Resenha | Amos Gitai – Serge Toubiana
Conferir o livro da Cosac Naify é embarcar numa viagem no tempo. No tempo do cinema, em especial, tão moldado pelas imagens e a relação entre elas. Amos Gitai é a principal homenagem brasileira já publicada ao mestre israelense, introduzindo para muitos os filmes e a visão de mundo de Gitai. Por carregarem a habilidade de transitar, sem esforço nenhum, entre o documentário e a ficção, o livro, uma iniciativa da Faculdade de Comunicação da FAAP, se apropria da exposição Percursos, exibida em Paris em 2003, para transmitir em um estupendo trabalho de curadoria, fotografias de seus filmes com altíssimo poder de impacto visual em nós. Imagens que possuem som, textura, amor e ódio, atenção e desespero próprio em um glorioso mural impresso e colorido, a potencializar a visão ultrarrealista de Gitai sobre o ser humano, suas condições e seu meio ambiente.
Em Diário de Campanha ou Éden, Gitai foi um daqueles cineastas desconhecidos de festivais inacessíveis ao grande público que conseguiam (e faziam parecer simples) expor a alma humana, decodificá-la, numa tela de Cinema. Quantos se deram ao luxo de sequer almejar tal feito? Para enquadrar o conjunto de realizações, primeiramente com total apelo visual, Amos Gitai é um projeto para figurar na estante de qualquer cinéfilo e pesquisador das belas-artes. De posse de tantos quadros retirados dos filmes de Gitai (que realizou quarenta filmes em vinte anos), poderia ser redundante no livro uma entrevista para descortinar, ainda mais, a alma do artista, com seus predicados e motivações pessoais, suas críticas aos sistemas políticos que tanto afetam a vida das pessoas no mundo. Entretanto, a conversa de Serge Toubiana em Nova York com o mestre, ainda no “pré-11 de setembro” ano de 2000, não poderia ser mais sedutora.
Assim, mergulhamos de vez nas entranhas da genial filmografia do israelense, através de suas próprias palavras. Dividida em inúmeras partes, nas quais Gitai discursa sobre Israel, o papel da ficção, o cinema e o cinema de Israel, suas memórias e suas angústias, o modo como as entrevistas são editadas tanto nos esclarecem, quanto nos instigam a saber mais sobre o homem, o artista e o seu tempo. A impressão é que Amos Gitai se consagra uma das grandes obras sobre cineastas já publicadas no Brasil, junto com a de Nelson Pereira dos Santos, de Darlene Sadlier, À Espera do Tempo sobre Akira Kurosawa, Fellini por Fellini e Conversas com Scorsese. Contando ainda com análises profundas sobre seus principais filmes, em ordem cronológica, a paixão pelo trabalho de Gitai ganha um testamento completo, e à altura de seus triunfos principais. Sem dúvida, um dos grandes tratados sobre Cinema já produzidos, nacionalmente.