Tag: Ana Abbott

  • Crítica | O Espelho (2015)

    Crítica | O Espelho (2015)

    O Espelho 1

    Parte que cabe a Rodrigo Lima no projeto em quatro partes  Tela Brilhadora, O Espelho trata das obsessões humanas, usando como cenário o ambiente rural e como artifícios linguísticos os ruídos naturais e balbucios selvagens. A intenção do filme é adaptar um conto do escritor Machado de Assis, elucubrando sobre o abstrato presente na mente do sujeito.

    Augusto Madeira interpreta um indivíduo que atendeu a um estranho chamado, para a porta de um sítio abandonado. Seu nome é Jacobina, e ele não demora a adentrar o espaço, encontrando então uma misteriosa mulher, executada pela bela Ana Abbott, que emerge do lado e do lodo, rugindo como um bicho. Sabrina finalmente rompe o silêncio, após quinze minutos de tela, dialogando com o homem que está a sua frente, para estabelecer um novo tipo de contato.

    A tentativa de Lima é em fazer poesia através de sua câmera, abrindo uma discussão sobre os estados de consciência humana, usando o reflexo no espelho para aludir ao retorno do estado mental humano a fase do primitivismo. A alegoria, nada inédita, serve de parâmetro para alguns dos problemas do filme, que acaba sendo redundante mesmo diante do curto espaço de tempo reservado ao desenvolvimento de sua história.

    A retórica do filme revela pouco além do usual, o que faz o esforço em ser espirituoso soa banal, e até frívolo, o que configura um enorme pecado pas intenções prévias do longa metragem. Rodrigo Lima pouco produz como diretor, e nem a desculpa de ser a sua realização algo semelhante a uma tela em branco para suas personagens tentarem brilhar, uma vez que Madeira e Abbott não executam personagens muito profundos, até por causa da proposta. O Espelho parece uma ótima ideia para um filme de tiro curto, não para um intermediário entre média e longa metragem.

  • Crítica | Dois Casamentos

    Crítica | Dois Casamentos

    Dois Casamentos 1

    Após uma carreira vasta e um hiato de quase 20 anos, Luiz Rosemberg Filho vai retomando sua carreira de realizador, após três filmes de temática interessante – Desertos, Trabalho e Linguagem. Sua tônica de cinema remete ao expressionismo ligado à produção teatral em Dois Casamentos, protagonizado pelas atrizes Ana Abbott, que faz Jandira, e Patricia Niedermeier, intérprete de Carminha. Ambas são mulheres à espera de subir ao altar, e passam a discutir as vicissitudes da humanidade e, claro, das obrigações do matrimônio.

    O texto de Rosemberg resgata a fina ironia de seu antigo América e o Sexo, atualizando-o para uma nova plateia e para os inerentes acontecimentos ligados à rotina: o tédio, a hipocrisia social e, claro, a falta de interesse e tesão. Carminha acaba por tornar-se uma figura semelhante a mentora, para Jandira, graças à compleição de mulher madura e sua experiência.

    Temas como homossexualidade feminina são debatidas de modo franco por personagens que, a priori, têm na base de sua moral o conservadorismo – talvez até com um bocado de machismo – em cada palavra presa na garganta, especialmente da moça de cabelos ruivos cujo maior sonho é construir uma família, ainda que pobre, fortalecendo um argumento arcaico, tradicional e envelhecido.

    A câmera transita pelo cenário escurecido, focando as duas figuras femininas, que usam seus diálogos para desconstruir uma quantidade exorbitante de aspectos do status quo, sob um modo dramatúrgico que vai na contramão da mesmice típica das telenovelas mencionada nas falas de Niedermeier, em um misto de opinião forte com comentário metalinguístico, especialmente por causa do background da prolífica atriz.

    O diretor consegue imprimir um lirismo visual ímpar, graças à ótima performance da dupla de atrizes, que exalam qualidade e química mútua, fruto de um intenso trabalho de corpo e ensaio. O intimismo e as falas francas compensam o quase silêncio da trilha, que só aparece quando não há diálogos ou monólogos. Ao contrário do que o estereótipo possa sugerir, a métrica do filme é excitante, especialmente por se tratar de uma crônica sobre o abandono, contrapondo a falsidade do discurso belo e irreal programado em nome do bem estar social inalcançável, ao menos em vias sentimentais normativas.

    Os gemidos no escuro da tela remetem a uma liberdade que não é vista atualmente, especialmente no cenário cada vez mais reacionário protagonizado no Brasil, contraponto com a crescente necessidade de assumirem-se os direitos dos secularmente excluídos. O aspecto mais interessante de Dois Casamentos é que seu texto faz eco com tantas situações, mas não panfleta em nome de nenhuma das desigualdades mostradas no argumento, pelo contrário, apresenta tudo sob uma ótica emocional e repleta de simbolismo, dando margem para essas e outras tantas interpretações sensitivas.