaum e John Hopkins, baseado na história original de Jack Wittingham, segue a cartilha dos anteriores e mantém os principais elementos dos filmes da franquia que conquistou a legião de fãs, como a motivação dos antagonistas em destruir o mundo, a ambientação em locais paradisíacos cheios de ricos elegantes, os assassinatos e o eterno clima de conquista do protagonista em relação às diversas Bond Girls.
O que muda na trama do roteiro é a ameaça. Pela primeira vez na franquia a detonação de uma bomba atômica é o grande problema a ser resolvido. O tema, em voga na época após a Crise dos Mísseis em Cuba em 1962, deixa o temor mais palpável, fazendo da trama mais realista, com um medo real do período.
As ações dos personagens são quase orgânicas, mas existem escorregadas dos roteiristas e forçações de barra para fazer a trama andar. Por exemplo, quando Emilio Largo vai entrar em seu barco no final do filme, ele escolhe ir por baixo d’água sem motivo aparente, o que se torna conveniente para que James Bond mate um dos seus seguranças e entre na embarcação.
Terence Young volta a franquia após dirigir os dois primeiros filmes. Ele soube usar de sua habilidade para narrar visualmente a história, em especial as cenas de ação e os romances entre o protagonista e as mulheres. Como diretor de atores, ele está no automático, o que não é mais que necessário para os filmes da franquia.
As atuações caricatas seguem a cartilha dos anteriores. Sean Connery é um bom 007 e Adolfo Celi um vilão memorável. Salta aos olhos as aparições, como Bond Girls, da francesa Claudine Auger interpretando Domino e a italiana Luciana Paluzzi sendo Fiona. E, ainda, as sempre ótimas aparições de quem não poderia faltar ao elenco da saga, Desmond Llewelyn como o chefe de tecnologia do MI-6 Q, Lois Maxuell como a secretária Moneypenny e Rik Van Nutter como o agente americano Felix Leiter.
A fotografia com tons naturalistas de Ted Moore, que trabalhou nos três filmes anteriores da saga, não consegue se sobressair, porém, faz seu papel em deixar 007 Contra a Chantagem Atômica uniforme. O grande destaque são as cenas embaixo d’água feitas pelo estúdio Ivan Tors, inclusive o belo clipe de abertura com a trilha sonora característica composta por John Barry e Don Black e cantada por Tom Jones é feito com cenas aquáticas.
A edição de Ernest Hosler dá ritmo ao filme e os 128 minutos não são sentidos por quem entende ser um filme de ação dos anos 60.
007 Contra a Chantagem Atômica vale a pena para quem gosta de acompanhar a franquia desde o começo, e consegue inserir um tema pertinente à época, deixando o filme mais interessante.
Documentário organizado por Stevan Riley, inicia-se com a atuação de Daniel Craig, já remetendo às primeiras linhas de Ian Fleming como novelista do romântico personagem que o tornaria famoso. Everything or Nothing investiga um pouco da intimidade do escritor, para remontar o ideal que o faria escrever sobre o agente secreto britânico. O autor sairia do front da Segunda Guerra traumatizado, indo enfim para a Jamaica para habitar sua casa de praia (chamada Goldeneye) fonte local dos contos e novelas sobre o espião, fantasiando sobre elementos comuns ao local em seus escritos, incluindo as barracudas e tubarões que habitavam os mares.
Da dor das perdas de seus amigos, viria a inspiração para aventuras que mesclavam o escapismo inocente e o medo do desconhecido presente na figura do soviético. Cassino Royale lançado e tachado como um livro que chocaria a população conservadora, especialmente pelo apetite do protagonista por mulheres e pela fácil entrega das mesmas. Esse e outros problemas fariam com que alguns produtores associados a Albert L. Broccoli achassem que James Bond não era um personagem talhado para o cinema, e sim para a televisão, isso depois da encenação de Cassino Royale de 1954. Tal fator coibiu o escritor de produzir novas aventuras, quase cerceando na raiz a origem das histórias que ficariam famosas no cinema.
Fundamental para que ocorresse a realização das adaptações foi Harry Saltzman, um sujeito cujo repertório envolvia o trabalho no circo, normalmente entretendo seu público através do colorido e espalhafatoso. Após conseguir os direitos dos livros de Fleming, organizou enfim a parceria com Broccoli e o consenso de ambos sobre a polêmica da persona de Connery como espião, já que ele era um desconhecido. Outros fatores colaboraram para tal identidade ser construída, como a personalidade de Terence Young, primeiro diretor da cinessérie.
