Outrora polêmico e muito comentado, hoje infelizmente um tanto ignorado, quatro anos depois do mediano O Símbolo Perdido, Dan Brown volta às livrarias com seu sexto romance, Inferno. Esta quarta aventura do simbologista e professor de Harvard, Robert Langdon, traz um admirável esforço do autor em renovar a estrutura de suas obras, mas mantendo sua marca que é mesclar suspense com informações histórico-culturais.
Desta vez, Langdon não é chamado às pressas para ajudar a investigar um assassinato bizarro (como em Anjos e Demônios e O Código Da Vinci) ou atraído para uma armadilha (início de O Símbolo Perdido). Na verdade, nem mesmo o professor sabe como começou esta história: ele acorda num hospital, com um ferimento na cabeça, sem qualquer lembrança dos últimos dois dias. Para piorar, ele não está nem nos Estados Unidos, mas na Itália, mais precisamente em Florença. Quando um atentado contra sua vida ocorre ainda dentro do hospital, Langdon inicia uma desesperada fuga, auxiliado pela médica Sienna Brooks. A partir de um perturbador objeto encontrado no bolso de Langdon, eles vão seguir diversas pistas na busca de respostas, e percebem que estão lidando com um gênio maligno obcecado pela célebre obra literária de Dante Alighieri. E que o mundo todo está em perigo, como não poderia deixar de ser.
A narrativa veloz e cinematográfica não é novidade nos livros de Brown, mas esse aspecto está particularmente afiado em Inferno. Além do ritmo acelerado desde o início e dos tradicionais capítulos curtos – claramente “cenas” de um filme, o autor segue a infalível fórmula de jogar o leitor na história sem saber (quase) nada, descobrindo junto com o protagonista. Falando em fórmula, pode se até dizer que Brown buscou fugir um pouco da sua, brincando com as expectativas do leitor. Suas figuras de sempre estão lá: a ajudante feminina, a figura de autoridade com motivações suspeitas, o capanga/vilão físico exótico, etc. Mas são tantas reviravoltas e pistas falsas (no geral, muito bem construídas), que pela primeira vez não da pra adivinhar nada se baseando pelos trabalhos anteriores do autor. Ponto pra ele.
Também digno de nota é o fato do vilão morrer logo no início da história. Nada de spoiler aqui, isso ocorre no prólogo no livro, e enfatiza o fator “refazer as próprias pegadas” que Langdon precisa percorrer. E a jornada será mais uma vez um divertido passeio turístico, passando por lugares como o Duomo de Florença, a Basílica de São Marcos, e a Galleria degli Uffizi. Vemos museus, igrejas, pinturas, esculturas, obras arquitetônicas; todos inspirados ou relacionados ao Inferno de Dante (pra quem não sabe, uma das três partes da Divina Comédia). As descrições de locais e obras podem irritar os mais impacientes, pois quebram um pouco o ritmo. Mas além de enriquecerem a história, mostram a importância de Langdon. Ele não é um homem de ação, um Indiana Jones. Mesmo em boa forma, ele continua sendo um tiozão acadêmico almofadinha, então sua arma tem que ser mesmo seu vasto conhecimento.
Um provável pergunta: há alguma polêmica, Brown tentou atacar alguma instituição dessa vez? Bem, sim e não. A exemplo do livro anterior, quando aliviou para a Maçonaria, aqui o autor alfineta de leve a OMS, mas reconhece sua importância. Os temas discutidos mais uma vez são científicos, e envolvem armas biológicas, superpopulação e o transhumanismo (filosofia que prega a obrigação moral de se usar ciência e tecnologia para superar as limitações humanas). Porém, diferente dos tediosos debates sobre noética em O Símbolo Perdido, aqui a a discussão é muito mais relevante. E Brown acerta em cheio ao estabelecer que não há respostas fáceis, óbvias… e nem mesmo “vilões” no sentido puro da palavra. Apenas pontos vista, alguns mais radicais e perigosos, mas não totalmente desprovidos de lógica. E palmas também para o final, consideravelmente corajoso ao buscar a resolução do dilema apresentado. Para um autor tão acostumado a panos quentes, surpreendeu.
