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  • Crítica | A Origem do Mundo

    Crítica | A Origem do Mundo

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    Normalmente associado a direção de arte de produtos audiovisuais, Moa Batsow dirige um dos volumes do projeto Tela Brilhadora, no hermético e contemplativo Origem do Mundo, um ensaio em forma de documentário, que visa elucubrar sobre a pré-história através da arte popular e do folclore brasileiro.

    A câmera varia entre o retratar dos repentistas, que declamam poemas a respeito do início da vida humana, além de registrar pedras e outros resquícios da natureza bruta usando desenhos na rocha para simbolizar as artes rupestres antigas, tão alardeadas pelos escavadores e arqueólogos. A tentativa de Batsow em produzir um filme ensaio esbarra em sua proposta e na clara falta de conteúdo a abordar.

    Os personagens entrevistados ao menos tem algum carisma, o que garante um charme discreto ao  filme, utilizando da simplicidade de outrem para tentar gerar simpatia nos pouco mais de 60 minutos de registro. Mesmo a curta duração do projeto parece bem mais extensa, graças ao enfado que ocorre em quem assiste o produto até o seu fim.

    A pretensão em fazer poesia via imagens pouco é alcançada, dando lugar somente a arrogância estilística, com as mesmas intenções vistas em O Espelho, O Prefeito e Garoto, ainda que sua execução consiga reunir os defeitos de todas as outras apresentações. Nem mesmo os textos de Bernardo Silva Ramos conseguem salvar a discussão em torno de Origem do Mundo, soando frívolos até os escritos canônicos do arqueologista e linguista.

  • Crítica | Garoto

    Crítica | Garoto

    Garoto 1

    O filme que cabe a Júlio Bressane no projeto conjunto da Tela Brilhadora, começa semelhante aos seus trabalhos pregressos, hermético de um modo particular, que só faz afeiçoar o espectador já acostumado ao seu cinema. A primeira cena de Garoto tenciona poesia, em um ângulo desfocado, centralizado em uma tartaruga. Passando do réptil para Ela (Marjorie Estiano), que interage com Ele (Gabriel Leone), travando um monólogo conduzido pela mulher, com falas que tangenciam desde o fato dele ser canhoto, aos mais recônditos detalhes do seu ser. O argumento é retirado do conto O Assassino Desinteressado Bill Harrigan, de Jorge Luís Borges.

    Garoto é mais um exercício de contravenção, desafiando a neura dos contemporâneos de Bressane em ser dominado pela fórmula, tentando quebrar o convencionalismo, através da filmagem simplória de uma proposta teatral muito antiga. A tentativa de emular o modo de contar uma história como os padres rezavam suas missas em latim, visando a elevação da alma de seus fiéis, fato que na prática, só coopta quem já é de fato seguidor de seu cinema, propenso a já elogiar seus longas antes mesmo de consumi-los.

    A ideia de emular o vazio moral da mente do assassino utiliza situações e diálogos com pouca conexão entre os assuntos e até entre os atores, fazendo até dos ruídos ordinários, elementos narrativos, que ainda assim nada acrescentam a trama proposta. A metalinguagem do vazio transborda também de vazio, com ausência de conteúdo, tanto de discussão quanto de proposta. O roteiro é banal e frívolo, especialmente se comparado ao texto original. Nem as manifestações de erotismo funcionam, ao contrário, soam risíveis ao tentar porcamente ousar, substituindo goza por seiva de árvore.

    Não há uma construção de atmosfera, todo exercício soa ridículo já que a suspensão de descrença não ocorre. Um homem correndo pode ter inúmeros significados inclusive no texto original, mas se a condução da cena não contém harmonia, a imagem é só a de um ser desconjuntado percorrendo rápido um caminho. Os 76 minutos de Garoto soam assim, uma pretensão de funcionar como poesia não tem exito e que ao ser criticada se esconde atrás do velho sofisma de não entendimento da proposta, que ademais, é bem simples, e ainda assim jamais alcançada.

  • Crítica | O Espelho (2015)

    Crítica | O Espelho (2015)

    O Espelho 1

    Parte que cabe a Rodrigo Lima no projeto em quatro partes  Tela Brilhadora, O Espelho trata das obsessões humanas, usando como cenário o ambiente rural e como artifícios linguísticos os ruídos naturais e balbucios selvagens. A intenção do filme é adaptar um conto do escritor Machado de Assis, elucubrando sobre o abstrato presente na mente do sujeito.

