O escritor britânico Lee Child conseguiu uma interessante façanha ao compor Jack Reacher, personagem principal de uma série de livros de sucesso mundial. Suas características apontam para um típico herói de filmes de ação, em que músculos são mais importantes que um raciocínio lógico. Mas sua inteligência investigativa, próxima das narrativas de suspense, aprofunda a personagem.
O romance Um Tiro foi a escolha certa para ser um cartão de visitas a quem desconhece a personagem. A história apresenta com precisão o protagonista, sendo um bom ponto de partida aos leitores. Na trama, um homem é preso após realizar um atentado que vitimou cinco pessoas. Alegando inocência, o atirador pede a presença do desconhecido Jack Reacher na cidade.
Ciente das diferenças entre literatura e cinema, Christopher McQuarrie, que também dirige o longa, trabalha em um roteiro em que as primeiras cenas são realizadas sem nenhum diálogo, valendo-se apenas da trilha sonora e de sua potência dramática. Uma maneira eficiente de apresentar a parte inicial da narrativa sem precisar de muito tempo excessivo, focando mais tempo no que surge a partir da personagem central e nos desdobramentos de sua investigação.
Tom Cruise funciona como Jack Reacher, sendo uma representação perfeita daquela vista nos romances de Child (embora antes de assistir a produção minha descrença era alta). Tem o rigor físico que compreende o uso da violência e a habilidade investigativa e dedutiva de um bom investigador analítico. Além de ser excelente na execução de cenas de ação, feitas, normalmente, sem uso de dublês.
Consciente dos clichês que se repetem no gênero, a produção é capaz de colocar em cena um personagem que situa-se a frente do previsível, desmascarando a saída mais fácil, ao mesmo tempo que consegue sustentar a progressão do suspense.
Cabe mencionar que Um Tiro foi o primeiro romance que li de Child, deixando-me impressionado com sua narrativa popular e bem articulada. O que me motivou a escrever um artigo sobre esta interessante personagem que é Jack Reacher.
A cada filme que estrela, Nicolas Cage dá passos para se tornar uma espécie de mito contemporâneo. Mesmo em uma época em que grandes atores não têm mais o prestígio de outrora e não cativam tanto público para suas produções, Cage continua realizando filme após filme e tendo um grande público, sendo alvo de montagens virtuais e, o mais estranho, figurando na capa de um livro de biologia de um país europeu com uma imagem retirada de Arizona Nunca Mais.
Houve um momento em que sua carreira era respeitada. Além do Oscar em 1996, por Despedida em Las Vegas, tornou-se um astro de ação com diversas boas produções presentes no coletivo popular e sempre reprisadas na televisão aberta. Até quando resolveu esquecer o talento e qualquer método de interpretação possível.
Ainda assim é personagem central em muitas produções. De dez anos para cá, estrelou vinte e quatro produções – a maioria repetindo os mesmos papéis, sendo O Senhor das Armas e O Sol de Cada Manhã os últimos vestígios de seu talento.
Retomando a parceria com Simon West, que o dirigiu em Con Air – A Rota da Fuga, O Resgate é um tradicional filme de um bandido arrependido que, após a prisão, tenta fazer as pazes com a família, normalmente formada por mãe e uma filha adolescente que não gosta do pai. A reviravolta acontece quando um dos homens de seu bando sequestra a garota, exigindo sua parte do último assalto, que resultou na prisão da personagem.
Com apenas noventa e seis minutos de duração, a motivação é muito clara. Um pai que fará de tudo para salvar a sua filha. O tempo relativamente curto em que se desenvolve a história é suficiente para ter agilidade e não pecar em apresentar reviravoltas desnecessárias. Mas outras tramas apresentaram a mesma história com mais vigor, como Busca Implacável.
Em cena, Nicolas Cage está igual ao seu personagem em Motoqueiro Fantasma: Espírito da Vingança. Que, por sua vez, é igual ao de Reféns. Igual ao de Pacto Sobre Rodas. E assim segue. Repetindo o mesmo olhar meio agressivo, meio maluco, a voz descontrolada que sempre precisa se impor da maneira italiana: gesticulando ameaçadoramente.
Em algum momento, o ator se perdeu. E hoje, ainda assim, continua produzindo filmes que devem ser vistos mesmo pelo riso involuntário. Pela sensação de ver em cena um ator que parece fingir não saber que tem descido uma triste ladeira sem fim.
O mais impressionante dessa produção é saber que, no mesmo ano, o diretor West realizaria com Stallone OsMercenários 2. Verificando sua filmografia percebe-se que o filme com Sly foi um dos poucos acertos entre diversos fracassos.
Adaptações são um perigo. Nos últimos anos pudemos presenciar vários projetos para cinema que foram trazidos a nós como adaptações de livros e histórias em quadrinhos. Alguns foram grandes acertos e outros fracassos completos. Quando foi anunciado que um filme em live action de Rurouni Kenshin (mais conhecido no Brasil como Samurai X), mangá criado por Nobuhiro Watsuki, estava sendo produzidos e dirigido por Keishi Ohtomo, os sentimentos se dividiram. O meu particularmente esperou pelo pior, porém fui surpreendido.
Rurouni Kenshin é ambientado em um Japão após a vinda da Era Meiji e conta a história de Kenshin Himura, um samurai que vaga pelo Japão ajudando pessoas e, ao mesmo tempo, tentando lidar com os fantasmas de seu passado, em que era um famoso e temido retalhador conhecido como Battousai.
Este filme, especificamente, abarca os dois primeiros arcos do mangá/anime, que seria Kenshin tendo que enfrentar o excêntrico traficante de ópio Kanryuu Takeda e o assassino Jin-E, com algumas modificações. Esse é o primeiro ponto que vale a pena ressaltar do filme: como toda adaptação que se preze, uma série de mudanças na forma como se constrói a narrativa é realizada. A dificuldade de ultrapassar a barreira da adaptação foi vencida perfeitamente pelo roteirista Kiyomi Fujii, o qual produziu um roteiro coerente e crível, mesclando dois arcos que englobam uma quantidade considerável de plots em um único filme e excluindo momentos superficiais da história original. Todos os elementos principais e importantes estão lá.
A escolha dos atores foi outro acerto. Takeru Sato interpretou perfeitamente Kenshin Himura. Desde o lado calmo e sereno de Kenshin, quanto a raiva incontrolável de Battousai (a dualidade do personagem) foram inseridas de maneira muito satisfatória em sua atuação. Munetaka Aoki interpretando Sanosuke Sagara não fez feio também. Seu personagem em diversas cenas rouba a atenção por seu modo de agir, que acaba provocando vários momentos cômicos. O elenco no geral foi muito bem escalado, respeitando fielmente as características físicas dos personagens na história em quadrinhos.
A fotografia e as ambientações foram um diferencial que elevou ainda mais a boa execução do filme. Somos levados a um antigo Japão feudal meticulosamente reconstruído. O tom amarelado nas cenas comuns ajudam a contribuir com a beleza do filme, assim como as cenas em tom azulado e cinza conseguem mesclar bem com a atmosfera de terror e violência nas cenas em que Kenshin incorpora o retalhador que tanto almeja deixar para trás.
O pouco uso de CG e efeitos especiais – estes apenas para inserir sangue e conferir efeitos de agilidade em algumas cenas de luta – corrobora o cuidado com que o filme foi desenvolvido. A trilha sonora espetacular e as cenas de luta muito bem coreografadas e empolgantes ajudam mais ainda ao fazer com que Rurouni Kenshin não seja apenas uma excelente adaptação, mas também um excelente filme de samurai, agradando até mesmo quem ainda não é fã de Kenshin, Kaoru, Sanosuke e todos os demais personagens que fazem essa história ser uma das mais cultuadas por todo o mundo.
A comprovação do talento de Jason Reitman, ou uma fortuita sorte, se deve ao fato de que seus três primeiros filmes – únicos, até então – são excelentes longas metragens. Histórias que mesmo em retratos diferentes equilibravam-se no drama cotidiano.
Em seu quarto filme da carreira, Jovens Adultos, Reitman retrata a problemática de adultos que, mesmo em uma idade madura, não saíram da fase adolescente. Seja pela negação de responsabilidades ou pela incapacidade de assumir sua maturidade.