A participação ativa de Maurice Binder foi fundamental para a abertura estilizada que se tornaria marca registrada do personagem, misturando elementos violentos com a sensualidade feminina dos textos canônicos de Fleming.
O documentário não teme em optar por um lado ao discutir a questão de Kevin McClory e Ian Fleming, primeiro ao diminuir a influência do primeiro nas ideias por trás de Thunderball, prosseguindo em atrelar à briga judicial o principal fator para o falecimento do criador de 007.
A gravidade está no reducionismo, já que o filme passa rápido demais por questões polêmicas, detalhando pouco a tomada de direitos de McClory, bem como a briga entre o cada vez mais famoso Connery e o produtor Saltzman, que resultaria na mudança de postura após Só Se Vive Duas Vezes. Apesar desses problemas, destaca-se a parte em que Lazemby confessa seus problemas de comportamento fora dos sets, além dos fatores que o fariam perder seu posto e a consequente fama e carreira que teria a partir daquilo, inclusive trazendo detalhes sobre sua postura de afronta, soando até bastante humilde ao falar sobre seu visual na premiere do filme, de barba e cabelos longos, diferente do estereótipo de seu personagem.
O filme funciona perfeitamente como tributo/homenagem, reunindo depoimentos de membros das produções e de tantos outros famosos aficionados, como Mike Myers, que declara seu amor pelo personagem através da paródia de Austin Powers. No entanto, o tempo curto da produção não permite um grande aproveitamento dos detalhes que envolvem uma franquia que já teve um jubileu, atingindo o raso em alguns pontos, especialmente em reafirmar a demonização de McCLory, anda tangenciando os direitos de Thunderball, que resultaria no filme Nunca Mais Outra Vez. No entanto, a briga entre Saltzman e Broccoli é somente citada ao passant, curiosamente gastando-se mais tempo até nas desavenças de Connery com os dois produtores, que o ajudaram a aceitar o papel no filme apócrifo.
Everything or Nothing soa como uma visão demasiada parcial, como um comercial publicitário, encomendado pelos atuais mandantes da franquia, que exibem a versão que lhes é conveniente. De positivo há a tentativa de justificar alguns dos equívocos dos filmes de Dalton como Bond, mas, ainda assim, sem se assumir.
Não há qualquer remorso por parte dos produtores em colocarem Pierce Brosnan em temas que tornam os resquícios da Guerra Fria como algo imbecil e parodial, tampouco há um assumir de culpa por abordar esses temas mais espinhosos. A convalescência de Cubby Broccoli seria responsável pela reaproximação dele com Sean, fator que talvez explique a boa abordagem que fazem do ator, o qual, ainda assim, não se permitiu sair de sua aposentadoria para participar das gravações do documentário.
Mesmo os comentários corretos em relação ao boicote preconceituoso a Daniel Craig soam oportunistas, como uma tentativa de trazer um virtuosismo para os atuais produtores, Barbara Broccoli e Michael G. Wilson, os mesmos que são incapazes de fazer uma autoanálise minimamente crítica em relação aos erros do passado. Para o fã do personagem 007, existem poucas informações inéditas, mas para um cinéfilo neófito Everything or Nothing funciona como bom artigo de curiosidade, mesmo considerando a quantidade absurda de fatos suprimidos.
É impossível seguir um padrão. Por mais que se busque o linear, até o mais fervoroso fã de Harry Potter, Star Wars ou Crepúsculo vai achar prós e contras nos episódios favoritos de cada um. É bom que se saiba que esses produtos, encapados como se fossem o mais nobre Cinema, são feitos para fãs e abertos a todo tipo de debate e discussões. Quando 007 – Um Novo Dia Para Morrer estreou, a internet ainda era um luxo, mas uma coisa já se podia afirmar: o filme é o Batman & Robin das aventuras de James Bond, e este parece ser um fato difícil de se contestar.
Logo na cena inicial, é impossível não rir com Bond surfando no litoral norte-coreano (?) vestido numa espécie de papel alumínio (??) com pranchas equipadas com armamento militar (???). É o tipo de comédia involuntária que, quanto mais se leva a sério, pior fica. Só faltou a MGM chamar o Joel Schumacher pra direção, bem antes do cara tentar se redimir com o mundo em dois bons episódios de House of Cards, em 2013. Boa tentativa, só que não.
