Autor: Vortex Cultural

  • Crítica | Parker

    Crítica | Parker

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    Apesar de ser o ator mais legal do mundo, Jason Statham tem sua coleção de bombas. Dungeon Siege de Uwe Boll que o diga. Talvez seja uma simples questão de probabilidades, o cara faz em média três filmes por ano, mas o fato é que ele costuma estar em produções medianas ou abaixo disso. Seu mais recente lançamento está nessa categoria.

    Em Parker (não, não é sobre o Homem-Aranha), Statham vive uma espécie de ladrão de bom coração, que tem como regra não ferir ninguém em seus assaltos super bem planejados. Após um trabalho, ele é traído, roubado e deixado para morrer por sua equipe. Surpresa nenhuma, ele sobrevive e parte em busca de ving… justiça, como ele diz. Apenas deixar as coisas certas. A sinopse já indica um filme bem comum, mas que poderia ser divertido caso fosse bem executado. Mas eis que surge um elemento estranho no meio disso e coloca tudo a perder. Elemento esse que atende pelo nome de Jennifer Lopez.

    Difícil entender o que houve aqui. Parece que os produtores tinham em mãos, pronto, um roteiro padrão-Jason-Statham, e decidiram que isso não bastava. “Vamos acrescentar um tempero latino, por que não? Mistura ação com comédia romântica, agradar todos os públicos, sucesso garantido!” Ou seja, algo na linha do horrendo Encontro Explosivo, aquele com Tom Cruise e Cameron Diaz.

    O resultado é uma personagem enxertada à força na história, depois de uma boa meia hora de filme, e que simplesmente não se encaixa com o que vinha sendo feito até então. Quando entra em cena a corretora de imóveis de Palm Beach, recém divorciada, com problemas financeiros e morando com a mãe pentelha, a impressão é que botaram um estagiário drogado pra fazer a edição (ou montagem) e ele colou dois filmes diferentes. Muda o clima, a fotografia, a trilha sonora, interrompe a trama para ficar tentando a todo custo criar alguma utilidade para a personagem, justificar sua presença. O detalhe mais patético é que até o cargo de interesse romântico do protagonista já estava preenchido, e não há triângulo amoroso ou reviravolta. Apenas a corretora doidinha pra dar pro charmoso ladrão, e ele nem aí. A única coisa boa nisso tudo é o breve instante em que ela aparece só de lingerie. Jennifer Lopez, com seus 43 anos, está de parabéns.

    O que resta é lamentar o quão prejudicado foi o bom potencial que havia em Parker. Chover no molhado, mas Jason Statham interpretando ele mesmo nunca é ruim. Da mesma forma, não deixa de ser divertido ver Nick Nolte no papel que vem repetindo em seus últimos trabalhos: um velho cansado que fumou sem parar por 50 anos, dada sua extrema dificuldade pra FALAR. O diretor Taylor Hackford (de Ray e O Advogado do Diabo) mostra competência no gênero ação e entrega ótimas cenas, agressivas e sanguinolentas. Toda a sequência no carro em fuga após o assalto inicial é muito bem filmada. Outro destaque é a luta estilo Bourne com uma sensacional resolução quando o herói tem uma faca apontada contra seu rosto.

    Contudo, esses são só pequenos alentos, o filme não consegue decolar. Mais um Mercenário que decepciona em sua aventura solo. Menos mal que veremos Jason Statham de novo ainda em 2013, torcendo para que seja numa produção melhor.

    Texto de autoria de Jackson Good.

  • Crítica | Mama

    Crítica | Mama

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    Atualmente, o que mais tem por aí é gente dizendo que o cinema (e a produção cultural em geral) está em crise, tanto pela falta de criatividade e homogeneização do pensamento em Hollywood quanto pela massificação e velocidade de reprodução e consumo dos bens produzidos pela indústria cultural.

    O fato é que o cinema de terror vive uma crise maior que a do cinema. Desde os clássicos dos anos 70, como O Bebê de Rosemary e O Exorcista, que levaram e assustaram multidões aos cinemas, não vimos mais fenômenos tão marcantes ou duradouros. Com algumas raras exceções, os anos 80 e 90 produziram uma quantidade enorme de títulos no gênero, um mais genérico que o outro, e apesar de algumas tentativas recentes mais realistas, intimistas e autorais, como as levadas a cabo por Guillermo del Toro, o cinema de terror ainda patina frente a uma população mais cínica, esclarecida e acostumada com a violência que desdenha de grande parte das produções que aparecem.

    Mama, filme de Andy Muschietti baseado em um curta do mesmo autor, se situa na descrição acima. Ao mesmo tempo em que tenta invocar um terror intimista, falha ao pecar justamente na progressão das cenas e dos personagens, não fazendo jus as suas quase duas horas de duração. O filme conta a história de duas crianças abandonadas pelo pai, que some de forma bem clara e nem um pouco misteriosa, colocando já de cara as cartas do filme na mesa. (Não é interpretação. O sobrenatural existe mesmo. Ponto para a coragem da abordagem.) As duas crianças sobrevivem por cinco anos na casa com a ajuda de uma entidade misteriosa até serem descobertas pelo tio Lucas (Nikolaj Coster-Waldau), irmão do pai delas, que as leva para criar junto com sua namorada Annabel (Jessica Chastain).

    A história se desenvolve a partir de situações que vão do leve incômodo (como em filmes de terror qualquer funcionário de cartório é especialista em fantasmas) até o mais absurdo (como da cena final, onde qualquer possibilidade real de final resolvido, só caberia justamente em uma plateia dos anos 70, sem o atual vício realista).

    Em momento algum acreditamos na relação das personagens, que passam, de uma hora para outra, de estranhos a um amor incondicional, ou mesmo na sucessão de eventos que exige uma crença do espectador que ele dificilmente dará. Pessoas se encontram em estradas desertas sem combinarem, personagens resolvidos fazem pós-aparições provocativas sem resultado algum na trama, são só alguns exemplos de incongruências da história, que não é salva pela bela e assustadora fotografia de inverno no início do filme, que remete aos Irmãos Grimm.

    Guillermo del Toro produz o longa, e parece ter chamado para si toda a responsabilidade a respeito dos filmes de terror na última década, após belas realizações como Labirinto do Fauno. No entanto, suas últimas produções têm deixado a desejar, pois parecem seguir um roteiro formatado e estabelecido (“filme independente europeu de um diretor jovem e desconhecido adaptado para o público americano”), que nos trouxe também coisas positivas, como REC e O Orfanato, mas que agora definitivamente parece ter chegado à exaustão.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.

  • Crítica | O Acordo

    Crítica | O Acordo

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    Mais uma tentativa de Dwayne Johnson de encarar um papel sério num drama, não sendo apenas “o fortão” do elenco. Infelizmente, a tentativa não passou disso. The Rock não consegue dar peso e presença a seu personagem. Contudo, esse problema não é exclusividade sua. Mesmo que não fosse dele o papel de John Matthews, o pai empenhado em ajudar o filho de qualquer forma, o filme ainda estaria longe de ser considerado bom. Os demais personagens, assim como a trama, carecem de verossimilhança e carisma. É difícil dar credibilidade a uma estória em que o protagonista procura informações sobre cartéis e chefões do tráfico na Wikipedia.

    Matthews tem uma construtora e, coincidentemente, um dos funcionários – Daniel James (Jon Berntha, o Shane de The Walking Dead) – é um ex-presidiário que, coincidentemente, foi preso por tráfico e, coincidentemente, conhece um traficante local e topa (sem muita resistência) apresentar o patrão ao traficante que, também sem muita resistência, aceita testar o serviço de transporte proposto por Matthews, e por aí vai. As coincidências se sucedem de maneira quase vergonhosa e a maioria dos eventos se desenrola de modo tão simplista e óbvio que os momentos de tensão – se é que podem ser chamados assim – passam praticamente despercebidos.

    Os personagens são rasos, boa parte deles não parecem ter uma motivação para seus atos, alguns aparecem e desaparecem do roteiro de acordo com a necessidade – a ex-esposa de Matthews, assim como a esposa atual e sua filha, por exemplo, não têm qualquer relevância, sua presença (ou ausência) simplesmente não mudam em nada o rumo da narrativa. Fica difícil para o espectador criar qualquer identificação e sequer se importar com o destino dos personagens, mesmo de Matthews ou de seu parceiro circunstancial, James – cuja família também pouco influencia no rumo dos fatos.

    Some-se a isso a atuação em “piloto automático” de Susan Sarandon, o excesso de closes e planos-detalhes, as cenas desnecessárias, a insistência e a frequência exagerada de discurso anti-drogas nos diálogos, além de o espectador ser obrigado a ver o protagonista apanhando de quatro drogados – algo inadmissível em se tratando de The Rock – e tem-se uma estória que se arrasta por intermináveis 112 minutos.

    Neste filme, é tudo tão moderado (pejorativamente falando), tão morno que dá saudades daquela selvageria estilizada dos filmes de Braddock. É um daqueles roteiros que ficaria bom se tivesse sido feito nos anos 80, com algum dos brutamontes da época – Charles Bronson, Chuck Norris, Stallone ou Schwarzenegger – no melhor estilo “um destemido contra tudo e contra todos”. Desse modo, ao menos, os furos de roteiro, os clichês, a falta de consistência seriam mais facilmente perdoados e sem dúvida o filme seria muito mais divertido.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.

  • Resenha | Na Natureza Selvagem – Jon Krakauer

    Resenha | Na Natureza Selvagem – Jon Krakauer

    livro-na-natureza-selvagemAs andanças pelos Estados Unidos que culminaram na morte do jovem aventureiro Christopher Johnson McCandless no Alaska, despertou de forma enigmática o interesse de muitas pessoas, entre elas o jornalista Jon Krakauer e o cineasta Sean Penn, instigados pelas circunstâncias envolvidas na tragédia.