Mavis Gary é uma escritora de uma série de livros para adolescentes frustrada com sua própria vida. Ao receber um convite em comemoração ao nascimento do filho de um ex-namorado, decide retornar a cidade onde foi criada com o intuito de tentar reconquistar seu grande amor do colegial.
Reitman sempre dedicou seu olhar a personagens imperfeitas de alguma maneira. O vendedor de cigarros que não se importa com as perdas humanas de seu trabalho, a adolescente que engravida sem a verdadeira percepção do fato, o homem que se sente confortável somente em aviões. Dentro das personagens aquebrantadas trazia a tona um elemento humano primordial que identificava o público.
A concepção infantil de Mavis chega a afastar de assustadora. Retira um elemento carismático de personagens anteriores pois explicita a frivolidade. Causa desconforto e não gera uma reflexão mais profunda como, até então, trabalhava o diretor, pois não há razão para o vazio da personagem além da negação de seu próprio fracasso.
Ao retornar a um instante anterior de sua própria vida, a escritora aos poucos percebe sua anacronia. Mas a composição de tal sentimento soa tão em descompasso que sua história chega ao fim sem identificar de fato sua mensagem. Se é que há uma.
Talvez desejando que dentro e fora de sua história existisse um vazio, a roteirista Diablo Cody – em seu quarto roteiro de longa metragem – tenha falhado na mensagem. A sensação é de que o material bruto continha uma história com mais força daquela que foi contada. Mas que não deixa de destacar o talento que, além de Reitman, a roteirista tem em explorar singularidades que abalam a todos.
Ler que um filme é baseado em fatos reais em sua introdução sempre é um diferencial para o espectador na forma como ele enxerga a história ao longo da projeção. O Impossível, dirigido por Juan Antonio Bayona, vai contar o drama do casal espanhol María Belón e Enríque Alvarez – que no filme são interpretados como um casal inglês – que sobreviveram, junto de seus três filhos pequenos, ao tsunami que devastou a Ásia em 26 de dezembro de 2004.
Filmes que contam histórias de catástrofe geralmente seguem um padrão de quererem explorar as calamidades em si. O diferencial de “O Impossível” é tratar mais proximamente das consequências do tsunami e, principalmente, das emoções passadas pelas vítimas. Isso por si só traz uma carga dramática mais expressiva à narrativa – e em nenhum momento de maneira forçada -, tendo em vista que o espectador vai basicamente acompanhar os protagonistas a superar seus limites físicos e emocionais, buscando pelos seus entes queridos e por salvação em meio ao caos e a destruição deixada pela natureza. Ao longo da trama somos apresentados a dramas de personagens secundários, que ajudam a imergir ainda mais o sentimento deixado pela catástrofe.
Ewan McGregor e Naomi Watts são os grandes destaques do filme, interpretando o casal protagonista. Ambos demonstram uma atuação excelente ao passar a intensidade dos sentimentos vividos pelos personagens no contexto. O Impossível se demonstra um excelente drama e que garante emocionar a maior parte do público.
A DC Animated Universe tem realizado um bom trabalho em animações direcionadas para o home vídeo. Realizam com consciência as adaptações de suas tramas e sempre optam por histórias fechadas que funcionem de maneira a entregar um bom filme sem que o espectador tenha que ser leitor das revistas em quadrinhos.
Recentemente, a editora tem investido em histórias clássicas, definidoras dentro do universo da personagem. A ideia é positiva, porém um tanto perigosa. Conhecemos tais histórias clássicas pela composição de narrativa e desenho. Uma adaptação pode ser um risco se muda os traços da história ou tenta amenizar o texto original.
Em Batman: Ano Um os traços de David Mazzucchelli e cores de Richmond Lewis são emulados para que a adaptação tenha semelhanças com a versão original. A composição escura e um tanto assustadora se perde por causa da formatação. Há cenas retiradas com perfeição do gibi, outras estilizadas em exagero, resultando em um pequeno desequilíbrio.
Mesmo com a pouca metragem, o ritmo não é tão frenético quanto no original, que abrange um longo espaço de tempo em cenas curtas, apresentando a evolução de Batman em sua jornada inicial de herói e Gordon reconhecendo a corrupção de Gotham. A tentativa de não perder o formato criado por Frank Miller retira a pouca liberdade que a animação poderia ter, escondendo tanto o herói que a história mais parece apenas o ano um de Gordon, e não o ínicio da longeva parceria dos amigos.
A transposição da história para as telas, como aconteceu com o também clássico O Cavaleiro das Trevas, tira parte de sua identidade e não consegue uma nova à altura. Os desenhos bem compostos, com estilo cinematográfico, são bonitos por si, mas parecem destoar do elemento original e não apresentar uma das melhores histórias do morcego à altura.
Após atravessarmos as quase infinitas e desnecessárias três horas de A Viagem — o título original é Cloud Atlas. Vai entender esses tradutores brasileiros… —, chegamos ao fim da jornada com um sorriso no rosto. Primeiro pelo alívio de o filme ter terminado. Depois, por realmente termos achado muito engraçado tudo aquilo que os irmãos Wachowski (Matrix) e Tom Tykwer (Corra, Lola, Corra) pretendiam nos apresentar como um estudo de grande profundidade filosófica.
Pelo menos em tese, ‘A Viagem’ seria uma investigação sobre como os atos de cada pessoa influenciam a vida dos outros, seja no passado, presente ou futuro. Isso é mostrado ao público por meio de seis histórias interligadas que se passam entre 1849 a 2114.
O conceito era interessante. Pena que ficaram só na intenção.
A produção passa boa parte do tempo tentando embasar suas teorias em frases vazias, mas pretensamente cheias de sabedoria. Quer um exemplo? Veja: “Não importa se nascemos num tanque ou num útero: somos todos puro-sangue”. Quer outro? Segura aí: “Meu tio era cientista, mas ele acreditava que o amor era real”. E por aí vai…
O filme é registrado numa escala que tem o mesmo tamanho de sua pretensão. Tudo parece grandioso, maior que vida, colossal. Tudo é feito para iludir os olhos do espectador. Não caia nessa: ‘A Viagem’ tem tanto conteúdo quanto uma casa vazia e, ao fim de sua exibição, sentimos na boca aquele gosto amargo de auto-ajuda.
As caracterizações feitas em Tom Hanks, Halle Berry e Hugh Grant deveriam acentuar os aspectos dramáticos dos personagens. Porém, a maquiagem têm efeito contrário e deixa todos com visuais risíveis. Poucas coisas são mais desastrosas para uma obra que se pretende muito séria do que se transformar num espetáculo provocador de risos involuntários. Justamente o que acontece aqui.
Único ponto positivo: o cuidado com a luz na fotografia concebida por Frank Griebe e John Toll.
Importante: até agora, ‘A Viagem’ arrecadou apenas US$ 26 milhões dos US$ 100 milhões que custou. Logo, corre o sério risco de ser o maior desastre financeiro cinematográfico do ano. Uma espécie de John Carter de 2013.
Sabemos o quanto Hollywood costuma ser implacável com pessoas envolvidas em projetos que resultam em tamanho prejuízo. Diante disso, é possível especular que o futuro da dupla que concebeu ‘Matrix’ seja um pouco mais complicado. Na melhor das hipóteses, a escala de produção diminuirá bastante e eles terão que topar orçamentos mais modestos.
A única certeza que temos até o momento é que o filme é a maior piada involuntária dos últimos tempos.
Nos primeiros minutos de um documentário, que acompanha o primeiro disco desta versão de diretor, um dos editores faz comentários a respeito de sua metragem. Diz que para o lançamento do filme a opção foi reduzir um pouco da ideia original, deixando-o mais ágil e com mais cenas de ação, diferentemente da ideia do diretor, Mark Steve Johnson, que procurava algo mais denso e fluido, com momentos para explicações e um pouco menos de ação.
Este pequeno trecho simboliza a diferença entre um editor pago para realizar um filme blockbuster sem se importar com sua qualidade e outros que tentam, mesmo em filmes neste formato, manter uma base narrativa.
