Crítica | Jimmy’s Hall
A atmosfera dos anos trinta é saudada logo na introdução da nova produção de Ken Loach, com uma trilha sonora apoiada no jazz, em que o som dos metais faz a dança da crise parecer assustadora. Os fotogramas, unicolores, mostram a população em meio a uma filmagem azulada, passando por árduos percalços, símbolo de um capitalismo decadente, pré-Segunda Guerra Mundial.
Neste mundo, habita o irlandês James Gralton – Barry Ward – que, após uma década inteira longe de seu país depois de deportado, pode retornar à terra que tanto amava, apesar da malfadada tentativa de desvencilhar sua pátria do Império Britânico. As condições simples da casa de seus antepassados revelam muito o modo de viver em que Gralton se insere: sua origem operária é mostrada em cada detalhe pensado pela competente direção artística de Stephen Daly. Caso não houvesse por parte do público qualquer conhecimento sobre a figura de Gralton, muitos dos elementos que compõem sua ideologia socialista seriam evidenciados pelos elementos visuais de cunho humilde que orbitam ao seu redor.
A simples presença de Jimmy no lugarejo incomoda os poderosos. Um representante do clero vai confrontá-lo, sem qualquer sinal prévio de hostilidade, unicamente por este habitar a mesma terra que os “justos homens conservadores”. A paranoia e o medo vermelho já eram presentes no discurso e ação dos britânicos soberanos, mesmo que qualquer resistência por parte dos irlandeses fosse semelhante à execução de cócegas em um ser agigantado, como era a extensão do poder dos servos da rainha. Mesmo diante da disparidade de poderio armamentista, Gralton não sossega seu espírito, ainda que a maturidade tenha feito dele um homem que não se inseriria em confrontos gratuitos.
De volta ao lugar que chamava de lar, James reabriu o salão de dança que abandonou em 1921, fazendo do lazer típico do lugar uma reunião entre amigos eruditos e pessoas cujo pensamento não se restringe ao que os mandatários ordenam. O simples ato de dançar torna-se algo diabólico aos olhos dos descontentes religiosos, como se os passos ensaiados naquele local fossem dar margem para o pensamento anti-cristão. A sociedade é coagida a perseguir aqueles que lá frequentam, enquanto os pais preocupados punem fisicamente os filhos que lá habitam.
O senso de oportunidade do socialista apita, fazendo de seu discurso sobre justiça algo inflamado, justificado em cada crítica pelas ações arbitrárias dos que detêm o poder e, consequentemente, os meios de produção. A simplicidade das coreografias no hall de Jimmy serve como uma forte alegoria para o discurso marxista (semelhante ao que George Orwell fez em Revolução dos Bichos), fazendo valer os preceitos do Manifesto Comunista por meio de metáforas que saltam aos olhos de quem já leu Marx e Engels.
A comoção que James proporciona ao povo é também aplicado a alguns de seus adversários, que não conseguem ver em sua conduta qualquer motivo para desaprovação. O jovem padre Seamus (Andrew Scott) não consegue conter sua fúria ao tentar demover seus colegas dos desejos de cercear a vida do camponês. A perseguição que sofre faz de Galbror um mártir, obrigado a ter de deixar seu país mais uma vez, ainda que suas ações nem tenham sido tão contestatórias. Sua vida seguiria até os anos quarenta, em Nova York, sem poder retornar à sua terra natal, mas ainda munido da coragem de um sujeito que dedicou sua vida a um ideal e a não desistência.