    O primeiro foi responsável pelo livro de não ficção Na Natureza Selvagem, publicado em 1996, e o segundo pelo filme ficcional de mesmo nome lançado em 2007 (leia nossa crítica aqui e ouça o podcast que eu participei e editei para o CineMasmorra aqui). Ambos tiveram sucesso nos meios literário e cinematográfico, e hoje em dia é difícil dissociar as duas obras, que acabaram se completando.

    Sinopse: um corpo em decomposição foi encontrado dentro de um ônibus por caçadores de alces em uma região selvagem do Alaska, e descobriu-se pertencer a um rapaz rico, bom aluno e excelente atleta. Jon Krakauer refez a trajetória do jovem e conversou com pessoas diversas ligadas direta ou indiretamente a ele, além de apresentar outros casos similares de aventureiros com o mesmo fim e relatar suas experiências como alpinista em situações extremas.

    Krakauer, fascinado pela tragédia de Christopher, conseguiu transformar um artigo da revista Outside que cobriu o caso, na época feita a pedido de seu editor como dito logo no começo do livro, em um relato muito mais completo e esmiuçado de sua aventura. E é essa a impressão que se tem ao se ler o livro, “Na Natureza Selvagem” (Companhia das Letras, 213 páginas, tradução Pedro Maia Soares, 1ª edição 1998), soa como uma grande reportagem.

    O autor visitou durante um ano os principais lugares que McCandless percorreu, pesquisou sobre a geografia, biologia e botânica do Alaska, teve acesso ao seu diário, a muitas das cartas que o jovem enviou e conversou com muitas pessoas. Professores com doutorado, caçadores de alce, alasquianos aventureiros, autoridades policiais, parentes distantes de outras vítimas, além dos familiares e amigos de Christopher foram alguns dos objetos de entrevistas usados para se tentar compreender os motivos, até hoje não claros, que levaram o jovem a abandonar uma vida promissora em um lar rico e virar um vagabundo caroneiro que passou a viajar o país até o Alaska.

    Algumas das perguntas feitas por Krakauer ao longo da narrativa eram respondidas por pesquisas feitas pelo mesmo, como a revelação de quem pertencia o corpo, a causa da morte, a possibilidade de sobrevivência naquela região do Alaska, e o mais importante: como uma parte de sua personalidade moldou-se através de seus ídolos literários Tolstói e Thoreau e o motivo que levou Christopher a se isolar da família. Uma curiosidade, revela-se muito da semelhança entre ele e o seu avô materno (p. 118 e 119).

    A narrativa não é linear, varia entre a descoberta do corpo de Chris e as suas andanças, com o restante. Os nomes dos capítulos remetem a lugares, sejam ligados a trajetória do jovem, onde ocorreram conversas com amigos e familiares, as outras tragédias citadas, assim como a aventura do autor como alpinista. Sempre abaixo de cada título há passagens grifadas por McCandless dos livros que leu ou trechos de outras obras destacadas pelo autor, até mesmo as cartas que Chris enviou para pessoas diversas, que ilustram o que será abordado.

    “Na Natureza Selvagem” ganha muita força nos capítulos 8 e 9, quando apresenta a narrativa de outros aventureiros românticos e idealistas que tiveram fins trágicos, como Gene Rosselini, John Mallon Waterman, Carl McCunn e Everett Ruess. Nos capítulos 14 e 15, o relato pessoal de Jon Krakauer quando escalou com sucesso o Polegar do Diabo (Devil’s Thumb ou Daalkunaxhkhu no dialeto Tlingit como mostra este blog) no final dos anos 70, serve para apresentar ao leitor a sobrevivência em uma situação extrema, mostrando como é fácil nestes casos o pré-julgamento feito por pessoas pouco informadas e a difícil tarefa de se tentar compreender a mente de uma pessoa nestas condições.

    Alguns leitores podem se incomodar com algumas partes onde se perde o cunho impessoal jornalístico e se transforma em comentários com livre interpretação de Krakauer. Apesar de marcante, eis um exemplo:

    “A 14 de março, Franz deixou McCandless no acostamento da Interestadual 70, perto de Grand Junction, e voltou para o sul da Califórnia. McCandless estava entusiasmado por estar a caminho do Norte e aliviado também – aliviado por ter novamente escapado da ameaça iminente de intimidade humana, de amizade, e toda a complicada carga emocional que vem com isso. Ele fugira dos limites claustrofóbicos de sua família. Tivera sucesso em manter Jan Burres e Wayne Westerberg a certa distância, afastando-se de suas vidas antes que esperassem alguma coisa dele. E agora escapulira também sem dor da vida de Ron Franz” (p. 66).

    Outro incômodo é a falta de imagens. Apesar de alguns mapas serem apresentados, o livro enriqueceria se fotografias de Christopher, sua família, os personagens que encontrou no caminho, além de alguns locais que ele visitou fossem mostrados.

    Embora Jon Krakauer tenha sido um dos consultores do filme de Sean Penn, existem semelhanças e direrenças entre as duas obras. Certos depoimentos viraram cenas, como sua mãe Billie falando que sempre que viam algum caroneiro parecido com Chris, davam meia volta para olhar de novo e terem a certeza de que não era ele (p. 135), além dos personagens secundários que realmente marcaram a trajetória de McCandless, como Wayne Westerberg, Rayne e Jan Burres, a menina Tracy e Ron Franz.

    No entanto, Christopher remou com uma canoa pelo rio Colorado sem problemas (p. 43), aceitou uma carona de Ron para San Diego (p. 64) e depois voltou para Cártago e ficou novamente com Wayne após abandonar o idoso (p. 67). Outras dramatizações não existem no livro, como a cena forte em que os pais de Chris brigam na frente dos filhos ou o problema vivido pelo casal hippie.

    Uma das partes mais tocantes do livro é relatada por Carine McCandless após retornar com as cinzas do irmão do Alaska:

    “Durante o vôo, Carine comeu, até a última migalha, tudo o que as aeromoças colocaram na frente dela, ‘embora fosse aquela coisa horrível que eles servem nos aviões. Eu não podia suportar a ideia de jogar comida fora desde que Chris morrera de inanição’” (p. 140).

    “Na Natureza Selvagem” vale a pena? Se você for fã do filme, da trilha sonora composta pelo vocalista do Pearl Jam, Eddie Vedder, que ajuda a narrar a obra cinematográfica, é mais do que obrigatório a leitura e posterior consulta. Como disse antes, as obras junto da trilha sonora acabam se completando.

    Texto de autoria de Pablo Grilo.

  • Crítica | Uma História de Amor e Fúria

    Crítica | Uma História de Amor e Fúria

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    O Brasil não é um país com um histórico forte em animação. Em 1996 foi produzido Cassiopeia, filme em 3D feito no mesmo ano do primeiro Toy Story, mas pouca coisa foi feita desde então, o que torna surpreendente a excelência técnica de Uma História de Amor e Fúria.

    O longa é a estreia na direção de Luiz Bolognesi, roteirista de Chega de Saudades e As Melhores Coisas do Mundo, e acompanha um homem (dublado por Selton Mello) ao longo de 600 anos de história, enquanto ele se encontra e desencontra de sua amada Janaína (Camila Pitanga). Anteriormente chamado Lutas, o filme salta através de momentos importantes da história do Brasil e termina com uma visão distópica do Rio de Janeiro em 2096.

    É um roteiro pretensioso e reside aí o maior problema do filme. A narrativa começa com o conflito entre os tupinambás e os colonizadores portugueses, em seguida salta para a Balaiada (revolta de escravos que ocorreu no Maranhão no século XIX), o movimento estudantil de resistência a ditadura e por último para o ficcional grupo terrorista que busca democratizar o acesso à água, tornada o bem mais caro do mundo no futuro. Ao condensar quatro pequenas histórias em um filme que tem menos de uma hora e meia, Bolognesi planifica seus personagens e os transforma em estereótipos.

    O protagonista e Janaína se tornam símbolos da luta contra a opressão e advogados da liberdade, mas não são nada além disso. Esse tipo de arquétipo, unido a história de amor imortal e as excelentes sequências de ação, funciona talvez com o público juvenil, mas Uma História de Amor e Fúria é também uma animação para adultos e assim, tanto os personagens como os diálogos acabam soando rasos e bastante ingênuos.

    Outro problema é que o filme parece uma aula de história da oitava série: não há ambiguidades, a divisão entre oprimidos-bons e opressores-maus é absoluta e a história é inevitavelmente contada pelos vencedores. Há certamente um mérito nessa posição e na vontade de Bolognesi de explorar o outro lado da história brasileira, mas de novo, tudo se torna raso e superficial quando não existem zonas de cinza ou quando a vida interior dos personagens se resume à sua vontade de lutar. Esse maniqueísmo diminuí um pouco na última história, passada no futuro, que é de longe a melhor parte do filme.

    Visualmente Uma História de Amor e Fúria é impressionante:  o traço estilizado dos personagens e o detalhamento dos ambientes funciona muito bem. A trilha sonora, original em sua maior parte, mas com participação de bandas como Nação Zumbi, também é extremamente bem usada e reforça a sensação de que as sequências de ação são o ponto alto do longa. No entanto, a sensação final é de um filme com pontos fortes e que poderia ter ganhado muito se tivesse menos ambições, mas acabou um tanto plano, ingênuo e inseguro de seu público alvo.

    Texto de autoria de Isadora Sinay.

