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  • VortCast 11 | Clint Eastwood – Parte 2

    VortCast 11 | Clint Eastwood – Parte 2

    Bem Vindos à bordo. Flávio Vieira (@flaviopvieira), Rafael Moreira (@_rmc), Jackson Good (@jacksgood), Levi Pedroso (@levipedroso), Mario Abbade (@fanaticc) e Ivan Motosserra (@ivanmotosserra) comentam sobre o amadurecimento de Clint Eastwood como diretor e de algumas de suas obras primas.

    Duração: 91 mins.
    Edição: Flávio Vieira
    Trilha Sonora: Flávio Vieira

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    Comentados na edição

    Parte 1 – Clint Eastwood
    Parte 3 – Clint Eastwood
    Podcast – Dia dos Namorados
    Rock Trinta

    Filmografia Comentada

    Crítica Os Imperdoáveis 
    Crítica Um Mundo Perfeito
    Crítica As Pontes de Madison
    Crítica Poder Absoluto
    Crítica Meia-Noite no Jardim do Bem e do Mal
    Crítica Crime Verdadeiro
    Crítica Cowboys do Espaço
    Crítica Dívida de Sangue
    Piano Blues (Documentário The Blues – Martin Scorsese)

  • Resenha | Admirável Mundo Novo – Aldous Huxley

    Resenha | Admirável Mundo Novo – Aldous Huxley

    Admirável-mundo-novoCreio que “poucas” pessoas podem dizer que nunca tenham nem sequer ouvido alguém falar a respeito de Admirável Mundo Novo. Seja através da associação com distopias, seja através de comentários esparsos sobre realidades opressivas, bizarrices, experiências literárias ou simplesmente sobre o mal estar que a tecnologia carrega em seu bojo. O livro de Aldous Huxley certamente não se tornou um clássico e nem se ganhou tanta notoriedade à toa, é definitivamente um livro marcante.

    Ainda que, tenho certeza, algumas pessoas associarão a idéia de futuro pessimista a obra mais conhecida de George Orwell, há que se entrar em favor de Huxley e mostrar como na década de 30 já havia vozes se levantando para procurar mostrar hipóteses sombrias sobre o porvir do mundo.

    Huxley, por sua vez, não deve ser visto também como grande pioneiro desse estilo, o russo Yevgeny Zamyatin já havia escrito uma história que certamente inspirou Huxley, retratando um futuro onde a humanidade tinha dado passos largos rumo a uma direção nada acolhedora. De qualquer forma Admirável Mundo Novo está incrustado na literatura mundial não por acaso, e é isso que pretendo tentar por em relevo nessa resenha.

    O livro foi publicado em 1932 e retrata um futuro onde a tecnologia tem papel primordial na manutenção da estratificação social e na controle de todos os mais milimétricos aspectos da sociedade. Como sinal dessa mudança, podemos apontar a cronologia existente nesse mundo distópico: ela começa a ser contada a partir da invenção do modelo T por Henry Ford. A ligação com a criação tecnológica pode soar antiquada para nós agora, mas representava uma mudança bastante relevante para a década de 30, afinal Ford foi um dos principais nomes da indústria não só estadunidense mas mundial.

    A invenção do modelo T não aparece somente como notação de tempo, mas com um significado religioso, pois o formato da letra “T” passou a substituir a cruz, tão cara ao cristianismo. Não mais Cristo, mas Ford é que representava uma entidade basilar na constituição do mundo. Ao passo que a tecnologia impregna o imaginário da população sob essas formas, outros setores da sociedade se valem de maneira extensiva dos avanços tecnológicos.

    O primeiro capítulo já nos atira em uma fábrica de seres humanos. Sim, exatamente isso, somos convidados a um tour ao longo da linha de produção (ah, a emblemática e famigerada linha de produção) para sabermos como os embriões são gerenciados e levados, por meio de uma manipulação precisa, a se tornarem indivíduos de um modo ou de outro. Não se controlam somente fatores biológicos, como a cor de pele, a estrutura capilar, a altura e as tendências de crescimento; mas também condições mentais e capacidades fisiológicas e intelectuais, que acabam por garantir uma estratificação social rígida e muito bem delimitada.

    A tecnologia faz as vezes de natureza e condiciona de maneira bastante eficaz o que serão os seres humanos. As classes Alfa, Beta, Gama, Delta (etc.) são os repositórios dos indivíduos fabricados na bizarra linha de produção. De acordo com os condicionamentos recebidos, eles serão direcionados a uma determinada classe e ficarão responsáveis por um ou outro trabalho. Toda a vida, por conseguinte, se encontra acorrentada ao fato de que os sujeitos já foram desenhados biológica e socialmente, para ocuparem um determinado lugar, Ou seja, não passam de engrenagens ou peças quaisquer, já que perdem sua liberdade de ação pela programação padrão.

    As emoções são suprimidas por meio de drogas, a sexualidade é canalizada pela exacerbação em um ato físico descolado de sentidos humanos e cada vez mais os seres humanos (se é que podemos ainda assim chama-los) se tornam incapazes de resistirem a essa programação.

    Porém, com um jogo de nomes divertido, Huxley nos apresenta Bernard Marx, um sujeito que está cheio da situação como a vê e encontra em Lenina não só uma companheira para o sexo como uma confidente e potencial ajuda em seus objetivos.

    Eles se envolvem em uma tresloucada trama que os leva a conhecerem as reservas dos Selvagens (os seres humanos não feitos em laboratório e que vivem segundo os preceitos e modo de vida pré-Admirável Mundo Novo), traze-los às peculiaridades sem sentido da sociedade voltada à tecnologia para estudo e questionarem, sob muita pressão, o status quo do qual eram produto e vítima.

    Não gosto de encarar Admirável Mundo Novo como uma alegoria, acho que esse termo tem uma tradição de mecanicidade que esteriliza mais do que ajuda. Entretanto, através da construção literária, Huxley nos informa bastante a respeito de sua sociedade e sobre como a tecnologia (e seus mais diversos corolários: exatidão exacerbada, controle absoluto, condicionamento artificial, anti-naturalidade etc.) tendem, nas condições em que são geridos, a prevalecer sobre os seres humanos.

    Apesar do lampejo débil de esperança, a obra de Huxley toca numa ferida que jaz em aberto ainda em nosso tempo (quiçá com mais purulência ainda): a de que quanto mais avançam as tecnologias, mais elas suplantam a humanidade. Essa discussão não tem nada de nova mas nem por isso se tornou velha, e isso por si só, já é indício da atualidade da obra e da profundidade das questões que aborda.

    Compre: Admirável Mundo Novo – Aldous Huxley.

    Texto de autoria de Lucas Deschain.

  • Crítica | O Homem que Mudou o Jogo

    Crítica | O Homem que Mudou o Jogo

    Billy Beane (Brad Pitt) odeia perder. Mais que tudo. Mesmo a sensação de vitória fica em segundo plano quando comparada à fúria provocada por uma derrota. Ele mesmo admite isso num dos vários bons momentos de O Homem que Mudou o Jogo, novo longa do diretor Bennett Miller (Capote).

    A primeira frase deste texto resume totalmente o gancho temático da produção. Muita gente poderá olhá-la sobre uma perspectiva equivocada e acreditar que “O Homem que Mudou o Jogo” é um filme sobre baseball.

    Nada poderia estar mais equivocado.

    O baseball é apenas um instrumento utilizado pelo diretor para contar a história de um homem consumido por duas obsessões: impor suas ideias e nunca, em hipótese alguma, perder.

    O esporte usado poderia ser futebol, vôlei, basquete, ou qualquer outro. Não faria a menor diferença. O foco não é a modalidade, mas o posicionamento do protagonista: a derrota não é, de forma alguma, uma opção.

    Em “O Homem que Mudou o Jogo”, Billy Beane é o gerente do time Oakland Athletic’s – os Oakland A’s. Uma equipe de resultados apenas modestos dentro da Major League Baseball (MLB), a principal liga de baseball norte-americana. Posicionamento pequeno demais para ser aceito peloo personagem interpretado por Pitt.

    Logo no início do filme, ele é visto num estádio vazio, acompanhando por rádio a derrota de sua equipe diante do poderoso New York Yankees. Nesse momento, ele dará sua primeira demonstração física dos efeitos que a derrota lhe provoca. Ao longo do filme, ele será visto em outros momentos como este – vai socar painéis de carros e arremessar cadeiras sempre que perder. Vai se matar na sala de musculação como uma espécie de punição por cada derrota, lembrando muito rituais de auto-punição adotados em determinadas religiões.

    Beane quer mudar o jogo. Quer transformar sua equipe num time campeão.
    No entanto, está cercado de assistentes que possuem uma visão antiga e ultrapassada do esporte. Ele precisa de alguém novo. Que tenha um posicionamento racional e embasado em análises frias sobre o baseball.

    Ele precisa de Peter Brand (Jonah Hill). O jovem formado em Economia por Yale. Que baseia sua visão dos jogadores e do próprio jogo em estatísticas, em números. Na ciência. Não em “tempo de estrada”. Fascinado por ele, Beane o contrata. A partir daí, enfrentando todo tipo de obstáculo e resistência, os dois vão revolucionar o esporte.

    A postura intransigente de Beane – que é um personagem verdadeiro – é fruto de uma vida anterior como atleta. Quando jovem, foi considerado um gênio pelos olheiros do New York Mets. Nesse momenteo, teve de fazer uma escolha entre o baseball e uma bolsa integral na Universidade de Stanford.

    O esporte versus os estudos.

    Optou pelo primeiro. Os resultados, entretanto, não foram dos melhores. A frustração foi inevitável.

    A partir daí, para se proteger de novas decepções, Beane decidiu criar uma espécie de “couraça emocional”, cortando vínculos afetivos até com as pessoas mais próximas. A única exceção é sua filha, com quem ainda se permite demonstrar sua fragilidade.

    Nesse ímpeto para impor sua visão e conseguir os resultados que deseja, é capaz de tudo. Percebam como ele troca e negocia jogadores como quem lida apenas com mercadorias. Para ele, aproximações sentimentais não podem entrar no caminho da vitória. Se um jogador ameaça o futuro dotime, deve ser extirpado.

    Esse posicionamento fica ainda mais claro quando ele ensina o assistente a fazer uma demissão. Rápida, direta e seca. Não há espaço para emoções ou apelos sentimentiais ali.

    Ao contrário do que vem se falando, a interpretação de Brad Pitt não é brilhante. Mas é eficiente. Muito eficiente, na verdade. Os olhares focados, arroubos físicos intempestivos e fala arrogante construídos por ele traduzem a postura de Billy Beane e a forma resoluta de impor sua vontade. Atenção especial à forma comedida e fisicamente tímida criada por Jonah Hill para dar vida à Peter Brand. Vale menção, também, a participação de Philip Seymour Hoffman, que interpreta o treinador Art Howe. Barrigudo, lento e cabeça dura. É a manifestação física do velho baseball – o oposto da abordagem proposta por por Brand.

    A narrativa é direta, com algumas intervenções em flashback da vida de Beane. A compreensão da trama, portanto, é bem simples. E esse é um pnto positivo.