Pierce Brosnam nunca foi um Bond cool, e uma edição ruim entre as cenas dramáticas para ajudar o ator, enfim, não ajuda muito. Brosnam tem essa expressão natural de “eu sei o que você tá pensando, bonitão”, e na mitologia do espião isso encaixa mais que perfeitamente, contanto, é claro, que o ator não ligue o modo-automático para tentar entender os mistérios de uma incógnita em forma de personagem. Bond, nos livros, é uma sombra, o X das questões onde é jogado para resolver, e tentar sobreviver. O filme de 2002 não consegue ser mais infantil e deselegante, com subtramas políticas profundas como pouco mais que um copo d’água; mero produto de exportação.
Na iminência de uma guerra entre as duas Coreias, a história tenta nos convencer que Bond sabe o que faz, quando é difícil de nos fazer acreditar na sua boa pontaria. Ao descobrir, por exemplo, da possível existência de um traidor, ou traidora, dentro da agência pra quem trabalha, a MI6, Bond prefere jogar esgrima e transar num cisne de gelo (o fogo é grande!) do que prestar serviços à embaixada britânica, afinal já virou rotina enfrentar os procurados pela Interpol. Por essas e por outras, Um Novo Dia Para Morrer (interminável) é o mais perto dos piores filmes de Jackie Chan e Os Pequenos Espiões que nosso agente já chegou; é a consolidação da falta de sorte de Sean Connery e Roger Moore, quando disseram-nos que já estavam velhos para acertar a mira. O mundo é um lugar frio, sim, mas o filme escolhe a pior maneira de demonstrar o que poucos ainda não sabem.
E que abertura cheia de faíscas, mulheres de gelo e escorpiões é essa? Nem Madonna e Halle Berry na causa, aliás, deixemos Berry fora disso; aluguel é caro. Mas quer saber o que é legal na vida? Os Vilões de Bond? Sim, a maioria, em especial o icônico Jaws, de 007-Contra o Foguete da Morte, mas no caso, bacana mesmo são dois carros (não tão legais assim porque não são Transformers) correndo no gelo e explodindo montanhas árticas com mísseis atômicos – com uma desculpa qualquer para a brincadeira acontecer. É no que o filme se molda, em torno de uma grande piada, cuja melhor cena de ação, vulgo caricatura, é a famosa sequência que Speed Racer em 2007 quis se inspirar e reproduzir, mas até essa referência os Wachoswki conseguiram estragar. Parabéns.
Promessas de Réveillon, piadas de português, alienação, cosplay da Madonna e cachorro. Outra coisa que também não falta nesse mundo é fã de James Bond, mas com um representante assim para o universo de espionagem criado por Ian Fleming, (“Parece que seu amigo acabou de vazar“, diz Bond a seu inimigo durante um acidente de avião), fica difícil afirmar que vida de fã é um mar de diamantes. Nem sempre.
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Assim que James Bond, o 007 malicioso e persuasivo interpretado por Sean Connery, assina a foto de Tatiana Romanova, sua lindíssima bondgirl no longa-metragem dirigido por Terence Young, 007 Contra Moscou tem início, adaptando a clássica história de Ian Fleming.
O ambiente de fundo é a Guerra Fria. O ápice da espionagem guerrilheira entre os Estados Unidos e a Rússia envolve desta vez, o Reino Unido e o MI-6, que corresponde a 007 investigar um programa de criptografia russo. Bond então parte para a Turquia, enquanto a inocente agente Romanova (Daniela Bianchi) é destinada a persuadir e colocar o espião em uma armadilha, que de fato estava armada desde o início da operação.
Seguindo a narrativa dos filmes anteriores e dos posteriores, o tradicional plot de espionagem é certeiro e contempla diversos meios para ser conduzido. Algumas sequências ilustram um filme noir, com perseguições e entraves nos diálogos, cooperando junto a ironias e um humor sarcástico, além da conhecida elegância inglesa.
O filme é bem dirigido. A fotografia é bela, exaltando a imponência e as cores do ambiente, principalmente em filmagens externas. O roteiro flui sem tanta naturalidade. Os diálogos são ótimos e muito bem escritos, mas algumas cenas não entregam o que o roteiro leva. Em alguns takes há falhas de comunicação, criando uma falsa perspectiva e gerando surpresas até mesmo aleatórias. Mesmo que isso não comprometa o filme como um todo, há momentos que me transmitiram uma impressão falsa do que estava por vir.
O ápice climático, as cenas de ação e os conflitos dos personagens são os alicerces. Conduzem o filme ao longo de quase duas horas. A química entre Connery e Bianchi é fantástica, fortificando a atriz como uma das melhores bondgirls da era do ator, e de todos. Vale o acréscimo para Robert Shaw, que interpreta o agente da SPECTRE, Red Grant. Seu jeito misterioso e imponente transporta a sensação de uma interessante vilania.