  • Resenha | Detective Conan

    Resenha | Detective Conan

    Jovem prodígio, filho de escritor de romances policiais, é conhecido por seu brilhante poder dedutivo e de observação. Chamado algumas vezes para ajudar a polícia a solucionar alguns casos de assassinatos, este é Shinichi Kudo. Certa vez, levado pela sua curiosidade, ele investiga um ato suspeito de dois homens de preto e é emboscado. Na emboscada, dão a ele um veneno que supostamente iria matá-lo, mas na verdade apenas faz com que ele fique parecendo um garoto de 7 anos.

    Essa é a premissa básica de Detective Conan – ou Case Closed, como é conhecido nos EUA -, mangá de Gosho Aoyama. Com isso, ele leva a história de Shinichi se passando por uma criança de 7 anos, que ele nomeou de Conan Edogawa (nome baseado em Arthur Conan Doyle), na casa de sua melhor amiga Ran Mouri, por quem é apaixonado. Ele conta com a ajuda do Dr. Agasa, cientista inventor que tenta descobrir como reverter o veneno. O pai de Ran, Kogoro Mouri, é um detetive, o que vem a ser muito útil para a história.

    O estilo da história é algo meio que seriado, um caso por vez, geralmente durando cerca de 10 capítulos. Na maioria das vezes os casos são de assassinatos, sendo sempre desvendados por Conan, que quando vai contar o que/como descobriu usa um invento que modifica sua voz para parecer a de alguém mais velho que está desacordado no momento, geralmente Kogoro.

    Este estilo é bom no inicio, mas tende a cansar conforme passa o tempo; chega a ser enfadonho você passar de caso a caso e nunca mudar nada, sempre retornando ao mesmo ponto. Há poucos momentos de excitação: são os capítulos que ele usa para investigar a tal Black Organization (nessa hora todos estão pensando em criminosos com afro na cabeça), que foi quem o transformou em criança. Pois é nesses capítulos que esperamos um avanço na história. Só que esses são BEM RAROS, deixando a maioria com casos de assassinatos e, assim, um mangá chato (o que me fez largar o mangá, e olha que eu sou uma pessoa bem resistente nesse quesito, vi os 10 episódios de The Cape, Heroes até o final e afins…).

    Outros pontos divertidos são quando ele encontra seu “rival” em termos de habilidades de detetive, Heiji Hattori, e eles ficam disputando. Também quando aparece o Phantom Thief Kid, que é um ladrão que Shinichi tenta pegar e falha. Esses são outros bons momentos na história, mas um pouco raros.

    Outra coisa que contribui muito para a história ser cansativa é o famoso “assassinato do quarto fechado”, um gênero raro de assassinato onde a pessoa é morta num local trancado por dentro. O primeiro você acha legal, é algo novo, mas isso acaba se tornando algo tão comum que você se pergunta como pode ser chamado de raro se todo mundo consegue bolar um.

    O traço é bem comum, nada de extraordinário, não atrapalha nem ajuda. Não é rico em detalhes, mas não deixa a desejar. Num mangá com a premissa deste, que seria a de detetive, se esperava que o principal não fosse o traço, e sim os casos.

    Detective Conan é um mangá divertido no início, mas tende a cansar conforme você o lê. É antigo, então tem muitos capítulos até você chegar ao que está saindo atualmente, e isso é mais um ponto de desânimo. Mas faz um tremendo sucesso no Japão e alguns casos são realmente interessantes, já aprendi várias novas maneiras de matar alguém e tentar despistar a perícia. Eu larguei mas pretendo voltar, um dia. Quem quiser ler vá por conta e risco.

    Texto de autoria de André Kirano.

  • Crítica | Anna Karenina

    Crítica | Anna Karenina

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    Joe Wright é famoso por suas adaptações literárias: nos últimos anos ele dirigiu Orgulho e Preconeito, Desejo e Reparação e agora Anna Karenina.

    Adaptado do clássico de Tolstoi, o filme conta a história de Anna, uma mulher casada da alta sociedade de São Petersburgo que se apaixona por um jovem militar e acaba sendo levada a ruína. O romance se estende por mais de 800 páginas e é quase um tratado sobre o amor, a felicidade doméstica e os costumes da Rússia do século XIX.

    O primeiro acerto de Wright é abandonar essas pretensões e condensar a história: ele reduz ao mínimo a importância dos personagens secundários e das histórias laterais e se foca na relação de Anna e Vronsky. Uma sensualidade explícita, ausente do original, e o bom trabalho de atuação dos protagonistas confere intensidade ao que já é uma das histórias de amor mais emblemáticas da literatura mundial.

    Na verdade, boa parte da eficiência do filme se deve a adequação dos atores: embora nenhuma atuação seja excepcional (talvez o maior destaque seja para Aaron Taylor-Johnson como Vronsky) eles encarnam bem seus personagens e aquilo que eles representam na história.

    Além do foco no casal principal, Wright torna Anna Karenina mais adaptável ao abrir mão de qualquer naturalismo. A trama se passa em um palco e a movimentação dos atores é teatral e coreografada. Não se trata mais de uma análise da natureza humana ou uma investigação sobre o casamento, é uma história de amor, épica, trágica e fantástica. Essa impressão é reforçada pelos figurinos e pela direção de arte, que criam uma Rússia quase de contos de fadas, uma terra distante, fria e maravilhosa.

    No entanto, por mais que o diretor se esforce em fazer a narrativa caber no filme, Anna Karenina tem problemas de ritmo: a ação é corrida e a narrativa acaba cheia de pontas soltas. A rapidez também acaba tornando raso o desespero final da personagem e seu suicídio parece quase gratuito.

    No final, Anna Karenina é um bom filme e uma boa adaptação, Wright confia em seus atores e na riqueza visual e tenta contornar as nuances psicológicas (que são justamente o problema em seu Desejo e Reparação). Não é uma obra prima, mas é uma história de amor bem contada, intensa e comovente e um filme visualmente impressionante.

    Texto de autoria de Isadora Sinay.

  • Resenha | Os Contos de Meigan: A Fúria dos Cártagos – Roberta Spindler e Oriana Comesanha

    Resenha | Os Contos de Meigan: A Fúria dos Cártagos – Roberta Spindler e Oriana Comesanha

    Contos de Meigan.inddAo ver o livro em uma livraria, ele certamente chamará sua atenção pela capa e pelo tamanho ocupado na prateleira. Porém, não é apenas em sua aparência que ele irá te surpreender. Contos de Meigan é uma prova do quanto a literatura brasileira está crescendo em mundos fantásticos que o levam em uma aventura extraordinária através de universos desconhecidos. Com uma narrativa constante, sua leitura flui e o tempo passa sem que você perceba, e sua trama bem desenvolvida, com uma sequência de acontecimentos coesos, faz com que Contos de Meigan seja uma leitura recomendada a todos.

    Honestamente, a primeira coisa que me fez realmente querer ler o livro foi o seu prólogo. Nele há uma explicação em formato de relato sobre o mundo onde a história ocorre e, basicamente, sobre todos os conflitos que ocorreram até o momento em que conhecemos a protagonista e embarcamos em sua aventura. Nele consta todo o desenvolvimento da civilização de magis e seu relacionamento com os humanos, que, ao fim da primeira guerra, foram exilados de Meigan e enviados para um local onde eles seriam incapazes de voltar a Meigan: a Terra.

    O começo da história se desenvolve em um cenário caótico de guerra, quando a protagonista volta após viver três anos na Terra como uma humana comum. É inegável a habilidade que as autoras têm ao descrever a maneira como as batalhas aconteciam e também toda a carnificina que ocorria por onde a protagonista passava, tentando voltar para sua casa. Até mesmo o uso dos poderes – mantares, como são chamados – de controlar elementos não contêm aquela característica sensação de overpower, deixando claras as vantagens e desvantagens de cada uma das habilidades e dos métodos de luta. Como disse, no quesito aventura e trama, esse livro é excelente. O que nos leva ao primeiro ponto negativo do livro: os personagens.

    Maya Muskaf, a protagonista, é uma menininha mimada sem amor nenhum à própria vida e ao título que viria a herdar quando sua mãe morresse, de líder da cidade. Em grande parte do livro, você sente muita raiva dessa personagem imprudente, impetuosa e explosiva. Porém, ao passar da raiva inicial, a princípio você começa a entender o motivo de determinadas burradas que ela sem querer comete. Contudo, errar uma vez é normal, errar duas até vai, mas errar toda vez é sacanagem, correto? Ela não dá uma bola dentro no livro todo, sempre contando com a ajuda de outros personagens para conseguir sobreviver ou ser um pouquinho útil.

    Dito isso para a protagonista, você pode pensar que – como geralmente ocorre – exista algum personagem secundário que roube o brilho. Bem, não há. Não pelo menos até você alcançar 90% do livro, quando a história de um dos personagens é contada e você o entende um pouco mais, mesmo ele tendo sido sem graça o livro todo e, só então, parecer um pouco mais digno de respeito. O Guardião que a protege é outro que poderia muito bem ser um dos melhores e mais fodásticos personagens, mas peca pela falta de profundidade que as autoras não deram tanto na questão de suas crenças quanto de suas vontades. O único pelo qual desde o princípio você cria respeito é, vejam só, o antagonista. Contudo, não se empolgue; este, mesmo tendo as melhores cenas de luta, ainda não tem aquele chã que faz com que você simplesmente adore o personagem e torça por ele.

    Na verdade – eu, pelo menos -, você não torce para ninguém. É como ficar preso em uma imparcialidade, apenas observando o que acontece e querendo saber o que vai ver depois. Não acho que seja o ideal para um livro. Porém, contudo e entretanto, por esse ser o primeiro do que acredito ser uma série – porque o final fica absurdamente aberto para uma continuação -, tenho fé de que foi uma boa jogada essa sensação que o livro passa: de não ter para quem torcer.