    Billy Beane é um revolucionário. Um rebelde que impõe suas convicções. Ele luta contra um um mundo antigo e ultrapassado. O velho embate entre o indivíduo e o sistema. Tema que foi muito abordado pela banda inglesa de punk The Clash.

    Não por acaso – e os mais atentos irão perceber isso – Beane é fã do grupo: perceba dois posteres da banda em seu escritório: um deles, o anúncio de um show. O outro, uma foto de Joe Strummer, vocalista do Clash.

    Ambos, cada um a seu modo, tentaram mudar o status quo no qual viviam. Ambos sofreram as consequências dessa postura. Como diz um personagem importante que aparece quase ao fim do filme: “O primeiro a atravessar uma grande parede sempre deixa seu sangue pelo caminho”.

    É a mais pura verdade.

    Texto de autoria de Carlos Brito.

  • Resenha | Hunter X Hunter

    Resenha | Hunter X Hunter

    Hunter x hunter

    “Animais monstruosos, espécies raras, riquezas enterradas, tesouros escondidos, a palavra “desconhecido” parece mágica, e alguns homens são atraídos por essa força.. Eles são chamados “Hunters””

    Hunter x Hunter é um mangá e anime de Yoshihiro Togashi, mesmo criador de Yu-Yu-Hakusho. Hunters são profissionais capazes de grandes feitos, em qualquer área. Hunter em si não é uma profissão e sim um título. E é sobre como este título afeta pessoas que a história deste mangá começa.

    Gon é um garoto que mora com sua tia, não possui nem mãe nem pai, e quer de qualquer maneira passar no “Exame Hunter” e ter o título de Hunter, titulo que seu pai “Gin” também tinha (Gin e Gon… ao menos a estória compensa esta falta de criatividade dos nomes). E temos o início da aventura, o primeiro arco da estória. É simples em todos os sentidos, o personagem principal é uma faz jus a todos os aspectos do termo criança:  inocente, impetuoso e desconhece quase tudo que o cerca.

    A motivação, para a estória continuar, é básica:  a busca pelo título. Gon prova sua inocência já nas primeiras cenas, em que aparece com sua fiel vara de pescar (não, essa vara não é magica e não cresce), ao pegar o maior peixe que havia perto de sua vila e correr para casa com o peixe na mão sorrindo, pois havia sido a promessa de sua tia de se ele pegasse o peixe liberaria sua ida ao exame.

    Seguindo de barco para o primeiro local designado ao exame, afinal ele mora em uma ilha, ele encontra mais vários outros candidatos ao exame. Durante o trajeto, uma tempestade atinge o navio e o comandante coloca todos para trabalhar, neste ponto ele encontra outros 2 que vão prestar o exame, Leorio e Kurapika (e este tira o prêmio que eu dei ao Pikachu de “o personagem de anime com nome mais dubio”) e cria um início de amizade com estes. E após o exame “começar” ele conhece Killua com quem se identifica logo de cara. Este quarteto é o “principal” da história. Também é neste arco que nós conhecemos nosso principal antagonista: Hisoka.

    Com uma excelente de história em andamento, o primeiro arco apresenta os personagens e o mundo, o segundo apresenta os poderes deste mundo, já que uma história do mesmo criador de Yu-Yu-Hakusho não ficaria sem poderes espirituais, que são os Nens. Após este arco, todas as lutas e outros afins serão tidas pelo Nens das pessoas, que permite desde telecinésia a correntes-de-andrômeda melhoradas. Porém, ao contrário do trabalho anterior o poder em HxH é extremamente explicado criando uma verosimilhança extremamente forte.

    O terceiro arco começa com o gancho do quarto: a busca por algo. Chamado de “York Shin” este arco é presenciado extremamente por usuários de Nen e conta a evolução dos principais à utilizá-la, principalmente Kurapika.

    Após este arco se resolver, chegamos ao quarto arco: Greed Island. Para mim o melhor arco da história. Onde nós já conhecemos o mundo, os personagens e os poderes. O arco te prende com uma história extremamente interessante, sem apresentar quase nada de novo ao mix.

    E finalmente o quinto arco: Formigas Quimera. Saga atual tanto no Japão quanto aqui no Brasil. Onde nós vemos uma evolução psicológica maior que de poderes, o que eu acho extremamente necessário para quando se tem um personagem principal “inocente”. Além de neste arco aparecer um clone do Kuwabara.

    Em termos de história o mangá se resolve perfeitamente, é um conjunto de partes que se completam, pouca coisa fica de fora e o que está de fora você sabe que vai ser respondido mais pra frente. Em termos de personagem você acompanha Gon e seus amigos desde o inicio de suas jornadas, os vê crescendo, não só em termos de poder como psicologicamente, eles sofrem e isso muda sua personalidade. As lutas são empolgantes e HunterxHunter é um grande baú de poderes interessantes e diferentes, já que nen é algo extremamente espiritual e alguns tem que ter “eventos gatilhos” para funcionar perfeitamente. Para os que gostaram de Yu-Yu-Hakusho, vale pelo autor, para os que não gostaram vale porque não tem realmente nada a ver e a história cresce de maneira completamente diferente.

    Texto de autoria de André Kirano.

    hunter x hunter

  • Resenha | Três Sombras

    Resenha | Três Sombras

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    Confesso que enveredei relativamente tarde no mundo dos quadrinhos, e talvez seja este justamente o fator que me faça apreciar mais os trabalhos alternativos, em detrimento da convencional história de super-herói.

    O ponto é que a cada obra alternativa que me deparo mais cresce a minha admiração por este seguimento.  Com Três Sombras, não foi diferente.

    A premissa é singela. Joachim vive com seus pais (Louis e Lise) em um local recluso, seguem uma vida de campo modesta, simples e feliz. Tudo corria perfeitamente até que um dia os nossos personagens notam três sombras, paradas no horizonte.  Eis que a trama se inicia.

    A simbologia e a representação metafórica destas sombras ante a vida da família é imensa, e Cyril Pedrosa discorre muito bem ao longo da HQ manifestando os mais primários e complexos sentimentos que tais sombras causam em cada um deles (e também em cada um de nós).

    Entre eles estão a mudança, a inconstância da vida e de tudo ao nosso redor. O pai de Joachim reage em um primeiro momento da maneira mais previsível e ineficaz possível, ou seja, cede à negação de tais entidades ou do que elas podem representar.  Não consegue aceitar a mudança e toda a corrente de eventos trazidos com ela.

    Joachim, ironicamente acaba tendo (a seu tempo) a visão mais madura de toda a situação, talvez justamente por não estar tão carregado dos temores dos adultos, nem da carga que os anos da vida trazem, seja ela boa ou não.

    Tudo isso é representado com maestria no traço de Pedrosa. Vale dizer que a HQ tem pouquíssimo texto, sendo talvez a sua arte o que mais lhe dá força e simbologia.

    O traço é fluído, contínuo, alongado, natural e terno. Casando perfeitamente com a temática central da obra: não se para o tempo, não se consegue fugir do seu destino, e o preço ao se tentar tal empreitada, pode ser caro demais. O desenho percorre as páginas como um rio fluindo através do tempo. O leitor, apenas mais um apreciando esta vista transitória, mas não por isso menos especial, ao contrário, exatamente por isso  extremamente especial.

    Há muito mais de significado nesta obra do que eu discorri aqui, valores e temores que afligem muitos de nós, mas creio que parte do prazer em lê-la seja justamente cada um assimila-la de maneira particular. Trazer para si o significado que Cyril Pedrosa transmitiu com o seu trabalho.

    O filósofo pré-socrático Heráclito (para quem a natureza está sempre em constante fluxo/mudança) com certeza apreciaria esta obra.

    Para finalizar, atente para o poema no final, simplesmente tocante dentro do contexto.

    Texto de autoria de Amilton Brandão.

    Compre: Três Sombras.

  • Os Animes de Kenji Nakamura

    Os Animes de Kenji Nakamura

    Poucos são os diretores de animação japonesa dos quais o publico geral digna-se a memorizar o nome após uma apreciação, para, quem sabe, no futuro, vislumbrar outras obras.

    Tal tratamento é geralmente reservado aos grandes mestres do cinema, como Hayao Miyazaki, Katsuhiro Otomo e Satoshi Kon. Quando falamos de produções televisivas, este seleto grupo de nomes conhecidos se reduz ainda mais, salvo exceções como Shinishiro Watanabe  e  Mamoru Oshii.

    Por mais que realizadores como Makoto Shinkai, com seu artístico e pessoal acervo, e Akiyuki Shinbou, com seu frenético, porém sempre competente trabalho, estejam constantemente produzindo, não existem muitos que, como estes, são acompanhados de perto pelo publico.

    Frente a essa multidão de ilustres desconhecidos, há um nome que vem ganhando notoriedade nos últimos anos: Kenji Nakamura, um diretor de animes televisivos que, apesar da pouca bagagem, mostra em seus trabalhos visão e técnica fora do comum.

    o inicio do ano de 2006, Kenji Nakamura, mesmo já figurando a lista de suporte de diversas séries, era ainda um nome inexpressivo na indústria. Isso veio a mudar naquele mesmo ano, quando a antologia animada Ayakashi – Samurai Horror Tales foi ao ar pelo bloco noitaminA, da TV Fuji,  lar de todas as animações futuras do diretor.  Propondo dar nova roupagem a contos de horror antigos e criaturas mitológicas nipônicas, o anime de 11 episódios apresentou três histórias, cada qual com um diretor diferente.

    Os dois primeiros, por mais que cumprissem seu papel na renovação dos clássicos adaptados, não obtiveram êxito em gravar suas identidades, deixando juntamente com os episódios uma impressão de vazio. Entretanto, o ultimo arco da série, uma história original que apenas baseava-se no conceito de Bakeneko (gato fantasma, monstro comum do folclore japonês), conseguiu tudo aquilo que seus antecessores falharam em fazer. Amarrando um enredo elaborado e impactante, personagens enigmáticos, uma atmosfera tensa e um visual deslumbrante, o diretor do ultimo arco mostrou talento e competência acima da média. Este diretor era Kenji Nakamura.

    O trabalho feito na conclusão de Ayakashi tanto agradou que, passado menos de um ano, este ganhou um spin-off. Eis que então, em Julho de 2007, ia ao ar Mononoke, marcando a primeira vez de Nakamura tendo em mãos o leme de toda uma produção.

    Mostrando ocorridos desconexos da jornada de seu carismático protagonista, uma entidade sem nome, cunhada apenas como Kusuriuri (antiga profissão, que consiste em um vendedor errante de medicamentos), cuja missão é buscar e exorcizar Mononokes – seres criados do rancor, temores e anseios dos corações humanos – o primeiro trabalho solo de Nakamura consegue ser intrigante, empolgante, por vezes assustador, e ainda assim poético.

    Primordialmente oculto pela premissa simples, o jogo de morte e ressentimento que se intensifica caso após caso nos mostra, através dos seres mitológicos da cultura daquele país, as enfermidades da alma humana. Mononoke é uma obra introspectiva, que agrada justamente por tragar o espectador para uma trama que exige reflexão sem se tornar maçante ou cansativo.