Demolidor foi a primeira adaptação de quadrinhos a ser um sub-produto dos sucessos anteriores. Pouco dinheiro foi investido no projeto, cuja missão primordial era um arrecadamento médio. Sem mais ganas, o resultado desse pensamento se tornou nada promissor. O descompasso é tão claro que o fraco diretor lançou sua própria edição do filme, com minutos a mais, tentando melhorar a fraca história e recuperar um pouco de sua imagem perante os fãs de quadrinhos.
Mesmo trabalhando com um material bruto inexpressivo, seu trabalho tem um ganho positivo em relação ao original, mas nada excepcional. Os erros desenvolvidos na trama estão concentrados em sua estrutura. Nenhuma edição poderia salvá-la.
A começar pela obtusa escolha do elenco — como colocar o gordinho Ben Aflleck para fazer o ágil Demolidor quando, por ator cogitado na época, Matt Damon seria mais indicado para o papel até fisicamente. Sem deixar de lado excessos de liberdade poética, transformando o rei do crime em negro e o Mercenário, grande vilão do Homem Sem Medo, em um patético personagem nas mãos de Colin Farrell, que despontou em um filme de Joel Schumacher e, depois de entregar mais uma atuação competente, vem desapontando desde então.
Com um pouco mais de duas horas de duração, a nova edição deixa a trama mais explicada, tentando se aprofundar no drama de Matt Murdock. Mas a falta de credibilidade que Affleck passa, de um cego canastrão, não dá espaço para que se compreenda seu heroísmo.
É lamentável que um personagem tão excelente como Demolidor tenha sido o escolhido para ser o primeiro filme B de quadrinhos, elemento parecido com o que aconteceria com o Quarteto Fantástico mas, dessa vez, voltado ao entretenimento familiar.
Murdock é o herói que possui uma das carreiras mais estáveis nos quadrinhos, com sagas memoráveis, além de ser carismático. Nas telas virou uma mistura insossa de senso comum e de atores mal selecionados, que culminam na Electra Natchios de Jennifer Garner.
Lista de melhores filmes é um negócio repetitivo e a essa altura eu suspeito que vocês já entenderam que Cavaleiro das Trevas é uma certa unanimidade por aqui. Então, honrando minha fama de menina dos filmes “cults” e nêmesis do Jackson, eu faço a lista de melhores filmes hipsters/alternativos/falados em línguas estranhas/não entendo nada, mas tá bonito.
Primeiro: essa não é minha lista de melhores filmes de 2012, em uma seleção que fosse só pela minha preferência entrariam um bom número de blockbusters. Pelo critério totalmente intuitivo e arbitrário dos filmes que caberiam aqui Drive ficou de fora (mas é de longe um dos melhores filmes do ano), mas eu vou considerar uma menção honrosa, porque o lançamento não foi tão grande assim.
Em segundo lugar, o critério: filmes lançados em circuito no Brasil em 2012. Doeu um pouquinho esse critério porque eu tive que deixar de fora filmes incríveis que vi em mostras, festivais ou por meios menos oficiais e que só vão entrar aqui em 2013. Enfim, ficam para a próxima. A única exceção é um filme lançado lá fora em 2012, mas que não chegou aqui de forma nenhuma, achei que a lista pseudo-intelectual merecia um desses.
10. Amores Imaginários Na verdade é um filme de 2010, um beijo para as distribuidoras brasileiras! Xavier Dolan, o diretor, ficou famoso em 2009 com Eu Matei a minha Mãe, filme pequeno, de baixo orçamento, que ele mesmo atuava, quase com cara de trabalho de graduação de estudante de cinema e que ainda assim foi a escolha canadense ao Oscar de melhor filme estrangeiro. Amores Imaginários é mais bem elaborado, mais maduro e bem dirigido, mas ainda mantém o que é tão interessante em Dolan: essa auto-exposição tão descarada, quase crua. Ele atua novamente e os personagens são mostrados em toda sua fragilidade, cheio das ilusões estúpidas de quem começa a se apaixonar. O roteiro e o ritmo do filme têm alguns problemas, mas a honestidade faz valer. Bônus para excelente trilha sonora.
9. Martha Marcy May Marlene Esse é o que não chegou aqui, mas eu aposto que daqui uns dois anos, quando a Elizabeth Olsen virar estrela de comédias românticas indies, ele chega. Elizabeth Olsen é a irmã boa atriz daquelas gêmeas de filmes da sessão da tarde que de repente surgiu do nada com esse filme em Sundance. Ela faz Martha, uma menina que foge de um culto e tenta se reintegrar na sociedade. A fotografia é escura, suja, e o filme flerta com o terror psicológico. É perturbador e todo o barulho em volta de Olsen tem razão de ser, já que tudo depende da capacidade dela de convencer o espectador do seu medo e sua paranoia.
8. O Gato do Rabino Eu vou para sempre promover animações de países que não sejam Estados Unidos e Japão e a França tem um bom histórico. O Gato do Rabino é adaptação de uma HQ e tem roteiro e direção do próprio autor. A animação em si é linda, com um traço cuidadoso, todo cheio de detalhes. Os personagens são carismáticos, o roteiro bem feito e engraçado. O filme faz um ótimo trabalho em colocar um ou outro diálogo filosófico sem atrapalhar o ritmo e a ironia do Gato torna tudo divertido e adorável.
7. Moonrise Kingdom Ok, ok, esse foi um lançamento consideravelmente grande, mas quem vai argumentar que o Wes Anderson não é hipster? Melhor filme dele desde Os Excêntricos Tenenbaums, com duas crianças lindas e um ar de ironia com um tema sério. Eu gosto particularmente de como ele transforma tudo em uma versão miniatura de um filme de guerra, assim como as crianças são versões pequeninas dos conflitos adultos. É leve, divertido, bonito, mas meio dolorido lá no fundo.
6. Pina Eu reclamo muito por aí que o 3D é um recurso legal, mas que o cinema não chega a explorar criativamente, além de ser uma forma de deixar tudo mais “bonito” e tentar evitar pirataria. Junto com Hugo, Pina é a exceção. Pina é um documentário do Wim Wenders sobre a Pina Bausch, ícone da dança contemporânea e amiga pessoal do diretor, cujo principal objetivo era explorar a relação dos corpos com o espaço do palco. Wenders não faz um documentário sobre a vida dela, mas sobre o trabalho da coreógrafa e assim o uso do 3D espelha toda a investigação sobre a ocupação do espaço. Wim Wenders é um dos melhores documentaristas em atividade e esse filme é plasticamente a coisa mais bonita que eu vi em muito tempo.
5. Habemus Papam Ou: se Woody Allen fosse italiano e católico. É o mesmo tipo de humor auto-irônico, paranóico e inseguro, mas por um outro viés e até um pouco mais escrachado. Nani Moretti dirige e atua como um psicólogo chamado para lidar com um Papa em crise existencial. O filme aponta todos os dedos possíveis para a igreja e o conservadorismo da sociedade italiana e desconstroi a imagem dos cardeais até chegar ao absurdo, sendo sempre um pouco melancólico, mas principalmente engraçado.
4. Um Alguém Apaixonado Porque não é uma lista esnobe suficiente se não tiver filme iraniano. Melhor: filme de diretor iraniano filmado no Japão. Eu confesso e aviso: talvez seja o melhor exemplo da minha definição de “não entendo nada, mas tá bonito”, mas ainda assim vale a pena. É sobre a relação entre um velho professor e uma jovem prostituta com um namorado horrível. Sobre as escolhas irracionais que as pessoas fazem e, sim, claro, sobre pessoas apaixonadas. É mais uma reflexão do que respostas, mas é um exemplo maravilhoso do que o cinema é quando desiste de dar respostas.
3. A Separação Porque eu não me satisfaço com só um filme iraniano. Ganhou Oscar de melhor filme estrangeiro em 2012, Bafta, Urso de Ouro em Berlim e mais um monte de prêmios e eu prometo que por mais que filme iraniano tenha fama de chato não é o caso desse. O diretor, Asghar Farhadi, fala das contradições entre a imagem de um Irã ultra-religioso e a modernidade que na verdade existe lá dentro e, da mesma forma, seus filmes integram o ritmo contemplativo pelo qual o cinema iraniano ficou famoso com elementos do cinema comercial. Seu filme anterior “Procurando Elly” era quase um thriller e aqui o mistério move boa parte da trama. É angustiante, claustrofóbico e um tanto genial. Mostra um Irã que nós não estamos acostumados a ver e reflete sobre o país, mas tudo em cima de uma narrativa bem feita e um filme envolvente.