    Resumindo: leia o livro pelo que acontece e pelo mundo em si, mas não crie expectativas sobre os personagens. Divirta-se com essa aventura fantástica e tente não se irritar muito com a inutilidade da personagem. Olhe só, pelo menos não há muito drama desnecessário, o que é definitivamente um ponto positivo para não abandonar a leitura. De fato, recomendo muito.

    Compre aqui.

    Texto de autoria de Thiago Suniga.

  • Crítica | O Âncora: A Lenda de Ron Burgundy

    Crítica | O Âncora: A Lenda de Ron Burgundy

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    Mesmo depois da tragédia de Os Candidatos, resolvi ver outro filme do Will Ferrell. Dessa vez, O Âncora, que não poucas pessoas disseram que era bom. Realmente, é melhor que Os Candidatos, mas se só isso não diz muito, O Âncora falha em ter exatamente muitos dos elementos de que não gostei no anterior.

    A ideia é excelente. Ferrell interpreta Ron Burgundy, um jornalista local de San Diego, famoso na cidade, juntamente com sua equipe, por comandar o jornal de liderança no horário, durante a machista década de 70, quando o movimento feminista começava a sair das universidades e dos protestos nas ruas para engrossar a luta diária das mulheres no dia a dia por melhores condições, igualdade e, principalmente, respeito e reconhecimento no ambiente de trabalho e na sociedade. Nesse aspecto o filme é primoroso, pois, se as mulheres reclamam de como são tratadas hoje, nessa época era absurdamente pior, e soa ridículo vermos hoje como os personagens da época as tratavam – mas não soa de modo algum irreal, o que transforma algumas situações engraçadas, mas aquele engraçado que incomoda, no bom sentido.

    Também há a boa ridicularização do papel da mídia na sociedade, que sempre se desvia de histórias relevantes, mas que poderia desestabilizar o status quo para cobrir eventos com gatos fantasiados e partos de animais em zoológicos que são tratados como a maior notícia do mundo, sem a menor cerimônia. Além, é claro, de tirar um sarro do ego enorme de jornalistas da TV que se acham o centro do universo por terem 30 minutos diários de aparição.

    No entanto, o outro lado, o do riso forçado, das esquetes fora de contexto e dos exageros, não me pegam. Ainda não entendo porque Steve Carrell é tratado a toda hora como gênio do humor, já que parece interpretar o mesmo personagem, do mesmo jeito, em todo filme, com as mesmas caras, bocas, frases e trejeitos. Sua única exceção parece ter sido no excelente Pequena Miss Sunshine, quando justamente saiu do seu estereótipo.

    Do final não daria para esperarmos muito, nem sei se o filme deveria tentar algo além do desfecho onde inimigos fazem as pazes e resolve os conflitos nesse tipo de filme justamente pela proposta de satirizar o  gênero, mas seria interessante ver uma elaboração mais inteligente do que essa.

    Como resumo da obra, O Âncora é um filme redondo, que funciona para a plateia certa, mas cansa o espectador que exija algo a mais. Possui bons momentos, e deixa a profundidade que poderia alcançar ser atrapalhada pelo humor raso que tenta forçar a todo instante.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.

  • Crítica | A Hospedeira

    Crítica | A Hospedeira

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    Sem dúvida, uma parcela do público será atraída ao cinema pelo simples fato de que o filme é baseado no livro homônimo de Stephenie Meyer. Essa parcela, caso vá esperando ver algo minimamente próximo a Crepúsculo, terá as expectativas ligeiramente frustradas. Não totalmente, já que a porção “romance” está presente. Contudo, diferente da estória de Bella e Edward, não é o foco principal, apesar de ser importante para o desenvolvimento da trama. Sobre a relação livro/filme, apenas mais uma observação. Espera-se de adaptações de livros que o filme se sustente per se, isto é, o roteiro não deve pressupor que quem está assistindo já leu o livro. E neste sentido, a adaptação foi bem sucedida. Não há necessidade de conhecimento prévio da obra, nem ficam faltando detalhes essenciais (ou não) que apenas os leitores teriam conhecimento.

    Diferente de outras estórias que versam sobre invasão alienígena, esta não se prende ao início da invasão – os primeiros humanos “infectados”, a percepção dos demais sobre o que está ocorrendo e a luta contra os invasores. Nesta, a invasão já está consumada, os alienígenas já estão entre os humanos ou, mais especificamente, dentro deles, assumindo o controle do corpo e sobrepujando a mente, tomando o lugar do “eu” de cada um. E a trama se volta para os focos de resistência, os humanos reminiscentes, os “não invadidos”, como Melanie (a princípio) e Jared.

    O modus operandi da invasão levanta um questionamento interessante: como reagem ou devem reagir os 100% humanos ao se deparar com um hospedeiro conhecido? O corpo é o da pessoa que se conhecia. Suas feições, seu modo de andar, seu jeito de falar continuam os mesmos. Ainda é a pessoa com que se convivia. Mas ao mesmo tempo, não é mais, ao menos na maioria dos casos. Melanie é uma hospedeira que resiste à invasão. Ela e a invasora, Peregrina (Peg), “brigam” pelo controle do corpo de Melanie, o que gera algumas situações engraçadas quando Mel se irrita com alguma ação de Peregrina.

    É uma pena que o roteiro não tenha dado mais ênfase à faceta sci-fi do filme, certamente para tentar agradar aos fãs oriundos de Crepúsculo. Contudo, essa não é a maior falha do roteiro, já que quem não leu o livro não faz ideia que esse enfoque é bem mais explorado. Apesar de Niccol ter conseguido eliminar a maioria dos excessos do livro – cenas desnecessárias e estórias paralelas que pouco ou nada acrescentavam – o ritmo da narrativa é extremamente lento, quase sonolento em alguns trechos. É uma pena que Niccol, responsável pelos roteiros de Gattaca, O show de Truman e O senhor das armas – todos acima da média – tenha conduzido a trama dessa forma. E o que resta ao espectador é acompanhar Mel/Peg tentando ganhar a confiança dos demais e o triângulo – ou quadrado – amoroso em que ela se envolve, ou seja, situações clichês em filmes para adolescentes.

    O elenco está bem, nenhuma atuação surpreendente ou fora do comum. Saoirse Ronan poderia ter se dedicado um pouco mais a diferenciar a personalidade de Mel e Peg, mas a voz em off de Mel dá conta do recado. Diane Kruger encarna de modo convincente a fria, calculista e (aparentemente) insensível Buscadora. E William Hurt, no papel de Tio Jeb, está em sua zona de conforto representando o chefe do grupo, detentor de sabedoria.

    Apesar das paisagens chamativas, da premissa interessante e do roteirista/diretor merecidamente premiado, o filme não chega a ser memorável. Talvez o espectador se lembre dele apenas quando anunciarem a sequência – o final do filme dá brecha para essa especulação, e a própria Stephenie Meyer cogita escrever mais livros sobre o tema.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.

  • Crítica | Jack: O Caçador de Gigantes

    Crítica | Jack: O Caçador de Gigantes

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    Mais um filme que revisita uma estória infantil, o conto de fadas inglês “João e o pé de feijão”. E ainda na onda do politicamente correto, desta vez, João (ou Jack) deixa de ser um ladrãozinho – que surrupia primeiro moedas de ouro, depois a galinha dos ovos de ouro e por último a harpa de ouro – para se tornar um jovem destemido que luta para defender seu mundo dos gigantes “malvados”. Porém, o cerne da estória – o garoto ludibriado numa troca que volta para casa com um saquinho de feijões ao invés de moedas – foi mantido, com alguns adendos na tentativa de enriquecer a trama.

    A aventura infanto-juvenil lembra bastante os filmes de fantasia dos anos 80 – Krull, A lenda, História sem fim – com valentes cavaleiros, donzelas em perigo, lutas de capa e espada, apenas com efeitos especiais mais elaborados, com menos maquiagem, maquetes e fantasias e mais computação gráfica. Contada de modo convencional e pouco inventiva, a trama não chega a entusiasmar, mas também não entedia o espectador. Com algumas pitadas de feminismo e tiradas de humor – bem ao estilo de Piratas do Caribe – entretém, mas está longe de causar empolgação. Tem-se a impressão de que o investimento foi grande na concepção dos efeitos especiais e pequeno na concepção do roteiro. Esperava-se bem mais de Christopher McQuarrie, o roteirista responsável pelo excelente Os Suspeitos.

    O elenco está bem, apesar dos personagens terem pouca ou quase nenhuma complexidade. São todos estereotipados: Jack (Nicholas Hoult) é o rapaz honrado, Isabelle é a moça (quase) rebelde, Elmont é o cavaleiro valente, Roderick (Stanley Tucci) é o conselheiro ardiloso. Aliás, enquanto o Elmont de Ewan McGregor vai ficando mais carismático à medida que o filme avança, a princesa Isabelle (Eleanor Tomlinson) parece cada vez mais apenas um elemento decorativo.

    Ao contrário do que aparentavam tanto nos trailers quanto nos anúncios, os efeitos de computação gráfica em combinação com a filmagem 3D deram um bom resultado final, exceto por uma ou outra falha pouco perceptível. Apesar de o 3D não acrescentar muito ao filme, também não chega a atrapalhar como ocorre em alguns casos, principalmente quando o filme é convertido de 2D para 3D. Vale destacar o pé de feijão que simplesmente enche a tela (e os olhos) com sua grandiosidade e riqueza de detalhes. E não se pode reclamar da aparência dos gigantes, já que eles são tão verossímeis quanto um personagem de conto de fadas pode ser. Sobre os gigantes, atenção especial para o “chefe” de duas cabeças, General Fallon, dublado pelo inconfundível Bill Nighy.