    A arte belíssima, caracterizada por texturas espessas e cores vivas, acentuando o character design incomum, de um balanço ímpar entre o realístico e o caricato e que coroa os muitos méritos da série.

    Trabalhando por mais de um ano com o Kusuriuri e seu universo, o diretor adquiriu experiência e traçou as características que permeariam o restante de sua obra: cores vibrantes, o uso de ângulos inusitados, recortes e uso do cenário como recursos narrativos. Elementos esses que podem ser observados, com acréscimos e evolução notável, em seu trabalho seguinte: Kuuchuu Buranko, também conhecido por Trapeze.

    Em algo que pode apenas ser descrito como um delírio animado, Nakamura mesclou animação convencional com lapsos do mundo e pessoas reais, seja em interação plena, sobreposição ou composição dos cenários, resultando em uma esplêndida experiência visual.

    Baseado, embora não muito fielmente, na série literária de curtas histórias de Hideo Okuda, o anime nos apresenta  Irabu Ichiro, um psiquiatra que acompanha e trata de forma atípica uma soma de 11 pacientes, um a cada episódio. Passados em uma semana, do dia 17 de Dezembro até o natal de certo ano, os diversos casos se intercalam em uma cadeia de distúrbios mundanos.

    Se em Mononoke o diretor pôde flertar com a psique humana, aqui, como a premissa sugere, foi-lhe permitido explorá-la a fundo. Alternando comédia, crítica e sugestão, Kuuchuu Buranko é uma obra de originalidade irrefutável e execução imponente, que merece ser, como por muitos já é, tratada como a máxima de Nakamura.

    Já tendo no curriculum uma série episódica e outra composta por arcos curtos, em 2011 Nakamura aventurou-se em uma obra com trama contínua, o que pode ter sido uma infeliz escolha. [C]: The Money of Soul and Possibility Control, ou apenas [C], consiste em um vago estudo social que mescla ficção cientifica não muito embasada, ação pouco empolgante e suspense.

    Aqui  vemos sua pior realização; uma obra que, afora o visual ainda magnifico e a trilha sonora grandiosa, não se equipara aos trabalhos anteriores.  [C] não possui uma proposta ruim, pelo contrário, propõe uma interessante análise do mercado financeiro e da relação entre homem e capital, somando ação e drama a esta que poderia ser uma premissa monótona. Porém, por mais adequado que o propósito seja, a execução é falha.  Nakamura erra sucessivamente em fechar um numero considerável de tramas em meros 11 episódios, direcionar os personagens de forma crível e dialogar com o espectador acerca de suas reais intenções.

    Trabalhar com tramas intimistas por um longo tempo certamente o privou do necessário para dirigir algo que, em certo ponto, alcançou proporções cataclísmicas como [C]. Por mais que tenha sim suas virtudes, este titulo é inexpressivo frente às joias de seu passado.

    Em uma carreira até então curta, composta por dois grandes acertos e um pequeno deslize, Kenji Nakamura revela ser uma mente criativa respeitável.  Ostentando uma percepção aguda, mãos cuidadosas e competentes e uma visão de mundo diferenciada, o diretor conquistou seu espaço em meio aos talentos da atual indústria. Que não tardem a chegar seus novos trabalhos, nos fascinando com suas vibrantes e perturbadoras cores!

    Texto de autoria de Alexandre “Noots” Oliveira.

  • Crítica | Histórias Cruzadas

    Crítica | Histórias Cruzadas

    Logo no quadro inicial de Histórias Cruzadas, somos apresentados à personagem Aibileen Clark (Viola Davis, espetacular). Naquele momento, uma das primeiras frases ditas por ela define exatamente como é a sua vida e as das outras domésticas que surgirão ao longo do filme.

    “Eu sou uma empregada, minha mãe foi empregada e minha avó foi uma escrava caseira”, ela diz.

    Tudo nas vidas daquelas mulheres negras gira em torno dessa realidade: a conformidade com a condição imutável de que suas existências se resumem a trabalhar nas casas de patrões brancos, preparando suas refeições e cuidando de seus filhos.

    Elas estão ali para servir. São uma parte invisível das famílias de seus empregadores. Mas uma parte que jamais é totalmente aceita. Afinal, são mulheres. E pior: são negras – a característica imperdoável para os brancos que viviam na cidade de Jackson, Estado do Mississipi, ao longo dos anos de 1960, local e época nos quais a obra se desenrola.

    “Histórias Cruzadas” trata de dois temas difíceis: a total incapacidade de mudar o rumo da própria vida e a estupidez humana ao segregar um semelhante apenas pela cor da sua pele. No entanto, mesmo lidando com assuntos áridos, a película é uma obra simples, direta e – pelo menos na maior parte do tempo – leve. E talvez essa simplicidade seja sua maior qualidade.

    O roteiro é linear. A história é clara, bem como o posicionamento de cada um dos personagens que a compõem.

    Na trama, somos apresentados à Eugenia “Skeeter” Phelan (Emma Stone). Aspirante à jornalista e escritora, ela consegue um emprego no jornal local. No entanto, por ser mulher e viver numa cidade racista e sexista, a jovem consegue apenas escrever uma pequena coluna dedicada a donas de casa na qual lhe cabe apenas dar às leitoras dicas de limpeza doméstica.

    É nesse contexto que Skeeter e Aibileen se aproximam – a partir daí, a jovem branca que quer ser escritora percebe que a empregada pode ser a fonte da matéria-prima necessária à realização de uma grande reportagem: contar como é a vida das empregadas naquela sociedade segregacionista a partir do ponto de um ponto de vista até então inexplorado – o das próprias domésticas.

    Ambas – Skeeter e Aibileen – estão infelizes: a primeira quer claramente ir além dos limites da cidade e provar que uma mulher pode ser muito mais que uma caçadora de maridos, atividade para a qual praticamente todas as moças de Jackson são treinadas desde muito jovens. Já a segunda, tem a dor da morte de um filho e a amargura imposta pelo preconceito atravessadas na garganta. Ela precisa colocar para fora os absurdos cometidos em nome da separação provocada pela segregação.

    Absurdos, esses, que são bem retratados por meio da ação mais simples que se possa imaginar: ir ao banheiro – ou seja, até mesmo o mais corriqueiro dos atos pode ser utilizado para demonstrar como brancos tratavam negros dentro daquele contexto. Cabe ressaltar a maneira honesta como o diretor Tate Taylor retrata a hipocrisia dos moradores do subúrbio norte-americano daquele período: por trás das cercas brancas, gramados verdes e bem aparados, encontros sociais e lares aparentemente perfeitos, é possível ver, mesmo no menor dos gestos, o ódio e o desprezo que as pessoas que viviam ali sentiam pelos negros.

    Essa visão segregacionista é incorporada pela personagem Hilly Holbrook (Bryce Dallas Howard) – tradução literal da América racista, branca e protestante.

    Seu mundo, no entanto, está prestes a ruir. Discretas intervenções feitas pelo diretor por meio de reportagens de TV assistidas pelos personagens mostram a evolução que os direitos civis nos Estados Unidos experimentavam naquele momento. A luta pela igualdade comandada por Martin Luther King e o assassinato do presidente John Kennedy contextualizam a história dentro daquele período e deixam ainda mais claro que as coisas estavam mudando.

    E a própria Hilly será vítima de uma das maiores ações de vingança e Justiça mostradas no cinema nos últimos tempos. Protagonizada por sua ex-empregada Minny (Octavia Spencer, excelente), a cena em questão se vale de uma, digamos, metáfora “orgânica” para mostrar do que ela realmente é capaz.

    Atenção também à bela performance de Jessica Chastain (A Árvore da Vida), que interpreta a personagem Celia Foote e carrega sua construção com altas doses de inocência, desprendimento e sensualidade involuntária.

    “História Cruzadas” é um daqueles filmes simples – e não simplórios – que nos lembram o quanto situações insanas podem estar mais próximas do que imaginamos – até dentro de nossos lares.

    Insanidades como acreditar que o valor de uma pessoa pode ser medido pela cor da sua pele.

    Insanidade como fechar os olhos para o fato de que, no fim das contas, todos pertencemos à mesma raça: a humana.

    Texto de autoria de Carlos Brito.

  • Agenda Cultural 37 | Especial: Quadrinhos

    Agenda Cultural 37 | Especial: Quadrinhos

    Flávio Vieira (@flaviopvieira), Rafael Moreira (@_rmc), Jackson Good (@jacksgood), Felipe Morcelli (@multiversodc), recebem Delfin (@delreydelfin) e Sidney Gusman(@sidneygusman), um dos maiores editores nacionais, responsável pelo consagrado projeto dos MSP 50, editor do Universo HQ, um dos principais sites sobre quadrinhos no Brasil. Nessa edição discutimos sobre o cenário nacional e independente, o crescimento e nascimento de editoras publicando quadrinhos, a famigerada lei de cotas e os grandes destaques de 2011. (mais…)

  • Crítica | J. Edgar

    Crítica | J. Edgar

    Lançando quase um filme por ano, Clint Eastwood não demonstra sinais de desgaste. Nada mal para um senhor de 81 anos. Em 2011, Clint retorna com seu novo longa,  J. Edgar, uma cinebiografia que conta a história de uma das figuras mais importante dos Estados Unidos. O controverso diretor do FBI, John Edgar Hoover.

    Hoover foi uma das figuras mais importantes dentro do governo norte-americano por anos. Serviu a oito presidentes americanos, totalizando a incrível marca de 48 anos de trabalho. Hoover também ficou conhecido por ter revolucionado o estudo da criminologia, quando transformou o Bureau de Investigação, uma pequena instituição de investigação no FBI, uma organização federal conhecida mundialmente. Além disso, a forma como modernizou a polícia americana, introduzindo peritos criminais e métodos científicos revolucionou a criminologia.

    O diretor do FBI ainda foi importantíssimo na prisão de grandes gangsteres nos anos 30 e figura fundamental na captura do sequestrador do filho do aviador Charles Lindberg, um crime brutal que ficou conhecido no mundo todo e só foi possível ser solucionado graças a essas inovações que ele trouxe para a investigação criminal.

    Contudo, Hoover ficou marcado como a figura que perseguiu comunistas, expulsou estrangeiros do solo americano durante a Segunda Guerra, caçou os direitos civis dos negros, controlou a mídia e subornou diversos congressistas com escutas ilegais para beneficiá-lo em seus problemas pessoais.

    O meu principal problema com o filme é ser superficial nesse ponto tão importante. Ora, não é novidade pra ninguém que Clint Eastwood é um republicano conservador, mas isso nunca o impediu de fazer críticas severas em seus filmes com uma abordagem mais política, seja o partido democrata ou republicano. Não é o caso de J. Edgar.