Ainda que perca pontos com algumas explicações forçadas e enigmas menos inspirados que o habitual (visualmente, são pouco estimulantes), o saldo final de Inferno é muito positivo. Aproxima-se do melhor trabalho de Dan Brown, Anjos e Demônios, e pode ser recomendado com tranquilidade até mesmo para quem não é fã do autor.
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Texto de autoria de Jackson Good.
Avisando logo que meus comentários estão cheio de spoilers do livro
Vamos lá.
Concordo com o Jackson que o Brown merece um reconhecimento por tentar mudar um pouco o início do livro. Mas, de fato, fora o início súbito, toda a estrutura de todos os outros livros se mantém logo nas primeiras páginas: Langdon e uma mulher atraente fogem da polícia e precisam desvendar códigos ocultos em obras de arte.
Gostei do livro até um pouco mais da metade, porque quando Dan Brown começou a explicar o que havia acontecido com o Largdon, pra mim a magia foi embora. Desapareceu. Sabe o filme “Vidas em Jogo” com o Michael Douglas? Igual, só que no filme do Fincher funciona.
Outra coisa que não gostei: sair da Itália. Se o livro se mantivesse em Florença e Veneza percorrendo os caminhos de Dante manteria a coerência, se fosse para Roma soltar o virus, tudo bem, mas quando vai para Istambul, achei que destoou.
De resto, concordo que a descrição de Florença é atraente, e a descrição histórica só fortalece o livro. O vilão morrer no início também foi interessante, mas mesmo assim o autor manteve a estrutura, como eu disse acima. Outros inimigos, ainda não revelados no começo da trama, fazem esse papel de vilão até serem explicados.
Tomara que quando o filme saia em 2015 eles melhores isso tudo aí.
“Langdon e uma mulher atraente fogem da polícia e precisam desvendar códigos ocultos em obras de arte”
Putz, tem razão. Mas se ele não fizesse isso, não seria Dan Brown. Ou melhor não seria “uma aventura de Robert Langdon”. E quando eu falei em estrutura, vai além disso. Vc disse que leu poucos livros dele, senão entenderia. Anjos e Demonios e o Codigo são 90% IDÊNTICOS, O Simbolo é um pouco menos mas ainda assim muito parecido, e até Fortaleza Digital e Ponto de Impacto, que não são com o Langdon, tem muitas similaridades. Achei, na minha humildíssima opinião, que Inferno foi o mais diferentão em meio aos outros.
“porque quando Dan Brown começou a explicar o que havia acontecido com o Largdon, pra mim a magia foi embora”
Não tive grandes problemas com isso, justamente por não saber o que esperar, pela primeira vez num livro do Brown. Mas admito que a explicação prática, biológica, de como a amnésia do Langdon foi provocada, achei forçado até a alma. No mais, tudo ok, pra mim.
Viu o filme que eu citei, Jackson “Vidas em Jogo”? É do Fincher com o Michael Douglas, e uma participação rápida do Sean Penn. Um dos melhores roteiros dos anos 90.
O livro acabei de de ler. A idéia central não é o livro em si, mas o que o autor está mostrando, qual o sentido maior do livro? É encontrarem a praga, o vírus, a bactéria, o raio atômico que seja, que um cientista pensa estar usando para o bem da humanidade. Isso sim se repete, os vilões de Brown na maioria das vezes tem o pensamento no bem da humanidade. Mas usam meios extremos. E é isso que o livro retrata, um homem querendo acabar com a superpopulação humana, para deixar a vida no planeta terra mais ‘viva’. E isso entra em choque então com a OMS, sempre tem que ter uma superorganização. Mas achei muito falsa a idéia da organização criminosa, não soou bem. Para mim, o livro ficou chato na últimas 20 páginas. mas vale muito a leitura, principalmente pela aula de arte e história. Coisas de Brown.