A Colônia foi feito para virar filme – ou uma dessas séries da Netflix que duram apenas duas temporadas, graças ao hype em torno delas, e somem do imaginário popular em uma semana. Isso porque o livro de Ezekiel Boone, uma ode aos filmes B de fantasia dos anos 50 – e se levando muito a sério, mesmo assim –, é fruto de uma literatura claramente mais inspirada nos filmes e na diversão de assisti-los, que por outras obras da mídia literária na qual se sustenta. Os capítulos, todos curtos, parecem ter a duração de cenas cinematográficas (hoje em dia, muito mais rápidas, com suas intenções quase que resumidas), e as ações, pela prosa do autor nesta que é sua estreia no mundo dos livros, são narradas para se encaixarem com perfeição num roteiro de Hollywood. Tudo muito veloz, e tão fácil de entender, quanto a mais óbvia das ficções.
Do princípio básico de se ter a nossa realidade invadida por criaturas desconhecidas, há muito adormecidas, no seio mais primitivo desta planeta, A Colônia é uma tentativa válida e simplista de fantasiar a revolta da natureza contra nós, seus mais ingratos hóspedes. Tudo começa quando inúmeras aparições assombrosas de sombras inexplicáveis começam a ser relatadas, seja nas florestas do Peru, seja no norte da China, obrigando inclusive o governo chinês a tomar medidas extremas para acabar com uma ameaça que ninguém sabe o que é – ou seus motivos reais. Ninguém, nem mesmo a renomada cientista e professora americana Melanie Guyer, especialista em aranhas, cuja entrega por dois de seus mais brilhantes alunos universitários de uma caixa cheia de ovos aracnídeos, de uma espécie latino-americana tida como extinta, é perturbadora o bastante para obrigar Melanie a dedicar seu tempo a estudar esses animais – e se aproximar do perigo que eles representam.
Nesse ponto, já ficou óbvio (até mesmo pela capa da edição em português, da editora Suma) o que é essa verdadeira força natural, e o terror que ela provoca em grande escala – e não apenas aos aracnofóbicos. Através de inúmeros personagens no irreverente multiplot no qual A Colônia é escrito, nos deparamos com a abrangência dessa vingança da Mãe-Terra para aqueles que intrigam e a destroem, sem pensar duas vezes, em nome do dinheiro. O bizarro das aranhas representa a iminência dessa revolta que criamos para nós, inconsequentes e soberbos, enquanto espécie humana. Assim, Boone dialoga para todas as idades com os medos sociais e político de uma época, a nossa época, transfigurados em criaturas nefastas que vão assolar o mundo. Se antes o medo era da guerra, agora é o aquecimento global que cada vez mais alimenta as nossas distopias provocadas por nós mesmos.
Sem tempo para nos culpar, mas sem deixar de fazer isso de forma indireta por um segundo, sequer, Boone se mostra um escritor habilidoso em segurar uma trama frenética em prol do nosso interesse. Com uma tomada em escala global de aranhas canibais, e com ovos que não param de eclodir nos quatro cantos do globo, para onde poderíamos ir? Nossa única casa se voltou contra nós, e mandou seus agentes mais implacáveis para cobrar uma dívida que fingimos não ser nossa. Eis uma história humilde e significativa a respeito de temas absolutamente reais, mas que em A Colônia ganha uma roupagem mais icônica, e atraente, focada em um público infanto-juvenil, ainda que as vezes inofensiva e aquém de todo o seu (suposto) potencial reflexivo.
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