    O filme lida com diversas questões, mas os bastidores políticos são deixados de lado para entrar em um tema bem diferente do esperado. A homossexualidade de Hoover. Para isso, Clint trouxe para junto de si o roteirista Dustin Lance Black (Milk – A Voz da Igualdade). Dustin usa um conceito de narrativa bastante interessante, o biografado narrando sua própria trajetória. O próprio Hoover dita sua história  para seus agentes que servem de datilógrafos para transcreverem sua vida. Essa narrativa justifica o ponto de vista dado ao filme, que parece promover o FBI e o próprio personagem, e maquia alguns acontecimentos não tão heroicos para a figura de Hoover.

    Clint sabe como ninguém que heróis são definidos pelos seus atos e não pela sua imagem (vide sua filmografia), porém, aqui ele brinca com esses clichês, mostrando como Hoover cria um personagem que ele não é. Isso traça um paralelo com sua vida pessoal. Como de costume, o cineasta sai do caminho mais fácil e demonstra sutileza e sensibilidade comovente ao tratar assuntos polêmicos como homossexualidade.

    A direção é impressionante, seguro do que quer, o diretor dá destaque à todos atores, respeitando os trejeitos de cada personagem, e assim, proporciona uma das melhores atuações da carreira de Leonardo DiCaprio, intensa e sutil, de um homem doentio e paradoxal. Apesar da maquiagem pesada que procura caracterizar o passar dos anos – pra ser bem sincero, mais atrapalha do que ajuda – DiCaprio está seguro em sua atuação, e em minutos você esquece esse detalhe estético.

    A fotografia – tão criticada por algumas pessoas – utiliza um jogo de sombras que quase parece um personagem com vida própria, como um traço do próprio Hoover que parece represar todos os seus reais sentimentos longe de todos, o que acaba sendo importante para compreender essas emoções. O mesmo não pode ser dito quanto à trilha sonora, composta pelo próprio diretor, que se mostra ausente musicalmente, faltando “gordura” em algumas composições, salvo exceções. O roteiro de Dustin Lance Black mantém um certo distanciamento do espectador, o personagem foco e a história que está sendo contado.

    O resultado final é positivo. Grandes atuações, a direção segura de Eastwood e sua visão como um contador de histórias nato, tudo isso somado a coragem e singeleza com as quais o roteiro aborda certos assuntos são os pontos fortes do filme. Como nem tudo são flores, J. Edgar têm seus problemas, e muitos deles parecem ocorrer em sua montagem, talvez pelos saltos temporais frequentes do filme. Outro ponto é o já comentado não aprofundamento em várias questões que envolvem a iconografia de Hoover e esse distanciamento do protagonista com o espectador, mas como dito, o resultado final é bem satisfatório.

    Ao terminar o longa, acabei comparando a trajetória do personagem com a de outro filme de tema parecido, Tudo Pelo Poder de George Clooney. Assim como o personagem de Ryan Gosling, Hoover é repleto de boas intenções, mas assim que começa a ganhar poder passa a ser corrompido se mostrando um homem egoísta, arrogante e paranoico. Um estudo interessante sobre a ambivalência do mundo da política.

  • Crítica | Os Descendentes

    Crítica | Os Descendentes

    O advogado Matt King (George Clooney) vive um dilema. Sua mente é povoada por questões para as quais, pelo menos aparentemente, não existem respostas fáceis. O que fazer quando sua companheira, a mulher que ele ama e escolheu para ser a mãe de suas filhas, está estática, quase morta, deitada numa cama de hospital diante dele e sem qualquer chance de recuperação?

    Sem dúvida a sensação não é das melhores. A frustração e tristeza seriam mais que naturais e coerentes. No entanto, como esse mesmo homem deve reagir ao descobrir – por meio da própria filha mais velha, como o trailer do filme já havia mostrado – que essa mesma mulher o vinha traindo sem maiores problemas de consciência? E pior: estava realmente decidida a abandoná-lo.

    Amor e carinho versus ódio e decepção.

    Esse confronto sentimental interno é o motor que vai mover boa parte da trama de “Os Descendentes”, longa mais recente de Alexander Payne (Eleição, As Confissões de Schmidt, Sideways – Entre umas e outras), um diretor que, além de demonstrar domínio da linguagem cinematográfica no que se refere a aspectos técnicos, como movimentação de câmera – e talvez o melhor exemplo disso esteja em “Eleição” – é muito feliz ao retratar os sentimentos ambíguos de seus personagens. Seja por meio de expressões faciais angustiadas – preste atenção em como fisionomia tensa de Clooney é esmiuçada nos vários “zooms” que serão vistos ao longo do filme -, seja no uso de pequenos truques utilizados para pontuar uma determinada situação ou estado interior.

    Na verdade, um desses artifícios é utilizado na imagem inicial do longa. Nela, Elizabeth (Patricia Hastie), a mulher do personagem vivido por Clooney, aparece feliz e sorridente dentro de uma lancha e em primeiro plano diante do belo mar azul do Hawaii. Em poucos segundos, aquela representação de prazer e satisfação será encoberta por um fade. A tela fica escura. A morte – ou pelo menos sua presença – acaba de chegar. As coisas serão diferentes a partir daqui.

    Diante da ausência da mulher, Matt King é forçado a restabelecer e reforçar um elo quase perdido com suas filhas, Scottie (Amara Miller, divertida) e Alexandra (Shailene Woodley, bela interpretação).

    Nenhuma das duas partes – nem pai, nem filhas – sabem lidar muito bem com o cenário estabelecido pelos fatos. E isso será sublinhado em vários momentos tensos – os confrontos são inevitáveis – e divertidos que surgem ao longo do filme.

    Este é um fator importante: Os Descendentes poderia ser classificado – se isso fosse realmente necessário – como um drama. Porém, não se surpreenda se, durante a película. você se pegar gargalhando das situações que surgem na tela.

    A descoberta da traição da esposa faz com que Matt entre numa jornada, acompanhado pelas duas filhas e o amigo da mais velha – Nick Krause, engraçado demais – em busca do homem com o qual sua mulher o traía. Subitamente, ele sente a necessidade de saber se ela estava mesmo apaixonada pelo amante ou tudo não passou de um caso passageiro e sem maiores envovimentos emocionais.

    As respostas virão de forma direta.

    No caminho, o advogado obsessivo por trabalho vai reavaliar sua presença – na verdade ausência – na vida familiar e tentar, à sombra da racionalidade, montar o quebra-cabeças dos fatos que teriam levado sua mulher a traí-lo.

    A trama tem como pano de fundo a venda de um gigantesco pedaço de terra que pertence à família. Todos ficarão milionários com a conclusão do negócio. E Matt, que é o depositário do imóvel, precisa tomar uma decisão. Ele é pressionado a fazê-lo. E por fim, após perceber que a posse da vista privilegiada da praia paradisíaca que ele e sua família receberam como herança pode significar bem mais que um imóvel valorizado, ele fará uma escolha.

    Payne é habilidoso ao construir a tensão e drama em seus personagens, bem como aliviá-las por meio de momentos cômicos. Interessante notar como, nos instantes de maior tristeza e tensão das pessoas que compõem a trama, externa a cada uma delas o cineasta cria uma atmosfera agradável e feliz – por meio da bela captação das lindas paisagens havaianas, mostradas em planos gerais e panorâmicas, e das músicas nativas que podem ser ouvidas ao longo de todo o filme.

    Sobre essa particularidade, há um comentário feito pelo personagem de Clooney logo no início, que resume bem a questão: “Meus amigos acham que só por que vivemos no Hawaii, estamos no Paraíso. Que passamos o dia inteiro sentados à beira da praia, tomando bebidas e sobre pranchas de surf. Eles são loucos? Como eles podem pensar que só por que moramos aqui nossa família é menos confusa? Que somos imunes à vida, que nossas frustrações são menos dolorosas!?”.

    São boas perguntas.

    E, de fato, como filme deixará claro, você pode até viver num lugar paradisíaco. Mas isso não fará a menor diferença se seu interior não estiver em paz.

    Texto de autoria de Carlos Brito.

  • Resenha | Horizonte Perdido – James Hilton

    Resenha | Horizonte Perdido – James Hilton

    horizonte perdido james hiltonHistórias absurdas conseguem prender o leitor justamente por seu distanciamento da realidade como a conhecemos. O incomum, o insólito se constituem como a atração principal quando atentam contra nosso senso de lógica imanente, fazendo-nos sentir ora assombro ora deleite ora uma sensação de suspensão da realidade que nos fazem, mais do quem em outros estilos de escrita, realmente não saber o que virá em seguida. O livro de James Hilton, Horizonte Perdido, partilha desses elementos e desse modus operandi.

    O livro começa com o autor dizendo onde conseguiu o material que usou como base para escrever a história. Ficamos sabendo que a história de Shangri-la, a cidade misteriosa dos lamas no Tibete, foi concedida ao narrador por meio de um amigo desse, num dos encontros de ex-colegas de universidade que ele participou. Já aí Hilton começa a colocar em xeque nossa capacidade de discernir até onde vai a realidade e onde começa a ficção.

    Um avião com quatro passageiros, Miss Roberta Brinklow, Henry Barnard, Hugh Conway e Charles Mallinson, decola de Baskul, rumando leste, para sobrevoar a Cordilheira do Himalaia e outras regiões próximas à Índia, Nepal e China. O curso do vôo, no entanto, é alterado. O avião para em um posto avançado no topo de uma montanha e os passageiros são mantidos presos dentro da aeronave, ao que parece estão sendo seqüestrados. Após essa parada de um dia, o avião permanece na rota distinta da original, sempre ganhando altitude.

    Os nebulosos cumes das altíssimas montanhas da cordilheira se desenham nas janelas do avião enquanto a apreensão dos passageiros aumenta. Não se sabe para onde estão sendo levados e não há modo de contatar o piloto. A certa altura o avião deixa de ganhar altitude e, ao que parece, o piloto perdeu o controle. O avião cai num dos altos picos da cordilheira com o piloto morto, deixando os passageiros entregues à própria sorte.

    Quando pareciam condenados a morrer sem encontrar viva alma, os passageiros vêem que, ao longe, monges budistas, na verdade lamas, se aproximam deles para ajudá-los a carregar seus pertences e bagagens e oferecer-lhes estadia em Shangri-la, uma cidade nas aparentemente inóspitas altitudes do Tibete.

    Não bastasse a natureza altamente incomum dos eventos, eles descobrem que Shangri-la é uma belíssima cidade incrustada num planalto elevadíssimo, cujo acesso é praticamente nulo. Apesar da relutância, eles são obrigados a permanecer dois meses no lugar, pois é somente em sessenta dias que os lamas irão descer da montanha para buscar mantimentos.
    Desse modo eles passam a partilhar do cotidiano da cidade e Conway é o mais integrado deles, sendo, portanto, o primeiro a quem os segredos que jazem nos recônditos da cidade são revelados. A cidade parece guardar o segredo da longevidade.

    Ao que tudo indica, as condições naturais em que se encontra a cidade, propiciam uma vida longa aos que ali permanecerem.