    Contudo, nem só de efeitos especiais sobrevive um filme. No máximo, este talvez seja lembrado como “aquele em que Ewan McGregor quase virou petisco de gigante”.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.

  • Crítica | Sete Psicopatas e um Shih Tzu

    Crítica | Sete Psicopatas e um Shih Tzu

    Sete Psicopatas e um Shih Tzu

    Depois do excelente Na Mira do Chefe o diretor e roteirista Martin McDonagh volta às telas com Sete Psicopatas e um Shih Tzu. Apesar do primeiro ainda ser melhor, esse segundo ainda cai bem como uma comédia de humor negro e metalinguagem a respeito do cinema e violência, que lembra os bons tempos de Guy Ritchie com Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes e Snatch – Porcos e Diamantes.

    Com um excelente elenco, que junta Colin Farrell, Sam Rockwell, Christopher Walken, Woody Harrelson e outros, o filme começa com o escritor Martin (Farrell) tentando bolar uma ideia a respeito de Sete Psicopatas com histórias interessantes de vida, e com a ajuda de amigos (Rockwell e depois Walken), vai acrescentando em seu bloco de notas um psicopata com uma história mais interessante e exótica que outra.

    Porém, conforme vai passando, podemos ver que a conversa dos personagens dentro do filme é cada vez mais metalinguística, e cada vez mais referencial ao próprio filme e ao que está acontecendo, subvertendo totalmente a experiência inicial do longa, que nos levava para um caminho tradicional do filme de “máfia-com-perseguição-e-vingança” (e que o próprio filme tira sarro de sua escolha).

    Quando é finalizada a subversão e a história vira totalmente auto referencial e se preocupa somente com isso, um pouco da mágica e da graça acabam, tornando tudo uma paródia dos filmes violentos de Hollywood, com seus finais grandiloquentes e redenções ainda mais carregadas de emoções milimetricamente construídas. Outro ponto positivo é que em momento algum os personagens são tratados como arquétipos tradicionais de “mafioso” ou “psicopata”, o que dá espaço a piadas e situações muito boas, principalmente com Woody Harrelson, cada vez melhor.

    A intenção da sátira é louvável, mas seu resultado acaba fazendo o filme perder um pouco da graça e da intenção original, apesar de garantir algumas risadas, porém, mais pela graça do escândalo do que pela inteligência da construção do clímax.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.

  • Resenha | Preacher

    Resenha | Preacher

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    Criada por Garth Ennis e Steve Dillon, escrita pelo primeiro e desenhada pelo segundo, além das capas feitas por Gleen FabryPreacher se tornou rapidamente uma das publicações da Vertigo mais famosas dos anos 90 devido ao seu estilo cínico, cheio de ação e de críticas a religião e a sociedade ocidental como poucas da época.

    Os 66 números se tornam uma leitura relativamente rápida, mesmo com pouco tempo disponível é possível ler sem maiores problemas uma média de 4 ou mais números por dia, ou a metade de um dos 9 arcos da história, e concluí-la em menos de 1 mês. A série tem as suas metáforas e reflexões interessantes, mas também tem muita ação, o que a faz ter um equilíbrio para quem busca algo a mais em uma HQ de leitura rápida.

    Sinopse: o reverendo Jesse Custer foi possuído por uma entidade que lhe confere a voz de Deus, super poder este que faz com que qualquer um lhe obedeça. Juntam-se a ele sua ex-namorada Tulipa e o vampiro irlandês porra-louca Cassidy. Devido a explosão da igreja onde estava na hora em que recebeu o poder, os três são caçados pelo governo americano e pelo Santo dos Assassinos enquanto ajudam Jesse em sua busca pelo paradeiro de Deus no meio de duas grandes conspirações, uma envolvendo a política celeste e a outra o Santo Graal.

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    Os três protagonistas: Jesse Custer, Tulip O’ Hare e Cassidy

    A história em si, apesar de regular, inova pouco dentro da narrativa de super-herói, todas as convenções do gênero estão lá. O que Garth Ennis faz é subvertê-la de forma interessante: o super poder do protagonista é pouco utilizado (ele é até esquecido às vezes, como no número 33), todos sabem a identidade secreta do (super-herói) pregador, ele tem uma namorada e um melhor amigo, sua galeria de vilões são todos regionais (específicos de locais por onde os protagonistas passam), com exceção do super vilão Herr Starr, que o persegue o tempo todo, além de que um importante personagem morre e retorna no número seguinte.

    A premissa de Preacher é a crítica ferrenha aos valores cristãos-católicos, na figura do ex-pregador que vai acertar as contas com Deus. Sendo mostrado o tempo todo de forma patética por fugir do céu e evitar o confronto com Jesse, Deus e as criaturas celestiais na história tem tantas falhas quanto os humanos, sendo movido pelos seus interesses pessoais, acima do bem comum, conspirando e assassinando, ao invés de promover o amor e a tolerância entre os humanos, como também salvar a humanidade.

    Onde esta Deus

    Jesse pergunta pelo todo poderoso…Preacher cena mais interessante

    …e finalmente o encontra em um dos melhores momentos da série.

    Ao longo da trama, Garth Ennis trabalhou bastante os protagonistas da série da Vertigo. Jesse e Tulipa, no entanto, tiveram poucas mudanças de caráter e de personalidade. Jesse começa e termina a história com seu senso moral de fazer o que acha certo a sua maneira, querendo acertar as contas com Deus, e enquanto isso não acontece se mete em brigas com quem quer que cruze o seu caminho.

    Tulipa como uma assassina de aluguel cheia de vida ainda é a namorada perdidamente apaixonada por Jesse e o segue até o fim. Ela tem dúvidas e incertezas quando posta de lado por ele algumas vezes, mas sempre são contornáveis no final das contas. Seu momento mais marcante de mudança de personalidade é quando fica de luto, e é aí que o autor lhe confere a qualidade mais interessante: ficar em depressão profunda.

    amar ate o fim do mundo

    O casal apaixonado

    Cassidy, por outra vez, se torna de longe o personagem mais tridimensional e o mais interessante. O alter ego irlandês do autor é dúbio, tem falha de caráter e o seu passado é um dos mais ricos de todos. Talvez por ser a mais extensa (já que ele é um vampiro de quase 100 anos), é a que melhor detalha a mudança de personalidade de Cassidy com situações que mostram a sua essência: ele te seduz sendo um bom amigo que faz tudo por você até se tornar um filho da mãe que te esfaqueia pelas costas. Ele te usa, e quando você não tem mais serventia, te joga fora. Em suma, pode-se dizer que é um vampiro social.

    Cassidy

    Cassidy saboreando a carne depois de amaciá-la em uma briga

    Um dos pontos altos na obra é o cinismo de Garth Ennis. Todas as grandes sacadas da narrativa envolvem mostrar situações onde algum personagem respeitável está fazendo algo condenável moralmente, ou quando sofre ou morre de forma esdrúxula. O mais curioso é que isso não se restringe somente aos protagonistas: todos os que fazem parte da história em algum momento caem nas armadilhas preparadas pelo autor, mostrando o quão patéticos eles são naqueles momentos. É aí que o leitor será surpreendido, quando o esquisito, o grotesco se apresenta.

    D'Aronique

     O Grande pai D’Aronique golfando, já que sofre de bulimia

    advogada do quincannon

    Senhorita Oatlash, a advogada de Odin Quincannon dando em cima de Jesse

    preacher_28_08Herr Starr escolhendo uma peruca

    Pai da Tulipa

    Pai da Tulipa morto por caçadores de forma patética: cagando no mato

    Outro ponto alto são os diálogos, que são sempre mostrados de forma a fornecer ao leitor mais sobre as particularidades dos personagens, como também de dar mais informações a cerca do universo que os circunda. Bem escritos, soam críveis na maioria das vezes, tendo uma ou outra escorregada aceitável.

    A série é muito violenta e a violência é apresentada de forma crua, sendo que a sugestão dela poucas vezes ocorre. O gore praticamente dá as caras o tempo todo quando pessoas são mortas por armas de diversas formas possíveis. Pode ser um incômodo para quem tem problemas com tamanha exposição, mas para quem gosta é um prato cheio.

    Violencia preacher

    O desenho de Steve Dillon no geral é interessante. Os personagens comuns são retratados de forma usual, mas o seu melhor se encontra nos personagens bizarros como Santo dos Assassinos, Cara-de-Cu, Herr Starr, Marie L’Angell, o grande pai D’Aronique, Odin Quincannon, entre outros. No traço de Dillon eles se tornam tão característicos e enigmáticos que são reconhecíveis facilmente inclusive quando mal aparecem em cena.

    Odin Quincannon

    Odin Quincannon, um dos vilões mais bizarros

    Sua caracterização de ambientes e cenários também é satisfatória, dando ao leitor a fácil capacidade de se ambientar no meio de tantas andanças que ocorrem ao longo da série.

    Mas seu traço também tem um problema que incomoda: o rosto das personagens femininas são quase sempre iguais. Isso só não torna mais difícil a caracterização para o pelo leitor pois as cores bem usadas das roupas e cabelos diferentes permite a identificação, mas ainda assim deixa a história mais pobre.

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    As duas personagens femininas e seus traços muito parecidos

    As capas de Gleen Fabry são um espetáculo a parte. De uma forma mais realista, as ilustrações tentam elevar os personagens desenhados por Dillon um patamar diferenciado.

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    Preacher vale a pena? Definitivamente pela relevância alcançada que tem no mundo dos quadrinhos alternativos dos anos 90. Ennis conseguiu atingir um nível superior de qualidade entre o auge das histórias com heróis super fortes e cor digital da Image e as fracas tramas de quedas de heróis da DC/Marvel. Junto com Grant Morrison, Neil Gaiman liderou a vanguarda alternativa do selo Vertigo, e se tornando uma alternativa interessante para uma época que o tempo mostrou ser relevante até hoje.