2. No O cinema latino-americano vem soltando coisas ótimas, inclusive de países inesperados, como o Peru e o Uruguai, mas o Chile andava meio quieto desde Machuca (2004). “Não” compensa isso. Em 1988 os chilenos deveriam votar em um plebiscito que diria “sim” ou “não” para o governo do General Pinochet e o filme se centra no publicitário responsável pela campanha que deveria convencer o povo a dizer “não”. “Não” tem um roteiro tão bom, tão bem amarrado e cheio de boas tiradas que é até difícil apontar exatamente porque ele acabou em segundo lugar nessa lista. O filme flui e trata do tema de forma honesta e leve, sem medo de revirar um tema complexo e é bem dirigido, atuado, fotografado sem ser correto demais.
1. Fausto Eu fiz uma crítica dele aqui e não sei se cabe falar muita coisa mais. Quando o Sokurov fez a Arca Russa eu fiquei fascinada, mas achei que faltava ancorar aquilo, dar uma narrativa, conseguir tornar esse cinema de sensações que ele faz um pouco mais palatável e Fausto faz tudo isso. É experimentação e estética, mas tem também uma narrativa forte, é cheio de diálogos sobre a vida, a morte, a efemeridade da beleza e o mal, mas também expressa essas contradições na fotografia, na direção de arte e na montagem. Fausto é um dos melhores exemplos do que é o cinema como arte, ao mesmo tempo apontando para toda uma tradição e sendo original. É difícil, é lento, definitivamente é um filme que requer investimento, mas é o melhor encontro de forma e conteúdo desde Asas do Desejo.
Depois de surpreender o público com uma boa direção em Medo da Verdade, Ben Affleck dá sequência a sua nova carreira sem se desapegar de uma história policial. Atração Perigosa comprova que Affleck não teve sorte de principiante e, ao contrário de sua naufragada carreira como ator, apresenta domínio ao narrar uma história.
Baseada no romance Prince Of Thieves, de Chuck Hogan, a trama se passa em Boston, no bairro de Charlestown — alardeado no início do filme como um local conhecido pelo alto índice de assaltos a banco, um ambiente em que pais passam seus ensinamentos aos filhos como uma tradição.
Doug MacRay (Affleck) é o mentor de um grupo de ladrões que, mesmo em um assalto bem sucedido, decide levar uma refém como segurança. Encarregado de resolver a situação, Doug se aproxima da moça à procura de um novo rumo para sua vida.
A tensão se produz tanto dentro do próprio grupo, com MacRay desconfortável ao executar um novo golpe que colocaria o grupo em desnecessário destaque em investigações policiais, como na relação que estabelece com a vítima Claire, que acreditar viver um relacionamento saudável.
Além da direção bem executada também nas cenas de ação, a fotografia de Robert Elswit destaca a crueza do ambiente de uma cidade que não parece encontrar espaços para a ternura e para novas oportunidades de mudança de vida. Porém, a temática de ladrão arrependido que busca mudar de vida não é nova.
Com a receptividade positiva do filme, Affleck reconquistou parte do carisma perante ao seu público e planeja realizar uma continuação desta trama que, mesmo com algumas qualidades evidentes, me deixa com a sensação de que poderia ser melhor. Ainda que não consiga explicar a razão.
Saudações, nem tão nobres colegas. Chegou a hora da nossa tradicional (é apenas a segunda vez que acontece, mas quem se importa) escolha dos destaques cinematográficos do ano que passou. Houve uma leve mudança em relação à lista anterior, intitulada “Os melhores blockbusters”, agora estão inclusos filmes que não se enquadrariam nessa categoria, por terem orçamento baixo e/ou lançamento limitado. Mas o espírito massa véio permanece em todas as escolhas, afinal este é o Top 10 do cara do blockbuster/cinéfilo de verão. Antes, porém, uma rápida menção desonrosa não ao pior, mas àquele que foi de longe o mais decepcionante do ano: O “Espetacular” Homem-Aranha. Os caras tinham que se esforçar muito, mas muito mesmo, pra tirar o bom e velho Cabeça de Teia desta seleção. E vejam só, conseguiram! Parabéns, campeões. Enfim, vamos à lista, naturalmente de baixo pra cima.
10. Looper – Assassinos do Futuro
Bastante controverso, o filme recebeu duras críticas, em especial pelo roteiro não muito bem resolvido e arrastado em diversos momentos. Mas ele ganha pontos por apresentar uma boa direção, cenas de ação bem legais, interessantes conceitos acerca de viagens temporais, e dois Bruces Willis; o próprio e Joseph Gordon-Levitt, numa atuação digna de nota e que supera até a bizarra maquiagem digital. Num ano cheio de decepções, isso bastou para Looper estar aqui.
9. 2 Coelhos
Uma produção nacional estar presente nesta lista é deveras surpreendente. Mas não dava pra deixar de fora este divertido filme de ação, como visual ultra estilizado e repleto de referências à cultura pop. O diretor, produtor e roteirista Afonso Poyart mostrou-se claramente influenciado por Zack Snyder, Quentin Tarantino e Guy Ritchie, entre outros, e entregou um produto fora dos padrões do cinema brasileiro. Ainda que peque por alguns excessos, é mais do que louvável ver algo fora dos eternos “gêneros” favela, sertão, Selton Mello e comédias imbecis com cara de televisão.
8. Poder Sem Limites Partindo do já explorado à exaustão estilo handcam, e do igualmente pouco inovador tema “pessoas comuns ganhando superpoderes”, esta modesta produção conseguiu surpreender. O roteiro foi muito bem trabalhado no sentido de tornar humanos e críveis os personagens e suas ações. Em essência, é uma história de origem de um herói – e de um vilão, simples, porém bem contada, coisa que muitos filmes milionários falham em fazer. Destaque merecidíssimo.
7. Operação Invasão (The Raid: Redemption) Sensação em vários festivais pelo mundo desde 2011, o filme indonésio chegou ao Brasil direto para o home video, com um título caprichado. A história trata de uma equipe de elite da polícia de Jacarta invadindo um prédio controlado por traficantes, e se ferrando gloriosamente no processo. As cenas de luta são coreografadas de forma impressionante, uma porradaria épica como só os orientais sabem fazer. Além do melhor uso de uma geladeira desde Indiana Jones 4. Já está programado um remake norte-americano, mas nem precisa dizer que o original é que deve ser assistido o quanto antes.
6. Dredd O policial badass dos quadrinhos britânicos surge bem colocado no Top 10, graças à fiel adaptação estrelada por Karl Urban. Com uma trama bastante similar ao item anterior, mas indo além por trazer um interessante pano de fundo sci fi (e um protagonista mais marcante). Ação constante, violência sem concessões e um 3D bem empregado renderam uma das melhores surpresas do ano, e que infelizmente pouca gente viu, dada a passagem relâmpago pelos cinemas.
5. Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge Ah, a polêmica. Este era um filme que tinha tudo pra estar no topo da lista (ok, mentira, mas o 2º lugar era garantido), as posições perdidas se devem única e exclusivamente ao roteiro. Foram muitos os elementos forçados, sem sentido prático, presentes em nome de um pretenso conteúdo simbólico, metafórico, subtextual. Se fosse uma obra puramente alegórica, nada de errado. O problema é que ela não é: sacrificou-se toda a contextualização realista tão bem construída pelas duas partes anteriores da trilogia. Ainda assim, é um filme poderoso, com excelente ritmo, direção fantástica e atuações espetaculares. E ainda é o Bátema, porra.
4. O Hobbit – Uma Jornada Inesperada Outro com potencial pra ser o campeão do ano (quer dizer, o vice), mas nesse caso a colocação se justifica mais pelos méritos dos concorrentes do que pelos seus próprios deméritos. Que se resumem à duração além do necessário e à consequente perda de ritmo, aliás. Peter Jackson mais uma vez está de parabéns por trazer a magia da Terra-Média até nós, com um filme divertido, empolgante e com um visual deslumbrante – que fica ainda melhor no 3D 48 quadros por segundo. Duas cenas de sair e pagar o ingresso de novo: Adivinhas No Escuro e a origem do Escudo de Carvalho.
