A referência óbvia ao jogo de cartas infantil deveria alertar o mal agouro que viria ao público. Jogo da Memória, de Jimi Figueiredo, deveria ser um conto obscuro sobre a busca por um reencontro que não se conclui. Simônia Queiroz interpreta (ou ao menos tenta) Karine, uma ex-modelo que retorna à sua cidade natal – Brasília – para realizar o inventário de sua falecida mãe. Nesse ínterim, a personagem reencontra pessoas importantes do seu passado, reabrindo velhas feridas, especialmente aquela causada pelo abandono de sua filha.
A inabilidade de Queiroz em passar emoção em tela é funcional, uma vez que sua personagem parece estar sempre aérea, alheia a realidade que a cerca. O núcleo familiar da protagonista atinge extremos como a boa execução dramática da atriz mirim Laura Teles e a completa atuação desmedida de Rosanna Viegas que consegue ser ainda mais alheia do que a protagonista mas sem desculpas de um recurso narrativo como muleta.
O roteiro é um tanto confuso, além de repleto de convenientes coincidências e também permeado por personagens completamente descartáveis. Falta emoção ao triste reencontro entre Karine e seu antigo amado, vivido por Dalton Vigh, um personagem que possui uma loja de antiguidades e se torna responsável por discussões dignas de comerciais de margarina em que se fala abertamente sobre curiosidades como a suposta autoria de Stanley Kubrick para a filmagem do pouso do homem na lua, introduzindo o público de um modo óbvio às informações em tom de “você sabia?”.
É a partir deste núcleo que o trabalho de resgate da memória perdida de Karine deveria ocorrer. É neste ponto que ela se depara com seus amigos mais próximos, permitindo o fluir da intimidade. Mas isto não ocorre. O que se vê são situações exageradas com uma tensão sexual além da natural causada pelos casais desequilibrados nas cenas, destacando a figura do namorado de Karine – executado por Flávio Tolezani – a epítome da condução equivocada. Uma sub-trama que não acrescenta nada ao produto final e causa vergonha pela violência estilizada, não condizente com a produção.
A quantidade de caracterizações bizarras aumenta a cada cena com atuações ou engessadas ou superficiais. As situações vividas pelo elenco global – composto também por Vivianne Pasmanter – tem um cunho nonsense com cenas que remetem à psicodelia do uso de entorpecentes que permanece entre um recurso funcional e incomodo a quem assiste.
O filme não se posiciona entre o público mais crítico e nem mesmo pelo espectador menos seletivo. Sem qualquer reflexão, o desfecho nem mesmo encerra o ciclo iniciado na sinopse. A premissa se perdeu em meio as desequilibradas cenas que tentam parecer sofisticadas com base em grafismos visuais. A falta de substância e conteúdo predominam neste Jogo da Memória, a despeito do bom começo de Figueiredo em Cru.