FEZ, um jogo que passou por um desenvolvimento conturbado, cinco anos de produção – Isso já é muito para um jogo AAA, imagine um independente – Prêmios concedidos pelo conceito em 2008. Atrasos, e mais atrasos no lançamento. Para entender um pouco melhor, recomendo o documentário Indie Game: The Movie. Mas finalmente no início de 2012, FEZ veio a público, e eu poderia parar por aqui dizendo apenas uma coisa, é uma obra prima, e nada que eu disser vai fazer jus a experiência com o jogo.
FEZ, antes de mais nada, é um jogo de plataforma 2d, em um mundo 3d, em que a sua jogabilidade é sempre baseado em 2d, mas você rotaciona o mundo. Nada de novo até aqui, Paper Mario iniciou esse conceito, Crush fez um bom sucesso também e até um jogo em Flash, chamado Sky Island (http://www.newgrounds.com/portal/view/566594), já tinha feito isso. FEZ porém usa esses elementos de um modo tão único e criativo que dá uma roupagem completamente nova à essa jogabilidade. Torcendo cada vez mais suas noções de perspectiva, usando essa rotação do cenário, não apenas como um bônus. Mas sim, como se todo o jogo fosse baseado apenas nela. E o que veio depois foi apenas para completar o todo e fazê-lo um jogo único.
A história de FEZ é a seguinte: você controla o personagem Gomez, que vive em um mundo 2d. Há inclusive uma brincadeira, de louvor ao cubo, mas que alguns não acreditam que ele realmente exista. Até que um dia, Gomez conhece um misterioso artefato, o Hexaedro, que dá a ele um chapéu mágico – que é o que nomeia o jogo. E esse chapéu dá a Gomez a habilidade de percepção do mundo 3d. E agora ele terá que salvar esse artefato, capturando os cubos que o formam, para evitar o colapso do universo. Com um plot simples, FEZ não está muito interessado em lhe contar uma história, a história maior é a própria experiência com o jogo. É um game designer convidando você para dar um passeio naquele universo que ele criou, com todas as referências de outros jogos, e autorreferências que ele inclui. Um dos exemplos de autorreferência muito bem inseridos é que em determinados pontos, o jogo simula um crash, um computador religando e você começando na tela de início tudo de novo. Referência clara a primeira exposição do jogo no PAX.
Screenshot da primeira fase, acredite, é a menos complexa de todas.
O sistema de fases do jogo é bastante complexo. Em cada uma delas você pode ter um ou mais objetivos, mas você tem uma linha de grandes fases que dão acesso a outras menores, ou até algumas que são apenas uma sala. Em cada fase, você pode ter que coletar um fragmento de cubo. Um cubo em si. Ou resolver um “desafio secreto” dos quais falarei mais a frente. Essa estrutura de fases dentro de fases dá ao jogo uma sensação de profundidade cada vez maior. Até pelo fato de cada um dos grandes cenários terem um tema e um motivo próprio, todos seguindo a linha principal do jogo, o Pixel Art baseado em Tetris. Um ponto importante, com tantos níveis que podem ser acessados, o uso do mapa se faz essencial. E um dos poucos problemas que FEZ apresenta, é justamente no mapa. Ele tem problemas de perspectiva, alguns bugs, que fazem com que você fique perdido sobre qual ponto você está observando. Depois de perceber os problemas, você consegue contorná-los com alguma paciência. Mas para evitar as frustrações possíveis, é bom que o jogador se acostume cedo com os problemas do mapa, e consiga se ajustar.
Infelizmente, FEZ tem além do problema com o mapa, outro um pouco mais problemático, é um problema de performance e drop de framerate quando o jogo faz o salvamento automático. Do meio pra frente, é bem possível que você sinta engasgos, que comprometem um pouco da jogabilidade. Nada que tire os méritos do jogo, mas que deve ser destacado.