3. Sherlock Holmes – O Jogo de Sombras Lá no distante janeiro de 2012 tivemos uma das melhores aventuras da temporada. A segunda parte da franquia que “modernizou” o clássico detetive britânico superou e muito a primeira, com Guy Ritchie caprichando na direção e uma trama épica de conspiração internacional. Sem falar no sensacional embate intelectual entre Holmes e seu nêmese Moriarty, engrandecido por Robert Downey Jr. (o cara do ano) numa atuação inspirada, e Jared Harris mais inspirado ainda.
2. Os Mercenários 2 Sylvester Stallone, Jason Statham, Jet Li, Chuck Norris (na melhor cena do ano, sem discussão), Terry Crews, Randy Couture, Liam Hemsworth, Scott Adkins, e também Jean-Claude Van Damme, Bruce Willis e Arnold Schwarzenegger. Nem precisava acrescentar mais nada, mas enfim: outra sequência infinitamente melhor que seu predecessor, assumiu o tom de comédia e acertou em cheio. Grande homenagem ao cinema brucutu dos anos 80 regada a tiros, porrada, mais tiros, explosões e mais alguns tiros. Pode algo ser melhor que isso? Hã, pode.
1. Os Vingadores Repetindo o que foi dito na lista de 2011, empolgação é a palavra-chave em um blockbuster. Assim, esta escolha já estava definida no momento em que o filme foi anunciado. Só uma catástrofe de proporções bíblicas mudaria as coisas. O que seria improvável, tendo em vista a competência da Marvel Studios em construir seu universo cinematográfico e preparar o terreno para a grande reunião de seus heróis. Atendeu às enormes expectativas, entregando ação, diversão, humor, ótimos efeitos visuais e uma trama simples mas que cumpre aquilo que se propõe a fazer. Um filme perfeito? Evidente que não, mas ele é maior que seus defeitos. Os Vingadores é maior que a VIDA.
Afastando-se do tradicional costume de produções com desastres e catástrofes mundiais, Roland Emmerich se volta para uma teoria a respeito da origem do dramaturgo William Shakespeare, polêmica fundamentada por um estudioso em décadas passadas, afirmando que um dos maiores da literatura mundial era apenas um ghost writer de um nobre inglês.
Antes que o absurdo gere protestos ou reclamações, Anônimo é um interessante exercício shakespereano. A trama inicia-se no próprio teatro com um ator apresentando a importância do dramaturgo e pedindo ao público um pouco de audácia para ouvir uma outra história sobre a origem deste mito. É a partir dessa história dentro da história – elemento clássico do autor – que conhecemos seu argumento.
Um dos fundamentos principais para afirmar que William Shakespeare foi apenas um objeto de um escritor desconhecido se relaciona ao pouco material histórico encontrado do dramaturgo. Como um mero ator de teatro, há quem afirme que William não teria formação suficiente para escrever as peças e o fato de ter morrido sem nenhuma posse confirmaria sua função de fantasma. Afirmações que vão contra uma gama vasta de escritores que, mesmo iletrados ou sem uma formação acadêmica, produziram grandes obras literárias.
No filme, o autor das conhecidas histórias mundiais viria da pena de Conde de Oxford, um apaixonado pelas letras mas que, oprimido pela família, prefere compor suas obras as escondidas. Encontrando na figura deste dramaturgo a possibilidade para escoar, de tempos em tempos, sua produção, alimentando a lenda de William Shakespeare.
Leitores que possuem afinidade com o bardo podem reclamar do exagero da narrativa mas não devem deixar de admirar diversas cenas famosas de suas peças que, mesmo entrecortadas, aparecem em cena em diversas apresentações. Pois, a potência de Shakespeare foi tão grandiosa que atraiu a própria Rainha além das massas populares que lotavam o teatro para assistir suas obras.
A produção de Emmerich tem um figurino tão apurado que mereceu a indicação ao Oscar. É curioso compreender porque diretor tenha se interessado por uma história que nada tem a ver com seu projeto constante de destruição mundial. Mesmo valendo-se de uma teoria fraca que tem mais imaginação do que realidade, a história é divertida e não deixa de ser um exercício de questionamento sobre a potência de grandes escritores. Mais importante é que o público saia deste filme desejando saber mais sobre Shakespeare, debruçando-se em sua obra única e ilimitada. Mesmo que Shakespeare não tenha sido este que conhecemos, a força de suas histórias falam por si só.
Mad Max 2é um filme com muita ação e movimento que tem enredo simples e eficiente. Nele, ainda temos a visão pós-apocalíptica e futurista do primeiro filme da série, com escassez de combustível e uma sociedade decadente, onde o mais forte prevalece e as pessoas se juntam em comunidades e gangues para sobreviver no deserto de um mundo anárquico e violento, o que proporciona um dos filmes mais implacavelmente agressivos já feito.
As maravilhosas paisagens desoladas da Austrália, combinadas com a trilha sonora (que não é necessariamente primorosa, mas é marcante), proporcionam ao espectador certa angústia e um tantinho de depressão. Temos ainda aquela estética bem anos 80, de roupas e carros bizarros, que frequentemente são envenenados e fortificados na frente, onde pode-se prender o inimigo (e matá-lo com uma batida frontal).
Estamos sozinhos com Mel Gibson, uma espécie de pistoleiro de western moderno (que lembra um pouco os personagens de Clint Eastwood), um homem que perdeu tudo, que quase não abre a boca e que, ao decorrer da trama, enfrenta os guerreiros da estrada, que dão nome ao filme e que são ajuntamentos de pessoas com códigos de conduta, lendas e mitos muito particulares. São basicamente gangues de motoqueiros, guerreiros samurais, kamikazes, gangues de rua, vaqueiros, policiais e pilotos que se digladiam pelos recursos escassos de uma comunidade protegida por Max. Isso proporciona muita ação, efeitos especiais primorosos e muita perseguição de carros (e caminhões).
A experiência proporcionada pelo filme é fantástica. Literalmente somos imersos nesse mundo catastrófico e isso é assustador, nojento e emocionante. Para mim, Mad Max 2 é o melhor filme da trilogia e um marco dos anos 80.
A cada nova produção, Tim Burton divide seu público cativo. Grande parcela reconhece que as refilmagens feitas pelo diretor mais mancharam sua imagem do que deram vazão a sua criatividade. O que antigamente era visto como um excepcional estilo com uma parceria consagrada com um ator famoso, hoje pode ser motivo de riso pelo uso constante de Johnny Depp e da esposa Helena Bonham Carter como uma fórmula desgastada.
Torna-se difícil avaliar mais uma de suas produções sem questionar-se o que aconteceu com Burton, que teve fase excelente na década de noventa e, desde a regravação de Planetas dos Macacos, começou a tropeçar tanto nessas adaptações, tidas como obras contratuais, como naquelas de cunho mais autoral.
Após o imperdoável Alice No País das Maravilhas, carregado por seu estilo, retorcendo a história original, Sombras da Noite parecia ser uma história de retorno a sua origem gótica e ainda parodiando a demanda atual de filmes vampirescos. Baseada em uma série da década de sessenta, a trama nos apresenta Barnabás Collins, um sedutor que se transforma em vampiro devido a maldição de uma bruxa. Preso em seu caixão por duzentos anos, a personagem desperta e vive as transformações do mundo moderno, reencontrando sua cidade e o legado da família perto da falência, tentando reascendê-la na sociedade.
Se o ambiente parece uma retomada daquele primordial, o mesmo não pode se dizer da história. Mesmo com liberdade, o diretor teve que caminhar por uma trilha já fundamentada pela série televisiva, o que serve de impedimento para maior escopo criativo. A adaptação cinematográfica não justifica-se pela falta de uma trama interessante que se divide entre o amor e ódio do vampiro e da bruxa que o transformou.
Estranhamente, Johnny Depp está bem em seu papel de vampiro deslocado, deixando de lado a afetação que, desde o Capitão Jack Sparrow, surgiu em suas interpretações, compondo um personagem excêntrico, mas realista. Quem permanece sem atrativo é a esposa Bonham Carter. É inexplicável compreender, além dos laços familiares, porque o diretor insiste em usá-la sempre para o mesmo tipo de papel, inserindo-a mais como um dever do que como espaço, para que a atriz demonstre seu talento.
