Certa vez um amigo me perguntou porque eu ainda gostava tanto de jogos adventure point and click, já que eles eram tão datados e com jogabilidade engessada típica de uma era dos computadores que ficou no passado. A conversa veio à tona enquanto eu falava de Back to the Future: The Game. Na época não soube explicar, talvez porque o último jogo não tenha sido nenhuma obra-prima. Hoje porém, eu sei responder e esse review dará o tom da minha resposta.
Botanicula é desenvolvido pela mesma produtora de Machinarium, e não vejo melhor maneira de começar esse review do que falando sobre o visual do jogo, todo desenhado a mão, com uma paleta de cores muito baseada em verde, amarelo e marrom, com desenhos belíssimos e detalhados, que têm papel fundamental na criação da atmosfera do jogo, num universo próprio, que não obedece às nossas lógicas, tampouco todas as leis da física do nosso mundo.
Além do próprio visual, os personagens são fundamentais na imersão do jogo, você controla na maior parte do tempo um grupo, mas há situações em que as ações são tomadas individualmente. O grupo é formado por cinco personagens: um tipo de galho, uma pena, um vegetal que não consigo definir o que é, o mais próximo que cheguei foi uma castanha. Tem também um tipo de cogumelo e um botão de flor. Cada um deles tem uma personalidade definida e o grupo completo é muito carismático, elemento fundamental para a experiência quando, por exemplo, um deles deve salvar todos os seus amigos.
Além dos personagens controláveis, o jogo conta com uma enorme quantidade de “NPCs”, vilões ou aliados, em formatos e desenhos mais criativos e variados. Toda essa união de visuais de cenários e personagens já fariam por si só, um jogo memorável, porém não é só nesse ponto em que ele brilha.
A trilha sonora composta por DVA, um grupo folk da Republica Checa, faz uma mistura inusitada entre instrumentos tradicionais e típicos de seu país, com o uso de vocais não falados mas também como instrumentos, finalizando com uma pitada de elementos eletrônicos sutis.
Com tudo isso, as músicas são ao mesmo tempo inusitadas afinal, quem conhece folk Tcheco? Compondo perfeita sintonia com aquele universo único do jogo. Além disso, a trilha é corajosa, e caminha muito bem pela linha fina que existe entre um som fora do comum, exótico, e o irritante, por ser diferente demais e parar de fazer sentido aos ouvidos. Ainda na parte sonora, todos os efeitos do jogo são baseados em sons feitos com a boca, dando um toque ainda mais natural, formando um dos trabalhos sonoros mais atraentes e exóticos que já pude conferir nos games.
Assim como Machinarium, Botanicula não tem uma linha de diálogo, seja falado ou escrito. Toda a história é baseada em pequenas cutscenes ou imagens e elementos visuais espalhados pelo jogo. A trama é simples, basicamente você precisa salvar esse mundo molecular e vegetal de inimigos parecidos com uma mistura entre aranhas e sentinelas de Matrix. Tudo que eles tocam se torna morto e transparente. Você então, tem que descobrir um jeito de colocar de volta a luz no mundo, para combater a escuridão dessa ameaça. O jogo também faz um bom trabalho colocando em contraste o tom feliz e colorido daquele mundo normal, com o que ele se tornará se não for possível conter seus inimigos, fazendo com que o jogador se envolva com a história e passe a se importar e querer defender do mal aqueles pequenos galhos, flores e etc.
Sobre a jogabilidade há pouco o que se comentar em um jogo point and click, mas é importante notar que Botanicula está mais para um jogo de exploração, do que um adventure propriamente. Já que os puzzles na maioria das vezes são mais baseados em observação visual do cenário e coleta de itens espalhados do que realmente um quebra cabeça que lhe deixará horas e horas empacado a pensar no que deve ser feito. Mas o que não significa que tudo é extremamente fácil e desinteressante, há sim boas sacadas, com alguma dificuldade, que lhe faram ao menos pensar um pouco diferente.
O game ainda usa tomadas de câmeras que referenciam à outros clássicos do point and click, como The Dig, além de outras referências a jogos da própria empresa e a clássicos da cultura geral como Da Terra à Lua de Meliès. Com tudo isso, Botanicula é mais um jogaço dessa boa safra de independentes que vivemos, em que as boas idéias e criatividade, suplantam o orçamento ilimitado e a primazia técnica. Seus únicos problemas são: a baixa resolução que deixará bordas pretas no entorno de monitores maiores, além de alguns puzzles pensados claramente para telas touchscreen, geram algum incomodo usando o mouse. Nada que desabone a obra como um todo, mas que deve ser lembrado.
Botanicula foi lançado em Abril de 2012, criado e distribuído pela Amanita Design, está disponível para PC, Mac e Linux, através do site oficial, ou em plataformas de distribuição como Steam.
Fiquei impressionado com a arte desse jogo quando o vi pela priomeira vez lá no GOG. O visual é bem peculiar e muito bonito. E interessante não haver falas no jogo. Vou aproveitar que comprei Machinarium e conferir o trabalho dessa desenvolvedora.