No final da década de 50, os editores (Mort Weisinger que trabalhara na série de tv) de Superman decidiram explorar a figura heroica em histórias de fantasia-científica (espaciais) difícil de reproduzir em qualquer coisa que não fosse quadrinhos. Os roteiros davam ênfase para o sensacional, e a arte era quase toda por conta de “Wayne Boring”, que Morrison critica como desenhista datado e preso a métodos ultrapassados de contar histórias, o herói de proporções titânicas era reduzido a algo que mãos pequenas poderiam tomar para si.
O ideal heroico, graças a Weisinger, mudaria muito, do ideal chauvinista social para algo próximo do divino, espelhando a condição e o poderio dos EUA sobre o resto do mundo. Otto Binder e Edmond Hamilton entraram para a equipe criativa e fundamentaram o conceito “familiar” para o antes órfão visitante de Krypton, trazendo uma prima e a legião de Superpets, movimento semelhante ao que Bender e Hamilton fizeram com a Família Marvel de Billy Batson e seu herói movido pelos poderes do mago Shazam. Morrison traça um paralelo curioso entre a fase da revista de Jimmy Olsen onde o repórter se travestia de mulher, macacos etc, com histórias de cunho underground e contestador contemporâneas. Já com Super, as coisas iam por um viés machista em sua relação com Lois, quase sempre punidor com um cada vez maior distanciamento de um enlace matrimonial, esse comportamento tinha um pouco de misoginia presente e evidentemente muito medo do compromisso. Talvez essa postura fosse uma crítica de Weisinger a mulher independente – como Lois Lane, ganhadora de um Pulitzer – com uma mensagem que buscava retomar a figura da mulher submissa e ocupada com os afazeres da cozinha. Talvez a possibilidade mais plausível para a mudança seja uma resposta ao código de ética, que fala sobre relacionamentos: “a paixão nunca deverá ser tratada de forma a estimular as emoções mais baixas. A abordagem das histórias deve enfatizar o valor do lar e a santidade do casamento.” Ora a indústria era formada por marginalizados, desprezados e rejeitados, que em seu duro ofício tentavam sobreviver, e poderiam através do subtexto passar uma mensagem importante para si. Cada vez mais longe de assuntos que tocassem o político, as histórias dos kryptonianos priorizavam a perfeição física que demonizavam pessoas carecas, gordas ou os desprovidos da beleza dita normal. A quase onipotência do anabolizado herói elevaram as aventuras para patamares cada vez mais absurdos e irreais.
Surge Robin, o parceiro mirim e personificação da infância perdida de Batman – de onde Frederick Wertham buscou referências, e quem aliadas a paranoia a sua auto-análise, via um comportamento homoerótico. Tal associação parece ter afetado o herói de pernas de fora, tornando sempre inseguro e enciumado de qualquer aproximação de Batman a qualquer ser vivo ou inanimado, achando sempre que seria substituído. Batwoman, Kathy Kane se mostrava uma mulher dominadora e logo arrebatou a atenção do Morcego, com a choradeira de Robin, esta tornou-se na opinião de especialista na revista com maior possibilidade de “conversão” ao “homossexualismo”.
Os heróis cientistas, representavam o ideal ligado aos anseios de Jack Kennedy – o exemplo máximo era Barry Allen. Flash era o herói preferido de Morrison, e foi este que primeiro quebrou a quarta parede, e o influenciaria em Animal Man. Shwartz fez um universo compartilhado, Flash era amigo de Hal Jordan, que por sua vez conhecia Ray Palmer e por este caminho seguiu a toada.
Jack Kirby e Stan Lee resgatavam com o Quarteto algo somente visto em Superman de Siegel, heróis espaciais, com poderes espaciais, mas com os pés no chão, mais próximos da realidade que os homens titânicos da DC. A família tinha em seu caráter a mesma vontade de JFK, vencer os comunistas na corrida espacial. Os super-homens Marvel eram cientistas, o Quarteto Fantástico era composto por astronautas, Bruce Banner era físico, Hank Pymm físico de partículas, Parker fazia faculdade de Ciências, Don Blake era médico.
Lee e Steve Ditko criaram o herói adolescente solo: Homem Aranha. O autor escreveu no final de Amazing Fantasy #15: “o herói que podia ser você!” trazendo um novo patamar de realismo para suas histórias. Mais do que isso, Stan Lee tornou algo amedrontador e escuro em algo heroico e multi-colorido, os heróis da Marvel faziam uso do milagre nuclear, sendo este a fonte de poder da maioria dos seus espécimes. Homem Aranha era o herói nerd e trágico. A Marvel parecia ter uma preocupação maior com as consequências dentro das histórias e com o universo compartilhado. Os calcanhares de Aquiles do Marvel Heroes não eram a madeira ou as pedras alienígenas, mas sentimentos e segredos mortais.
O Batman nos anos 60 era tão pueril quanto o telefilme Cassino Royale de 1967, mas à época e aos olhos de uma criança assistindo aquilo numa televisão de péssima resolução em preto e branco, aquilo tudo era eletrizante. Como na outra Era, outra guerra levaria os heróis a cair em um mar de irrealismo, o Vietnã levou muitos jovens e toda aquela crueldade devastou a auto-estima do americano, que se sentia como um perdedor.
Julius Schwartz teria a ideia do Multiverso, diferencial da DC, que tentava tirar o atraso junto a Marvel. O exemplo mais notório disso é a história Flash de Dois Mundos, em que o conceito de viagem do Tempo tirou da aposentadoria Joel Ciclone e outros: Sandman, Homem Hora, Pantera, Senhor Destino, Doutor Meia Noite, e outros heróis da SJA e Era de Ouro, fora é claro outras realidades como a Terra X e o Sindicato do Crime. Schwartz dizia que Terra em que vivemos é Terra Primordial, parte integrante do multiverso, e já se inseriu em algumas histórias do Flash, encontrando-se com seu alter-ego.
Morrison aponta os Novos Deuses como a obra-prima de Kirby, e usa uma fala de Neil Gaiman para exemplificar o que significava para ele: um gênio, que sabia tratar tanto de histórias suas, quanto de personagens de outros autores. Por questão de número de vendas, que não eram baixas, mas eram aquém das expectativas por ter seu nome na capa, foram canceladas, e impediram-no de concluir sua história. O golpe o magoou e ele só pôde concluir sua história na tacanha Hunger Dogs, já geriátrico, com apenas 60 paginas – muito pouco – e seu traço já estava ultrapassado, além de muito primitivo gracas provavelmente a dificuldade motora que adquirira. Mas ele ainda faria Omac em 1974, que só viria a ser plenamente entendido anos após seu lançamento. Destaca boas sagas da Marvel como eco dos News Gods, usando Guerra Kree-Skull de Roy Thomas, e Odisseia Cósmica e Metamorfose de Jim Starlin. Todas sagas cósmicas, espaciais, viagens de ácido tanto no visual quanto no roteiro bastante louco com um caráter psicodélico de pop art psycho-sci-fi. No fim desta Era a Marvel solidificava-se cada vez mais como editora mais popular e pioneira, a essa altura já desafiara o Código de Ética dos Quadrinhos mostrando Harry se drogando, Rick Jones ficava chapado na zona negativa e tais subversões preveriam a próxima época, de forma cínica e explorando mais o amoralismo.
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