Segunda experiência da musa Melanie Laurent na direção solo em longas-metragens, Respire trata da vida de Charlie (Joséphine Japy), uma moça de belas feições que em sua intimidade vive dramas comuns a tantos adolescentes da modernidade, como caos familiar e, claro, a sexualidade em ebulição.
Apesar da gravidade dos acontecimentos que ocorrem a Charlie, a moça não se furta em permitir experimentar novas sensações, e o roteiro de Laurent e Julien Lambroschini flagra a chegada de uma nova aluna, Sarah (Lou de Laâge), uma moça igualmente bela e bastante curiosa. A amizade entre as duas se dá de modo tão rápido que se confunde com um fórmula instantânea, mas que não soa falsa, uma vez que inter-relações efêmeras e automáticas são bastante comuns nesses estágio da vida.
Não demora para a amizade das duas evoluir, passando pelo estágio da absoluta cumplicidade, onde segredos e sonhos são compartilhados, habitando questões de pura curtição, com uso indiscriminado de substâncias ilícitas, desembocando enfim em uma intrincada e ambígua fraternidade, que vez por outra se confunde com possibilidades de affair, ainda que não haja nenhuma manifestação mais taxativa de homo afetividade, nem entre ambas tampouco com outras moças num primeiro momento.
As descobertas e o desabrochar da libido em meio a adolescência são retratadas de modo bem mais discreto do que em Azul é a Cor Mais Quente, ainda que seja mais enérgico que o recente As Vantagens de Ser Invisível. As mudanças na intimidade de Charlie e Sarah revelam surpresas desagradáveis envolvendo ameaças e desprezo, pondo algumas discussões bastante profundas em pauta, ainda que o tom seja leve na primeira camada da abordagem.
A gravidade dos eventos mostrados é suavizada pela direção sensível de Laurent nos primeiros tomos, o que provoca uma sensação de claro estranhamento, por se tocar de modo tão singelo em questões bastante agressivas e pontuais. O caráter do filme visa demonstrar que a crueldade e a obsessão estão longe de ser exclusividade do convívio adulto apenas, distanciando o conceito da simples descaracterização tola e reducionista que o bullying e o assédio moral são normalmente associados, mostrando-os de modo muito pessoal e normativo, o que torna este Respire bem mais palatável para o grande público do que Depois de Lúcia, por exemplo, já que este é motivado especialmente pelos maus-tratos, muito mais ligados a mente e a moral do que ao físico.
O formato defendido pela diretora faz Respire se aproximar bastante da recente filmografia de Bernardo Bertolucci, ainda que o registro das obsessões tenha muito mais visceralidade neste do que em Eu e Você. O clamor, que dá nome ao filme, é feito de um modo desesperado, aos soluços, intenso como a inevitabilidade da vida, cru como é a vivência comum, sem medo de revelar a verdade de modo rude e ríspido.