Aproveitando que falei de Pixel Art, toda a parte visual de FEZ é um ponto que merece quantos elogios forem necessários. Aqui temos a primeira imagem disponível de FEZ: http://forums.tigsource.com/index.php?topic=354.0. E podemos compará-la com o que aconteceu cinco anos depois de desenvolvimento. Tudo é pixel art, com um uso de cores fantástico. O jogo tem um tipo de passagem de tempo, que serve apenas para fins estéticos, e mudança de cores do background, simulando um poente, ou nascer do sol. Além da própria estética das construções, que tem um nível de detalhamento individual de cada ponto, na maioria das vezes baseada em peças de Tetris, que é muito fácil você se pegar parando por um tempo, só pra observar melhor os detalhes que foram ali inseridos.
Os detalhes do cenário são tão bem inseridos, que muitas vezes não tem apenas fins estéticos, e esse talvez seja um dos pontos mais inesperados e brilhantes de FEZ. Os desafios secretos que citei anteriormente, muitas vezes são baseados em um tipo de mix de criptografia e esteganografia (acalme-se, você não vai precisar ser um gênio da criptoanálise para concluir o jogo). O que acontece é o seguinte: espalhado pelo mundo, você tem dicas visuais sobre como resolver certos desafios. Logo no início, por exemplo, você tem um tipo de uma sala de aula, que explica, de modo vago e em nenhum momento didático, nem aos moldes de tutorial. Tudo sutil, como resolver ou decifrar certos enigmas. Apesar disso não ser absolutamente necessário para o cumprimento do objetivo inicial, de capturar 32 cubos, salvar o hexaedro e assim o universo. Caso você queira completar e coletar os 32 cubos e os 32 anti cubos existentes no jogo, você vai ter que quebrar a cabeça. Fazer anotações das pistas disponíveis, usar um celular pra decifrar um QR code. Até a trilha sonora do jogo, quando passada por um espectrograma, aparecem mais coisas escondidas, imagens, números, QR Codes. Enfim, FEZ é um jogo cheio de mistérios, que ao observamos o próprio processo de desenvolvimento do jogo, é fácil fazer uma conexão com o game designer que projetou tudo aquilo. Ou seja, é um jogo autoral, com muito do seu criador inserido nele.
Harry Truman, no espectrograma da música.
Sobre a trilha sonora, além dos seus mistérios escondidos que você pode conferir mais aqui: http://kotaku.com/5904168/fezs-soundtrack-is-full-of-mysteries-too. Ela foi desenvolvida por um artista de chiptune chamado Rich Vreeland, sob o codinome de Disasterpiece. Além de ser ótima como um aspecto isolado, e que cabe perfeitamente na sua biblioteca do iTunes, no jogo, o cuidado para compor a ambientação é tanto, que mesmo em um jogo tão leve como ele é, em uma fase passada em um cemitério, adquire um tom mais obscuro e tenso, chegando a causar alguns arrepios. E a trilha sonora é parte fundamental para isso.
Apesar de todos esses elogios, ainda assim é difícil de explicar porque FEZ agrada tanto, que me faz colocá-lo junto a outros clássicos como um dos jogos que mudaram um pouco do conceito que eu tenho dos jogos eletrônicos. Talvez seja uma mistura do lúdico com o desafio misterioso. Beleza visual e sonora. O poder do jogo te surpreender em uma situação simples, mas ao mesmo tempo impensável, brincando com todas as noções de perspectiva e retorcê-las cada vez mais. Talvez sejam todos os mistérios e enigmas aliados ao fato de ser um dos jogos mais autorais que pude apreciar. Cada um dos detalhes que dão a impressão de terem sido pensados exatamente para construir o todo. Talvez até o absurdo carismático que seja o Gomez, com seu chapéu, que te conquista logo de início apesar de nunca proferir uma palavra e ser um apanhado de Pixels. Ou talvez seja tudo isso junto. Essa união de pequenos detalhes que agrade tanto em FEZ e faça dele um dos melhores jogos dos últimos anos.
FEZ foi criado e idealizado por Phil Fish, lançado pela Polytron em 13 de Abril de 2012. Distribuído pela Microsoft Games, e está disponível para Xbox 360 (XBLA).
Será que vai ter pra PC?
Há rumores de que no momento em que acabar a quarentena de exclusividade para o Xbob 360, vai sim sair pra PC. Eu não sei como funciona exatamente os tempos de quarentena. Mas acredito que pelo menos um ano.