Moscou Contra 007 comprova o vislumbre, a realeza e a tradição dos filmes de espionagem. Sem forçar estereótipos, e até mesmo quebrá-los ao insinuar uma personagem russa como homossexual, é um filme bonito e, mesmo que aparente ser datado, agrada pela contextualização, sendo um dos melhores de toda a saga.
Criar um mito só não é mais difícil que mantê-lo. James Bond virou sinônimo de espião, e seu nome fidelizou o público com sua imagem, desde Sean Connery até Daniel Craig e suas várias faces ainda por vir. A personagem do agente mais secreto do mundo virou o mais amado e copiado de todos – incluindo a cinesérie de Spielberg, um tal de Indiana Jones que viria a aparecer nove anos após esta primeira aventura do Bond mais clássico e divertido de todos, na correria inicial de 1962 adaptada do livro Dr. No, de 1958. O escritor Ian Fleming jamais poderia prever o sucesso da sua versão mulherenga e (não tão) misteriosa de Sherlock Holmes, com o primeiro livro, Cassino Royale, levado as telas apenas em 2006. Por muito tempo, a saga foi a mais bem-sucedida do Cinema, mas já superada por Harry Potter e o universo Marvel.
Na trama, um cientista louco que quer dominar o mundo nos esclarece sobre a SPECTRE, uma organização de gênios que, em tese, controla o mundo por trás das cortinas. São tais persianas que Bond, no melhor estilo Bogart em À Beira do Abismo é obrigado a queimar, em ordem de desvendar planos terroristas em uma base ultra-secreta na Jamaica. Assim como no filme de Howard Hawks ou em Uma Aventura na Martinica, o mito Bond encarna com perfeição em SeanConnery, ainda tido por muito e por quem vos escreve como o melhor 007, não só pelo ator carregar aquele extinto charme da era de ouro de Hollywood, mas se para Pierce Brosnan e DanielCraig o espião deve ser gélido, direto e mecânico em suas ações, quase assexuado se não fosse as bond girls, para o pai de Indiana Jones tanto cérebro quanto coração mediam o bom uso d’um gatilho. São esses detalhes que fizeram-no mito ao longo de mais de 50 anos e 24 filmes.
Além de afirmar a mitologia bem apresentada neste primeiro filme, a produção mostra competência e, historicamente, o gênero ação deve (e muito) para esta obra e a outros como 007 Contra Goldfinger e MoscouContra 007, aprimorando uma abordagem, mise en-scène, identidades e uma ambientação tidas, hoje, em 2015, como parâmetro por uma indústria que não sabe olhar para o futuro sem beber do passado.
Quando o Bond mais Bogart de todos, bem como é descrito por Fleming nas páginas do livro homônimo, mata um dos soldados do perverso doutor em seu paraíso tropical para completar sua missão, sem provocar angustia na vítima ou derramar uma só gota de sangue, a primeira mocinha a acompanhá-lo mundo afora o indaga, assustada: “Por que fez isso?”, e Bond responde, “Porque precisava ser feito. Vamos!”, pronto! Está feita para sempre a mitologia e a ética de nosso espião em qualquer outra de suas missões; métodos e temas inesgotáveis, e bem revisados em Skyfall, de 2012, no provavelmente melhor filme da franquia (apesar de ser cedo para afirmar isso).
Mesmo sobre questões extra-filme, como racismo, machismo e políticas globais, o filme é sóbrio o bastante para manter sua elegante atmosfera, aquele charme tão citado que verte da tela, tão envolvente, e interpreta um livro sério demais num filme bem divertido, e que simplesmente não envelhece jamais.
Quatro anos após a queda de James Bond e uma audaciosa renovação da personagem, em sincronia com sua época e o estilo de ação formatado nestes anos, o agente britânico retorna às telas para sua 24 ª aventura, demonstrando força desta longeva franquia do cinema. O sucesso de 007 – Operação Skyfall garantiu a Sam Mendes a cadeira da direção, dando continuidade à sua narrativa.
Como nas demais produções estreladas por Daniel Craig, a obra de Ian Fleming, criador da personagem, se mantém próxima desta nova história, trazendo à tona uma organização criminosa presente em diversos romances do autor. A intenção de promover um recomeço desde Cassino Royale e retornar à base fundamental da obra é coerente. James Bond foi reintroduzido ao público em um formato diferente do habitual. O cerne da personagem estava presente mas havia uma interpretação mais realista tanto na história como nas cenas de ação, fugindo de outras interpretações anteriores. Um movimento que atingiu o ápice na produção passada com a destruição do universo conhecido.
