O nome acima dos créditos, de Geraldine Chaplin – a prolífica atriz, filha do mito cinematográfico Charlie Chaplin –, talvez engane a plateia sobre qual será o foco da produção dominicana Dólares de Areia. Acostumada a realizar filmes com o cinema de origem hispânica (Um Amor de Película, O Orfanato), ela interpreta uma figura que comumente habita a região praiana de Terrenas, utilizando o arquétipo da idosa turista que se vale de suas qualidades monetárias avançadas para viver como um membro da nobreza, em meio às condições paupérrimas da população em geral.
A carência de Anne (Geraldine) é o campo perfeito para a atuação da protagonista feminina Noeli (Yanet Mojica), uma jovem moça de feições sensuais que se vale de sua malícia para seduzir a rica idosa, tomando para si o máximo de dinheiro e luxos possíveis, uma vez que o dinheiro “investido nela” certamente não faria falta, dada a pequena fortuna da longeva senhora.
Terrenas guarda em si o arquétipo local de paraíso, lar da sensação de férias eternas, como uma colônia onde turistas gringos usufruem das benesses locais sem preocupações maiores, unicamente travadas pela – ainda assim pequena – possibilidade de contaminação com doenças venéreas. Não é exatamente este o caso de Annie, que se vê engodada e explorada, invertendo o paradigma de que o homem civilizado se aproveita da ingenuidade do bom selvagem, uma vez que é o casal formado por Noeli e o personagem de Ricardo Ariel Toribio que a assaltam de modo discreto.
A verossimilhança do conto é fundamentada por sua base de análise. Adaptada de Les Dollars des Sables, do escritor francês Jean-Noël Pancrazi, a fita de Israel Cárdenas e Laura Amelia Guzmán guarda muitas semelhanças com a realidade, especialmente na aviltante situação de Noeli, uma das muitas meninas que dedicam sua vida à prostituição. O roteiro não trata a personagem como coitada, ao contrário, assinala o oportunismo emocional que ela pratica, exibindo através de sua sexualidade extrema uma malandragem poucas vezes vista em espécimes de sua idade. A beleza, contrastada entre os corpos nus das duas intérpretes, mostra uma realidade dicotômica, pondo de um lado a jovialidade da moça e as incômodas rugas e magreza extrema da sexagenária.
Curioso é notar que grande parte das cenas de sexo foi suavizada antes do filme entrar em circuito, especialmente pela condição conservadora do público de países como Argentina e México, em exibições testes. O texto de Guzman e Cárdenas se vale do estado depressivo inerente ao final da vida, como a perspectiva da velhice como motivo de lamúria. No entanto, apesar da proposta ser bastante simples, em uma narrativa linear, para o grande público há a antiga questão da relação entre duas mulheres, que afasta mentes mais retrógradas das salas de cinema.
Apesar de tocar em questões controversas, destacar uma fotografia que valoriza as belezas naturais de Terrenas e as belas curvas da estrela em ascensão Yanet Mojica, qualquer crítica ao estilo de vida, seja dos nativos ou dos turistas, somente arranha a superfície. Não que essa pareça ser a prioridade do roteiro. O aspecto de eterna contemplação ressalta o tédio, a frivolidade e demais condições típicas do cotidiano, que até são válidas, mas que são presentes em histórias muito menos inspiradas do que no escrito original de Pancrazi. A base da história é frágil, pouco sólida, quase justificando a associação da fita à tolice de construir e fundamentar residência na areia.
Fiquei com vontade de assistir