Conheci Junot Díaz um pouco atrasado. Em meados de 2011 li uma série de críticas bastante elogiosas sobre seu trabalho, principalmente sobre seu romance A Fantástica Vida Breve de Oscar Wao, publicado pela editora Record em 2009 e que lhe rendeu o Pulitzer de ficção em 2008. Diante de tudo isso, acabei comprando o livro no ano passado, mas ele permaneceu na minha pilha de livros a serem lidos. Meses atrás, tomei conhecimento do lançamento de seu novo trabalho, É Assim que Você a Perde, um livro com 9 contos do autor dominicano radicado nos EUA, sobre amores fracassados, proibidos e obsessivos. Por se tratar de contos, decidi dar prioridade e embarcar na narrativa de Díaz.
É Assim que Você a Perde é um processo lento de 15 anos de trabalho do escritor, que segundo ele, dos nove contos que o livro contém, outros dez foram descartados. Apesar desse formato, o livro também pode ser encarado como uma espécie de romance fatiado, pois apesar de poderem ser lidos de forma independente, ao lê-los na íntegra é possível ordená-los como a trajetória de seu protagonista, Yunior.
Para quem já é um velho conhecido da obra de Díaz, sabe que Yunior é o mesmo protagonista de Afogado, além de narrar partes de A Vida Breve de Oscar Wao. Dessa vez retomamos um pouco sobre a vida de Yunior, desde sua infância até sua vida mais adulta, acompanhando sua relação com as mulheres que passaram em sua vida, o que acabará rendendo ao leitor um misto de amor e ódio pelo personagem.
A prosa do autor é irresistível, convergindo de apaixonantes relatos repletos de erotismo de um casal apaixonado à agressão vivenciada por um término de relacionamento conturbado, tudo isso, contado quase como uma conversa íntima entre bons amigos em um boteco qualquer, como ele deixa claro na abertura de sua primeira história O sol, a lua e as estrelas, onde ele relata: “Até que não sou mau sujeito. Sei o que parece – que estou na defensiva, e é balela -, mas pode crer. Sou um cara igual a todo mundo: fraco, cheio de defeitos, mas basicamente, do bem. A Magdalena, porém, discorda. Ela me considera o típico dominicano: um sucio, um babaca.”, e temos contato com os grandes temas que o livro aborda, relacionamentos que chegam ao fim, e que quase sempre se dá em função da traição, mas que pouco importa, o grande tema é a fragilidade do amor.
A traição é o que move o primeiro conto, um relacionamento que chega ao fim, mas a mágoa e o amor próprio parecem girar em torno dos relacionamentos que tendem a não dar certo. Uma ressaca incurável de amores mal-acabados que transitam na vida romântica do protagonista. O caráter “malandro latino” do protagonista dá um toque especial à narrativa, como ao ser questionado pela namorada traída se tinha sido bom transar com ela, Yunior responde: “Pra ser sincero, amor, foi péssimo. Essa aí nunca é lá muito verossímil, mas você tem que dizer, por mais deslavado e falso que pareça: diga.”, cada mentira é escrita com uma propriedade única.
Outro conto que merece um destaque especial é Invierno, que mostra um pouco do relato do protagonista ao deixar seu país de origem e ir morar em New Jersey com a mãe e o irmão mais velho, ao lado do pai que pouco conhecia, já que ele havia se mudado para os EUA anos antes, em busca de melhor qualidade de vida e agora trazia a família para morar com ele. O primeiro ponto importante é traçar um paralelo do pai com o próprio autor sobre a forma como encaram os próprios relacionamentos. A imigração é outro tema recorrente na obra do autor, como relatado por Yunior: “Isso não é uma favela, começou Papi. Quero que vocês tratem ao seu redor com respeito. Não quero ver vocês jogando lixo no chão nem na rua. Não quero ver vocês usando arbustos como banheiro”.
A narrativa de Díaz é extremamente fluida, num sincopado de suingue latino, com a robustez das vozes dos grandes crooners norte-americanos. Sua escrita é repleta de termos em “espanglês”, além de várias referências à cultura pop, hip-hop e o linguajar das ruas dão um charme ao texto do autor. Os costumes culturais da República Dominicana permeiam a obra, mas o ponto forte é a autenticidade do autor sobre explorar o amor. Nunca optando por escolhas fáceis, Díaz passeia sobre as dificuldades do amor, envolvendo dilemas elementares sobre sexo, amores inacabados e a dificuldade de amar a si mesmo quando tudo parece desabar, como o autor relata em seu último e mais contundente conto, Guia Amoroso do Traidor, onde o protagonista se vê imerso num amor obsessivo, onde faz de tudo para consertar o seu erro ou esquecer a pessoa objeto de sua obsessão, mas nada parece surtir efeito, nem mesmo o tempo, e conclui sua história, dizendo: “É isso aí. Nos meses subsequentes, você se dedica ao trabalho, porque lhe dá esperança, porque lhe parece uma benção e porque sabe, no fundo do seu coração de traidor mentiroso, que às vezes só podemos mesmo contar com um recomeço”.
É Assim que Você a Perde traz uma série de histórias calcadas em uma realidade palpável, de relacionamentos concretos, onde cada gesto e cada emoção são minuciosamente discriminados, cada mentira dissecada e cada frase brilhantemente escrita.