007 Contra Spectre é o próximo passo natural que abre um novo momento, realocando a série na tradição de seus filmes após um caminho nunca antes percorrido. A sustentação realista permanece demonstrando que o MI6, e seu projeto de agentes autorizados para matar, pode ser um conceito obsoleto. Sem dúvida, a desconstrução é o cerne deste novo momento, tanto desta franquia quanto de seu parente mais pop, Ethan Hunt, que desde Missão Impossível – Protocolo Fantasma também refletia sobre a importância de atividades de espionagem realizadas em segredo diante de um mundo contemporâneo, conectado e supostamente mais transparente. Ambos são personagens fiéis a uma ordem diferente da atual, que se torna, simultaneamente, obsoleta mas ainda necessária para se manter a ordem.
A aventura é mais linear e tradicional no quesito espionagem, aproximando-o dos filmes anteriores. É um realocamento das aventuras Bond: ainda na vertente atual, mas inserindo novamente o universo exagerado e charmoso do espião que nunca falha. O senso da realidade dá um passo atrás avisando ao público que estamos diante de uma personagem cujo marco são as cenas impossíveis, o carisma sedutor e um enfoque no qual prevalece a ação.
Quando o vilão de Christoph Waltz entra em cena, vemos uma composição contrária daquele concebida em Skyfall. O vilão de Javier Bardem era um homem dissonante em uma história realista; nesta Waltz parece um homem real em uma trama com indícios da tradição de Bond. Em pouco tempo em cena junto com o protagonista, sua loucura é expressa pela contenção do ator, motivo pelo qual se projeta o medo. Se novamente compararmos as obras de Craig, a cena de tortura em Cassino Royale e a desta produção têm a mesma base. Porém, enquanto a primeira era brutal e simples, a segunda é elaborada, megalomaníaca, coerente com os grandes vilões que, em maior ou menos grau, desejam dominar o mundo.
Ao inserir o grupo terrorista SPECTRE, o filme entrelaça suas tramas anteriores, resgatando o necessário para demonstrar que a dinastia de Craig tem uma única e grande história narrada em pontos altos para chegar a este momento. Após a ruptura de Skyfall, os rumos da personagem seriam diferentes se os roteiristas continuassem com queda e crise, talvez descaracterizando James Bond. SPECTRE faz a curva que retorna à pista da tradição da franquia com um vilão megalomaníaco, cênico ao extremo, demonstrando que, realismos à parte, estamos vendo uma obra de ficção.
Na direção, Sam Mendes compartilha deste preceito e brilha criando cenas que fogem da realidade mas que são um deleite visual, com cenas à meia-luz que intensificam a personagem; contrastes teatrais que trazem poesia à sua história, além de ainda se apoiar em um senso realista nas cenas de ação, pontuais e bem equilibradas.
Novamente, observamos um novo ponto de transição de James Bond, um movimento de retorno em que a tradição é resgatada com os conceitos deste novo recomeço, um equilíbrio entre a brutalidade da ação com vilões bizarros e planos elaborados, um caminho que aponta para uma última produção com Craig mais próxima deste conceito, mantendo, novamente, em vertentes variadas, o destaque deste grande personagem da ficção.
Após o sucesso de Cassino Royale, a franquia de James Bond parecia novamente blindada, com grande potencial de apresentar uma sequência tão interessante como a primeira produção. Porém Quantum Of Solace não se mantém como obra por depender do desenvolvimento da trama anterior, sem um novo enfoque.
Há uma significativa troca dos tradicionais vilões da franquia para uma personagem mais humana, sem nenhuma característica física marcante e que, sem um objetivo evidente de destruição, é um mercenário oportunista e ganancioso.
O grupo terrorista que tinha como líder Le Chiffre era apenas um pequeno detalhe de uma rede mundial inserida no subterrâneo de cada governo, informações que nem mesmo o MI6 tinha conhecimento prévio. É dentro dessa ordem que James Bond tenta impedir que o grupo realize um acordo que prejudicará um país de terceiro mundo.
Se a narrativa carrega potencial, teve uma execução mal formatada. Principalmente por ter sido realizada na época da greve dos roteiristas. O abalo significou começar as filmagens sem o roteiro completo, fazendo com que até mesmo Daniel Craig fosse obrigado a escrever diálogos para dar sequencia as gravações. Recentemente o ator pediu desculpas pelo fato, ciente de sua limitação para o cargo.