    Conway se encanta com as maravilhas da cidade, que apresenta todas as belezas e o conforto de uma vida de contemplação, desde fontes de jade até o cultivo da música erudita, de uma biblioteca bem equipada até a hospitalidade calorosa dos lamas, que comungam da filosofia da moderação, que diz que tudo deve ser moderado para que se mantenha o equilíbrio. Parece uma espécie de Utopia, uma versão oriental da terra de Thomas More.

    Mallinson reluta mais do que todos em ali permanecer, colocando constantemente a necessidade de saírem dali o quanto antes, pois havia algo de misterioso e estranho no ar daquele lugar. Assim, não demora para que discussões sejam travadas entre Conway e Mallinson e para que os mistérios do lugar sejam questionados.

    James Hilton nos mantém em dúvida até o último momento, testando-nos como o fizeram a Conway, que oscilava como um pêndulo entre considerar o que lhe fora dito como verdade ou como mentira. Tudo parece conspirar para que acreditemos na história e queiramos permanecer na cidade para também termos a longevidade tão propalada pelo mestre de todos os lamas, mas será que isso é realmente verdade? As leis da natureza deixam de imperar nesse novo contexto? Supondo que se deixe a cidade, não se estaria deixando a oportunidade de uma longa e feliz existência?

    James Hilton realmente criou um suspense digno de deixar-nos com um grande ponto de interrogação pululando na mente. Não lhes conto o final porque isso acabaria com toda a graça da história.

    Texto de autoria de Lucas Deschain.

  • Anotações na Agenda 07 | Leitura de E-Mails

    Anotações na Agenda 07 | Leitura de E-Mails

    Sincronizem suas Agendas. Flávio Vieira (@flaviopvieira), Rafael Moreira (@_rmc), Bruno Hecates Gaspar, André Kirano (@kiranomutsu), Levi Pedroso (@levipedroso) e Kell Bonassoli (@kellbonassoli), a primeira participante feminina da história do Vortex (!!!) se reúnem para ler os comentários e emails das edições anteriores. (mais…)

  • Crítica | Millennium: Os Homens que Não Amavam as Mulheres (2011)

    Crítica | Millennium: Os Homens que Não Amavam as Mulheres (2011)

    O primeiro plano que o espectador vê, logo no início de Millenium: Os Homens que Não Amavam as Mulheres, é a paisagem de uma vila sueca. Branca, fria e nevada. Tudo é perfeito. Tudo está em ordem.

    Pela beleza e “asseio”, o local remete muito mais a um cenário adequado a histórias natalinas ou a um conto de fadas infantil que a um thriller policial, costurado por assassinatos em série, esquartejamentos, estupros e relações incestuosas.

    E esse é justamente o truque. As coisas aqui não são o que parecem. Aliás, quase nunca são. É sabido que as ações mais sombrias costumam se disfarçar sob uma fachada de civilidade, gentileza e harmonia. Embora não pareça, o pior do ser humano está escondido naquela ilha de beleza gélida.

    Além de um conto policial muito bem construído, “Millenium: Os Homens que Não Amavam as Mulheres” é uma crítica contundente à hipocrisia imposta pela aparência. Ao quanto as percepções podem ser enganadas – muitas vezes de forma até letal – por noções superficiais de perfeição e normalidade. Neste caso, o clichê é mais que válido: imagem não é nada.

    O diretor David Fincher (Seven, Alien 3, Clube da Luta, O Quarto do Pânico, Zodíaco, A Rede Social) escancara essa noção ao adaptar a obra de Stieg Larsson – criador do best-seller que deu origem ao filme e das outras duas partes que formam a trilogia Millenium, A Garota que Brincava com Fogo e A Rainha do Castelo de Ar. A trama começa quando o jornalista Mikael Blomkvist (Daniel Craig) recebe um telefonema em plena noite de Natal. Seu interlocutor, do outro lado da linha, o convida a ir até uma ilha afastada, na parte mais fria do território sueco, para ouvir uma proposta.

    Blomkvist acabou de sofrer uma derrota nos tribunais por ter feito acusações sem provas contra um financista. Sua carreira e credibilidade, bem como sua vida pessoal, estão abaladas. Ele não tem muito a perder. Por issso, decide ir até o local.

    Ao chegar lá, conhece o industrial Henrik Vanger (Christopher Plummer). Ele quer que o jornalista conduza uma investigação para descobrir quem é o assassino de sua neta, Harriet, desaparecida desde 1966. O milionário está convencido de que ela foi assassinada por um dos integrantes da própria família – todos moradores da mesma ilha – e quer provar sua tese.

    O repórter reluta. Mas diante dos benefícios oferecidos por Vanger – um deles diretamente ligado a seus probelamas com a Justiça -, acaba aceitando.

    A partir daí, a trama avança sobre dois trilhos que acabarão se unindo: a investigação feita pelo jornalista e o desenvolvimento de Lisbeth Salander (Rooney Mara, excelente), disparada a melhor e mais profunda personagem da história, e que também irá auxiliar o repórter na solução do mistério.

    Hacker e investigadora com habilidades raras, Lisbeth não guarda espaço para sentimentos ternos. Eles existem, mas ela os mantém presos o mais fundo possível. A única coisa que importa é seu trabalho, ao qual se entrega com uma objetividade obsessiva. De fato, a jovem de 23 anos é tão direta e objetiva que transfere essa abordagem até mesmo para sua vida sexual. Ela tem as respostas. Ela precisa estar no comando.

    É uma personagem de emoções primárias acentuadas – raiva, medo, timidez e fúria. Ao mesmo tempo, é possuidora de um forte senso moral. Certamente o mais sólido entre todos os que compõem a história.

    Ao longo do filme, Lisbeth aparecerá em quatro cenas sexuais – dessas, apenas duas são consentidas. Repare como nessas últimas, é ela quem dá as cartas. Já a primeira mostra o que ela está disposta a tolerar para continuar com o seu trabalho. A segunda, é um ato de violência – pelo qual a hacker e sua particular noção de Justiça farão com que o perpetrador pague da pior forma possível.

    A abordagem visual escolhida por Fincher reflete a frieza e aparência de normalidade que formam o cenário ao redor dos personagens. A estética é “clean”. A luz é dura e branca, fazendo um paralelo com o ambiente coberto de neve da ilha.

    As exceções ficam por conta das imagens referentes ao dia do desaparecimento de Harriet, quando todas as cenas são banhadas por um filtro dourado. Metáfora visual para dias mais ensolarados e felizes que já foram vividos naquela ilha.

    Repare como, em pelo menos dois momentos, o cineasta retrata Blomqvist em planos gerais, pequeno diante de um ambiente nevado e frio. Nessas duas situações, o repórter tenta, sem sucesso, usar seu telefone celular. Não é possível. Não há sinal. A mensagem é clara: o jornalista está isolado na sua busca pela verdade e diante do enigma que precisa decifrar.

    Craig empresta a fragilidade necessária à construção do repórter. Nem pense em ver o atual intérprete de James Bond realizando as mesmas ações dos filmes de 007. De jeito nenhum. Aqui, ele está até mesmo fisicamente mais fraco e magro. Uma aparência que ressalta o quanto ele pode ser uma presa fácil naquela trama.

    A cenografia contribui para a sensação de frieza e isolamento. Quer exemplos? Na ilha, há dois tipos de imóveis: os muito pequenos, velhos e frios e os novos e modernos – esses últimos, principalmente a casa do personagem Martin (Stellan Skarsgärd) – são assépticos e extremamente impessoais. Quase sem traços de humanidade.

    A trama é desenvolvida no ritmo de uma locomotiva: começa lenta e pausada – como todo bom início de investigação – e depois acelera rumo à solução definitiva do mistério, onde se chega por meio de uma longa e exaustiva análise de provas, informações cruzadas, entrevistas e imagens. Mas atenção. Fique atento. Este filme possui dois finais. Não se preocupe. Não se trata de anticlímax. É apenas a amarração de todas as pontas do enredo.

    Vale uma menção muito especial à trilha incidental criada por Trent Reznor, o líder da banda de Rock/Tecno/Industrial Nine Inch Nails. Repare na tensão e agonia que seus teclados etéreos e ruídos eletrônicos provocam em cada cena. Isso sem falar na excelente versão que ele e Karen O (a vocalista dos Yeah Yeah Yeahs) fazem para “Immigrant Song”, do Led Zeppelin, que já podia ser ouvida no primeiro trailer e que aqui está nos créditos iniciais do filme.

    Aliás, por falar na presença de Reznor, nesse sentido o próprio Fincher faz questão de dar uma piscadela para o público: logo no início do filme, um especialista em informática aparece usando uma camisa com o logotipo do Nine Inch Nails (NIN).

    Ao fim de “Millenium: Os Homens que Não Amavam as Mulheres”, pelo menos duas mensagens ficam muito claras: a primeira é que o mal de verdade é insidioso e está mais perto do que imaginamos.

    A segunda – e aqui não há qualquer intenção de pieguice ou conselhos de auto-ajuda – é que não importa quanto dinheiro você tem, quais roupas você veste ou quão alto você está na escala social. São suas ações que farão de você uma pessoa boa ou ruim.

    Duvida?

    Assista o filme e depois reflita…

    Texto de autoria de Carlos Brito.

  • Crítica | O Garoto da Bicicleta

    Crítica | O Garoto da Bicicleta

    Rejeição. Quem consegue lidar bem com ela?
    Todos já fomos rejeitados por alguém. Sabemos o quanto isso pode magoar, machucar e deixar marcas que levam tempo para serem cicatrizadas. Isso quando a cicatrização é possível.

    No entanto, na maioria das vezes, e sobretudo depois que nos tornamos adultos, as regras do jogo social nos obrigam a disfarçar esse mal estar e não deixar transparecer os efeitos devastadores que a rejeição de alguém que amamos pode provocar. Rejeição paterna, então…

    Sinceramente, ninguém nasceu ou está totalmente preparado para conviver facilmente com essa emoção.

    O que aconteceria, porém, se pudéssemos acompanhar a vida de alguém que não tem a menor preocupação em ocultar o quanto lhe transtorna o fato de ser rejeitado por uma pessoa fundamental em sua vida?

    É justamente esta experiência que temos em O Garoto da Bicicleta, longa mais recente dos irmãos belgas Jean-Pierre e Luc Dardenne. Uma observação aguda dos efeitos da rejeição e do poder transformador que o amor de uma mulher pode provocar na vida de um jovem perdido.

    Ao externar a tristeza pelo afastamento de seu pai, o jovem Cyril Catoul – interpretado de forma magnífica por Thomas Doret – expressa toda a fúria e frustração da forma mais intensa, violenta e descontrolada possível. As emoções mais agressivas e viscerais vêm à tona sem qualquer tipo de freio.

    Ele quer encontrar e ser aceito pelo pai. E nada, nem ninguém, pode ficar no seu caminho. Por isso, Cyril é grosseiro, indisciplinado, agressivo e incontrolável. Um desafio para os educadores que trabalham no internato onde está trancado há um mês. Um teste pesado no exercício de tolerância e amor posto em prática pela cabeleireira Samantha (Cécile de France).