Torna-se impossível não pressupor que Depp, Burton e Bonham Carter reconheçam o declínio desta parceria. Porém, permanece a impressão de que, uma vez definidos, não há nenhuma vontade de inovação, já que este formato foi funcional diversas vezes. Talentosos todos são, mas parece que estão mais preguiçosos do que nunca.
Produção independente lançada em 2008, Bronson é dirigido por Nicolas Winding Refn (Drive, O Guerreiro Silencioso), co-escrito por ele e Brock Norman Brock, e estrelado por Tom Hardy. O filme é uma biografia altamente estilizada de Michael Peterson, que ficou famoso como “o prisioneiro mais violento – e caro – do Reino Unido”. Já há mais de 30 anos encarcerado, boa parte desse tempo na solitária, Peterson fez a alegria dos tabloides ingleses ao longo dos anos. Seu nome virou sinônimo de episódios violentos, situações com reféns, rebeliões, incêndios e protestos.
Ainda que vislumbre as motivações e origens da insanidade do protagonista, o foco do filme é na verdade um mergulho na sua perturbada psique. Aproveitando essa figura incompreensível de tão maluca, o diretor opta por uma narrativa surreal, com o próprio Bronson contando sua história diante de uma plateia imaginária e conseguindo a ovação que sempre buscou. Isso porque ele declara que sempre quis ser famoso, mas não tinha talento para atuação ou canto: a única coisa em que sempre foi bom era machucar os outros. Após brigas constantes na escola, Peterson foi preso pela primeira vez aos 19 anos. Assumindo o pseudônimo de Charles Bronson como sua identidade real, ele passou a extravasar toda a agressividade que havia dentro de si e a se sentir confortável atrás das grades, onde a sonhada fama finalmente veio.
Da mesma forma que em Drive, aqui a direção de Winding Refn é marcante do início ao fim. O surrealismo citado aparece também no modo como os (vários) rompantes de violência são mostrados, sempre com o uso de trilha sonora pesada, seja ela orquestral ou eletrônica (com os sintetizadores típicos dos anos 80, que parecem ser uma obsessão do diretor). Isso confere às cenas um ar de apresentação artística, quase um balé. Com isso em mente, não são absurdas as comparações que Bronson teve com Laranja Mecânica. Antes que os xiitas tenham seus ataques, não estamos falando de genialidade e muito menos de importância na história do cinema. As semelhanças estão na estrutura narrativa e no plot básico de um indivíduo incompreendido que se expressa através da violência.
Parece haver um consenso entre os críticos de que Bronson faz uma crítica ao culto às celebridades, mas, honestamente, o filme toca muito pouco, ou nada, nesse aspecto. As consequências e repercussões para a sociedade dos atos do protagonista são praticamente ignoradas. Muito mais pertinente seria apontar sua reflexão sobre a incapacidade da sociedade em lidar com alguém tão incomum: após sua “reabilitação” fracassar tanto em prisões quanto em instalações psiquiátricas, o governo chega ao absurdo de libertá-lo com um falso atestado de sanidade – o que obviamente não dura muito. Outra crítica, sutil ou nem tanto, é em relação à condescendência que os pais de Peterson sempre demonstraram para com ele, desde sua infância problemática.
Tais observações, porém, são muito subjetivas e restritas à interpretação de cada espectador, uma vez que a atenção do filme é voltada toda para o próprio protagonista. Isso permite que Tom Hardy brilhe na composição do personagem, entre overactings propositais e justificados e uma expressão corporal assustadora (reconhecível no Bane que ele faria mais tarde). Mesmo não possibilitando nenhuma empatia, o Bronson dele consegue captar toda a atenção do espectador, sem dúvida ajudado pela claustrofóbica direção que nos mantém incomodamente próximos a ele o tempo todo – inclusive nos momentos mais desagradáveis.
Único ponto a se lamentar, a ausência de alguns episódios mais doidos da vida de Bronson, como suas exigências malucas (certa vez pediu uma boneca inflável, uma xícara de chá e um helicóptero como resgate) e sua conversão e rápida “desconversão” ao islamismo. Provavelmente situações mais engraçadas foram deixadas de lado em nome da proposta de contar a história sob o viés psicológico. Nada que comprometa este filme perturbador, com direção e atuação poderosas.
Informers – Geração Perdida é um filme de 2008 dirigido por Gregor Jordan, com roteiro de Nicholas Jarecki e Bret Easton Ellis – que, além de roteirista, é o escritor do livro em que o filme se baseia. Assim como suas obras anteriores, Ellis retoma aqui seus temas recorrentes: um universo de niilismo, almas perdidas e sempre cometendo excessos em uma vã esperança de preenchimento do seu vazio interior.
Informers tem um formato parecido com o de uma novela. Há diversos núcleos de personagens que se conectam brevemente, sem grandes conexões físicas entre elas. Há, por exemplo, o porteiro de um um prédio (Brad Renfro) que deseja tornar-se ator mas, após tentar se desvencilhar de uma vida indigna do passado, é arrastado de volta a ela por seu tio (Mickey Rourke), um criminoso e viciado.
Há também o casal formado por Kim Basinger e Billy Bob Thornton. Os dois tentam retomar um casamento de aparências depois de um caso do marido com uma âncora de jornal (Winona Ryder), que se relaciona com ele apenas pela sua posição de produtor de TV. O casal é desacreditado até mesmo pelos filhos. Um deles, Graham (Jon Foster), se vê em um triangulo – amoroso não seria o correto, e sim sexual – junto com Martin (Austin Nichols) e Christie (Amber Heard), e todos se encontram perdidos em meio a seus vícios e os falta de coragem, ou força, para retomar o controle de suas vidas.
Apesar das breves conexões entre os personagens, o que verdadeiramente conecta a todos na história é a desgraça e a decadência. Se o formato pode ser parecido com o de um folhetim, seus temas e impacto não. Não existe redenção para nenhuma dessas pessoas. O paraíso de riqueza e a “terra do faça o que quiser” cobram o seu preço; seja pela AIDS, numa época em que a doença ainda não tinha esse nome, seja pela vida miserável, vazia e sem esperança.
Qualquer traço de humanidade do filme não consegue passar dos minutos iniciais, quando, num velório de um amigo em comum, um dos personagens demonstra afeto e dor pela perda daquele que está sendo velado. Com isso, ele já não faz mais parte daquele universo e não aparece mais durante o longa.
Em Informers não existe conclusão. Propositalmente, o filme não tem terceiro ato, justamente para mostrar a falta de perspectiva daquelas vidas e, assim, criticar e questionar a própria sociedade que dá origem a uma narrativa como essa: os ricos Yuppies da década de 80. Assim, Informers diz qual é o destino das pessoas se tomarem essas mesmas atitudes, que é a própria ruína e decadência.
Justamente por sua construção, o filme talvez não seja tão interessante quanto as adaptações anteriores das obras de Brett Easton Ellis, como Psicopata Americano ou Regras da Atração. Mas, ainda assim, é uma boa pedida, tanto para os já apresentados a esse universo de perdição, sexo e drogas em função da sua crítica social quanto para aqueles que não dispensam uma obra sobre um mundo distópico. Apesar das formas, estilo e tecnologia serem do passado, o filme retrata uma distopia em que quase todos os nossos valores comuns foram abandonados em troca de uma vida que gira apenas em torno de si própria, sem possibilidade de avanço, como um vírus silencioso e mortal, que faz com que o tom dourado do sol, presente durante todo o longa, dê lugar a um céu escuro e nublado.
Aproximadamente 9 anos atrás, saíamos da projeção de O Retorno do Rei emocionados tanto pela história, adaptada de maneira irretocável para o cinema, quanto por ter acabado aquela épica aventura para salvar a Terra Média. O questionamento de quando viria a adaptação para o cinema de O Hobbit era constante, e problemas dos mais diversos com a produção tornaram o hiato entre os filmes ainda maior. Mas, depois de uma longa e conturbada espera, podemos finalmente apreciar no cinema mais essa aventura baseada em uma obra de J.R.R. Tolkien, dirigida novamente por Peter Jackson, com roteiro de Peter Jackson, Guilhermo del Toro, Philippa Boyens e Fran Walsh.