Embora composto pelos mesmos roteiristas do primeiro, a trama parece um confuso emaranhado político entrecortado por cenas de ação. A direção de Marc Foster oscila, sem o mesmo apuro que Martin Campbell nas cenas físicas que repetem a estética sem o mesmo brilho. E parecendo aguardar algum gancho importante que nunca chega no clímax.
Em 2002, no lançamento de 007 – Um Novo Dia Para Morrer a franquia do agente secreto tentava, sem muito sucesso, mudar de estilo. Havia uma tentativa de alinhar sua história aos dias de hoje, colocando em xeque a função do próprio James Bond em um mundo não mais polarizado. O último filme com Pierce Brosnan fez sucesso, mas trazia a tona um exagero nas cenas de ação, escondendo o roteiro fraco. Aos poucos, o futuro de James Bond nos cinemas foi sendo questionado. A composição de suas produções atingiram uma crise criativa que gerou o adiamento de um novo filme e, logo após, a liberação de Brosnan como o agente do MI6. Em parte, porque, finalmente, produtores haviam adquirido os direitos para filmar Cassino Royale, primeiro livro escrito por Ian Flemming, filmado para a televisão em 1954 e como sátira em 1977 no filme com Peter Sellers e Ursula Andress.
Apresentar o começo da história de James Bond necessitaria de um novo ator e também rever a estética ao realizar uma produção que tanto fosse fiel ao original, quando refletisse uma maneira nova de apresentar a personagem. Aproveitando o sucesso de Identidade Bourne com sua ação realista, trouxeram as telas um agente mais cru e brutal em Cassino Royale.
Dirigido pelo mesmo Martin Campbell que trouxe a franquia de volta em 1995, com Brosnan, em 007 Contra GoldenEye, a produção é uma estupenda construção cinematográfica, equilibrada entre a tradição e o novo. Concebendo com cuidado uma espécie de origem da personagem, sem perder o charme tão característico de vinte filmes anteriores.
Mesmo situada no começo de sua carreira, a trama se desenvolve no presente atual, distorcendo a cronologia para um melhor resultado. O filme inicia-se em preto e branco, reverenciando produções antigas e marcando a idade da personagem, com um Bond prestes a matar um traidor, logo após adquirir sua licença para matar. Novo no cargo, é um agente mais violento, sem o esnobismo futuro e próximo aos tempos de hoje que procuram heróis imperfeitos.
O filme costura bem as cenas de ação e a trama intricada de investigação. A ação bem executada por Campbell produz uma tensão real no público, principalmente por usar o mínimo de efeitos digitais. O roteiro bem realizado permite plena compreensão da investigação que culmina no jogo de cartas no local do título.
Nunca houve tanta tensão em um jogo de Poker. A história de Le Chifre, que tem como único elemento bizarro chorar lágrimas de sangue por um problema lacrimal, é conduzida com excelência. Faz do jogo um espaço a mais para o suspense que cresce em confronto com Bond, que nunca se mantém incógnita, sendo uma constante ameaça.
A personagem desenvolvida por Craig é o James Bond mais físico até então. Mesmo trajando o impecável terno, não há momento ruim para perseguir assassinos por telhados ou em uma corrida frenética com o famoso Aston Martin. Além da iconoclastia da personagem que não se importa com o tipo de bebida que toma, desde que fique levemente embriagado. Zombando de suas características desenvolvidas anteriormente.
O mérito desta produção é recolocar a personagem de novo no radar em uma roupagem que respeita tanto a tradição como agrega novos fãs da franquia. Ao retomar a única obra de Flemming não adaptada, um novo Bond surgiu, ainda com classe e mais próximo aos dias de hoje. Reintroduzindo o famoso agente de uma maneira única ao cinema.
Oficialmente interpretado por seis atores, James Bond mantém-se durante décadas a serviço da Inglaterra, assistindo à derrocada de grandes nações e a crises e revoluções em escala global. Criado há cinquenta anos, parte de sua força como personagem vem da capacidade de compreender o mundo que o cerca, sincronizando e refletindo o contexto global em cada uma de suas histórias. Sendo atemporal.
Foi preciso que seus produtores retornassem à história primordial de Bond para alinhá-lo ao arquétipo do herói atual: sem vestígios de inocência, com capacidade física apurada e um escopo psicológico que aprofunda a conduta de suas ações. Neste vigésimo terceiro filme da franquia de 007, a mítica deste regresso é destruída para um retorno ainda mais profundo.