    Texto de autoria de Pablo Grilo.

  • Resenha | Frostbite: Um Romance de Lobisomem – David Wellington

    Resenha | Frostbite: Um Romance de Lobisomem – David Wellington

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    Para falar a verdade, nunca fui muito fã de lobisomens. Até hoje, não conheço um filme decente que faça jus às criaturas místicas que são uma mistura grotesca de homem e lobo e mais poderosas e ferozes do que qualquer outro predador. No entanto, alguns livros atualmente sobre lobisomens os trazem de uma maneira diferente, não havendo um meio termo: nasceu a lua cheia, são lobos. Lobos de verdade, e não os híbridos bizarros. Esse é o caso de Frostbite e, apesar de eu preferir o modo trash lobisomem de ser, esse livro está entre os melhores relatos desses monstros que eu já tive o prazer de ler. Com personagens atormentados e uma sequência frenética de acontecimentos, essa é uma leitura indispensável para todos aqueles que buscam por sangue e um ritmo caótico.

    Narrado em terceira pessoa, essa mesma narrativa se divide em dois momentos: quando Chey, a protagonista, está em sua forma humana, e outro enquanto ela está em sua forma de lobo. É evidente a mudança que ocorre mesmo no modo de contar a história quando esses dois momentos mudam. Quando humana, tudo se desenrola de acordo com os sentimentos da protagonista, seja quando está com raiva, com medo ou com a certeza de que vai morrer. Quando loba, tudo que quer é sangue e morte, dando assim um ar tenebroso para aquela protagonista que, mesmo forte, não parecia ter essa maldade dentro dela.

    Sim, tem um casal protagonista de lobisomens (own). Porém, não há drama e não há meninices nessa parte. Você torce por eles por serem parecidos (veja bem, no primeiro encontro deles como humanos, ele tenta matá-la com um machado. No primeiro encontro deles como lobos, ela tenta arrancar a jugular dele com os dentes, não é o casal perfeito?) e combinarem. Porém, desde o princípio fica evidente que a protagonista tem um segredo que a levou até ali. E é o que nos leva ao outro ponto forte do livro: os personagens.

    A protagonista não é uma donzela indefesa. No entanto, ela também não é a personagem mais útil do livro enquanto humana. Não porque ela não pensa no que faz, mas sim porque os outros são simplesmente muito mais habilidosos e mais treinados do que ela. Porém, ela tenta, e ganha respeito por não desistir mesmo quando tudo parece dar errado e ela está, literalmente, toda quebrada em algum canto da floresta. O outro, Powell, que é o lobo que a transformou, também merece ser mencionado por condizer o tempo todo com a impressão inicial que passa ao leitor. Ele não muda aquilo em que acredita e não contém sua raiva quando certas coisas acontecem. Powell é, acima de tudo, um predador.

    Existem, é claro, alguns personagens babacas, como o namorado de Chey, que não o é por ser um personagem mal criado, mas por ser criado tão bem em suas manias que é simplesmente um babaca completo. Todos os personagens são únicos e bem feitos. E agora vamos ao melhor personagem do livro: Dzo.

    – Eu sei. O engraçado é que não estou com tanto medo de ser morta como estou de falar com Powell novamente. Mas você não entederia isso.

    Ele ergueu as mãos em desculpas fracas.

    – Talvez você morra entes de ir tão longe – sugeriu ele.

    – É – Ela começou a andar novamente – Obrigada, Dzo.

    Ele não se importa com o que você pensa, como você aparenta ou quem diabos você é. Dzo é a criatura mais pacífica e mais despreocupada que você poderia conhecer em toda sua vida. Suas palavras de sabedoria (como visto ali em cima) são indispensáveis para você manter foco no seu objetivo. Como a pessoa que me emprestou o livro disse: todo mundo deveria ter um amigo como o Dzo, e eu concordo com ela. É um personagem cativante que permanece uma incógnita até o final do livro. Apenas capaz de entender frases literais, é digno dos melhores diálogos presentes no livro.

    Por último: as transformações. Diferente dos seriados, filmes etc., a transformação que David Wellington narra é muito mais poética do que a grotesca quebra de ossos e dores absurdas. A luz da lua toca o lobisomem e seu corpo se desfaz, como se nunca houvesse existido, e em seu lugar o lobo se materializa. Foi uma surpresa agradável – apesar de preferir as transformações dolorosas e repletas de gritos – ter uma visão de como ele quis colocar os lobisomens: como se lobo e homem fossem duas entidades diferentes com duas consciencias distintas.

    Portanto, apesar do final um pouquinho frustrante – afinal, era desejável que a protagonista arrancasse a cabeça dos antagonistas a dentadas -, o autor criou e desenvolveu uma excelente história de lobisomens e recomendo a leitura até mesmo para quem nunca foi, assim como eu, um grande fã dessas criaturas.

    Compre aqui.

    Texto de autoria de Thiago Suniga.

  • Crítica | O Amante da Rainha

    Crítica | O Amante da Rainha

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    Nikolaj Arcel foi roteirista da versão sueca de Os Homens que Não Amavam as Mulheres, mas seu novo filme como diretor tem pouco em comum com o romance policial. O Amante da Rainha, indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro pela Dinamarca, é um drama de época, clássico, embora violento a sua maneira.

    Caroline é uma adolescente inglesa enviada à Dinamarca para se casar com o jovem rei, o instável Christian. Entre a loucura de Christian  e a constante vigilância da corte, Caroline, ainda uma menina, vive infeliz e solitária até conhecer Johann Struensee o novo médico real. Excêntrico, Johann consegue se aproximar do rei e ajuda-lo a exercer realmente seu poder,de forma humana e moderna, além de começar um caso com a rainha. Mas O Amante da Rainha é uma tragédia e no final tanto o plano de uma nova Dinamarca quanto o romance do casal desmoronam.

    O fio condutor da narrativa é uma carta que Caroline escreve aos filhos no leito de morte e é a voz dela que guia os acontecimentos. Quase todo o filme se passa dentro do palácio, ricamente decorado, mas claustrofóbico, o único momento em que há luz e ar é quando Caroline se aproxima de Johann. Essa oposição entre ambientes fechados e abertos, iluminação dourada e cinzenta, marca de forma muito clara  as partes do filme: a solidão inicial de Caroline, o idílio com Johann e o sonho de uma Dinamarca iluminista e o drama final.

    Da mesma forma o filme opõe iluminismo e religião: a juventude de Caroline, Johann e Christian à velhice dos membros do conselho, suas roupas claras ao preto deles e inclusive a luz com que os personagens são iluminados. A discussão de Arcel sobre o peso da religião na política e os interesses do jogo político são extremamente atuais, ainda que ele cite filósofos do século XVIII.

    O Amante da Rainha se parece com uma tragédia grega, ou de Shakespeare: é a paixão dos personagens que os destrói no fim e desde o início o diretor anuncia isso. O espectador vê , devagar, o poder subindo a cabeça de Johann e Caroline se tornando menos cautelosa em esconder sua traição. O filme é tenso porque envolve o espectador no destino dos personagens, o faz gostar e torcer por eles, mesmo sabendo desde o início que o final não pode ser bom.

    Arcel fez um filme clássico, em termos de cinema e dramaturgia, extremamente minuncioso e bem feito. Mads Mikkelsen (aparentemente o ator nacional da Dinamarca) dá nuances variadas ao seu Johann, mas é Alicia Vikander que brilha no filme: o sofrimento de sua Caroline é real e pungente e ela é igualmente frágil e ousada.

    O Amante da Rainha é um filme longo e de pouca ação. Mas é bem filmado, muito bem atuado e angustiante como as melhores tragédias.

    Texto de autoria de Isadora Sinay.

  • Crítica | Amanhecer Violento

    Crítica | Amanhecer Violento

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    A cena inicial tem um estilo de documentário. São mostradas, em rápida sucessão, imagens jornalísticas (muitas delas reais) situando um conturbado cenário internacional. Crise econômica na Europa gerando protestos civis; o Oriente Médio em crescente agitação, o que exige maior participação militar norte-americana; a Rússia de alguma forma envolvida em tudo isso; e, principalmente, a Coreia do Norte assumindo uma postura cada vez mais belicosa, deixando os analistas políticos do mundo inteiro perplexos e apreensivos. Tal abertura parece indicar uma preocupação em ser realista, ou ao menos apresentar uma extrapolação crível da nossa realidade… “só que não” elevado à enésima potência. Amanhecer Violento é, mais que um filme, um ode à inverossimilhança.

    Um belo dia, os moradores da pequena cidade de Spokane, localizada próxima a Seattle, têm sua tranquilidade quebrada ao acordar e ver o céu cheio de aviões e para-quedas inimigos. Norte-coreanos. Exatamente: a Coreia do Norte está empreendendo uma invasão em larga escala aos Estados Unidos. Com as forças da Lei rapidamente dominadas, cabe a um grupo de adolescentes formar uma resistência contra os invasores. Liderados pelo deus do trovão, Thor (quer dizer, Jed, um jovem soldado interpretado por Chris Hemsworth), eles vão assumir o nome do time de futebol local, os Wolverines, e do dia para a noite vão virar mestres na arte da guerrilha.