Para os não familiarizados com a história, O Hobbit: Uma Jornada Inesperada se trata de uma aventura vivida por Bilbo Bolseiro (Martin Freeman/Ian Holm), em que ele se une ao mago Gandalf (Ian McKellen) e a um grupo de 13 anões, liderados por Thorin Escudo de Carvalho (Richard Armitage). O objetivo da comitiva é retomar o Reino Anão de Erebor e o tesouro dos anões do dragão Smaug. Nessa jornada pela Terra Média, enfrentarão os mais diversos inimigos e contratempos, desde orcs, lobos, armadilhas na floresta e tudo mais que uma boa aventura pode lhes proporcionar.
A primeira coisa a se notar é que, assim como a trilogia Senhor dos Anéis não permitia uma análise final sobre cada um dos filmes individualmente, O Hobbit: Uma Jornada Inesperada também não pode ser pensado apenas como um filme único. Seu roteiro, planejamento e montagem foram para 3 filmes. Portanto, o arco dramático da história também fica à mercê de suas continuações, apesar de também ter que se comportar e funcionar de alguma forma como um filme sozinho.
Outro ponto importante, ainda sobre a adaptação, é que com O Hobbit uma lógica comum do cinema foi invertida. Como se trata de apenas um livro de aproximadamente 300 páginas, dividido em 3 filmes, nesse caso foram adicionadas personagens, passagens ou elementos, quando o natural seria que fossem retiradas ou aglutinadas. Alguns desses elementos foram resgatados de O Senhor dos Anéis, outros repensados de Silmarillion. Essas inserções, ao mesmo tempo em que podem enriquecer ainda mais esse universo de criaturas fantásticas, podem também levar ao excesso, com situações jogadas apenas pelo intento de se criar algo ainda maior do que o original. Infelizmente, é o caso desse filme.
O maior problema de O Hobbit: Uma Jornada Inesperada reside justamente na extensão de tramas, subtramas e flashbacks adicionados ou transcritos de maneira quase literal das páginas para o cinema. É nítido que os 169 minutos de exibição são muito mais extensos do que deveriam, e já suficientes para questionar a necessidade de 3 filmes para contar essa história. Apesar de contar com bons trechos cômicos, adaptados de maneira fiel ao livro – por exemplo, a chegada dos anões à toca de Bilbo -, a primeira metade do longa é um convite ao bocejo constante. Muitos são os momentos em que a trama gira em torno de si mesma sem levar a lugar algum e, para os que conhecem a obra, fica a constante expectativa para que chegue logo algum momento chave do livro, sem se importar realmente com esses elos da narrativa. Já para os que não conhecem, não posso entrar na mente de alguém nessa situação para saber exatamente, mas acredito que a experiência deve ser algo próximo à primeira leitura dos capítulos de A Sociedade do Anel em que Tom Bombadil dá o ar da graça. Ou seja, tedioso e andando em círculos.
Entretanto, se a primeira metade é em grande parte desinteressante e sonolenta, do trecho final não se pode dizer o mesmo. Todas as batalhas – que acontecem com grande frequência – são muito bem elaboradas e trazem de volta a atenção do espectador. Um dos trechos icônicos, a briga dos gigantes de pedra, nada menos do que sensacional pode definir, e o aguardado trecho mais interessante dessa parte da história, as “Charadas no Escuro”, foi brilhantemente adaptado para as telas. Vemos um Gollum (Andy Serkis) ainda mais perturbado e ambíguo. Méritos aqui tanto para a atuação de Serkis, que se mostra ainda melhor e focada na construção desse personagem. E méritos também para os efeitos visuais, que deram ainda mais brilho e vivacidade para ele, confirmando o posto como uma das melhores composições entre CG por cima de uma atuação.
Sobre o visual do filme – e nesse ponto é bom ressaltar que a versão a que assisti foi 2D normal, já que o filme tem 4 diferentes: 2D, 3D 24 FPS, 3D 48FPS e 3D Imax. Nessa versão, como já era de se esperar, todo o aspecto visual do filme é ótimo, desde a belíssima fotografia – capturando tanto os belos campos abertos da Nova Zelândia, que servem como palco para o filme, quanto cenas internas, com cenários trabalhados nos mínimos detalhes e que funcionam não só visualmente, para compor a perfeita ambientação e imersão na história, mas também dando vida à Terra Média, tornando-a novamente um personagem, talvez até o maior e mais importante personagem das histórias de Tolkien. Por mais fantasiosa que seja a história, com o bom trabalho executado em sua composição ela se torna crível.
Outro aspecto interessante é a mudança de tom das histórias. Enquanto Senhor dos Anéis é uma jornada para salvar a existência das raças da Terra Média, uma jornada dura e temerosa para seus participantes, O Hobbit, como livro, já é uma aventura mais leve, com espaço para trapalhadas, comilança e um tom infantil – tanto é que o livro de 1937 era destinado aos filhos do Tolkien. Já na adaptação, algumas trapalhadas e situações engraçadas continuam presentes, mas um tom sombrio, mais sério, foi adicionado à história. Os anões já não são tão desajeitados e dão mais importância a recuperar suas terras do que o tesouro, em contraponto ao livro. Talvez isso seja uma tentativa de aproximar O Hobbit ainda mais à Trilogia do Anel, o que não é necessariamente bom nem ruim, principalmente ao vermos apenas a primeira parte da história. Talvez a versão para o cinema exija esse tipo de mudança e isso se mostre uma decisão acertada, mas essa diferença de rumos é algo que só poderá ser avaliado com clareza no encerramento do terceiro filme. Por enquanto, o máximo que podemos fazer é relacioná-la às nossas expectativas.
No mais, O Hobbit: Uma Jornada Inesperada é um bom filme, bem apresentado como introdução à aventura de Bilbo Bolseiro, que deve agradar tanto aos mais fanáticos pela obra de Tolkien quanto aos recém iniciados nesse universo, mas ávidos por boas histórias de fantasia de capa e espada. Todavia, sua longa e desnecessária duração, aliada à falta de um encantamento subjetivo, quase “mágico”, fruto talvez do inesperado (que se faz presente nos filmes de O Senhor dos Anéis, mas no momento não desencantou em O Hobbit) faz com que essa nova trilogia comece a pelo menos um degrau abaixo da sua antecessora, algo que pode muito bem ser revertido nos próximos filmes. Mas esse é um assunto para dezembro do ano que vem.
Em 1985, Bret Easton Ellis chocou todo um público quando lançou seu primeiro romance “Less Than Zero” (Abaixo de Zero na tradução nacional), o qual mostrava de uma forma diferente, pessimista e quase agressiva a classe de pessoas com maior poder aquisitivo na sociedade. Em 1987, o diretor Marek Kanievska faz uma adaptação homônima e leva a visão de Ellis para os cinemas.
Abaixo de Zero conta a história de três jovens que se formaram juntos no Ensino Médio: Julian (Robert Downey Jr.), Clay (Andrew McCarthy) e Blair (Jami Gertz). Após vários anos distante de seus amigos, por ter ido para a Universidade, Clay é chamado por sua ex-namorada, Blair, para visitá-los. Chegando de volta à sua terra natal, Clay encontra seu amigo Julian completamente entregue ao vício por drogas e tenta ajudá-lo.
A primeira coisa a se dizer de Abaixo de Zero é que o filme é um soco no estômago. Marek é bem sucedido ao adaptar a realidade de jovens ricos, mas que se entregam a uma vida de sexo e drogas em excesso, ausentes de qualquer esperança. É exatamente isso que se trata este filme: a falta de esperança. Esta ganha forma pelo fato de que é praticamente impossível fazer um viciado largar o seu vício.
O filme apresenta várias cenas significativas que constroem a atmosfera decadente da narrativa. A atuação de Robert Downey Jr. é arrebatadora ao interpretar Julian que, além de viciado, foi expulso de casa e está devendo uma grande quantia em dinheiro para seu traficante. Seu personagem vai se mostrando cada vez mais ao longo do filme, mostrando devagar ao expectador o quão fundo ele está dentro do poço e o que faz para conseguir um pouco de droga. Os sentimentos são fortes e expressivos por parte do ator a retratar tudo isso. McCarthy e Gertz não são excepcionais, mas cumprem uma atuação satisfatória para seus personagens, desesperados ao ver um amigo decadente e tentando ajudá-lo.
