Dirigido em seu piloto por Joss Whedon, responsável pela realização do competente Vingadores e de inúmeras séries televisivas como Buffy, Angel e Firefly, Marvel’s Agents of S.H.I.E.L.D resgataria algumas aventuras de cunho investigativo com personagens que vivem no mesmo universo de Thor, Capitão América, Homem de Ferro e companhia, mas obviamente com poder e influência bastante reduzidos se comparados aos medalhões. A equipe de seis membros é ordenada pelo Agente Coulson (Clark Gregg), morto em Avengers por Loki e trazido de volta a vida com uma questão um tanto quanto misteriosa.
A premissa da série poderia funcionar muito bem, não fosse o clima insosso, a ausência de carisma de seus personagens centrais e o medo por parte de sua produção executiva em utilizar os personagens poderosos que já não foram usados no cinema. Seus roteiros, quase sempre assinados por Jed Whedon e/ou Maurissa Tancharoen, contêm inúmeras gags de humor físico, nada muito diferente das outras séries de Whedon (especialmente Buffy), mas a fórmula parece desgastada, já que a caracterização é deveras datada, não funcionando mais para a geração acostumada a assistir produções sérias como Breaking Bad ou qualquer derivado da HBO. A priori, não seriam os mesmos públicos que consumiriam tais coisas, o “nerd” que sintoniza sua televisão na ABC pode até não estar procurando uma trama densa, como em True Detective, mas ele espera ao menos, poder ver na TV uma dinâmica parecida com a tônica que a Marvel Studios enviou ao cinema. A série é o segundo produto da fase 2 da Marvel, precedido somente por Homem de Ferro 3, no entanto, consegue ser ainda mais vazia e sem substância que a película de Shane Black.
No décimo episódio é inserida uma nova possibilidade de trama mais elaborada, com o envolvimento da Centopeia, uma força-tarefa que se usa do Extremis, introduzido no universo Marvel em Homem de Ferro 3. Daí, é retomada a história de Mike Peterson (J. August Richards), e investigado a fundo o retorno de Coulson a vida. Com o tempo, a questão é discutida e re-discutida, as atitudes dos mandantes da Shield é deveras discutível do ponto de vista ético, e finalmente algo minimamente interessante ganha os roteiros da série. As consequências que o envolvem em Vingadores ainda ecoam, e a versão de que ele esteve falecido por apenas 8 segundos é desmentida com o desenrolar do trabalho detetivesco, o que se descobre um complexo trabalho de engenharia genética e implantes de memória, que visaria o retorno de agentes tombados.
Apesar do trôpego começo, a tônica muda e o folhetim torna-se mais interessante com o desenrolar dos fatos. Algo que enche os olhos do espectador desde o princípio é o ótimo casting feminino, quase todo formado por desconhecidos. Ming Na Wen do alto de seu meio século de vida é um absurdo de sensualidade, assim como todo o recato de Elizabeth Henstridge. Mesmo Ruth Negga que faz um papel secundário consegue se destacar, mas os holofotes certamente estão sobre Chloe Bennet, um achado, que mesmo com seu corpo pouco curvilíneo consegue concentrar a atenção até do criador vivo dos agentes do “escudo”.
Tais descobertas amoleceram Coulson, que não tem a mesma facilidade para guardar segredos, ele não teima em contar o que sabe a Skye (Chloe Bennet), uma vez que ele também se sentiu enganado pela agência. As subtramas episódicas permanecem, mas como já era praxe, são muito menos interessantes que os mistérios dos protagonistas. As tramas vão aproximando os personagens, e a máxima antes só cantadas, se mostram reais, como a fama de Melinda May (Ming Na Wen) de ser um exército de uma só pessoa.
O líder do esquadrão decide por uma alternativa pouco ortodoxa e temerária, de submeter um dos seus ao mesmo processo que ele mesmo sofreu. A partir daí as coisas ficam mais sérias, a vigilância em cima de Leo Fitz (Iain De Caestecker) e Jemma Simmons (Elizabeth Henstridge) fica maior e se desenha uma dupla ordem para Grant Ward (Brett Dalton), o misterioso agente super bem treinado que convenientemente age por instinto em uma operação que necessitava de sangue frio.
O episódio 17 é um divisor de águas, uma vez que explicita que a paranoia de todos dentro da SHIELD é plenamente justificável. A partir deste ponto é mostrada que há uma dupla trama, dois mistérios a serem desenvolvidos, um envolvendo a ressurreição de Coulson, e outro ligado aos fatos mostrados em Capitão América 2, o que dá a série um nível de importância até então não visto, pois o que acontece nela tem influência clara no que ocorre também no cinema. A partir daí, é praticamente impossível falar sobre o desenrolar dos mistérios sem citar a infiltração da Hydra, explicitada no filme de Anthony e Joe Russo e concluída, mudando ao longo do seriado.
Os fatos tornam-se mais sérios episódio a episódio, onde os membros da tropa vão descobrindo os segredos uns dos outros, e o nível de ligação com o inimigo. Outro fator preponderante é a nova condição de inexistência da agência extra-governamental, além da consideração desta como uma instituição de fins terroristas, obviamente por estar baseada em outra organização de cunho nazista. Conforme as soluções se aproximam de uma conclusão, notam-se muitas semelhanças entre o background de Ward e Skye, mostrando que ambos escondem segredos dos mais escusos, que fazem contraponto a dificuldade de ambos em não se apegarem às pessoas e às coisas. A carência de ambos é explicitada de forma clara, mesmo quando tentam se mostrar superiores a tais dogmas.
Curiosamente no season finale, o papel de vigilância se fazendo dos remanescentes o principal alvo das agências fiscalizadoras do país. Os entraves do final guardam boas surpresas, com retornos inesperados de alguns personagens e lutas muito boas, além de um vilão auto-contido no seriado, mas de importância grande e poder relevante, claro, para os padrões de um produto para a TV. O noutecer da seara é curioso, contém múltiplos ganchos não só para o próximo ano da série como para a Fase 3 do audio-visual da Marvel, aventando a possibilidade de uma ressurreição da Shield, e claro, uma longa discussão sobre os escrúpulos relativos a experiência feita em Coulson. Se comparado as expectativas iniciais, certamente o final superou demais o nível de seu alvorecer, ainda que essa melhora tenha sido demasiada demorada. Quanto ao nível de informação, a série não é propriamente necessária para compreender o todo da Fase 2, mas ajuda a preencher lacunas inconvenientes, deixadas pelos filmes.