Dirigido por Sam Mendes, a narrativa tem ingredientes bem diferentes daqueles vistos em Cassino Royale. A ação frenética cede espaço para uma história linear de espionagem. O vilão perde o tradicional bizarro físico para se tornar um cidadão normal, camuflado na multidão. A antítese plana entre bem e mal se rompe e, com isso, a história se concentra no próprio James Bond e na sua relação com o MI6 e com a mentora M.
A queda da personagem, que é tida como morta, é o ponto de início para evidenciar a figura do defensor e da importância de se manter a ordem em um mundo caótico, não mais polarizado pela eficiência de bem ou mal. A trama se desenvolve de maneira dupla em muitas camadas: explora o avanço tecnológico tanto como progresso quanto como uma arma, equipara o novo e o velho, elevando a premissa de que, sem um elemento negativo, não existira o positivo em contraste.
É uma produção que vai além da personagem autorizada para matar. Deixando as grandiosas cenas de ação de lado, Mendes demonstra competência em criar tensão e silêncio pelos diálogos, no embate entre a figura que deseja destruir aquilo em que o agente secreto acredita. Esqueçam qualquer plano de destruição mundial ou um monólogo que explica o que acontecerá para a reviravolta. Admirando seu passado, a história se molda com nossa atualidade, que almeja por deter significados para compreender o mundo. Justifica a importância da ordem, a origem do caos, a necessidade de saber quem se é, meneado pelo embate do famoso agente e do vilão.
O vilão de Javier Bardem é um caso à parte. O ator pediu para que todo o roteiro fosse traduzido para o espanhol para que compreendesse suas motivações e psicologia. Mergulhado em uma personalidade afetada, que esconde um interior destruído, ele se transforma em um dos vilões mais carismáticos da franquia, sendo bizarro e assustador pela estranheza de alguém que não tem nada a perder.
A direção de Mendes mantém a trama sem perder as rédeas. O escopo reflexivo se projeta no público, não no argumento que fundamenta este embate. Suas tomadas são precisas e mostram apenas o necessário, sem deixar de lado o elemento artístico, valendo-se de sombras, luzes e reflexos para gerar atmosfera. A cena de luta entre Bond e um atirador no interior de um prédio em Xangai com um letreiro luminoso de fundo é um destes exemplos de eficiência e beleza, além do desenlace da trama, que ecoa nos duelos de tradição western.
007 – Operação Skyfall consegue, na queda e no retorno às origens, alinhar a personagem por inteiro, fazendo-a clássica sem se tornar anacrônica. A personagem que, mesmo seduzindo mulheres e preferindo o Martini batido, nunca foge de tempo, seja ele qual for.
Após comentarmos sobre as primeiras canções da franquia da série do James Bond com o fechamento da lista com Live and Let Die, do Paul McCartney, hoje daremos continuidade à lista de canções, dessa vez dando sequência aos filmes estrelados por Roger Moore e Timothy Dalton.
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The Man with the Golden Gun (007: O Homem da Pistola Dourada, 1974) – Lulu
Após sua ausência no filme anterior, John Barry retorna para 007: O Homem da Pistola Dourada e além de compor a trilha sonora do longa, também fica responsável pela canção-tema, que contém letras de Don Black. A artista escolhida para interpretá-la foi a cantora escocesa Lulu, que não teve uma carreira próspera na música, sendo mais conhecida pelo seu papel no filme Ao Mestre com Carinho, com Sidney Poitier e pelo seu casamento e divórcio relâmpago com Maurice Gibb, dos Bee Gees. A canção-tema e a trilha sonora são considerados os mais fracos de toda série, opinião compartilhada também pelo compositor John Barry, que disse ser um o trabalho que ele mais odiou.
Alice Cooper chegou a compor uma música para o longa, mas os produtores optaram pelo tema de Lulu. A canção de Cooper intitulada The Man With The Golden Gun e pode ser ouvida no álbum Muscle of Love.
The Spy Who Loved Me (007: O Espião que me Amava, 1977) – Carly Simon
John Barry dá lugar ao jovem músico Marvin Hamlisch, ganhador de três prêmios Oscar, dois pelo filme Nosso Amor de Ontem (melhor canção original e melhor trilha sonora) e o terceiro pelo filme Golpe de Mestre (melhor trilha sonora). Para canção-tema, Hamlisch se juntou com Carole B. Sayer e compôs Nobody Does It Better, que foi interpretada por Carly Simon. A canção é um marco na série, pois esta foi a primeira vez em que o tema de James Bond tem um título diferente do filme.
Nobody Does it Better é uma clara alegoria erótica as façanhas amorosas realizadas pelo espião britânico, além de marcar o retorno da balada à série, algo que se repetiria nos três filmes seguintes.
