O filme que cabe a Júlio Bressane no projeto conjunto da Tela Brilhadora, começa semelhante aos seus trabalhos pregressos, hermético de um modo particular, que só faz afeiçoar o espectador já acostumado ao seu cinema. A primeira cena de Garoto tenciona poesia, em um ângulo desfocado, centralizado em uma tartaruga. Passando do réptil para Ela (Marjorie Estiano), que interage com Ele (Gabriel Leone), travando um monólogo conduzido pela mulher, com falas que tangenciam desde o fato dele ser canhoto, aos mais recônditos detalhes do seu ser. O argumento é retirado do conto O Assassino Desinteressado Bill Harrigan, de Jorge Luís Borges.
Garoto é mais um exercício de contravenção, desafiando a neura dos contemporâneos de Bressane em ser dominado pela fórmula, tentando quebrar o convencionalismo, através da filmagem simplória de uma proposta teatral muito antiga. A tentativa de emular o modo de contar uma história como os padres rezavam suas missas em latim, visando a elevação da alma de seus fiéis, fato que na prática, só coopta quem já é de fato seguidor de seu cinema, propenso a já elogiar seus longas antes mesmo de consumi-los.
A ideia de emular o vazio moral da mente do assassino utiliza situações e diálogos com pouca conexão entre os assuntos e até entre os atores, fazendo até dos ruídos ordinários, elementos narrativos, que ainda assim nada acrescentam a trama proposta. A metalinguagem do vazio transborda também de vazio, com ausência de conteúdo, tanto de discussão quanto de proposta. O roteiro é banal e frívolo, especialmente se comparado ao texto original. Nem as manifestações de erotismo funcionam, ao contrário, soam risíveis ao tentar porcamente ousar, substituindo goza por seiva de árvore.
Não há uma construção de atmosfera, todo exercício soa ridículo já que a suspensão de descrença não ocorre. Um homem correndo pode ter inúmeros significados inclusive no texto original, mas se a condução da cena não contém harmonia, a imagem é só a de um ser desconjuntado percorrendo rápido um caminho. Os 76 minutos de Garoto soam assim, uma pretensão de funcionar como poesia não tem exito e que ao ser criticada se esconde atrás do velho sofisma de não entendimento da proposta, que ademais, é bem simples, e ainda assim jamais alcançada.