Após Bingo: O Rei das Manhãs e a série da Netflix Samantha, parece haver no ideário dos cineastas brasileiros a vontade de falar abertamente sobre as figuras televisivas dos anos setenta e oitenta. Chacrinha: O Velho Guerreiro tem um pouco disso, apesar de ter sua origem no programa televisivo de 2007, Chacrinha: O Eterno Guerreiro, que celebrou o centenário do homem que é para muitos o maior comunicador popular do Brasil, e como lá, o apresentador Stepan Nercessian.
A composição artística do longa é muito bem feita. Figurinos, cenários e atuações do elenco são excelentes e ajudam a restaurar boa parte da aura das épocas mostradas em tela, mas o roteiro não é nada fluido. Há claramente dois filmes disputando a atenção do espectador, o primeiro, com Nercessian reprisando o papel que fez no especial da Globo, e outro com Eduardo Sterblitch fazendo o jovem Abelardo Barbosa (alcunha civil de Chacrinha), subindo na carreira de radialista. Os tons de ambos intérpretes é diferente demais e esse destoar pesa contra o produto final.
Ao menos a proximidade do diretor Andrucha Waddington de Nercessian e Sterblitch facilitou a composição e atuação, visto que os dois já atuaram com o diretor em Os Penetras e Os Penetras 2: Quem Dá Mais?. O texto de Claudio Paiva erra muito em apressar os fatos. As figuras de Karen Junqueira e Gianne Albertoni executando respectivamente Rita Cadillac e Elke Maravilha são tão bem feitas que a falta de semelhanças físicas entre personagens e pessoas reais é simplesmente ignorável. Óbvio que o longa não tem qualquer pudor em explorar o corpo e as curvas de suas intérpretes, mas ambas conseguem traduzir bem em tela toda a ferocidade que os dois ícones tinham quando estavam no auge, ainda que quase não tenham falas ou diálogos dentro do filme.
A escolha por ser completamente desprendido do politicamente correto foi outro acerto da obra. Nesse quesito, Waddington acerta mais que Daniel Rezende em Bingo, que tem medo de se assumir sacana e mergulha em uma caretice moralista que não tem motivo para acontecer. No entanto, fora a iconoclastia, o longo tem pouco a acrescentar, soando como mais uma cinebiografia sem muito a dizer, mas apenas uma colagem de fatos históricos, ainda assim, é divertido e uma boa forma de relembrar ou conhecer um pouco da cultura de massa televisiva brasileira.