A edição da Nova Fronteira para o Vestido de Noiva, do incomparável Nelson Rodrigues, é das melhores possíveis. Texto da primeira montagem do espetáculo, em 1943, conta com roteiro de leitura e notas do professor, jornalista e crítico Flávio Aguiar. Na edição também encontramos uma reprodução do programa de estreia, em 28 de dezembro de 1943, com um glossário de termos teatrais e dois textos que ampliam a visão sobre a importância da peça e do teatro de Nelson Rodrigues.
Vestido de Noiva, dirigido pelo polonês Zbigniew Ziembinski (refugiado da Segunda Guerra Mundial no Brasil em 1943), representa o início do teatro moderno no país. A história de Nelson Rodrigues é uma tragédia com toques de terror psicológico que, como parte da obra do autor, expõe as feridas ocultas da sociedade burguesa tupiniquim.
A trama é contada em três atos e em três planos diferentes: o da realidade, o da memória e o da alucinação. A peça tem seis personagens principais: as irmãs Alaíde e Lúcia, Pedro (o marido de Alaíde), Madame Clessi (uma antiga prostituta de luxo), e dona Lígia e Gastão, pais de Alaíde e Lúcia. O leitmotiv da história é o casamento de Alaíde e Pedro. O marido tivera um namoro anterior com Lúcia, a irmã da esposa, mas acabou se casando com Alaíde, o que criou um mal estar entre as duas. Após o casamento, o cínico e ambicioso Pedro volta a desejar Lúcia, e a dupla pretende matar Alaíde.
Armados os personagens, o brilho da peça reside nos diálogos e nas insinuações que delineiam a trama. Do ponto de vista escrito, Nelson Rodrigues ascende as fogueiras da intimidade familiar, insinua, moraliza e provoca a pequena burguesia carioca que o fez fama. Na interpretação, em adicional, a rubrica do diretor (apontamentos que orientam o comportamento do ator), aponta que Ziembinski buscava um comportamento intenso, quase histriônico, dos personagens.
Vestido de Noiva, encenada como um estopim, aflora da paixão à culpa, da ganância à revolta, da tristeza à paixão, mas, sobretudo, chacoalha, questiona de forma íntima as escolhas que trazem o arrependimento. Curioso é que não há uma espécie de perdão para Nelson; todos os personagens parecem impedidos de tentar uma segunda oportunidade porque preferem justificar seus atos cruéis a admitir seus erros. Todas as escolhas são castigadas.
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Texto de autoria de José Fontenele.
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