    Augusto Madeira interpreta um indivíduo que atendeu a um estranho chamado, para a porta de um sítio abandonado. Seu nome é Jacobina, e ele não demora a adentrar o espaço, encontrando então uma misteriosa mulher, executada pela bela Ana Abbott, que emerge do lado e do lodo, rugindo como um bicho. Sabrina finalmente rompe o silêncio, após quinze minutos de tela, dialogando com o homem que está a sua frente, para estabelecer um novo tipo de contato.

    A tentativa de Lima é em fazer poesia através de sua câmera, abrindo uma discussão sobre os estados de consciência humana, usando o reflexo no espelho para aludir ao retorno do estado mental humano a fase do primitivismo. A alegoria, nada inédita, serve de parâmetro para alguns dos problemas do filme, que acaba sendo redundante mesmo diante do curto espaço de tempo reservado ao desenvolvimento de sua história.

    A retórica do filme revela pouco além do usual, o que faz o esforço em ser espirituoso soa banal, e até frívolo, o que configura um enorme pecado pas intenções prévias do longa metragem. Rodrigo Lima pouco produz como diretor, e nem a desculpa de ser a sua realização algo semelhante a uma tela em branco para suas personagens tentarem brilhar, uma vez que Madeira e Abbott não executam personagens muito profundos, até por causa da proposta. O Espelho parece uma ótima ideia para um filme de tiro curto, não para um intermediário entre média e longa metragem.

  • Crítica | O Prefeito

    Crítica | O Prefeito

    O Prefeito 1

    Após uma tentativa de poetizar em vídeo que dividiu opiniões em O Uivo da Gaita, na Operação Sonia Silk, Bruno Safadi volta a outro projeto conjunto, dessa vez dirigindo somente um filme da Tela Brilhadora, determinado como O Prefeito, uma crítica nada velada ao modo de governo tacanho que vêm afligindo o Rio de Janeiro a décadas.

    O personagem de Nizo Neto serve de paralelo não somente ao atual mandatário da cidade, Eduardo Paes, mas coopta em si também os arquétipos de Cesar Maia e Luiz Paulo Conde, políticos da mesma linha administrativa do sujeito que ocupava o cargo no momento. Há na construção do personagem um bocado do comportamento datado e pitoresco de candidatos lacerdistas, de homens cujo discurso é doce as plateias, de comportamento retrogrado e métodos de governo superados a mais de meio século, a exemplo até de figuras históricas como Pereira Passos e seu desejo de expandir os horizontes via engenharia civil na cidade.

    O cenário em que o personagem título se insere é a céu aberto, com um gabinete/escritório em meio as pedras das constantes obras que invadiram a antiga capital federal, dentro e fora da trama, uma vez que a intenção do político é audaciosa, visando separar a cidade de “São Sebastião” do resto do país, apesar de todos os gracejos ao receber o telefonema da então presidenta da nação,misturando tempos distintos em seu discurso e prática, referenciando a alcunha que a cidade teve no passado com a atualidade da crise.

    O estilo do filme mistura alguns maneirismos pós modernistas com alusões a momentos ensaísticos, que se misturam ao discurso pragmático dos poderosos que só visam o comodismo que é manter-se no poder, propondo uma crítica intensa a governabilidade que impera na maior parte dos poderes executivos do Brasil, incluindo esferas federais, estaduais e municipais, contendo até contradições de inspiração em figuras canônicas do cenário  atual e provecto.

    As imagens estáticas curiosamente possuem muito mais movimento do que o conjunto de promessas de revitalizações de praças e notáveis marcos culturais da cidade. As partes em que o interprete se veste maltrapilho aludem a questões óbvias, como a intenção separatista, gritada por alguns inconformados mimados que viviam ao sul do país – piorada após a eleição de 2014 – e também a condição de miséria da maioria dos mandantes eleitos pelo povo, não do ponto de vista financeiro, mas sim de caráter, ética e existência.

    O personagem composto por Nizo Neto e Bruno Safadi salva o filme da mediocridade, aludindo a versões clássicas da fantasia da ópera, sem abrir mão do cunho social e real que envolve a dantesca figura do megalomaníaco e aborrecido tratante, que ao se cansar de explorar o eleitorado, o mesmo que deveria ser seu objeto de serventia e honraria, passa tencionar alcançar feitos maiores, sem qualquer ação que lhe cause esforço que exijam mais de si, mostrando de modo até óbvio o engessamento do “protagonista”, perto do final da fita, o que evidentemente não estraga a experiência do espectador.