    Logo no início, os dois se encontram de forma acidental, quando Cyril tenta entrar no apartamento do seu pai. Há uma identificação entre ambos quando Samantha devolve ao jovem a bicicleta que lhe havia sido roubada – único símbolo da união paterna que lhe restou. Os dois – o jovem e a mulher – passarão a se ver nos fins de semana.

    A história deslancha.

    Cyril é retratado quase que todo o tempo com uma camisa ou casaco vermelhos. Símbolo visual da raiva que há dentro dele. Há apenas dois ou três momentos ao longo da película nos quais ele está vestido de azul – quando está dormindo e durante uma cena num tribunal.

    Ou seja, quando não está ligado às suas emoções, uma vez que não se encontra desperto, ou já mais à frente, quando sua própria personalidade está em transformação. Logo, é possível entender que, durante todo o tempo no qual está consciente, Cyril é guiado pela raiva e frustração. E esse sentimento de fúria só piora quando finalmente encontra a figura paterna que, ao invés de aceitação e carinho, dá ao garoto apenas a certeza de que ele não o deseja. Que quer vê-lo o mais longe possível.

    O mal estar e o constrangimento da cena do encontro entre pai e filho são transmitidos de forma tão honesta, que fica difícil não sentir pelo menos um certo desconforto. O corte dado pelo pai levará o jovem à substituição dele por uma perigosa figura paterna e às consequências dessa aproximação.

    A raiva, por ser cega, sempre pode ser direcionada para o mal. Basta que alguém mais malicioso e observador perceba isso. E essas consequências também chegam à vida de Samantha, que ignora os problemas causados pelo jovem e insiste em acolhê-lo movida por um sentimento que talvez nem ela mesma consiga descrever. Amor materno? Talvez…

    Os irmãos Dardenne registram toda a trama de forma naturalista. Sua câmera é quase voyeurística – parece estar espiando secretamente a vida dos personagens. Preste atenção especial às cenas gravadas dentro do carro de Samantha. A maneira como a lente passeia da direita para a esquerda e vice-versa, extremamente próxima, contrapondo os rostos dela e do jovem.

    De um lado, amor. Do outro, cólera.

    Há um embate emocional. Atenção especial também à cena retratada no pôster do filme, quando ambos passeiam num dia ensolarado à beira de um lago. Pouco mais à frente do fotograma usado no cartaz, eles trocam de bicicletas. Essa troca, entretanto, guarda um significado bem maior que a cessão de um veículo.

    Ao pedalar a bicicleta de Samatha, Cyril mostra – de forma metafórica – que os sentimentos de amor oferecidos a ele pela cabelereira desde o início da trama finalmente estão fazendo efeito. Ele está se transformando. E essa transformação é testada na sequência final, quando o próprio garoto é vítima de um ato de violência.

    Ao fim, os dois cineastas deixam uma mensagem: a rejeição vai te fazer sofrer e sentir raiva. Mas o amor da pessoa certa pode te transformar. No fim das contas, a escolha é pessoal. E Cyril faz a dele.

    Texto de autoria de Carlos Brito.

  • Crítica | Sherlock Holmes: O Jogo de Sombras

    Crítica | Sherlock Holmes: O Jogo de Sombras

    A temporada dos blockbusters deste ano começou, para nós brasileiros, com uma estréia atrasada de 2011, mas foi em grande estilo. Sherlock Holmes – O Jogo de Sombras, continuação do filme de 2009 (que por aqui saiu já em 2010), traz novamente Guy Ritchie na direção e Tony Stark no papel principal. O que? Tudo bem, vamos fingir que o nome “real” dele é Robert Downey Jr.

    Em 1891, grupos nacionalistas promovem atentados por toda a Europa, gerando um clima de desconfiança e medo, e uma guerra mundial parece iminente. Sherlock Holmes tem certeza de que por trás de tudo está o gênio conspirador James Moriarty, um respeitado acadêmico e colaborador do governo britânico. O problema é que, mesmo se dedicando febrilmente ao caso, o detetive não tem provas concretas, e pra piorar, seu fiel amigo John Watson está prestes a se casar e nem um pouco disposto a ajudá-lo em suas loucas aventuras.

    Tudo nesta seqüência evoluiu muito em relação ao primeiro filme, que se sustentava quase que unicamente no carisma do protagonista. As investigações de Holmes, sempre baseadas num dom de observação praticamente sobre-humano, ganharam muito mais espaço. Continuam as ótimas cenas de ação, com Ritchie mais Zack Snyder do que nunca, um tom humorístico muito forte, e a inevitável pegada steampunk, com tecnologia revolucionária explosões mil. Porém, isso não fica forçado, pois a trama enfoca justamente a indústria de armas e sua rápida evolução.

    Mas onde o filme realmente supera folgadamente seu antecessor, é no vilão. O clássico arquiinimigo de Holmes possibilitou uma história mais grandiosa e ousada, e um sensacional embate intelectual entre dois gênios. Tão empolgante que não incomodam nem por um segundo os clichês monstruosos de 1) vilão como uma cópia evil do herói, e 2) Associar uma partida de xadrez aos estrategistas e seus planos.

    Falando das atuações, Downey Jr. parece até mais a vontade no papel, somando ao sotaque inglês meio mequetrefe um ar perturbado totalmente dorgas, mano. Jared Harris está absurdo como Moriarty, chegando até a roubar a cena do herói em vários momentos. Jude Law, como deveria ser, faz um Watson discreto, o contraponto perfeito a Holmes. Já a cigana Simza vivida por Noomi Rapace não serve pra muita coisa fora movimentar a trama na direção necessária, a delícia Rachel McAdams reprisa o papel de Irene Adler numa (infelizmente) curta participação, e Stephen Fry faz uma divertida ponta como Mycroft Holmes, o irmão de Sherlock, mostrando uma afetação britânica nível máximo.

    Como ponto fraco, vale citar a fotografia muito escura em alguns momentos. Tudo bem que é um filme de época e a iluminação não era grande coisa, mas cinema é espetáculo, eu gostaria de VER tudo o que acontece! Além disso, alguns momentos mais dramáticos ficaram deslocados, mesmo sendo bem executados, devido ao clima comédia predominar durante a maior parte do filme. Nada que tire o brilho dessa aventura divertidíssima, que certamente vale o ingresso. E dando spoiler da última cena, tomara que a resposta seja “não”.

    Ps: Sei que já tem um filme brasileiro disso, mas… uma continuação adaptando O Xangô de Baker Street. Pensem o quão ÉPICO seria.

    Texto de autoria de Jackson Good.

  • Crítica | Sherlock Holmes (2009)

    Crítica | Sherlock Holmes (2009)

    Baker Street, Apartamento 221B.
    Aproveitando a chegada da nova adaptação, sobre o detetive mais famoso do mundo, Sherlock Holmes (não nerds, não é o Batman), decidi fazer um review rápido sobre o que achei do primeiro filme.

    Filmes sobre o Holmes não são novidade. Desde que a obra caiu em domínio público, tivemos a oportunidade de conhecer diferentes versões do detetive inglês, até mesmo Jô Soares fez a sua. Com Guy Ritchie, a coisa não poderia ser diferente.

    Quem esperava ver algo idêntico aos livros vai perder tempo. Não que não exista o Sherlock dedutivo, tem sim, mas o gentleman inglês, a persona séria, arrogante e um tanto enigmática, é quase nula nessa adaptação. Isso é natural, tendo Guy Ritchie na direção, um diretor autoral que, evidentemente, vai deixar sua marca no filme, a menos que fosse barrado pelos produtores, o que parece não ter acontecido.

    Ritchie aborda a faceta mais aventureira do herói, enaltece sua paixão pelo boxe a um novo patamar e o despe da seriedade londrina, que é tão comum em seus livros. E é claro que não faltam os ótimos diálogos (rápidos e afiados), takes em slow motion que antecedem algumas ações, personagens sujos e porradaria, detalhes que Guy Ritchie adora colocar em seus filmes, tudo isso somado a excelente trilha de Hans Zimmer.

    Mesmo com o inglês britânico um pouco forçado, Robert Downey Jr. esbanja carisma na construção de seu personagem. Jude Law trabalhou muito bem e teve uma ótima química com seu parceiro. O vilão interpretado por Mark Strong enche a sala cada vez que aparece. O único problema no elenco é Rachel McAdams que veio com a proposta de fazer o papel de sedutora no filme, mas não consegue cumprir bem isso, felizmente não é nada que prejudique a história.

    O plot é básico, após Lord Blackwood (Strong) ser capturado por Holmes e Watson e ser entregue a Scotland Yard, acaba sendo condenado a morte, pelo assassinato de 5 mulheres, envolvendo rituais de magia negra. Com a resolução do caso e sem nenhuma investigação que instigue sua mente dedutiva, Holmes se isola do mundo aguardando algo que atraia sua atenção. A trama tem suas reviravoltas, Holmes demonstra toda sua perspicácia de grande detetive e a história deixa em seu desfecho a apresentação de um grande inimigo de Holmes.

    Sherlock Holmes não é o melhor, nem o pior filme de Guy Ritchie. Tem seus méritos, já que conseguiu fazer um grande blockbuster sem perder sua assinatura.

  • Crítica | 2 Coelhos

    Crítica | 2 Coelhos

    O estreante Afonso Poyart cria uma narrativa inédita no cinema brasileiro, vomitando uma série de referências à cultura pop, aos quadrinhos (a apresentação de seus personagens é um bom exemplo), games (uso de computação gráfica simulando jogos como GTA) e o próprio visual nos remete a alguns diretores do cinema norte-americano, como Zacky Snyder, além de uma narrativa visivelmente influenciada por grandes mestres como Quentin Tarantino. Contudo, essas referências servem apenas como elementos no universo apresentado pelo cineasta. As influências existem, mas em nenhum momento a identidade da nossa cultura é perdida.

    2 Coelhos conta a história de Edgar, que passa seus dias ou vendo filmes pornográficos em seu computador ou jogando videogame em sua TV. Seus planos como jovem adulto não deram certo e agora ele elabora um plano complexo em que visa resolver dois problemas simultaneamente ao concretizá-lo. No decorrer do filme, descobrimos a ligação do protagonista com Walter (Caco Ciocler) e Julia (Alessandra Negrini).

    Com uma estrutura narrativa não-linear e intervenções gráficas para explicar alguns trechos da história, 2 Coelhos é mais do que competente. Apesar do excesso visual, o que acabamos vendo é algo autêntico. O roteiro do próprio Poyart fala de temas recorrentes no cinema brasileiro, como corrupção e violência, com um ar de filme noir. Edgar é um personagem dúbio, com narração em off, Alessandra Negrini é a femme fatale, e que lugar melhor para ambientar uma história do gênero do que na cinzenta cidade de São Paulo.

    Assim como em Tropa de Elite, a trama expõe um Brasil corrupto, com leis que beneficiam os favorecidos e prejudicam aqueles que realmente precisam dela. Contudo, o filme não tem a pretensão de colocar o dedo na ferida e escancarar as mazelas sociais do povo brasileiro e nem de ir à fundo na corrupção. Até porque não é esse o objetivo do longa. O filme é uma forma de desabafo, mas mais do que isso, 2 Coelhos quer mais é brincar com o tema de forma ácida do que fazer um filme-denúncia.

