Suspense de proporções enormes, cuja trilha sonora e música de Phillipe Sarde já ambienta o espectador no breve início de suas duas horas e cinco minutos de duração, O Inquilino prossegue na esteira que Roman Polanski havia iniciado em 1965 com Repulsa ao Sexo e prosseguido em 68 com O Bebê de Rosemary. O filme, se baseia no livro de Roland Topor, e é protagonizado pelo próprio realizador.
Polanski interpreta Treikovsky, um polonês que se muda para um novo prédio francês e é encarado de maneira desconfiada por seus novos vizinhos. A estranha figura da locatária Madame Jioz (Jo Van Fleet) põe o jovem estrangeiro a par da situação em que se encontra a sua nova casa, contando o que houve com a antiga moradora, que se jogou pela janela do apartamento. Aos poucos, o personagem começa a se interessar pelo caso, ao ponto de tornar isto uma obsessão mórbida.
A sensação de isolamento é presente em todo o decorrer do longa, fazendo até as interações do protagonista com Stella (Isabella Adjani) soarem forçosas, do ponto de vista erótico e até irreais, não por serem irreais pragmaticamente, mas porque o clima a volta dos dois é carregado de uma duplicidade e de um clima de delírio. O estrangeiro prima pela carência, em cenários tão sujos quanto sua moral dúbia, diferente e muito dos heróis clássicos em cada manifestação de caráter que propõe.
Polanski reverencia Stanley Kubrick, ao mostrar nos detalhes escondidos do cinema, um pôster de Laranja Mecânica. Em comum entre Treikovsky e Alexander, herói da distopia kubrickiana estão as perversões sexuais e voyeurismo, aplacada no personagem forasteiro por sua timidez latente e contenção de suas pulsões. A tensão faz o inquilino parecer anestesiado o tempo inteiro, incapaz de dar vazão a emoções, tendo um motivo escuso para não liberar tais sensações.
O terror presente na história que Polanski propõe no roteiro que ele e Gerard Brách adaptaram é baseado na realidade e em um mal moderno, tema mais universal do que o emergir do diabo e até do que a frigidez sexual. O colapso mental pelo qual passa Treikovski é preocupante e serve de alarde para a sua geração, assim como ocorreu com Taxi Driver, ainda que o foco da ultra violência seja diferente, mais interno neste do que no clássico de Martin Scorsese.
A dificuldade em representar emoções dá lugar a empatia, nos últimos momentos de filme, em que o herói falido passa a se vestir como a moça que atentou contra a própria vida. As poucas pessoas de seu convívio se envolvem em uma encenação grotesca, de uma época nefasta, onde o julgamento do comportamento alheio era mais importante que o bem estar humano. Os momentos finais mostram um novo despertar, seguido do desejo de não existir profetizado por Sigmund Freud dentro dos seus primeiros trabalhos psicanalíticos. A maldição destes tempos se manifesta através de dificuldade em lidar com a troca de identidade e dificuldade em lidar com a opinião alheia, mesmo que o social não esteja necessariamente contra o indivíduo. A mensagem final de O Inquilino é que o homem é refém de suas ambições o obsessões e sua história de fracasso é cíclica, repetitiva e inexorável, o que por si só é amedrontador demais.