Crítica | Sobrenatural: A Última Chave
As duas franquias escritas e difundidas pelo roteirista Leigh Whannell são a prova que em Hollywood, o lucro e a qualidade do produto são duas forças das mais opostas, algo que encontra exceção no ótimo e recente Um Lugar Silencioso, mas que seja inferido aqui como a devida exceção que infelizmente é o seu merecido sucesso. Diferente do fantástico filme de John Krasinski, Jogos Mortais e Sobrenatural são fontes que bebem do oportunismo maniqueísta de um dos gêneros que mais, senão o que mais é fraturado e abusado pela ganância desimaginativa e de péssimo gosto dos magnatas do empreendedorismo cinematográfico, promovendo quase um agouro cinematográfico a favor do lucro financeiro de estúdios que veem nas ideias de Whannell (que de bobo, não tem nada) o pretexto perfeito para investirem pouco, muito pouco, e faturarem mais que dez vezes mais nas bilheterias – culpa do público que aceita ser manipulado mais que fantoche nas mãos certas por ‘filmes’ feito Sobrenatural: A Última Chave, de Adam Robitel.
Verte-se então a vontade de se estudar a decadência do terror norte-americano na última década (já que em países como Coréia do Sul ele está bem até demais, obrigado), a despeito de produções que tentam salvá-lo das agruras as quais é submetido ano após ano; gênero órfão que é de figuras como George Romero e Wes Craven, mas que ainda conta com as investidas tímidas de John Carpenter e David Cronenberg para sobreviver aos bombardeiros de Whannell e outros charlatões, adeptos de jumpscares baratos para banalizar os efeitos de um estilo. Na trama, ou melhor, na fórmula requentada de outras bobeiras filmadas com pouca ambição artística e muita ambição monetária, segue os dramas presentes e passados de Elise Rainier, interpretada por Lin Shaye, boa atriz que faz o que pode, na pele de uma médium investigativa que deve voltar as suas raízes para enfrentar uma criatura que assombra a casa onde cresceu.
Uma versão empobrecida, vulgarizada e de sentidos sequestrados e lobotomizados dos dois Invocação do Mal, sendo que por mais fraca que seja a sua sequência, apelando para um terror de shopping e ao entretenimento de seus símbolos ligados ao oculto que aquelas histórias de horror de antigamente eternizaram, ainda consegue manter uma coerência divertida e um gosto mediano no que se refere a tensão e ao suspense que constrói e desconstrói, ao longo da projeção. James Wan, um cineasta ligado a ambos os projetos, saltou do barco antes desse começar a afundar, se apegando direto às histórias baseadas em fatos reais do casal Lorraine, e se deu muito bem. Duas tramas com suas semelhanças de espiritualidade umbralina, sendo uma assombrada, e a outra assombrosa, cujos personagens vivem à mercê de assombrações insanas guiando-as a uma morte compartilhada, mas cuja perturbação que esse quarto Sobrenatural nos traz acaba por ser pior e mais ofensiva que qualquer entidade demoníaca com mãos de chave ou boca desproporcional, à espreita.
Seria este um dos fins apologéticos da inventividade exclusiva do gênero, caso ainda não houvesse a esperança resistente que algumas obras, de longa e curta metragem, como os ótimos filmes de Neill Blomkamp disponíveis no YouTube nos provam, reimaginando o horror nesse mundo, ano após ano, surgindo da inspiração bem aventurada de alguns para iluminar o bom e velho exercício de nos envolver e nos encantar com forças que vivem sob o efeito de múltiplas sombras – ora sedutoras, ora estarrecedoras, o que de nenhuma forma é o caso, aqui.
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