Toda essa decadência do personagem Julian se contrapõe, durante toda a extensão do filme, com as ambientações de Los Angeles, Bel Air e Palm Springs. Mansões, ruas limpas, carros caríssimos, glamour. Dentro de todo esse lugar visualmente intocável, a existência de elementos de podridão. Jovens que representavam “o futuro da nação” completamente entregues à aceitação da decadência de suas vidas.
Abaixo de Zero é forte e expressivo. Todos os elementos do filme são muito bem colocados em sintonia com sua narrativa, o que o torna mais significativo ainda.
O ano de 2012 foi excelente para Joss Whedon. Ao mesmo tempo que foi super aclamado pelo roteiro e direção em Os Vingadores, escreveu uma excelente história de terror que, não por acaso, tem conquistado uma legião de fãs.
Ao se tratar de um filme de terror, saber menos é sempre mais interessante. Confesso que raramente leio sinopses de filmes com medo de descobrir detalhes antes de assistir ao filme. Assim, o que conheci de O Segredo da Cabana foi um belo poster que brincava com a ideia de uma cabana para montar, como um cubo mágico, e notícias afirmando que era uma produção recomendada para se assistir pela excelente história. Considerei o panorama atual do terror focando os grandes estúdios, indagando-me se seria mesmo um argumento tão interessante ou apenas um burburinhos de críticos tentando levantar um filme com má qualidade.
É difícil apresentar sua sinopse sem apresentar nenhum detalhe específico que estrague a diversão. Portanto, é necessário saber apenas que o filme é uma homenagem aos filmes de terror. Com grande apuro, Whedon revisita o conceito de terror, principalmente a vertente atual, e, ao mesmo tempo que compõe sua trama, estabelece uma homenagem crítica. Se tornando complicado catalogá-lo como um mero filme de terror, pois sua narrativa quebra este conceito diversas vezes, ainda que o medo prevaleça como sensação primordial.
A ambientação está presente, a maneira parcial de apresentar a história e com isso aterrorizar o público também. O diferencial é a potência da história implícita no meio assustador. Caminhando de segmento a segmento, o diretor realiza uma trama que tem sua história mas é, ao mesmo tempo, todas as histórias de terror. Não sendo exagero chamar esta excelente produção de um meta filme, dialogando com o próprio gênero.
Mais do que criar uma teoria sobre o gênero do terror, como algumas personagens de outros filmes fazem, Whedon coloca a própria teoria em prática, o que explica porque a produção conquistou tanto público. A maneira fluida que conseguiu encaixar a crítica, dentro da história de terror, completa o filme além produzir genuína tensão no público. E nos fazendo inferir que talvez o terror de hoje está esgotado e precise de renovação.
Infelizmente, a produção não será lançada nos cinemas brasileiros. Foi programada mas a Universal decidiu lançá-lo direto em home video em breve. Uma pena, pois produções de terror sempre tem boa recepção de bilheterias e uma história como essa mereceria ser vista na tela grande.
A década de noventa marcou auge e decadência dos brucutus. Vindos principalmente dos anos oitenta, realizaram bons e rentáveis filmes até então. Porém, os gêneros começaram a mudar seu paradigma, quebrando barreiras internas e o estilo machão em um filme de ação violento perdeu parte do prestígio. Van Damme, Stallone e Schwarzenegger, depois de sucessos como O Alvo, Risco Total e Exterminador do Futuro 2, respectivamente, viram o sucesso de suas carreiras minguando aos poucos.
A grande problemática de O Último Grande Héroi é a época de seu lançamento. O filme é um misto de comédia com ação, desenvolvendo a descrença do exagero destas produções ainda populares. Na época, a barreira entre gêneros ainda era alta, não houve espaço e aceitação para uma história que brincava tão explicitamente com tais mundos. O mesmo Scharza repetiria a sátira em outro estilo, no excelente True Lies.
Vilões caricatos, heróis quase imortais, são aceitos hoje como um alívio cômico. Não se leva mais a sério pela tendência realista do cinema contemporâneo. Evidente que há exemplos isolados, tanto do realismo, como de um elemento mais híbrido. Porém, hoje se tornou um padrão que somente o tempo transformará.
Assistido com distanciamento, a produção teve bom envelhecimento. A trama brinca com a fantasia de todo garoto em conhecer o seu herói favorito de ação. Ao ganhar um bilhete mágico para seu filme preferido, o garoto Danny Madigan atravessa para o mundo fictício do enredo. O estranhamento de situar-se em um mundo regido por outras leis é evidente. Armas possuem tiros limitados, heróis não sangram e sempre estão dispostos para mais um golpe. A ação se concentra boa parte neste ambiente até que o reverte com a chegada das personagens no mundo real, realizando outro golpe, dessa vez evidenciando como é difícil ser um mocinho na vida real.
Sem perder a ideia de um entretenimento, o filme promove uma reflexão de seu próprio tempo e acabou por prever como o cinema pipoca se comportaria na década seguinte. Elementos que hoje apresentam alguns sinais de cansaço e que, muito provavelmente, também começarão a ser deixados de lado, à procura de outra inovação.
Mesmo a metragem um tanto extensa, não tira o divertimento deste filme que falhou em seu lançamento, mas que hoje tem mais significado do que em sua época.
Regras da Atração, baseado no livro homônimo de Bret Easton Ellis e dirigido por Roger Avary e considerado um dos trabalhos mais significativos do mesmo como diretor. Assim como os demais trabalhos de Ellis, vai se focar em uma geração perdida e vazia, de jovens ricos, os quais se entregam às drogas e ao sexo.
A história do filme vai se envolver nos conflitos e confusões amorosas de alguns jovens: Sean (interpretado por James Van Der Beek), traficante de drogas na universidade de New Hampshire, o qual é apaixonado por Lauren (Shannyn Sossamon), que está guardando sua virgindade para Victor (Kip Pardue), o qual já namorou Paul (Ian Somerhalder), que por sua vez só possui olhos para Sean.
Durante toda a narrativa, somos apresentados aos fatos através dos olhos de Sean, Lauren e Paul, muitas vezes inclusive repetindo algumas cenas com o intuito de mostrar as mesmas situações, mas dos olhos de cada um deles. Essa é a primeira coisa a se dizer sobre o filme, o qual explora esses momentos com vários recursos divertidos e muito válidos à trama. Temos a “rebobinação” de cenas e o uso de “Split-screen” (tela dividida em duas). Em uma das cenas, duas câmeras se encontram e se unem a partir do momento em que Sean e Lauren se encontram também. Alguns momentos do filme são muito significativos e mesclam bem ao jogo de câmeras utilizados.
Alguns podem achar que se trata de mais um filme do estilo de “American Pie”, mas aqui cabe uma ressalva, pois Regras da Atração não busca apenas mostrar o lado divertido da vida de jovens pansexualistas. Breast Easton Ellis é conhecido por retratar uma geração vazia de uma juventude entregue aos prazeres e a efemeridade da vida.
Por mais que Regras da Atração possua esse lado divertido, temos situações que beiram o desesperador. Sean recebia cartas de uma admiradora secreta, a qual acreditava ser Lauren. Em determinado momento do filme uma garota completamente desconhecida ao espectador se mata em uma banheira, em uma das cenas de suicídio mais significativas que pude ver em filmes – e não pelo explícito da cena, mas pelo o que ela passaria a significar. Em flashbacks o diretor nos mostra a garota em dezenas de cenas anteriores do filme, porém em posições secundárias. Avary nos faz sentir que assim como Sean havia ignorado a a existência da sua real admiradora secreta no seu dia a dia, nós também a ignoramos. Os espectadores eram cúmplices de Sean ao fazê-la se sentir extremamente solitária, perder as esperanças e se matar.
Tudo o que acontece leva a um fim onde todos os personagens acabam se entregando para a própria decadência e se conformando com ela. Regras da Atração é uma jornada a um mundo de jovens irreverentes e sem escrúpulos. As atuações são significativas para somar positivamente à narrativa deste filme. Avary adaptou muito bem os sentimentos, os quais Ellis é conhecido por passar em suas obras.