Tag: Stepan Nercessian

  • Review  | Sob Pressão – 2ª Temporada

    Review | Sob Pressão – 2ª Temporada

    Após o filme Sob Pressão de Andrucha Waddington, e sua continuação na primeira temporada da série, finalmente começou o segundo ano, em episódios eletrizantes com a equipe do Doutor Evandro (Julio Andrade) no Hospital Luiz Carlos Macedo, e já em seu início, os personagens se deparam com uma situação limite envolvendo o protagonista e sua amada, Carolina (Marjorie Estiano), ao ter de cuidar de um traficante baleado como reféns dos amigos dele. Por mais fantasioso que seja, a história segue emocionante e plausível dentro da proposta que já havia se estabelecido.

    Uma nova personagem é apresentada, Renata Gomes, uma burocrata que assume a direção que antes era do Dr. Samuel (Stepan Nercessian). A personagem de Fernanda Torres é organizada, porém tem moral dúbia, e sua aproximação do político Roberto Arruda (Marcelo Serrado) a faz se lambuzar com pequenos pecados morais e políticos.

    A partir de certo momento, o roteiro opta por tornar a trama uma lição de moral bastante barata, não só na questão do desvio de verba e super faturamento, mas também com relação ao abandono parental. Os roteiros ficam cansativos ao repetirem demais os clichês temáticos. Há um trabalho ligeiramente melhor com os muitos núcleos, especialmente do terceiro episódio em diante, que desenvolve mais personagens além dos recém-casados Carolina e Evandro. O ritmo frenético em que os personagens estão inseridos os mostram quase como super-seres, com poderes infinitos. Evandro é quase um MacGyver, dado que ele usa cola, camisinha etc em procedimentos por não ter condições ou recursos dentro do hospital, ele se torna o rei do improviso, mas nada que justifique algumas maquiagens hiper artificiais.

    Os arcos dramáticos envolvem um retorno aos vícios por parte de mais um personagem, aspecto esse que faz a série parecer um novelão. Há algumas fragilidades e forçadas dentro do roteiro, como a obrigação de levar Evandro numa feira hospitalar, para conversar com políticos. Este momento serve para quase nada, é irreal e esta ali apenas para estabelecer uma possibilidade de um futuro triângulo amoroso.

    A crise moral de Samuel não faz muito sentido, assim como a insistência do roteiro em tornar os feitos incríveis de Evandro e cia como coisas corriqueiras. Ao menos, a trama mais violenta é bem construída mesmo com os elementos típicos de novelas mexicanas, mas segue irritante a rima narrativa que trata de pacientes alcoólatras ao passo que um dos personagens se recusa a participar dos narcóticos anônimos. Também irrita bastante o fato de Carolina virar detetive da noite para o dia. Aliás, o casal está em crise e toda a desconfiança mútua não faz sentido, pois Evandro havia sido acusado de algo que não fez no primeiro ano, e não vê o mesmo ciclo se repetir com a amada, nem com os diálogos mega expositivos.

    Sob Pressão termina bem pessimista, e é salvo principalmente graças ao desempenho de seu elenco, que tem em Humberto Carrão um dos melhores chamarizes, com o ortopedista Henrique, um personagem com camadas, que foge do maniqueísmo que acometeu quase todos os personagens antigos. O pessimismo que toma o destino dos heróis médicos de Cascadura ao menos sobra em emoção e dramaticidade.

    https://www.youtube.com/watch?v=uJpDcHKbGj4

    Facebook – Página e Grupo | TwitterInstagram | Spotify.

  • Crítica | Chacrinha: O Velho Guerreiro

    Crítica | Chacrinha: O Velho Guerreiro

    Após Bingo: O Rei das Manhãs e a série da Netflix Samantha, parece haver no ideário dos cineastas brasileiros a vontade de falar abertamente sobre as figuras televisivas dos anos setenta e oitenta. Chacrinha: O Velho Guerreiro tem um pouco disso, apesar de ter sua origem no programa televisivo de 2007, Chacrinha: O Eterno Guerreiro, que celebrou o centenário do homem que é para muitos o maior comunicador popular do Brasil, e como lá, o apresentador Stepan Nercessian.

    A composição artística do longa é muito bem feita. Figurinos, cenários e atuações do elenco são excelentes e ajudam a restaurar boa parte da aura das épocas mostradas em tela, mas o roteiro não é nada fluido. Há claramente dois filmes disputando a atenção do espectador, o primeiro, com Nercessian reprisando o papel que fez no especial da Globo, e outro com Eduardo Sterblitch fazendo o jovem Abelardo Barbosa (alcunha civil de Chacrinha), subindo na carreira de radialista. Os tons de ambos intérpretes é diferente demais e esse destoar pesa contra o produto final.

    Ao menos a proximidade do diretor Andrucha Waddington de Nercessian e Sterblitch facilitou a composição e atuação, visto que os dois já atuaram com o diretor em Os Penetras e Os Penetras 2: Quem Dá Mais?. O texto de Claudio Paiva erra muito em apressar os fatos. As figuras de Karen Junqueira e Gianne Albertoni executando respectivamente Rita Cadillac e Elke Maravilha são tão bem feitas que a falta de semelhanças físicas entre personagens e pessoas reais é simplesmente ignorável. Óbvio que o longa não tem qualquer pudor em explorar o corpo e as curvas de suas intérpretes, mas ambas conseguem traduzir bem em tela toda a ferocidade que os dois ícones tinham quando estavam no auge, ainda que quase não tenham falas ou diálogos dentro do filme.

