De Santiago Dellape, A Repartição do Tempo é uma comedia brasileira que não tem medo de entrar no filão de filmes de gênero, acrescentando muitos elementos de ficção cientifica em sua trama. O longa mostra um empresa de serviço publico, extremamente burocrática, que registra patentes. Um dia, o chefe de departamento Lisboa (Eucir de Souza), que era um sujeito triste e ranzinza se cansa da morosidade de seus servidores, e resolve prende-los no porão da base, que é uma espécie de bunker nuclear, criado pelos militares durante a guerra fria. Nesse ínterim, ele usa maquina do tempo que está para ser patenteada, para pôr em pratica seu estranho plano.
O modo como ele utiliza essa maquina é igualmente estranho, uma vez que o vilão usa esse equipamento para matar a si mesmo, na verdade, sua contra parte. Um dos funcionários, chamado Jonas (Edu Moraes) consegue fugir da prisão, e encontra sua duplicata. Depois, intui que está em um paradoxo temporal, como em O Feitiço do Tempo, no clichê comum do Dia da Marmota.
Jonas tenta chamar as autoridades, mas esbarra na burocracia dos outros órgãos públicos, em piadas afiadas do texto de Delappe e Davi Matos. O mesmo mal que os trabalhadores presos cometem, também sofrem quando precisam e o comentário metalinguístico é ágil, ácido, fugindo de obviedades ou piadas marcadas por claquetes.
Há um uso na trilha de dois aspectos incomuns, o primeiro é o tema musical de A Hora do Brasil, e o segundo é a discografia de Raul Seixas, principalmente Cowboy Fora da Lei e Como Vovó Já Dizia. A mistura presente nesse elemento acrescenta bastante a trama, misturando de forma harmoniosas um tema em canção típico dos governos com o lirismo de um artista que era rebelde e contra cultura.
O final tem uma breve explicação sobre a loucura que o roteiro explora, feita pelo Doutor Brasil (Tonico Pereira), que é o criador da maquina do tempo. As discussões em A Repartição do Tempo são existenciais, mas não no sentido de tentar determinar de maneira arrogante como o homem deve ou não viver seus dias, ainda que discuta o quanto se perde tempo com o exercício de uma profissão chata, enfadonha e que não acrescenta em nada nem para a nação e nem para quem necessita dele. O texto se fortalece demais ao culpabilizar a morosidade de alguns setores públicos aos patrões respectivos e não aos funcionários chão de fábrica, e só por lembrar disso já é algo digno de muita nota.