    A direção e fotografia são mais do que competentes, mas pecam pelo excesso, porém é algo que é facilmente relevado levando em conta que este é o primeiro filme do diretor, além do que, a forma como o roteiro se encaixa com o desenvolvimento da trama faz com que esqueçamos isso. Destaco a cena de tiroteio que ocorre na praça Roosevelt, em São Paulo, digna de filmes policiais norte-americanos com grande orçamento.

    O elenco tem seus problemas e acertos. Fernando Alves Pinto se sai muito bem como protagonista, é um personagem que sabe o que quer. Alessandra Negrini (sempre linda) parece não se firmar na sua personagem e em alguns momentos parece ligada no piloto automático. O mesmo não pode se dizer de Caco Ciocler que praticamente não tem diálogos durante o filme e ainda assim rouba a cena, tudo isso apenas com expressões corporais. Roberto Marchese interpreta o deputado Jader e coloca todo o cinismo necessário para tornar crível algumas ações do mesmo. Por último, mas não menos importante, Marat Descartes é Maicom, um vilão que não mede esforços para alcançar seus objetivos, uma pena que sua personagem exagere na “canalhice”.

    2 Coelhos é um filme que cresce cena-a-cena e até o final da trama se consolida como algo que vai muito além do visual. O cinema brasileiro agradece.

  • Crítica | As Aventuras de Tintim

    Crítica | As Aventuras de Tintim

    Ao chegar no fim de As Aventuras de Tintim fica difícil, mas muito difícil mesmo imaginar que qualquer outro diretor possa fazer uma adaptação do principal personagem do cartunista Hergé tão impressionante quanto a realizada por Steven Spielberg.

    A ideia de se levar Tintim às telas é antiga. Afinal, ele mesmo, o próprio personagem, também já passou dos 80 anos: sua primeira publicação data de 1929. Por todo esse tempo de existência, não é difícil imaginar quantas pessoas já imaginaram como seria ver as aventuras do jovem repórter na tela grande.

    Também é fato conhecido há bastante tempo na Europa que, tanto o artista belga quanto a crítica – sobretudo a francesa -, acreditavam que Spielberg era o homem certo para o trabalho. Diz a lenda que Hergé ficou encantado depois de ter assistido Caçadores da Arca Perdida e que viu no cineasta americano a pessoa ideal na transposição de sua criação mais conhecida para a sala escura.

    E agora que o filme chegou ao circuito, é possível afirmar: ele estava absolutamente certo. Spielberg acerta do início ao fim em “As Aventuras de Tintim”. E o primeiro acerto precede o filme em si.

    A opção por usar cenários virtuais e o recurso da captura de movimentos foi preciosa. Os principais detalhes encontrados nos personagens que formam a história de Tintim nos quadrinhos estão lá: o capitão Haddock, os inspetores Dupont e Dupond e o fox terrier Milu – que, aliás, em vários momentos se transforma no personagem principal do filme.

    Todos retratados com uma fidelidade que dificilmente vai decepcionar quem acompanha as viagens dos personagens nos álbuns originais. É a prova do respeito que o cineasta tem pelo material original. Ou seja, a caracterização está mantida.

    Imaginar uma versão com atores reais chega a dar calafrios. Isso porque determinados personagens têm características físicas tão cartunescas – traços exagerados ou minimalistas, retratação em cores berrantes – que torna praticamente impossível imaginá-los sendo vividos por seres humanos.

    São justamente os exageros visuais dessas criações que nos transportam para outros lugares e garantem a fantasia. E quando se fala em fantasia, de fato ninguém supera Spielberg. Um dos maiores clichês sobre o cineasta é dizer que, em boa parte de suas obras, ele ainda mantém um olhar de criança ao filmar. Tintim comprova a afirmação.

    “As Aventuras de Tintim” é um filme de ação desde o início. Sem o menor pudor de se assumir como tal. E esse talvez seja um de seus maiores méritos. O ritmo é acelerado, porém os cortes não são fragmentados – aqui não há o que se convencionou chamar de “estética MTV”. Trata-se de uma ação contínua: uma cena puxa a outra e a outra e a outra e assim por diante.

    Muitos poderão até achar engraçado, mas ver esse filme faz imaginar o quanto Spielberg deve ter assistido as obras de François Truffaut. A câmera é de uma leveza e fluência assustadoras, que lembram muitos momentos do autor francês. E o meio virtual no qual a produção foi registrada rompe qualquer amarra que a realidade física poderia impôr ao cineasta.

    A construção dos personagens fica em segundo plano, porém não é esquecida. E nesse ponto, nenhum chama mais a atenção que Haddock. Talvez para dar um pouco mais de drama e sofrimento, no filme o capitão é bem mais viciado em bebida que nos quadrinhos – o que, certamente, aprofunda sua fragilidade e, por consequência, sua dimensão humana.

    E aqui cabe sublinhar mais um trabalho primoroso do ator Andy Serkis. Que ele não fique estigmatizado, mas o homem se tornou um mestre na composição de personagens virtuais, vide o “Gollum” de O Senhor dos Anéis e o César de Planeta dos Macacos – A Origem.

    Em meio a tantas cenas de ação bem construídas, com muitos tiros e socos – quem leu os quadrinhos sabe que as histórias de Tintim não podem ser exatamente classificadas como “infantis”. Esse é um erro recorrente – , uma delas se destaca: preste muita atenção na sequência da fuga do castelo, no Marrocos. Se você não se movimentar na cadeira pelo menos um pouco com a agilidade das tomadas e a sucessão de cenas para se chegar à conclusão da sequência, acredite: há algo errado contigo.

    Outro excelente momento ocorre quando Haddock finalmente se lembra da história contada por seu avô – fundamental para a compreensão da trama. Repare na precisão da sequência de fusões e flashbacks que o diretor cria para que a história fique coerente aos olhos do espectador.

    É um filme para sair da sessão de cinema pensando seriamente em descer escorregando pelo corrimão da escada. Para voltar a se sentir um pouco como os garotos que já fomos numa época de nossas vidas. Sensação semelhante à que experimentamos quando assistimos Indiana Jones.

    Aliás, veja como Tintim, numa das cenas citadas acima, utiliza uma motocicleta com sidecar muito parecida como a usada por Harrison Ford e Sean Connery em Indiana Jones e a Última Cruzada.

    Há quem veja muitas semelhanças entre o repórter criado por Hergé e o arqueólogo concebido por Spielberg e George Lucas.

    Sinceramente: bendita semelhança.

    Texto de autoria de Carlos Brito.

  • 20 Filmes Essenciais de 2011 (Parte Um)

    20 Filmes Essenciais de 2011 (Parte Um)

    Fazer uma lista de melhores filmes nunca é uma tarefa fácil. A quantidade de filmes é sempre enorme, o tempo escasso e as reclamações por esquecer de algo é sempre frequente. Por mais que você deixe claro se tratar de uma lista pessoal, sempre vai aparecer alguém reclamando sobre algum filme que foi deixado para trás ou pelo filme tal estar nessa lista. Pois bem, ainda assim decidi fazer essa lista, mas optei por deixar de lado o quesito “melhores filmes”, por um amigável “filmes essenciais”, quem sabe evito futuros conflitos.

    Preferi listar os filmes que tem estréia em 2011 nos seus países de origem, do contrário estaria presente Bravura Indômita, Cópia Fiel e tantos outros de 2010 mas que chegaram no Brasil apenas em 2011. Deixei de lado alguns blockbusters de lado, pelo simples motivo de já terem sido comentados na lista feita pelo Jackson, o que caso não tivesse ocorrido, certamente figurariam por aqui.

    Dito isso, vamos à primeira parte da lista (a listagem abaixo não segue ordem de preferência).

    Margin Call – O Dia Antes do Fim
    Um filme que retrata a crise norte-americana de 2008 com um clima digno de filme de ‘catástrofe’ ou de ‘fim de mundo’. O que se olharmos bem, faz todo sentido. A história 0corre durante a madrugada, em um banco de investimentos que acaba de descobrir que a bolha já estourou, sua única alternativa é vender todas as ações, títulos e papéis que a empresa tem para evitar a falência.

    Margin Call acerta onde outros não chegaram nem perto, como o caso de Wall Street 2. A forma como retrata o colapso do mercado financeiro de forma e a ganância do capitalismo selvagem é digna de aplausos. Tudo isso somado a um estelar elenco.

    Compramos Um Zoológico
    Ok, o filme não é tudo isso. Eu sei disso, mas Cameron Crowe consegue mesclar um drama familiar com comédia sem soar clichê. Só por isso sua empreitada já é louvável. Apesar de errar a mão na construção de alguns personagens e se estender mais do que deveria, Crowe dá um banho de sensibilidade. Singelo e cheio de sutilezas.

    Compramos Um Zoológico é um filme sobre descoberta de novas oportunidades, negação sobre a morte e de como se reencontrar após uma perda como essa, enfim, seguir em frente. Uma ode ao otimismo e ao recomeço.

    50%
    O longa-metragem do novato Jonathan Levine tinha tudo para  ser um daqueles filmes feitos para você chorar do início ao fim, retratando o dia-a-dia de um paciente com câncer. Confesso que esse gênero de filme não me agrada nenhum pouco e boa parte deles tem um papel social péssimo, mais atrapalhando do que ajudando. Levine deixou de lado o mar de prantos proporcionado por esses tipos de filmes e faz um filme leve e divertido sem deixar de lado o drama vivido pelo personagem, e acima de tudo, sem soar desrespeitoso.

    O título faz menção a porcentagem que o protagonista tem de sobreviver a doença, e diferente dos filmes do mesmo gênero, 50% busca uma visão otimista para o tema, inclusive ao mostrar a dor dos amigos e parentes próximos, as dúvidas sobre o futuro que uma pessoa nestas condições tem. Destaques para as atuações e a incrível trilha incidental de Michael Giacchino e o belo fechamento com Yellow Ledbetter do Pearl Jam. Delicado, autêntico e uma grande lição de obstinação.

    O Guarda Ouça nosso podcast sobre o filme
    O Guarda deixa claro a máxima de que ‘Todas as histórias já foram escritas, o que importa é a forma como elas são contadas’. E de fato é isso que o filme faz. O diretor John Michael McDonagh resgata o gênero de ‘dupla de policiais’ com pitadas de um western moderno. Brendan Gleeson, em uma interpretação recheada de nuances que vai de policial racista, rabugento, acomodado e por vezes corrupto, mas que não deixa de ser extremamento competente e verdadeiro em suas ações.

    Despretensioso, cínico, sarcástico, inteligente, divertido e até mesmo melancólico em alguns momentos, O Guarda vira o gênero do avesso e tudo isso sem soar gratuito ou ofensivo.

