Projeto mainstream do seu diretor Aluisio Abranches (também realizador do elogiado Copo de Cólera), Bem Casados é uma inocente comédia romântica que se baseia no ideário dos casamentos para estabelecer o lugar comum de suas desventuras. Heitor, vivido por Alexandre Borges, é um editor de filmagens de matrimônios, carente e ultrapassado, contraditório em relação aos romances que protagoniza.
Há uma chance imensa de usar de metalinguagem como instrumento dramático através da profissão de cinematógrafo do personagem, o que é evidentemente desperdiçado graças ao erros crassos de direção, que permitem que haja uma “luz” intrusa, em variadas cenas. O lamento esquizofrênico do personagem principal é cortado pela aparição da bela Penélope, vivida por uma inspirada e bela Camila Morgado, que tem em sua intenção, destruir o casamento de um dos clientes de Heitor, motivada por uma dor de cotovelo – e inveja também – imensa.
Bem Casados tem bons momentos, todos focados em Penélope, que através de seu comportamento faz discutir o paradigma ultra conservador do matrimônio, assim como a sua quebra, mostrando que o inverso deste também pode ser vazio. A crítica à baixa sexualidade da noiva e de suas amigas prenuncia uma discussão que infelizmente é deixada de lado muito cedo, sem maiores preocupações.
Borges é ofuscado naturalmente, a fim de pavimentar o caminho para a personagem de Morgado brilhar. Todo o roteiro serve para debochar de todo o cerimonial e a hipocrisia comum a muitos casamentos armados, mas soa frívolo graças à qualidade imensa de personagens inúteis e sem qualquer complexidade, que se contradizem sem qualquer cerimônia, com o perdão do trocadilho. O texto decai demais na metade final, piorado pelo estabelecimento nulo do romance.
Bem Casados confunde citações ao socialismo e a um feminismo mal feito pra tentar arrotar erudição, ou uma qualidade mínima de seu drama. É tudo tão deslocado que os acertos ganham ares de acaso, principalmente por conter uma montagem tão amadora que inverte momentos de clímax.
A falta de personalidade e identidade da fita faz o espectador ter dificuldade em ver na direção de Abranches todos os bons momentos da sua filmografia anterior, lamentando-se ainda mais pelo potencial perdido desta que poderia ter sido uma comédia repleta de vivacidade, fracassando e muito na proposta de ser diferente da patuleia.