    A escolha por ser completamente desprendido do politicamente correto foi outro acerto da obra. Nesse quesito, Waddington acerta mais que Daniel Rezende em Bingo, que tem medo de se assumir sacana e mergulha em uma caretice moralista que não tem motivo para acontecer. No entanto, fora a iconoclastia, o longo tem pouco a acrescentar, soando como mais uma cinebiografia sem muito a dizer, mas apenas uma colagem de fatos históricos, ainda assim, é divertido e uma boa forma de relembrar ou conhecer um pouco da cultura de massa televisiva brasileira.

    Facebook – Página e Grupo | Twitter Instagram.

  • Review | Sob Pressão – 1ª Temporada

    Review | Sob Pressão – 1ª Temporada

    Depois do longa Sob Pressão, de Andrucha Waddington, finalmente chega a Rede Globo a primeira temporada de mesmo nome, com direção de Waddington e Mini Kerti. O piloto mostra o Doutor Evandro (Julio Andrade), um cirurgião sempre nervoso e ansioso, que no primeiro momento em que aparece, vê sua esposa chegando quase morta no hospital, assumindo a cirurgia que não deveria operar, e se desesperando com o fato de não ter conseguido salva-la. Esses eventos são anteriores ao longa que esteve no Festival do Rio de 2016, e mais uma vez Andrade e Marjorie Estiano estão muito bem.

    A série é assinada por Jorge Furtado, e há algumas semelhanças com a filmografia e obra do escritor, diretor e produtor, como na cena em que Carolina (Estiano) pergunta sobre o café do hospital estar frio ou não, e a resposta de Evandro de que ela deve ser mesmo novata pois a pergunta não faz sentido, conversa demais com os momentos de A Vida Como Ela É e Meu Tio Matou um Cara, na parte do humor, mas o drama explorado e os vícios mostrados conversam muito mais o pragmatismo humorístico de Waddington, até por conta de ser baseado no filme dele.

    Como no filme, parte da narrativa se dedica a denunciar a precariedade do serviço médico público, ao mostrar um hospital que atende a comunidade mais carente, localizado em algum lugar suburbano do Rio, muito provavelmente Cascadura, Madureira ou adjacências de algum bairro da Zona Norte da cidade da Guanabara. O ultrassom quebrado, a falta de remédio, gaze, é só mais um número diante do montante de problemas de mantimentos dali, e essa realidade desenhada é maravilhosamente bem conduzida, aliada a uma linguagem dos personagens que é bem franca, repleta de palavrões que fazem toda a situação soar ainda mais realista que as novelas da emissora.

    Os  casos dos pacientes são diversos mas sempre há um caráter dúbio implícito. Há gente que aparece tentando suicídio e escondendo uma história de abuso sexual, o menino que supostamente engoliu uma bala mas que na verdade era cocaína, histórias que ao mesmo são fantasiosas e extremas mas que também guardam semelhanças com a realidade tangível da população brasileira, sobretudo a mais pobre. Nada é fácil, nem os dramas dos personagens casuais.

    O quadro de funcionários – e consequentemente de elenco também –  é diferenciado. Quem está na direção do hospital dessa vez é Samuel, de Stepan Nercessian e não mais a personagem de Andreá Beltrão, e uma boa discussão levantada é a respeito da vista grossa ao superfaturamento de mantimentos do hospital, com Samuel tendo de aceitar isso e Evandro sendo completamente contra esse tipo de forma de corrupção. A diferença fundamental dos dois é a demora para aceitar essa percepção ou não, porque ambos chegam a mesma conclusão, já que não aceitar esse tipo de sujeira significa (por exemplo) não ter um tomógrafo na clínica.

    Há um trabalho de caracterização muito bom, que faz com que os personagens pareçam realmente sofridos, sem tempo para cuidar até de seu visual. No quarto episódio há dois núcleos importantes, um com um cego, interpretado por Matheus Nachtergaele, que tem um cão que também foi ferido, e uma mulher que é agredida pelo marido e depois retribui com uma facada nesse esposo, quando o mesmo dormia. Essas histórias lidam com o lado duplo da vida do homem, em especial no embate que crescia entre Evandro e Carolina, mostrando que a ética do doutor vai além da moral profissional e se permite cumprir deveres que a junta de medicina não permite, afinal um cirurgião não pode operar um animal, ao mesmo tempo, Evandro resolve também não denunciar o caso de violência doméstica a polícia, por medo de represálias a moça ou dela retirar a queixa.

    Essas duas histórias citadas são muito bem exploradas, e tocam em detalhes pontuais da biografia de ambos, conversando com os casos de abuso que Carolina sofreu, e com a fé cristã que ela professa, e claro, com a história de Evandro, mostrado no piloto envolvendo a sua falecida esposa e uma subtrama judicial levantada por sua sogra, vivida por Carla Ribas que o culpa pela morte da filha. Mais tarde esses dois assuntos são novamente visitados e explorados.

    Todo capítulo tem ao menos uma lição moral, que as vezes excede ao panfletarismo, mas não chega a incomodar. Nos últimos dois episódios, Carolina revive seus dramas do passado, e enfrenta a memória do seu pai, enquanto Evandro enfrenta o julgamento sobre sua ex-esposa morta. A tentativa do nono episódio é de  findar emocionalmente o julgamento de Evandro e a relação paternal de Carolina, e ao final dele, repete-se o ciclo do começo, com Carolina na mesa de operação, fazendo o médico ter que decidir o que fazer ao ver sua amada mais uma vez sofrendo com o presságio da morte. Depois da resolução desse caso, Evandro retorna a sua casa mesmo com uma oferta de trabalho em um hospital particular ele decide regressar ao ambulatório da Zona Norte, por se enxergar como um sujeito mais útil nesse local. Apesar de um pouco didática e forçada em alguns pontos, Sob Pressão acerta demais no tom pragmático, sendo uma das melhores opções dramatúrgicas da Globo atual.

    Facebook – Página e Grupo | Twitter Instagram.