    A direção do estreante Dan Bradley não é das mais inspiradas, as atuações são todas sofríveis (em especial a de Josh Peck vivendo o rebelde Matt, irmão de Jed), mas deixa isso pra lá. Muito mais divertido é analisar a coleção de furos desse inacreditável roteiro. Vamos considerar que os norte-coreanos enlouquecessem de vez e declarassem guerra aberta aos EUA. Bombardeios intensos seriam uma opção mais lógica do que uma invasão. Porém, o filme sugere que o interesse dos orientais não é destruir o inimigo, nem roubar seus recursos naturais, e sim algo como “tornar o país um lugar melhor para as pessoas que vivem lá, libertando-as do capitalismo maligno etc”. Fingindo que isso tem um resquício de sentido para podermos ir em frente, surge a pergunta natural: de onde a Coreia do Norte tirou os recursos (humanos, inclusive) pra fazer isso? Pois é dito no filme que a ocupação está acontecendo no país inteiro, não apenas nos grandes centros. Ah, os russos ajudaram fornecendo tecnologia, equipamentos? Tudo explicado, então.

    E quanto a todo o poderio bélico americano, que não dá as caras mesmo passando-se várias semanas desde a invasão? Sério mesmo que devemos aceitar que uma movimentação militar desse tamanho passou despercebida, ou talvez que TODO o contingente dos EUA estivesse no exterior? Quando, próximo ao final, a coisa adquire ares de ficção científica (é sugerido que os invasores têm uma nova superarma elétrica que desliga todas as máquinas inimigas), o filme se torna nada além de risível. Aliás, o fato de se levar totalmente a sério, o tempo todo, também contribui muito pra isso.

    Amanhecer Violento é na verdade um remake. No original, de 1984, os invasores eram soviéticos. Já era algo forçado, mas perdoável, dada a ameaça mais palpável da Guerra Fria e a ingenuidade geral que ainda havia na época. Esta nova versão foi filmada em 2009, e o atraso em seu lançamento deve-se a dois fatores. A gigantesca crise pela qual passou o estúdio MGM, e outra que adiciona uma nova camada de ridículo: originalmente o inimigo era a CHINA (o que até faria o filme ter um pouco mais de sentido, mas só um pouquinho mesmo). Como os chineses estâo entre os maiores investidores de Hollywood, além de um mercado consumidor altamente lucrativo, há uma diretriz de não mais colocá-los como vilões. Amanhecer Violento optou por simplesmente alterar falas e algumas imagens na pós-produção, e magicamente “China” virou “Coreia do Norte”. Asiáticos são todos iguais mesmo, afinal. Sabendo disso, fica hilário notar que permaneceram no filme vários cartazes em vermelho e amarelo, com mensagens comunistas.

    Depois de tudo isso, não há necessidade (ou mesmo vontade) de analisar os aspectos mais práticos da produção. Como a narrativa péssima, personagens rasos, sem carisma nem desenvolvimento, ou a fotografia e cenas de ação… vá lá, razoáveis. Amanhecer Violento merece ser lembrado como um dos filmes mais ERRADOS de todos tempos, perdendo por muito pouco para o inigualável Imortais.

    Texto de autoria de Jackson Good.

  • Resenha | Red Luna: A Biblioteca do Czar – Gabriel Morato e Marcos Inoue

    Resenha | Red Luna: A Biblioteca do Czar – Gabriel Morato e Marcos Inoue

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    Red Luna é um projeto transmídia (entenda aqui o que é isso) cuja etapa inicial é a publicação de uma série de três livros, dos quais A biblioteca do Czar é o primeiro. Além dos livros, a princípio, haverá também a publicação de quadrinhos que complementarão o universo criado pela equipe de escritores, roteiristas e ilustradores.

    Universo Red Luna
    Três raças de vampiros, ou Hollows, lutam entre si desde tempos imemoriais: os Devas, os Varnis e os Auras. Suas origens estão envoltas em mistério, e o ódio que sentem uns pelos outros só cresceu ao longo dos tempos. No meio desse fogo cruzado, está a Humanidade, de quem se alimentam.
    A cada ascensão e declínio de um império vampírico, novas peças são acrescentadas a uma épica e milenar partida de xadrez. As histórias de Red Luna relatam como cada um desses clãs surgiu e como a inimizade entre eles começou.
    Cada livro focaliza um protagonista diferente, com seus conflitos únicos e em determinado período da História, mas todas as tramas acabarão por se entrelaçar numa batalha pela Terra Prometida dos Hollows: Red Luna
    (fonte: primeira orelha do livro)

    O leitor acompanha as aventuras de Miguel, um rapaz morador de uma cidade costeira no País Basco que, junto com uma cigana, cuida da taverna deixada pelo tio que partiu em viagens. Em circunstâncias inesperadas, Miguel descobre que o tio talvez esteja em perigo e, com o auxílio de Alisa, uma princesa Varni, parte em viagem para a Rússia a fim de localizá-lo.

    Apesar de o texto ser escrito em terceira pessoa, o narrador não é onisciente. O narrador observa e relata os fatos do ponto de vista de Miguel. Sendo assim, não revela o que acontece aos demais personagens quando não estão com ele. Se, por um lado, é interessante ao criar uma identificação do leitor com o personagem – já que o que Miguel (não) sabe, o leitor (não) sabe; por outro, dá a impressão em alguns momentos de que a narrativa está incompleta. Porém, mesmo essa aparente falta de informações é benéfica, já que instiga o leitor a ir procurar em outras fontes o que “falta” – nos quadrinhos, no site, ou qualquer outra mídia que esteja compondo o universo Red Luna.

    O livro é voltado ao público infanto-juvenil, o que minimiza o efeito negativo de a história lembrar muito – muito mesmo – o roteiro de Indiana Jones e a Última Cruzada. O tio de Miguel, Lasko, é dado como desaparecido, assim como o pai de Indiana. Miguel encontra-se em posse de um caderno com anotações de Lasko; em certo ponto da trama, ele deve enfrentar desafios cujas pistas para a solução estão no caderno de Lasko; e o último obstáculo é um obstáculo de fé, assim como o “leap of faith” do filme. Enfim, para quem cresceu assistindo aos filmes de Indiana na Sessão da Tarde, e que não é o público-alvo deste livro, essa sensação de déjà-vu pode atrapalhar a imersão na estória. Contudo, o público infanto-juvenil certamente não tem essa referência tão fortemente arraigada e deve se deixar conquistar pela escrita fluida do autor.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.

  • Resenha | Holy Avenger: Edição Definitiva – Vol. 1

    Resenha | Holy Avenger: Edição Definitiva – Vol. 1

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    “Lisandra. Criada por animais em uma ilha selvagem, esta jovem vivia feliz em seu mundo puro… Até que os sonhos vieram. Sonhos sobre o Paladino, um herói com o poder do Panteão. Sobre como ele havia sido derrotado por forças malignas. E sobre como Lisandra poderia ressuscitá-lo se encontrasse suas gemas divinas — os vinte Rubis da Virtude. Para ajudar Lisandra surgem Sandro, filho do maior ladrão do Reinado, Niele, a bela e maluca arquimaga élfica, e Tork, o troglodita anão.”

    Holy Avenger surgiu em 1998 dentro da revista Dragão Brasil, revista brasileira especializada em RPG (role playing game) e possúia um grande destaque à época. A história apresenta 40 edições que foram lançadas à época e, hoje, podemos conferir uma das HQs mais relevantes do mercado nacional sendo publicada em um material de luxo que agrada aos olhos de qualquer fã.

    O roteiro simples, porém cativante de Marcelo Cassaro não deixa a desejar. A história de Holy Avenger tem personagens carismáticos e uma narrativa envolvente. Soma-se a isso a arte de Erica Awano, uma expoente da arte em mangá no Brasil, com traços sutis, porém significativos, as quais podem ser visualizadas em um formato maior do que antigamente graças a essa edição definitiva.

    O material de luxo é de encher os olhos de qualquer pessoa que encontra o encadernado em uma livraria, porém possui um problema que incomoda qualquer um que acompanhava a série antigamente. Nas edições antigas sempre haviam algumas poucas páginas coloridas no começo das revistas. Estas, porém, foram simplesmente negligenciadas e esquecidas na edição definitiva. Isso pode parecer pouco, mas é um erro bastante grave considerando que a edição definitiva deveria possuir o ápice de qualidade em sua publicação – isso se aliando ao fato de que as páginas coloridas eram de excelente qualidade-, ainda mais considerando o preço “salgado” que está sendo comercializado, representando um certo descaso por parte da editora com o público.

    Pois bem, tirando  o problema da ausência de algumas páginas coloridas que simplesmente sumiram da edição, o material é de qualidade e poder relembrar as histórias de Lisandra e seu grupo de aventureiros  é sempre uma excelente pedida, ainda mais se você for fã de jogos de RPG e afins.

    Compre aqui.

    Texto de autoria de Pedro Lobato.

  • Crítica | Duro de Matar: Um Bom Dia Para Morrer

    Crítica | Duro de Matar: Um Bom Dia Para Morrer

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    Os astros reúnem-se para um épico filme em grupo e depois retornam para suas aventuras solo: Os Mercenários são Os Vingadores do cinema de ação old school. Depois de Schwarzenegger em O Último Desafio (e, pelo menos no Brasil, antes de Stallone em Alvo Duplo), é a vez do inoxidável Bruce Willis ser o centro das atenções. Ele encarna mais um vez seu personagem mais famoso, o policial John McClane, no recente lançamento Duro de Matar – Um Bom Dia Para Morrer. Mesmo desconsiderando a pra variar “genial” tradução brasileira de A Good Day To Die Hard (era díficil chamar simplesmente de Duro de Matar 5?!), é triste comentar sobre este que acabou se revelando o pior capítulo da franquia.

    Naquilo que se passa por “história”, McClane fica sabendo que seu filho Jack, com o qual não falava há anos, foi preso na Rússia e está sendo acusado de assassinato. Como canais legais e diplomáticos são para os fracos, ele resolve embarcar por conta para a terra do grande Zangief pra resolver a parada. Chegando lá, mas que vergonha, descobre que seu pimpolho trabalha para a CIA e está numa missão ultrasecreta visando a recuperação de (sim, isso mesmo) armas nucleares. A partir disso, pai e filho vão rapidamente se entender, sobreviver e derrotar os vilões. E só.

