A proposta de horror que Frederico Machado apresenta em seu Lamparina de Aurora encontra um intimismo de qualidade ímpar, emulando um caráter que mistura naturalismo com contos sobrenaturais. A história do longa retrata um casal de idosos que vivem isolado da civilização, interpretados por Buda Lira e Vera Barreto Leite, um dia, um sujeito misterioso aparece, e a rotina de ambos aos poucos se modifica, normalmente incorrendo uma narrativa poetizada.
O homem que se aproxima e traz os ventos de mudança é muito bem interpretado por Antonio Saboia, e quase todas as frases que ele disfere frente as câmeras soam com uma teatralidade ímpar. Essa sensação de estar assistindo a um espetáculo encenado com a mesma pompa de um teatrão baseados nos textos de William Shakespeare ou Sófocles, ainda que tenha obviamente um pé na brasilidade, lembrando um pouco Nelson Rodrigues, ainda que em um nível subliminar.
Outra influência clara é do realismo fantástico, que tem pés na literatura e que em algumas vezes incorre no cinema. Há um bocado de Jorge Amado e Gabriel Garcia Márquez, especialmente nas narrações em off, enquanto a reação dos personagens, perplexos com o que ocorre a eles, parece retirar de um conto de Edgar Allan Poe, enquanto o visual, a luz e o uso das cores faz lembrar os escritos de H. P. Lovecraft. De qualquer forma, o aspecto mais positivo e bem urdido de do longa é sem dúvida o visual, além da excelente tradução em imagens de todas essas influências literárias.
Além da direção, Machado também assina roteiro, produção e fotografia, e é impressionante o trabalho hercúleo apresentado aqui. O lirismo do texto casa a perfeição com toda a composição de imagens, soando belo e prazeroso apreciar os momentos propiciados pelos pouco mais de setenta minutos de Lamparina de Aurora, que soa como uma pequena pérola de cunho econômico, tanto emocionalmente quanto em linguagem épica, sem preciosismos, seca e certeira em seu golpe.
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