Ela Quer Tudo, filme de 1986, traz a personagem Nola Darling (Tracy Camilla Johns) vivendo seus dias entre amores, romances e satisfações sexuais, com eventuais quebras da quarta parede e apelos a metalinguagem. O filme de Spike Lee é a estréia do diretor em longas e se vale de uma abordagem em ritmo de ensaio que contém elementos do cinema negro underground para contar uma história sobre o ideal feminino.
A fotografia de Ernest Dickinson em preto e branco traz uma atmosfera diferente para o filme de Lee. Há claros elementos do cinema europeu alternativo, com elementos da Nouvelle Vague, misturado à estética da Nova Hollywood, temperados pelo modo de agir típico dos guetos nova-iorquinos.
A abordagem das relações de Darling é direta em alguns pontos, mostrando os pretendentes e amantes como homens imaturos, inseguros e carentes, não só da presença da musa do filme, mas também de atenção e holofotes de terceiros. Ao mesmo tempo que o roteiro de Lee tenta fugir de clichês de heroísmo nos homens que cortejam Nola, ele usa as mesmas características típicas dos homens urbanos que costumam inspirar o comportamento da juventude para desconstruir o mito de que o machão heterossexual é bem resolvido.
Nola não se sente plena com nenhum desses sujeitos. A tentativa de conquista mostra o quão tediosos e repetitivos todos eles são e o quanto falta espontaneidade e vigor em cada um deles. Os homens que cercam a protagonista são quase todos iguais, dignos de pena, inclusive a persona de Mars Blackmon, que Lee interpreta.
Nola é sincera quando acha necessário. Seu primeiro monólogo dá conta da possibilidade de mudar a fama que possui, a personagem é dona de seu destino, e não tem qualquer receio de transar com quantos homens ou mulheres ela quiser. Lee faz um libelo de sua própria cultura, tornando-a palatável para todos públicos, mas sem subestimar o espectador. Como Nola há muitas mulheres que podem se sentir contempladas pela figura que Camila Johns interpreta, não à toa a série foi adaptada recentemente para a Netflix.