    Na linha do que aconteceu recentemente com Skyfall, grande parte das críticas negativas de Um Bom Dia Para Morrer vem se concentrando na alegação de que este não é o “verdadeiro” John McClane. Besteira. Os mais radicais (e chatos) falam isso desde Duro de Matar 3, e apesar disso os filmes foram empolgantes e divertidos (com o 4.0 sendo o ápice do massa véio bem executado). O problema agora é que o 5º filme é ruim, simplesmente. O roteiro é fraco até para os padrões do gênero, a ação nao consegue compensar isso por ser muito genérica, e nem o carisma do protagonista aparece.

    Bruce Willis costuma mandar bem mesmo no automático, mas aqui ele está em algum ponto abaixo disso. Ele parece se apagar em vários momentos, como se McClane quisesse deixar o filho brilhar. O que nunca passa nem perto de acontecer, naturalmente. E a culpa é mais do roteiro do que do esforçado Jay Courtney (visto em Spartacus e Jack Reacher). A história tenta trabalhar uma relação conflituosa entre pai e filho, mas de maneira rasa e extremamente indecisa. A mágoa que Jack sente pelo pai ausente acaba num passe de mágica quando John diz que o ama. A dinâmica do veterano acostumado ao improviso em contraste com o jovem metódico e certinho espião style, que poderia render algo interessante, fica apenas na sugestão. Isso porque tudo na trama acontece muito fácil e rápido, não há senso de perigo ou urgência em momento nenhum, então não faz diferença o modo como eles resolvem as coisas.

    A velha ironia de McClane, resmungando sobre a roubada em que se meteu, também sai prejudicada no meio disso. Como não demonstra estar passando por dificuldades, ele perde sua humanidade e torna-se chato repetitivo. Por exemplo, ao repetir umas doze vezes que estava de férias. As cenas de ação, que poderiam contar pontos a favor do filme (afinal, é um blockbuster), não chegam a impressionar. Com a breve exceção da perseguição de carros inicial, que começa burocrática mas diverte quando se torna galhofa e absurda. Depois, tudo se resume a tiroteios e correrias Comuns da Silva. Quando surge um lampejo de inspiração visual na cena do “yippee-ki-yay, motherfucker” ou até na referência ao final do primeiro filme, já é tarde demais pra salvar qualquer coisa.

    Com uma recepção amplamente negativa, e uma bilheteria mediana, difícil exergar um futuro para a franquia Duro de Matar. O que não deixa de ser uma pena, pois John McClane merecia um encerramento melhor. Mas pelo menos continuaremos a ver Bruce Willis chutando bundas por aí, certamente.

    Texto de autoria de Jackson Good.

  • Crítica | Lincoln

    Crítica | Lincoln

    lincoln

    Spielberg foi por muito tempo um marco do cinema hollywoodiano: seus sucessos comerciais, como Tubarão e Indiana Jones, entraram para a história e, em A Lista de Schindler e O Resgate do Soldado Ryan, ele parecia ser o grande herdeiro do cinema clássico americano. No entanto, já há alguns anos o diretor vem perdendo a relevância, e cada novo filme seu parece apenas mais do mesmo: formulaico e um tanto monótono.

    Lincoln, embora melhor do que Cavalo de Guerra, não é muito diferente. O filme não é uma biografia do ex-presidente, mas se foca nos esforços deste para aprovar a 13ª emenda à constituição americana, que aboliria a escravidão em todo país e assim poria fim à Guerra de Secessão. Dessa forma, quase toda a ação é composta pelo jogo político: senadores convencendo uns aos outros, subornando, ameaçando. E a tensão fica por conta da aprovação ou não da emenda.

    A escolha do tema é acertada: a abolição da escravidão é algo que desperta a simpatia do espectador, algo pelo qual é possível torcer. Mas o filme não tem tensão: o espectador, mesmo que desconheça a história americana, adivinha de início o final e todos os artifícios de Spielberg para disfarçar o desfecho soam como clichês ineficientes.

    Por outro lado, o jogo político em si não deixa de ser interessante, principalmente quando se considera que o partido de Lincoln, a favor da abolição, era o partido Republicano. Outro ponto forte do filme é o próprio personagem central: para os americanos, Lincoln é uma figura gigantesca, quase mítica; para nós ele não possui o mesmo aspecto, mas Daniel Day-Lewis consegue infundir humanidade e dimensão no presidente. Não é que a atuação de Lewis seja excepcional: ele é sempre um excelente ator, mas não faz aqui nada além do esperado. Ainda assim, seu carisma carrega o filme e faz com que o espectador se apegue ao personagem.

    Talvez o maior problema aqui seja que Spielberg leva seu filme a sério demais: a fotografia é escura, contrastada e dramática, e os tons do cenário e do figurino, todos cinzentos. Spielberg quer enfatizar a todo momento o drama da Guerra de Secessão, os horrores que estavam sendo combatidos por seu personagem e ainda se manter fiel à história de uma forma quase didática. Nesse esforço ele perde o que seu filme poderia ter de melhor: a ironia fina, o caráter forte e a excentricidade do próprio Abraham Lincoln. É um filme potencialmente interessante, mas que se torna monótono por excesso de reverência.

    Além disso, no final, o filme se arrasta por uns 30 minutos desnecessários. Lincoln não se propõe a ser uma biografia, mas um recorte de um momento específico na vida do presidente; ainda assim, se alonga até seu assassinato, que, desconexo da história, faz com que Spielberg perca um ótimo final e com que seu filme perca boa parte da força.

    No fim, Lincoln não é um filme ruim, nem chega a ser excessivamente chato: tem momentos interessantes e alguns pontos fortes. Mas é facilmente esquecível, um filme preso em esquemas e fórmulas prontas.

    Texto de autoria de Isadora Sinay.

  • Crítica | A Fuga

    Crítica | A Fuga

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    Após o assalto a um cassino, trio de ladrões dirige-se à fronteira EUA-Canadá, quando um acidente na estrada acaba causando a morte de um deles. Escapando ilesos, os irmãos Addison (Eric Bana) e Liza (Olivia Wilde) separam-se com o intuito de dificultar a perseguição policial, tomando rumos diferentes no meio da neve para chegar à fronteira. Enquanto isso, Jay (Charlie Hunnam), um ex-boxeador recém saído da prisão, viaja para passar o Dia de Ação de Graças na casa dos pais – o xerife aposentado Chet Mills (Kris Kristofferson) e sua esposa June (Sissy Spacek).

    A sequência inicial é suficientemente impactante para chamar a atenção do espectador e fazê-lo querer saber o desfecho da estória dos dois irmãos. A tranquilidade quase excessiva dentro do carro – de certo modo um reflexo da quietude da paisagem branca ao redor – é subitamente interrompida pelo acidente. É uma pena que a força dessa cena não se mantenha no restante do filme que avança numa sucessão de eventos bastante previsíveis, com coincidências que por vezes soam forçadas.

    É um thriller de perseguição. Ponto. Dito isto, pode-se afirmar que o filme é satisfatório enquanto thriller de perseguição. Não se deve esperar algo similar a Argo, em que a perseguição é pano de fundo para o estudo dos personagens – todos muito bons. Neste, ao contrário, a tentativa de mesclar ação e dramas pessoais apenas enfraquece a trama. O roteiro, aliás, se mostra bem indeciso, sem saber se explora os dramas pessoais, o isolamento causado pela nevasca, as pequenas tramas paralelas ou se se atém à fuga dos ladrões. Ao tentar focar nos conflitos interpessoais de alguns personagens – Jay e seu pai, Liza e Addison, Hanna e seu pai – ou ao tentar acrescentar um pouco de complexidade psicológica aos personagens – Addison na cabana, por exemplo – a trama perde ritmo e interesse.

    Percebe-se a boa intenção do roteirista, mas isso não é o bastante. A sucessão de clichês e estereótipos, principalmente na construção dos núcleos de personagens, poderia ter sido evitada. Citando apenas os mais óbvios: clichê machista – uma policial feminina, a única da delegacia, que é sempre preterida por ser mulher; clichê racial – um caçador com feições indígenas vestindo um casaco de peles com uma águia pintada nas costas.

    Mesmo a presença de bons atores – Spacek, Kristofferson e Kate Mara (que demonstra todo seu potencial na série House of Cards) – não ajuda na construção dos personagens, já que estes são unidimensionais. A performance do elenco é correta, mas nada além disso. Eric Bana quase convence como o ladrão meio anjo meio demônio. Olivia Wilde não tem como ir além do perfil apático de Liza. Hunnam talvez pudesse tornar seu personagem mais carismático, se ele fosse mais que apenas o link entre os ladrões e seu destino.

    Apesar do excesso de closes e de “establishment shots”, a fotografia não deixa a desejar. Principalmente nas externas em que é beneficiada pela paisagem. Ajudaria bastante se a montagem fosse um pouco mais ágil. Afinal, é uma perseguição a fugitivos, não um filme contemplativo. A sequência de perseguição com snowmobiles, mesmo com a obviedade de alguns cortes, é um bom exemplo do ritmo que deveria ser seguido no restante do filme.

    A sequência inicial e o final (quase) inesperado – depois que os personagens lavam a roupa suja durante o jantar de Ação de Graças – compensam o “miolo” meio morno da narrativa. Em suma, é um filme mediano. Longe de ser um blockbuster, mesmo com o roteiro convencional e pouco criativo, personagens estereotipados e pouco complexos, consegue cumprir a função de entreter e passar o tempo.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.