Moonraker (007 Contra o Foguete da Morte, 1979) – Shirley Bassey
Após o resultado irregular da trilha incidental de Marvin Hamlisch no filme anterior, John Barry é novamente convocado para compor a trilha do próximo James Bond, e dessa vez é o controverso 007 Contra o Foguete da Morte. Barry convida Al David, coautor da canção We Have All The Time in The World para juntos comporem a belíssima Moonraker, uma balada extremamente melódica e suave, que marcou o retorno de Shirley Bassey em sua terceira e última interpretação de uma canção do James Bond.
For Your Eyes Only (007: Somente para seus Olhos,1981) – Sheena Easton
John Barry mais uma vez não estava disponível para compor a trilha do próximo 007, e ele mesmo sugeriu como seu possível substituto, Bill Conti, compositor norte-americano responsável pela trilha do filme Rocky, Os Eleitos, Karate Kid, entre outros. Apesar da trilha sonora de 007: Somente Para Seus Olhos ser considerada irregular, a canção-tema For Your Eyes Only é um grande destaque no trabalho de Bill Conti. Escrita em parceria com Michael Leeson e interpretada por Sheena Easton, a canção se tornou um sucesso instantâneo, sendo uma das mais lembradas de toda a série. For Your Eyes Only rendeu indicações ao Oscar e ao Globo de Ouro para Conti.
Octopussy (007 Contra Octopussy, 1983) –Rita Coolidge
O ano de 1983 foi marcante para a série 007, pois naquele mesmo ano estreou Nunca Mais Outra Vez, filme não-oficial que marca o retorno de Sean Connery para o papel principal. Neste cenário, Roger Moore contra-ataca com seu sexto filme, 007 Contra Octopussy, filme que mais uma vez traz de volta John Barry.
A trilha de Barry é extremamente marcante, utilizando o tema de James Bond em abundância e ainda assim colocando uma assinatura forte do compositor. A canção-tema, All Time High, pela segunda vez não coincide com o nome do filme, e trouxe Rita Coolidge para interpretá-la. A música transcendeu à barreira do tempo e ainda hoje muitos lembram dessa linda canção de Barry interpretada por Coolidge.
A View To A Kill (007 Na Mira Dos Assassinos, 1985) – Duran Duran
Em 1985, John Barry retorna para mais um filme da série 007, e traz Roger Moore interpretando James Bond pela última vez, mas acima de tudo é um marco para as músicas da série, já que a canção-tema ficou em primeiro lugar nas paradas de sucesso dos Estados Unidos e Inglaterra. A View To A Kill, composta por Barry e o grupo britânico Duran Duran, se tornou um dos temas de maiores sucessos da série.
A escolha da banda se deu após uma festa, onde o baixista John Taylor (grande fã da série) ainda bêbado se aproximou do produtor Cubby Brocoli perguntando: “Quando é que você vai arrumar alguém decente para fazer uma das canções da série?”.
The Living Daylights (007: Marcado Para a Morte, 1987) – A-Ha
007: Marcado Para a Morte marca o último trabalho de John Barry frente à série de James Bond, e é considerado por muitos o seu melhor trabalho. Além disso, o filme também traz a estreia de Timothy Dalton no papel do agente secreto, mudança esta que trouxe áreas mais sombrios e realistas à série, algo que seria refletido na trilha sonora de Barry.
Com o sucesso da canção anterior, os produtores optaram pela escolha de outra banda pop, dessa vez os escolhidos foram o grupo norueguês A-ha. The Living Daylights foi composto por Barry e Paul Waaktaar (guitarrista da banda). Originalmente, os Pet Shop Boys foram convidados para compor o tema, mas recusaram quando souberam que seria apenas a canção-tema e não a trilha sonora completa.
Licence to Kill (007: Permissão Para Matar, 1989) – Gladys Knight
A ausência de Barry, que na época estava indisponível devido a problemas médicos, os produtos contrataram Michael Kamen (Máquina Mortífera) responsável pela composição apenas da trilha incidental. Houve rumores de que o tema seria uma composição instrumental de Eric Clapton e Vic Flick (guitarrista original do tema da série), mas os produtores desistiram da ideia.
A canção-tema Licence To Kill foi composta por Narada Michael Walden, Jeffrey Cohen e Walter Afanasieff, e teve a interpretação de Gladys Knight. Apesar de uma bela interpretação de Knight, Licence To Kill não teve nenhum destaque nas rádios ou entre o público, sendo uma das canções mais ignoradas da série.