    Rango Ouça nosso podcast sobre o filme
    Como um grande admirador do gênero Western, não poderia deixar Rango fora de uma lista de filmes de 2011. Reunindo todas as referências típicas dos filmes de faroestes, um roteiro simples e uma animação impecável, faz de Rango a melhor animação de 2011 disparado. O roteiro tem seus problemas, o fato de seguir o padrão ‘jornada do herói’ me cansa um pouco, contudo, o diretor Gore Verbinski conseguiu contornar bem isso e transformar o personagem título de um andarilho-errante em um grande herói utilizando bem os clichês do próprio gênero.

    Só pela coragem de fugir de convenções gratuitas e infantiloides típicas de animações infantis que teimam em julgar que crianças são bobas, Rango já merece ser aplaudido de pé. A Pixar que se cuide.

    Tudo Pelo Poder Ouça nosso podcast sobre o filme
    Ambientado nas primárias do partido democrata americano onde buscam definir quem será o candidato a concorrer a eleição a presidência do país, Tudo Pelo Poder é certeiro ao escancarar o quão corruptível o mundo político pode ser, seja na figura do idealista Stephen Myers (Gosling), ou na do próprio candidato e atual Gorvernador Mike Morris (Clooney).

    Tupo Pelo Poder não é o primeiro filme ao retratar o jogo político, mas sua abordagem inicial cria um clima de morte da inocência e coloca o espectador na linha de frente para assistir ao assassinato sem puder fazer nada para mudar isso. Transformando-o quase num cúmplice do que ocorre em tela.

    Another Earth
    Another Earth traz uma premissa de que um planeta espelho a Terra acaba de ser identificado em nosso sistema solar. Um planeta idêntico ao nosso, como disse, um planeta espelho. Com base neste fato, o destino de dois personagens se cruzam e suas vidas nunca mais serão as mesmas.

    O que você faria se encontrasse uma versão de si mesmo?” são um dos questionamentos que o filme traz, o que pode parecer uma idéia absurda, mas metaforicamente, muitos de nós, ao se olhar frente à um espelho não se deparou com uma figura que não é familiar a si mesmo, uma figura de quem se perdeu durante o caminho, fez um escambo com aquilo que eram seus sonhos e seus ideais. Complicado dizer o que criticar em um filme como esse, apesar de um drama com fundos de ficção científica, Another Earth não é pretensioso e nem se estende mais do que deveria, dura somente o necessário e passa sua mensagem a quem estiver disposto a ouvi-lá.

    É preferível tentar viver sem saber o que pode te esperar ou continuar vivendo em desgraça e sofrimento?

    Árvore da Vida – Ouça nosso podcast sobre o filme
    Infelizmente Árvore da Vida foi um daqueles filmes onde se comenta mais sobre as saídas dos espectadores do longa durante sua exibição nos cinemas que do filme em si. Uma pena, já que deixa claro que boa parte do público não está mais interessada em pensar, apenas digerir pensamentos liquefeitos.

    É lógico que o filme não segue uma história tradicional, talvez por isso tenha sido tão malhado pelas pessoas que achavam que veriam apenas mais um filme do Brad Pitt. A narrativa de Árvore da Vida é composta por imagens, quase sem diálogos, e que em sua essência não passa de uma viagem sobre a existência humana, tudo isso de forma não linear. Um estudo sobre a vida, o amor e os relacionamentos. Uma experiência áudio-visual.

    A Pele Que Habito Ouça nosso podcast sobre o filme
    Almodóvar retoma sua parceria com Antonio Banderas e cria uma obra-prima. Apesar de diferente de seus trabalhos anteriores, A Pele Que Habito tem toda assinatura típica do diretor, obsessões, sexo, solidão, tudo isso num misto de thriller de suspense, ficção científica e horror. Banderas se torna quase um cientista louco, decidido a criar uma espécie de pele perfeita que seria uma revolução entre os cirurgiões plásticos, e como todo cientista maluco, seu personagem não mede esforços e passa por cima de tudo para realizar seus anseios.

    Não vou me alongar nesta pequena resenha, pois qualquer detalhe estragaria a experiência do filme. A Pele Que Habito é um filme que te faz sentir-se desconfortável com o que vê, talvez por isso seja tão genial. Contudo, a maior mensagem do filme é sobre quem somos.

    Meia-Noite em Paris – Ouça nosso podcast sobre o filme
    Woody Allen é um dos meus diretores favoritos e Meia Noite em Paris já entrou para o meu top 10 de filmes dele. Em 2005, Woody Allen começou a filmar na Europa, dessas viagem surgiram Vicky Cristina Barcelona, Scoop, Match Point e outros. Em 2011 foi a vez de Paris e o cineasta acertou em cheio.

    Woody Allen, dessa vez personificado na figura de Owen Wilson é um roteirista de Hollywood que sonha escrever seu primeiro romance, viaja para Paris com sua noiva e seus sogros, e ali sem mais nem menos embarca em uma viagem de volta aos anos de ouro, em plena década de 20, onde tem diálogos incríveis com Hemingway, Pablo Picasso, Salvador Dali, Luis Buñuel (em uma conversa interessantissima sobre seu “Anjo Exterminador).

    Allen cria uma linda história de amor por Paris e por uma época que serviu de catarse para o que viria a seguir.

  • Agenda Cultural 36 | Especial: Séries, Animes e Mangás

    Agenda Cultural 36 | Especial: Séries, Animes e Mangás

    Mais uma edição da agenda chegando e com ela mais uma série de participações de convidados especiais. No bloco de séries tivemos a presença de Hugo Soares do Pauta Livre News, Hell do Melhores do Mundo e Carlos Voltor do Jovem Nerd Adolescente Geek. Ainda neste programa, Laivindil e Darkonix retornam em mais uma participação trazendo suas dicas de Animes e Mangás de 2011. Enjoy it!

    Duração: 88 mins.
    Edição: Flávio Vieira
    Trilha Sonora: Flávio Vieira

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  • Crítica | O Espião que Sabia Demais

    Crítica | O Espião que Sabia Demais

    Vamos deixar bem claro, logo no início do texto, a informação mais importante sobre O Espião que Sabia Demais: trata-se de um filme absolutamente dedicado à espionagem.

    Já sei o que você pode estar pensando.

    “É óbvio que ‘O Espião que Sabia Demais’ é sobre espionagem! Todo mundo sabe disso!”.

    Sim, meu amigo. Mas é justamente aí que você pode se enganar.

    Quando se fala em espionagem no cinema, a associação mais comum é com filmes da série 007 ou, na última década e meia, com os episódios das franquias Missão Impossível e Bourne. Ou seja, filmes com algum – pouco – conteúdo relacionado à espionagem e imensas doses de ação.

    “O Espião que Sabia Demais” não poderia ser mais diferente dos exemplos citados acima.

    Gosta de tiroteios? “O Espião que Sabia Demais” não tem nenhum.

    É fascinado por perseguições de carros em alta velocidade? Em “O Espião que Sabia Demais”, não há uma sequer.

    Aprecia muita pancadaria e explosões? “O Espião que Sabia Demais” passa longe disso tudo.

    Agora que as ressalvas foram feitas e você está advertido, vamos direto ao ponto: “O Espião que Sabia Demais” é uma das melhores películas lançadas nos últimos tempos.

    O filme, como se sabe, é a adaptação do romance homônimo, escrito por John le Carré – um dos mais populares autores de romances de espionagem, responsável por títulos como O Espião que Veio do Frio, o Alfaiate do Panamá e O Jardineiro Fiel. Ele mesmo, ex-espião inglês.

    Na trama, ambientada em 1973 – portanto, durante a Guerra Fria –, logo de cara somos informados que um dos integrantes do Circus, o alto escalão do serviço secreto da Inglaterra, é, na verdade, um agente duplo que vende informações para a KGB, a agência de inteligência da falecida União Soviética.

    O personagem George Smiley (Gary Oldman), que curiosamente havia acabado de ser demitido do Circus, é contatado diretamente pelo gabinete do primeiro ministro e recebe uma missão: investigar o caso para descobrir quem é o traidor.

    E é a partir daqui que o diretor sueco Tomas Alfredson – da excelente versão original de Deixe Ela Entrar – imprime seu ritmo: toda a trama é construída lentamente. Passo a passo. Não há cortes bruscos, nem tempo narrativo acelerado. Pelo contrário. A história flui num ritmo caudaloso que muitos, certamente, poderão considerar arrastado.

    Mas não caia nessa.

    Alfredson sabe exatamente o que está fazendo. Ele dita um ritmo cadenciado e contínuo – com algumas idas e voltas no tempo – para construir um mistério que é impenetrável para quem está assistindo. Acredite: a menos que tenha lido o livro, você dificilmente descobrirá quem é o traidor antes do filme chegar ao fim.

    Por ter esse andamento, as cenas de maior violência – sim, elas existem – são impactantes quando surgem na tela.

    E aqui há um ponto muito importante: este filme é exigente com quem o assiste. Se o espectador resolver deixar a sala por dois minutos para ir ao banheiro ou comprar pipoca, corre o imenso risco de perder o fio da meada e ficar confuso em relação à trama. Logo, faça tudo isso antes do filme começar. “O Espião que Sabia Demais” pede atenção absoluta.

    Os planos são longos e, em boa parte das vezes, estáticos. Os movimentos de câmera, quando acontecem, são incisivos, mas ao mesmo tempo discretos: aproximações , afastamentos e deslocamentos laterias.

    A composição é primorosa. Cada cena é construída com grande cuidado. A fotografia é do suíço Hoyte Van Hoytema, que já havia trabalhado com Alfredson em “Deixe Ela Entrar” e também cuidou da imagem de O Vencedor. Perceba como o trabalho dele, associado ao figurino e à cenografia, remetem imediatamente ao visual europeu da década de 1970.

    Em alguns momentos, a impressão que se tem é que estamos assistindo – pelo menos em termos estéticos – imagens de O Dia do Chacal, de Fred Zinnemann – não por acaso, adaptação de outro clássico da literatura de espionagem, este de Frederick Forsyth.

    Atenção especial à sede do então MI6 – atual SIS, sigla que designa a inteligência britânica. O marrom e seus matizes, além das prateleiras, mesas e arquivos de pastas dominam o ambiente, dando ao local uma inevitável cara de repartição pública. O estoicismo de alguns planos é reflexo da imensa burocracia que aquele local deixa transparecer.

    E no meio de um time espetacular de atores – John Hurt, Colin Firth, Mark Strong, entre outros – Gary Oldman rouba praticamente todas as cenas. É impressionante a postura de contenção que ele imprime ao espião George Smiley. O personagem, mesmo nos momentos de solidão em casa, parece viver num mundo de autocontrole e ordem. Em apenas um ou dois momentos do filme ele ameaça ceder para, logo em seguida, recuperar o controle absoluto que tem sobre si mesmo.

    E se você acha impossível associar Julio Iglesias – ele mesmo. Aquele cantor espanhol brega que sua avó provavelmente adorava – à espionagem, espere até o fim do filme. Você vai se surpreender.

    E aqui, ao fim do texto, vale relembrar a explicação do início: “O Espião que Sabia Demais” é um filme de espionagem.

    Não de ação.

    Acredite: neste caso, isso faz toda a diferença.

    Texto de autoria de Carlos Brito.