Crítica | The Warriors: Os Selvagens da Noite
Os Selvagens da Noite é um longa-metragem de Walter Hill. Mais conhecido no Brasil por seu nome original The Warriors, tornou-se clássico por conta de sua linguagem singular às influências estranhas que o fez ser reverenciado em filmes e games ao longo dos anos.
O começo da trama chega a ser engraçado de tão lisérgico, tanto pela música, que mistura elementos de disco com eletrônico, mas também pelas cores gritantes que sobressaem no escuro dos letreiros e das ruas nova-iorquinas a noite, seja na roda gigante famosa de Coney Island como também nos trilhos do metrô que servem de estrada pata as tribos, o caminho até seu líder espiritual, o misterioso Cyrus.
O filme também é conhecido por conta da tribo de protagonistas, os Warriors ou Os Guerreiros, como é dito na voz estridente, engraçada e clássica pelo dublador André Filho (que faz a voz brasileira de Luther, personagem de David Patrick Kelly). Apesar de simples, a trama envolve um ideal como um sonho dos mais estranhos, beira até as teorias da conspiração de tão irreal: juntar todas as gangues de Nova York para sobrepujar as autoridades, para então vencer a polícia e demais autoridades.
Cyrus é corajoso, e mesmo sendo encarado como visionário não era tão esperto, visto que não foi capaz sequer de prever o próprio fim quanto mais juntar 60 mil soldados em torno do mesmo objetivo. Há semelhanças entre o líder e outras figuras revolucionarias como Jesus Cristo ou Moisés. Seu destino é tão trágico quanto o dos dois libertadores de Israel. Bastou um louco, um sujeito mal-intencionado, para pôr por terra o esforço do líder dos Riffs.
De qualquer forma, essa premissa é apenas o início do filme de Hill, como os tradicionais mcguffins de Alfred Hitchcock, os momentos após esses atos mostram a correria dos Warriors após o sacrifício heroico de seu líder, Cleon. Nessa empreitada eles passam por outras “turmas” que tem a missão de espanca-los até a morte, passam por brigas pela sucessão da liderança, e repetem clichês de guerra antiga como as disputas de Marco Antônio e Otávio Augusto pela sucessão de Júlio Cesar, repaginando isso tudo de forma engraçada, divertida e popular, envelopadas por um fotografia bem conduzida por Andrew Laszlo.
O filme lembra demais o formato dos jogos beat’ em up, dado que os rapazes só andam, correm, batem e apanham. O roteiro de David Shaber e Hill mostra uma via crucis, uma estrutura que serviria de inspiração para os jogos. Outros elementos estariam também nos games populares posteriores, como o caráter irascível e inconsequente dos personagens, a passagem por diversos cenários diferentes ao longo da trama e, claro, gente com libido mal utilizada que, aliás, parece ser a razão para uma sucessão de atitudes erráticas. Boa parte desses elementos estão presentes nos personagens anti-heróis de GTA e outros jogos que glorificam a violência e a ganância.
Para além das gangues galhofa — há mímicos, jogadores de beisebol maquiados com tinta no rosto e até gigolôs de blaxploitation — o que se percebe é que Nova York é fragmentada até na marginalidade. O crime organizado não parece ter tanta influência nesta versão de mundo, pois mesmo que a história se passe toda numa noite, não é possível que adolescentes dominem as ruas, mesmo que estes aqui pareçam ter meia-idade, todos. Os clichês de filmes de briga ajudam não só a mostrar que esses meninos são ingênuos na juventude, como também serve de denúncia, de como uma geração que não é acompanhada dos pais pode se transviar, mas não de maneira séria, como no clássico Juventude Transviada, e sim de maneira super colorida e estilosa. Mesmo diante dessa simplicidade narrativa, há alguns temas relevantes.
A batalhar final contra os Rogues é cômica e tosca, o Luther de Kelly é derrotado de maneira bastante patética. Definha diante do desafio, e não consegue sobressair sequer em cima de um grupo armado. É uma criança mimada, tola e burra. A justiça das ruas é falha, sujeita a mentiras. Além disso, as turmas que se julgavam acima do bem e do mal são todas ingênuas, o que é até esperado, dado que quem as formam são garotos que mal saíram da infância. Os Selvagens da Noite é icônico e, em simultâneo, banal. Divertidíssimo dentro de sua simplicidade.